Conferences Agostinho Goenha juin 2010

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1 UNIVERSITÉ PARIS 8 Département d’Études des Pays de Langue Portugaise Textes des quatre conférences données à l’Université PARIS 8 par M. Agostinho Matias GOENHA, professeur à l’Université Pédagogique du Mozambique juin 2010

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UNIVERSITÉ PARIS 8

Département d’Études des Pays de Langue Portugaise

Textes des quatre conférences données à l’Université PARIS 8 par

M. Agostinho Matias GOENHA, professeur à l’Université Pédagogique du

Mozambique juin 2010

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Au nom des étudiants et des enseignants-chercheurs de

l’Université Paris 8, je me réjouis de la qualité e t de la richesse des

échanges entre notre université et l’Université Péd agogique du

Mozambique, dont les textes des conférences données à

l’Université Paris 8 par le professeur Agostinho Ma tias Goenha

témoignent.

Maria Helena Araujo Carreira

Professeur au Département d’Etudes des Pays de Langue Portugaise

Université Paris 8

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M. Agostinho Matias GOENHA est enseignant-chercheur de langue portugaise et de littératures africaines d’expression portugaise à l’Université Pédagogique du Mozambique. Il est titulaire d’un doctorat en Études Portugaises, spécialité “Littératures africaines d’expression portugaise”, obtenu en 2006 à l’Université Nouvelle de Lisbonne. Pendant le mois de juin 2010, M. Agostinho Matias GOENHA a été accueilli à l’Université PARIS 8, comme professeur invité par le Département d’études des pays de langue portugaise, avec le soutien du Service des Relations Internationales. À l’occasion de son séjour, M. Agostinho Matias GOENHA a donné à l’Université PARIS 8 quatre conférences en langue portugaise sur les thèmes suivants : - “Panorama de la littérature mozambicaine depuis l'indépendance” (mercredi 2 juin 2010) - ”Littératures africaines de langue portugaise et littérature portugaise : l'exemple mozambicain” (jeudi 10 juin 2010) - “Littératures nationales africaines de langue portugaise et littérature portugaise coloniale : problématique de la définition d'une “mozambicanité” littéraire” (jeudi 10 juin 2010) - “La situation linguistique au Mozambique et l'enseignement du portugais” (vendredi 11 juin 2010)

Cette brochure reproduit les textes de ces quatre conférences.

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FACULDADE FACULDADE FACULDADE FACULDADE DE CIÊNCIAS DA LINGUAGEM, COMUNICAÇÃO E ARTESDE CIÊNCIAS DA LINGUAGEM, COMUNICAÇÃO E ARTESDE CIÊNCIAS DA LINGUAGEM, COMUNICAÇÃO E ARTESDE CIÊNCIAS DA LINGUAGEM, COMUNICAÇÃO E ARTES

DEPARTAMENTO DE PORTUGUÊSDEPARTAMENTO DE PORTUGUÊSDEPARTAMENTO DE PORTUGUÊSDEPARTAMENTO DE PORTUGUÊS

MAPUTOMAPUTOMAPUTOMAPUTO----MOÇAMBIQUEMOÇAMBIQUEMOÇAMBIQUEMOÇAMBIQUE

Junho de 2010Junho de 2010Junho de 2010Junho de 2010

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Aspectos Gerais sobre a Cultura de Moçambique

A cultura Moçambicana, como a cultura africana em geral, continua a ser apenas

associada à arte tradicional, entretanto, há produções interessantes que importa

também valorizar ao nível dos criadores e intérpretes contemporâneos.

Moçambique é reconhecido, por exemplo, pelos seus artistas plásticos:

escultores (principalmente da etnia Maconde) e pintores (inclusive em tecido e

técnica batik). Esta escultura dos macondes, no norte de Moçambique é uma das

artes tradicionais mais conhecidas. Oa macondes são de origem ética bantu e

habitam uma vasta região da África Oriental. O vale do Rio Rovuma corta o planalto

maconde que se estende do norte de Moçambique ao sul da Tanzânia. Os macondes

são agricultores instalados numa região árida. Os seus escultores trabalham a

madeira desde tempos remotos. O ébano é o material mais utilizado.

A música vocal moçambicana também impressiona os visitantes. Em 2005, a

UNESCO reconheceu a timbila chope como um instrumento do património da

humanidade. A timbila é um instrumento de percussão utilizado pela etnia chope,

da província de Gaza, sul de Moçambique e que combina a música e a dança.

Neste sentido julgo que ninguém fica indiferente a estas manifestações culturais, na

sua relação com a arte da escrita que, bastas vezes, busca inspiração e ‘voz’ nessas

manifestações.

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O País Moçambique

Maiores Elevações

Monte Binga (Manica) 2436 Montes Namule (Zambézia)

2419

Serra Zuira (Manica) 2277

Messurussero (Manica) 2176

Massasse (Manica) 2134

Monte Domue (Tete) 2095

Serra Mácua (Zambézia) 2077 Serra Chiperone (Zambézia)

2054

Elevação em metros

Principais Rios

Zambeze 820

Rovuma 650

Lúrio 605

Messalo 530

Licungo 336

Save 330

Pungue 322

Buzi 320

Maputo 150

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População Projectada Total e por Província, 2007

População 2007

Total 20.226.296

Homens 9.734.678

Mulheres 10.491.618

Províncias

Niassa 1.169.837

Cabo Delgado 1.605.649

Nampula 3.985.285

Zambézia 3.848.274

Tete 1.783.967

Manica 1.412.029

Sofala 1.642.636

Inhambane 1.252.479

Gaza 1.226.272

Maputo Província 1.205.553

Maputo Cidade 1.094.315

Fonte: Instituto Nacional de Estatística (Moçambique)

Extensão em kms

Extensão Territorial

Total 799 380

Terra Firme 786 380

Águas Interiores 13 000 território em km2

Línguas Maternas Bantu

Ekoti Cindau

Shimakonde Ciwutewe Elomwe Cimanika Echuwabo Xitshwa

Shona Xichanga

Cisena Gitonga

Lolo Txitxopi

Ciniyungwe Xironga

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Pintura de

Malangata tornou-se, a partir dos anos 60, um nome de projecção internacional. É

dos mais reconhecidos artistas moçambicanos e já experimentou várias áreas, como

pintura, desenho, aguarela, gravura, cerâmica, tapeçaria, escultura, mural.

A este artista, juntam-se pintores como Naguib, Chichorro, Bertina Lopes, entre

muitos outros. Bertina Lopes já expôs na Fundação Gulbenkian, em Portugal, no

Luxemburgo, Espanha, Moçambique, Angola e Cabo Verde.

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TEMA A: Literaturas Africanas de Língua Portuguesa e Literatura Portuguesa: o exemplo moçambicano

O papel da imprensa no surgimento da Literatura em Moçambique

Antes de nos debruçarmos sobre este tema, importa referir, de forma sintética e para efeitos de contextuliação, que nas ex-colónias

portuguesas o surgimento da literatura tem raízes sobretudo na actividade jornalística. De um modo geral, são consideradas

três condições prévias que contribuiram para o surgimento das literaturas africanas em língua portuguesa, a saber, (i) a abolição

do tráfico de escravos; (ii) a criação de uma rede escolar e (iii) a introdução da Tipografia, consequentemente, da Imprensa.

Neste sentido, pode-se constatar que a evolução da literatura escrita em Moçambique tem necessariamente uma ligação directa

com o surgimento da Imprensa. Como anotou Margarido, a imprensa da época «aborda os problemas da burguesia do momento, a

qual (…) se vê muito depressa ultrapassada pelo aparecimento de fenómenos económicos consecutivos à exploração intensiva do país

(…). A imprensa colocará, então, o problema da colonização de Moçambique (…). Em torno do Jornal Brado Africano, reunir-se-ão com

esse objectivo negros, mestiços, às vezes indianos e mesmo, embora raramente, brancos.» (Alfredo MARGARIDO, 1980: 67)

Alguns estudiosos consideram que o primeiro escritor de língua portuguesa nascido em Moçambique era, sobretudo, poeta e que

tal facto prenunciava o que viria a acontecer e a caracterizar as primeiras manifestações da Literatura em Moçambique: terra de poetas,

sobretudo no período de emergência; chamava-se José Pedro da Silva CAMPOS OLIVEIRA.

Campos Oliveira nasceu numa localidade fronteira à Ilha de Moçambique (Cabaceira) em 1847. Era filho de gente abastada. Tornou-se

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funcionário público, primeiro, na Índia e depois em Moçambique.

Breve historial sobre a primeira capital de Moçambique

Até ao século XIX, a primeira capital de Moçambique estava sedeada no Norte do país, concretamente, na Ilha de Moçambique, na

actual província de Nampula. A base de desenvolvimento económico da ilha era o comércio de escravos, principalmente para o Brasil.

Em termos de administrativos, a Ilha estabelecia uma forte dependia com a Índia, particularmente através de Goa, por delegação

da Coroa portuguesa. Todos os funcionários, ou quase todos, eram goeses. No ano de 1810, esta Ilha passou a ter o estatuto de cidade.

Por esse período (sensivelmente, nos finais do século XVIII) chega à então capital (Ilha), degredado para Moçambique, Tomás António

Gonzaga, preso em 1789 no seu país, acusado de conspiração por ter participado no movimento reivindicativo da Inconfidência

Mineira (ocasionada pelo aumento de impostos sobre os minérios por parte de Portugal). Esse aumento originou uma grande insatisfação

geral. Importa recordar que a Inconfidência Mineira foi perpetrada, basicamente, por um pequeno grupo de letrados, muitos deles ex-

estudantes da Universidade de Coimbra.

Tomás Antônio Gonzaga, nascido em 1744, em Miragaia, Porto (Portugal), morreu na Ilha de Moçambique, em 1810. O seu nome árcade

é Dirceu; foi um jurista, poeta e activista político luso-brasileiro. É considerado o mais proeminente dos poetas árcades e neoclássicos.

Cumpriu a sua pena de três anos na Fortaleza da Ilha das Cobras, no Rio de Janeiro. Em 1792, a pena é comutada em degredo e o poeta

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é enviado à costa oriental de África, a fim de cumprir, em Moçambique, a sentença de dez anos.

Como referimos acima, o comércio de escravos era a actividades básica e em franco desenvolvimento na Ilha; entretanto, com a

Independência do Brasil em 1822, a 7 de Setembro, esse comércio ficou ameaçado, na medida em que o Brasil era um dos destinos

desses escravos. Neste sentido, no que diz respeito a esse comércio de escravos, houve uma mudança de estratégia: os escravos foram

transferidos para as plantações.

Em 1888, José Campos de Oliveira regressa à Ilha, vindo de Goa, onde esteve a estudar e, mais tarde, a trabalhar como funcionário

público. Destacou-se como pessoa interessada pela vida cultural da Ilha e, em particular, pela actividade literária.

Um dos documentos oficiais que circulou nas colónias foi o Boletim Oficial. Na Ilha de Moçambique foi publicado em 1854. Campos

Oliveira colaborou também no Almanaque de Lembranças de larga circulação na época nas colónias portuguesas.

Convém recordar que, após a abolição do comércio de escravos, foram criados alguns jornais que eram pertença do Estado, que

legitimavam obviamente o poder dos senhores Proprietários: Em 1868 surge o primeiro Jornal “O Progresso” e em 1875 surge o

Jornal “ O África Oriental”.

Em termos de vivência humana, a Ilha de Moçambique era heterogénea, pois transitaram por ela portugueses, árabes, goeses, brasileiros

e outros. Paralelamente à actividade jornalística, a Ilha apresentava igualmente uma dinâmica cultural característica, por exemplo,

realizavam-se alguns saraus culturais à volta das autoridades portuguesas. Havia também um clube literário recreativo; mais tarde,

estas actividades culturais e literárias faliram, entretanto, supõe-se que terá sido precisamente nesses saraus que Campos Oliveira foi

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conhecido pela elite da época, na ilha.

Em 1881 Campos Oliveira cria a primeira Revista Literária designada “Revista Africana” tornando-se simultaneamente seu

director e autor. Profissionalmente desempenhou também as funções de Director dos Correios da Ilha de Moçambique. Crê-se que

Campos Oliveira tenha reivindicado nessa revista alguns versos do já aludido poeta brasileiro Tomás António Gonzaga de

quem tinha grande admiração. Importa salientar ainda que Campos de Oliveira dedicou-se também ao jornalismo e era uma espécie

de crítico social, contudo, esse facto não parece ter influenciado, de forma marcada, a sua escrita literária, ou seja, não se terá reflecido,

eventualmente, na sua poesia.

Influência do Ultraromantismo português em Campos Oliveira

Importa antes recordar que o Romantismo marca uma ruptura com a sociedade feudal e tem a sua base na Revolução Francesa. Esta

defendia direitos iguais entre os Homens e o seu lema era: Igualdade, Fraternidade e Liberdade.

Observa-se ainda, ao nível da visão do mundo, que o centro do universo já não é a terra, pois Galileu tinha descoberto que esta gira à

volta do sol. Coloca-se o Homem como o centro do universo, com imaginação, criatividade, etc.

O Romantismo nega os princípios de seguidismo das regras instituídas pelos Clássicos, ou seja, recusa o dogma, nega a rima e a métrica

tal como eram concebidos por estes e cria a imagística (verso livre ou branco); quebram-se as imagens mitológicas, de magia, da

Antiguidade Clássica. O poeta romântico centra-se no culto do EU, nos sonhos, na morte, no álcool, etc.

A escrita literária de Campos Oliveira sofre uma forte influência do Romantismo Português, concretamente do Terceiro

Romantismo (Ultra-Romantismo) e a sua manifestação na Ilha de Moçambique realiza-se com um certo atraso em relação aos

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autores portugueses.

Para esta elucidação, o poema mais representativo é “Uma Visão”, de Campos de Oliveira:

Uma Visão Ao meu amigo

A. do Rozario Alvares

Cismando na gentil, donosa virgem, Que amo na terra com ardor imenso Eu adormecera uma vez tranquilo!... Alta noite, sonhei-a…triste, pálida, Desfigurada, sem vida, já morta!!! Vi o seu corpo esbelto, donairoso, Imóvel e, como a neve, gelado! Aqueles olhos meigos, fascinantes, Já despidos do seu fulgor divino! Os lábios mudos, sem a cor carmínea! Desbotadas de todo, as róseas faces!... Rodeava-lhe a fronte imaculada D´alvas, virgínias rosas uma coroa Da sua própria mãe pelas mãos posta! E jazia a donzela num esquife Vestido de negro, do qual em roda Gente imensa reunida a contemplava! Em todos os semblantes eu bem via Profundos sinais de profunda mágoa; Da mãe os prantos, os ais, descrevê-los Não posso eu por certo; expressões me faltam,

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E eu contemplava-a mudo, triste atónito. Com os olhos de lágrimas banhados, Até que enfim já vê-la não podendo Por mais tempo, naquele triste estado Afastei-me dali mui pesaroso. Momentos após, quis ainda lançar-lhe Mais um olhar, só um, o derradeiro… Mas não achei ninguém. Do campanário Uns tristes sons, funéreos, compassados Ouvir supus; ao longe, bem ao longe Vozes confusas, trémulas, plangentes! Entendi que a donzela conduziam Ao asilo final da humanidade! Gritei doido, varrido, e presuroso Ao cemitério encaminhei meus passos! Que cena pavorosa, Deus Eterno! Sacerdotes inúmeros eu via Por entr´as sepulturas, cabisbaixos, Co´acesas tochas dextra, entoando Cânticos dolorosos, que ecoavam Majestosos pela amplidão enorme Da soturna morada; e povo imenso, De luto revestido, silencioso, Escutava magoado as tristes vozes!... Sepultaram, afim, a linda virgem! Oh! Não sei que senti n`esse momento! Parecia-me já que a alma ia arrancar-se Do corpo, que tremia soluçante! …………………………………………... ……………………………………………

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Sumiu-se a gente toda! E sozinho, Sozinho me achei na tétrica estância! Oh! Que horror me infundiam as caveiras Alvacentas, mirradas e disformes Que em roda de mim eu via espalhadas! Que medonhos fantasmas pareciam Quietos divagar ante meus olhos! E além ouvia do mocho agoureiro, Dos cemitérios o nocturno socio, Os horríssonos pios vagarosos Cortando da noite a mudez profunda! Vencendo o susto em que submerso estava Estas palavras disse, o céu olhando: «Ó meu Deus! Primaveras só catorze «contava a desgraçada, e tão depressa «era para morrer?! Morreu?! Ai tudo «Para mim acabou-se neste mundo! «Nunca jamais verei aqueles olhos «Repletos de pudor e de inocência… «Oh! Jamais hei-de vê-la! Triste sina!... «E tu agora, pobre, triste lira, «Que tantas vezes a cantaste, tantas «Emudeceste! Não terás mais cantos, Que a inspiração caiu-te para sempre! Nada me resta mais o mundo, nada. «Somente a esperança de que bem depressa «Irei vê-la no céu, onde repousa «Confundida entre os anjos, junto ao trono «Do ser Eterno! Irei, sim, vê-la em breve, «Pois que muito viver não pode aquele «Aquém já falta da vida metade!...» Isto disse, e convulso, lacrimoso,

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Ajoelhei sobre a gélida lage, Que eu vira encerrar a virgem; eis súbito O meu nome bradar sinto. Desperto! Desperto! O coração me palpitava Co´stranho palpitar, suor gelado Inundava-me a fronte toda! …………………Ergui-me E meditei no sonho que tivera No sonho tão horrível, pavoroso… E caiu-me dos olhos uma lágrima!...

(Campos Oliveira)

Este poema pode ser comparado, ao nível formal e temático a «O noivado do sepúlcro», do português ultra-romântico Soares de Passos.

Tecendo breves comentários em torno deste poema de Campos Oliveira, pode-se constatar que se apresenta como dedicatória ao amigo

A.do Rosário Alves, iconicamente está organizado em treze estrofes, com versos livres ou brancos.

O sujeito lírico reporta o acontecimento vivido por ele no sonho de amor (por uma amada) tido (o sonho) numa noite; o alvo desse sonho

é a “morta amada”:

(...) “eu adormecera uma vez tranquilo!... Alta noite sonhei-a...triste, pálida, Desfigurada, sem vida, já morta!!!” “o seu corpo esbelto, donairoso (...) olhos meigos, fascinantes” (...)

O sujeito poético descreve essa amada euforicamente, recordando o seu estado físico, quando viva; caracterizando-a como inanimada: “

(olhos) já despidos do seu fulgor divino/ os lábios mudos, sem a cor carnínea”. A descrição da amada penetra no interior do

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“esquife”, onde ela jaz e, por sua vez, o sujeito poético apresenta-se como um ser vivo que se recorda eufórica e disforicamente da

“donosa” virgem”; faz menção ao ambiente fúnebre vivido no momento do enterro: a presença da multidão no acto, destacando-se a

mãe da defunta, cujos “prantos, os ais”, não conseguiu descrevê-los por falta de palavras.

Ainda no enterro, o sujeito poético continuou a “sonhar” ,sem estar a dormir, imaginando o quão “são tristes, funéreos,

compassados” os passos e deduziu tratar-se da comitiva fúnebre que conduzia a donzela “ao asilo final da humanidade”, pois ao

anoitecer “(e) além ouvia do mocho agoureiro”.

O sujeito poético procura estabecer igualmente um monólogo «dirigido» à recém-morta, clamando pela sua morte prematura e

desgostando-se da vida: “Óh meu Deus, primaveras só catorze”; exprimindo os seus tristes sentimentos, as suas incontroladas

emoções; perde o gosto pela vida e evade-se na morte:

“(...) Morreu! Ai tudo Para mim acabou-se neste mundo!...Nada me resta mais no mundo, nada, Somente a esp’rança de que bem depressa Irei vê-la no cêu, onde repousa (...). Irei vê-la no mundo” (...).

Terminado o sonho, ainda na sepultura da “donosa virgem”, ajoelhado, desperta do sonho, voltando-se para si, ao ouvir uma voz que

chama por si. O sujeito poético recorda-se do sonho tido na véspera com mágoa e tristeza: “Desperto (...) ; caiu-me dos olhos – uma

lágrima”.

De forma sintética, é de destacar neste poema de Campos Oliveira: a evocação da amada morta; o sonho como meio de evocação; o

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cemitério como cenário; o mocho – indicador de um certo presságio; o apelo às cenas naturais – a comitiva fúnebre; o gosto pelas horas

mortas da vida; o recurso a alguns vocábulos apelativos do romântico, como cismando, donosa, ardor, desfigurada, donairosa, fulgor,

carmínea, roseas, imaculada, d’alvas virgíneas, esquife, prantos, pesaroso, campanáreo, funéreos, plangentes, donzela, doído, dextra,

alvacentes, agoureiro, horríssonos, etc.

Conclui-se, desta breve análise, que o texto tem aspectos característicos da época do ultra-romantismo português; vejam-se

alguns: a evocação da morte; o cemitério como cenário; o mocho como indicador de certo presságio; o gosto pelas horas mortas; o prazer

pelo luar; o amor decepcionado. Basicamente, a morte, o cemitério e a tristeza constituem o epicentro deste poema.

Não obstante o facto de a primeira manifestação literária se ter feito sentir na Ilha de Moçambique, também em Quelimane houve

manifestações sobretudo de imprensa, através dos seguintes jornais: 1872 – O Vigilante, 1877 – O Africano, 1892 – O Amor Africano.

A dinâmica cultural na cidade de Lourenço Marques: “O Africano” e “O Brado Africano”.

Por razões económicas, no século XVIII, a capital da cólonia transfere-se do Norte (Ilha de Moçambique) para o Sul (ex-Lourenço Marques

– actual Maputo), mas oficialmente, só nos finais do século XIX, a 10 de Novembro de 1887 é que se torna capital. Aqui a imprensa vai

desempenhar um papel preponderante de crítica ao regime colonial e teve um forte carácter interventivo; era um factor dinamizador

da arte, particularmente, da literatura; um meio difusor da opinião pública; era independente, liberal e progressista e constituia-se

como um meio de realização dos propósitos intelectuais da classe média africana.

Esta dinâmica cultural em Moçambique, isto é, as transformacões sociais, foram grandemente favorecidas pela instauração do sistema

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republicano na então Metrópole, que destituira a Monarquia.

Grande papel desempenharam os jornais surgidos, que tiveram igualmente como vectores do seu dinamismo (i) a fundação das

Companhias de Manica, Sofala e Niassa, (ii) a necessidade de propaganda republicana e a luta política relativa à implementação da

República em Portugal, (iii) o eclodir e o fim da 1ª Guerra Mundial, entre outras.

A imprensa surge em Lourença Marques em 1888, também como consequência da importância da ligação ferroviária com o Transvaal

(África do Sul).

Com a implantação da República em Portugal, em 1910, assiste-se em Moçambique a uma fervilhante actividade jornalística

por parte de operários portugueses que na maioria tinham ido (vindo) para Moçambique por motivos políticos (como degredados).

Em apenas 10 anos surgiram 20 novos jornais, alguns com número único, mas todos caracterizados pela sua adesão à Repúlica; são eles:

O Gráfico, Os Simples, Jornal Operário, O Proletariado, Germinal, Os Emancipados, etc.

Curioso é notar que, em todos, os problemas da classe operária em Moçambique estão relacionados normalmente com o homem branco.

Nunca o homem negro é referido em termos de igualdade com o branco na exploração a que, enquanto operários, ambos estavam

sujeitos. É neste contexto que se demarca em primeiro lugar o jornl O Africano, fundado em 1908, por iniciativa dos irmãos Albasini e

mais tarde, O Brado Africano, que lhe sucede em 1918, também sob orientação de José Albasini e João Albasini e outros.

Importa salientar ainda que em Lorenço Marques havia grupos de assimilados que se reuniam em torno de duas importantes

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organizações, O Grémio Africano e A Associação Africana. O Grémio Africano congregava personalidades-chave da vida social,

cultural e intelectual de Lourenço Marques, algumas delas tinham profissões liberais, tais são os casos dos irmõs Albasini, de Joaquim

Stewart, de Karell Pott, de Guilherme Bruhein, entre outros.

Ainda a propósito do jornal O Africano: para além dos Albasini, fundaram-no também Guilherme Bruhein e Joaquim Stewart. Fazia

propaganda a favor da instrução escolar; era dirigido às populações locais; foi o primeiro jornal que se tornou bilingue:

Ronga e Português. De qualquer modo, o seu discurso não deixou de ser fragmentário e contraditório (dado o seu estatuto social e

administrativo ambíguo), apesar de nacionalista, como se nota deste artigo jornalístico:

«Por este território já muito preto sabe ler: mas sabe ler o quê/ Landim!! Somos, portanto, obrigados a escrever landim para sermos compreendidos. Aqui temos outro mal que pretendemos combater: os dialectos cafres. Pode parecer uma parvoice (...) mas compreendemos muito bem que não é landim que nós precisamos saber – queremos falar e escrever Português o melhor que pode ser. Somos portugueses. A ideia desta escola pode dizer-se que é um pretexto à orientação seguida ultimamente pelos (...) pais da pátria. Apesar de todo o seu empenho, com o Arcebispo de Sienne à frente, o resultado é de que os missionários só falam Landim (...). Para opôr uma forte barreira à tolice pretendemos pois fundar uma escola para o ensino de Português e pensamos que dentro da nossa escola não se falará outra língua».

In “O Africano” nº 1, 25 de 12 de 1908”.

Os fundadores deste jornal já tinham, de certo modo, ligações com o Pan-Africanismo (mais adiante referimo-nos a este movimento).

Este movimento, nos anos 40 torna-se mais organizado após a realização, em Londres, da sua 1ª conferência. Também tiveram ligações

com a ideologia trazida pela Revolução Francesa e com a Massonaria.

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É à volta desta publicação que homens como Bandeira de Castro, Estácio Dias, Rui de Noronha, etc, passam a desenvolver

uma intensa actividade que se caracteriza pela defesa dos interesses do homem negro, pela denúncia das arbitrariedades

cometidas sobre as populações nativas e pela defesa da prevenção de certos valores da cultura moçambicana.

Massonaria – Ideias: fraternidade universal, liberdade religiosa (laicidade), liberalismo (sistema político defendido), socialismo e

humanismo. Baseia-se nos Símbolos de construção. É uma sociedade secreta de inspiração iluminista, defensora dos princípios da

liberdade, igualdade e fraternidade.

O jornal “O Brado Africano”, para além de ser um semanário bilingue (Ronga/Português), apresentava três vectores de conflitos:

com a igreja, com o governo e dentro do próprio jornal, o que contribuiu, de certa forma, para o seu fim.

Esta geração é literária ou política?

Percurso

Protagonistas Actividade política Actividade literária

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João Albasini (1876-

1922)

José Albasini (? - 1935)

Estácio Dias (? - 937)

Karrel Pott (?)

Rui de Noronha (1909-

1943)

Augusto Conrado (1904-

?)

1908 -1922 14 anos

1908 – 1935 27 anos

1908 – 1937 29 anos

1932 –1937 5 anos

1926 – 1941 15 anos

1928 – 1941 13 anos

O livro da dor”[1925]

“Sonetos” [1946]

“A perjura ou a mulher

de duplo amor” [1935]

“Versos”[1935](V)

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“Divagações”[1938](VI)

Anotações suplementares referentes ao quadro :

O livro da dor - Livro de cartas, “Diário”, às raparigas – Publicaçào póstuma, tem fortes marcas de influência do romantismo

português.

Os “Sonetos” de Rui de Noronha, de publicação póstuma, em 1946, reflectem também uma forte influência do romantismo

português. O caso mais ilustrativo é o da intertextualidade entre o poema de Antero de Quental (A um poeta) e o de Rui de Noronha

(Surge et ambula). Este poema, para além de ser uma dedicatória ao poeta português, estabece um interxto com a Bíblia e é uma glosa

à epígrafe do soneto de Antero de Quental a que nos referimos, como se pode constatar abaixo:

A um poeta Surge et ambula! Tu, que dormes, espírito sereno Posto à sombra dos cedros seculares, Como um levita à sombra dos altares, Longe da luta e do fragor terreno, Acorda! É tempo! O sol, já alto e pleno, Afugentou as larvas tumulares... Para surgir do seio desses mares,

Surge et ambula Dormes! E o mundo marcha, ó pátria do mistério. Dormes! E o mundo avança, o tempo vai seguindo... O progresso caminha ao alto de um um hemisfério E no outro tu dormes o sono teu infindo... A selva faz de ti sinistro eremitério,

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Um mundo novo espera só um aceno... Escuta! É a grande voz das multidões! São teus irmãos, que se erguem! São canções... Mas de guerra... e são vozes de rebate! Ergue-te pois, soldado do futuro, E dos raios de luz do sonho puro, Sonhador, faz espada de combate! Antero de Quental

(Portuga

Onde sozinha, à noite, a fera anda rugindo. A terra e a escuridão têm aqui o seu império E tu, ao tempo alheio, Ó África, dormindo... Desperta. Já no alto adejam negros corvos Ansiosos de agir e de beber aos sorvos Teu sangue ainda quente, em carne de sonâmbula... Desperta. O teu dormir já foi mais que terreno... Ouve a voz do Progresso, este outro Nazareno Que a mão te estende e diz – «África, surge et ambula»

Rui de Noronha (Moçambique)

Propostas temáticas que corporizam a poesia da época e correntes de pensamento influnciadoras

A causa africana, a raça e o progresso são os temas que predominam nos discursos jornalístico e poético desta geração. Aflora-se

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também a junção destes elementos Em relação à causa africana, era evidente e intencional a denúncia das condições de vida e de

trabalho; a denúncia dos abusos de autoridade; a reivindicação do direito a ser educado (à instrução) e a ser “civilizado”.

Ao discurso adoptado, que designamos por fragmentário, contraditório e descontínuo, Mário de Andrade designa-o de

protonacionalista. O Memorial por eles escrito no Brado Africano na época é notável e elucidativo, nesse aspecto:

Memorial

Nesse memorial é posta em causa a portaria 317 de 9 de Janeiro de 1917 (Boletim Oficial Nº 2 1ª série de 13 de Janeiro de 1917) conhecida como a portaria dos assimilados. “Como é que se distingue um assimilado de um selvagem? A pergunta parecerá néscia, mas é sobre ela que infelizmente temos que queimar a girândola dos nossos pensamentos. Naturalmente ninguém deixará de distinguir um homem culto de um inculto. E se esse lamentável desastre se desse alguma vez com uma autoridade sertaneja, se houvesse um fncionário administrativo que, pelo aspecto, pela conversação, pelo porte não distinguisse um homem dentro dos moldes da colonização portuguesa (compatível com a estonteadora difusão da instrução que Portugal tem espalhado nesta colónia) essa autoridade deveria ser imediatamente substituida por um muleque que, certamente, sempre saberá distinguir quem se senta com propósito e à vontade numa mesa. V.Exª., pode, querendo, solucionar esta horrenda questão determinando simplesmente o que o código civil exige e a lei do recenseamento preceitua. É cidadão português aquele que for eleitor e elegível. Isto é que a lei geral e não irritará ninguém (...porque o lado melindroso desta abominável portaria está justamente no facto indecoroso e ailtante de se distinguir ums determinados cidadãos para serem marcados, para andarem munidos de um papel o tal alvará. Porquê? Não é preciso andar com alvarás alvitantes para mostrar a padeiros analfabetos que são brancos, mas que, brancos como são, ou por culpa sua ou dos pais ou do Estado não lêem o papel. É agradecer pouco, é uma flagrante injustiça. Exmº. Sr. Retribuir o gigantesco esforço que meia dúzia de nativos fez e fez para sair da chata rotina, marcar-se-lhe com uma ignomínia a vontade, a dedicação e a coragem de aprender à sua custa a língua estranha escrever e ilustrar-se pelo seu único esforço”. Assinaram: João Albasini, José Albasini, Vicente Xavier Lobo, Joaquim Swart, Guilherme Bruhein.

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Alguns conceitos contextualizadores:

Ideologia do protonacionalismo: impõe-se como tema a questão do “negro”, desde a dimensão sócio-económica, com o pedido de

não aplicação da lei de excepção, à racial.

Exige-se a “reabilitação do negro” e do seu passado. Surge a ideia de que não há raças inferiores e que o “negro” tem um papel na

história – aqui surge a ligação com o Pan-africanismo.

Progresso – há a ideia de que o progresso vem da Europa e que a solução para o “negro” é adquirir o ensino baseado em

ideologias europeias; daí esta “Associação” de negros aceitar o Governo Português para a instrução e consequente progresso. Esta é uma

atitude contraditória em relação à anterior posição de reivindicação da “africanidade” por eles defendida. Neste discurso não há ainda a

ideia de povo e de nação. (Só o discurso nacionalista - posterior - é que põe em causa a soberania portuguesa e propõe as noções de país

e de nação).

É nesta controvérsia que surge a questão da língua:

Moçambique tinha, e ainda tem, uma cultura de oralidade. O desenvolvimento da cultura de uma sociedade depende do seu

desenvolvimento científico e tecnológico. A cultura europeia é letrada e por isso apodera-se de alguns conceitos filosóficos e científicos,

pois tem um registo. A dicotomia línguas nativas/língua portuguesa torna-se relevante, na medida em que alguns dos integrantes desta

geração em referência defendem que as línguas africanas são incapazes de veicular conceitos científicos.

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Esta é a razão, segundo eles, que lhes levou a adoptar a escrita em língua portuguesa. Como se pode notar, os escritores desta

geração não tinham tradição literária moçambicana, para a literatura escrita e são obrigados, pela contigência histórica, a

apropriarem-se da língua portuguesa, tendo eles, de certo modo, também uma tradição africana. Cria-se, assim, uma

situação conflituosa.

Ainda que também não tenha tido uma tradição literária moçambicana, é a partir de Rui de Noronha que se pode

considerar que existe já alguma tradição na literatura moçambicana (ainda que com reservas).

Neste sentido, a literatura moçambicana não é totalmente autónoma; tem ligações com as literaturas portuguesa (na sua fase iniciática,

com o Romantismo e, de certo modo, com o Realismo) e Brasileira, por via do Arcadismo e do Realismo.

Mais tarde, a partir dos anos 50, a literatura escrita em Moçambique ganha uma nova dinâmica, na sequência dos movimentos políticos

globais. Estes marcaram muito a literatura da época, em parte, por via da incorporação da estética literária neo-realista, para o caso

português, cujos propósitos e temáticas «colavam» com os seus.

Pode-se considerar, nesta perspectiva, que é a partir desta época que se manifesta uma literatura escrita moçambicana com alguma

propriedade (será uma espécie de ponto de referência iniciático), na medida em que esta começa a afastar-se, de certa maneira, dos

cânones da literatura hegemónica portuguesa. Aliás, é deste tópico que vamos tratar no tema seguinte, na sua relação com a

abordagem feita supra.

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BIBLIOGRAFIA 1. ANDRADE, Mário de, Prefácio à Antologia Temática de Poesia Africana I, na noite grávida de punhais. Livraria Sá da Costa, 2ª ed., Lisboa, 1977. 2. ANDRADE, Mário de, Prefácio a Cadernos de Poesia Negra de Expressão Portuguesa, C.E.I., Lisboa, 1953. 3.- CARRILHO, Maria, Sociologia da Negritude, Edições 70, Lisboa, 1976. 4. MARGARIDO, Alfredo, Estudos sobre literaturas das Nações Africanas de Língua Portuguesa, A regra do Jogo, Lisboa, 1980. 5. MARTINHO, Fernando J. B, “Karingana ua Karingana de José Craveirinha”, Cadernos de Literatura, Coimbra, (1982?), p.p. 34-41. 6. MATUSSE, Gilberto, “A Subida em aproximação à morte – o progresso tecnológico num poema de Craveirinha e dois de Knopfli”, Limani 4, Maio, 1988, p. 75-82. 7. MENDES, Orlando, Sobre Literatura Moçambicana, INLD, Maputo, 1978. 8. MENDONÇA, Fátima, Literatura Moçambicana – A Histótia e as Escritas, Faculdade de Letras e Núcleo Editorial da UEM, Maputo, 1988. 9. MOSER, Gerald. Essays in Portugues African Literature, University Park, Pennsylvania State University, 1969. 10. TENREIRO, F.J. e ANDRADE, Mário Pinto, Poesia Negra de Expressão Portuguesa, África, Lisboa, 1982. 11. ROCHA, Ilídio, “Sobre as origens de uma literatura moçambicana de expressão portuguesa: raízes e consciencialização”, In Les Litteratures Africaines de langue portugaise – À la recherche de l’ identité individuelle et nationale (Actes du colloque in international), Paris, Foundation Calouste Gulbenkian. Centre Culturel Portugais, 1985, p.p. 407-410. 12. FANON, Frantz, Peles Negras, Máscaras Brancas, Paisagem, Porto, 1975. 13. FERREIRA, Manuel, O Mnacebo e Trovador Campos Oliveira, Imprensa Nacional – Casa da Moeda, Lisboa, 1985. 14. FERREIRA, Manuel, Literaturas Africanas de Expressão Portuguesa, Instituto de Cultura Portuguesa, VOL. 2, Lisboa, 1977. 15. HAMILTON, Russel G, Literatura Africana, Literaura Necessária II. Edições 70, Lisboa, 1984. 16. FERREIRA, Manuel, No Reino de Caliban I, II e III, Plátano, Lisboa, 1985. 17. LEITE, Ana Mafalda, A Poética de José Craveirinha, Colecção “Palavra Africana”, Vega, Lisboa, 1991. 18. KNOPFLI, Rui, “Breve relance sobre a actividade literária”, Facho, nrº 30. Ed. Sonap, Lourenço Marques, Set/Outubro, 1974.

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TEMA B: Literaturas Nacionais Africanas de Língua Portuguesa e Literatura

Portuguesa Colonial: Problemática da Definição de uma Moçambicanidade

Literária

Problemática teórica introdutória: literatura portuguesa colonial vs literaturas

nacionais africanas em língua portuguesa

O conceito de ‘literatura colonial’ refere-se àquela literatura que foi produzida desde

a colonização até às independências; remonta da época dos descobrimentos

portugueses, com cronistas como Fernão Lopes. Esta literatura descrevia,

basicamente, o exótico desconhecido, as terras (fauan e flora) estranhas, as gentes

nativas e os seus costumes, isto nos séculos XV-XVI, mas é a partir dos séculos

XVIII e XIX que se manifesta uma produção da literatura colonial com um

carácter, de certo modo, regular.

Importa antes referir que, de uma maneira geral, a abordagem das literaturas

africanas em língua portuguesa pressupõe uma relacionação a dois níveis: (i) ao

nível da tradição oral africana e (ii) ao nível da literatura portuguesa como literatura

antecessora.

Pode-se afirmar que, grosso modo, a literatura colonial se caracteriza pela

valorização do eurocentrismo literário e, em relação a África, pela folclorização

dos vários aspectos culturais africanos. A sua ideologia era marcada pela

política assimilacionista dos nativos, pela evangelização da doutrina cristã

e, mais tarde, pelo Fascismo.

A incapacidade de penetrar no mundo africano e na complexidade do nativo

condicionam a produção de uma literatura cujo centro do universo litarário é o

Homem europeu, ocorrendo, bastas vezes, a “coisificação” ou a “animalização” do

Homem africano. Este era superficialmente referido e era visto como um objecto

passivo, porque era desconhecido e, em contrapartida, o Homem europeu era visto

como um sujeito dinâmico.

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O Homem europeu é elevado à categoria de herói mítico, desbravador de

terras inóspitas, portador de uma cultura superior e distribuidor de saberes

civilizacionais a gentes incultas.

Este ideário teve, na época um forte suporte teórico e seguidores desapaixonados,

alguns dos quais, autores desta literatura colonial. De entre vários, vingaram as

ideologias do francês Conde Joseph Arthur de Gobineau (Ville-d'Avray, 14 de

julho de 1816 — Turim, 13 de outubro de 1882). Foi um diplomata, escritor e filósofo

e um dos mais importantes teóricos do racismo no século XIX.

Gobineau nasceu de família comum, com poucas posses. Mais tarde, criaria para si

uma falsa genealogia que o colocaria como membro de uma família aristocrática,

passando a fazer-se conhecer pelo título nobiliárquico adoptado de "Conde de

Gobineau".

Vivendo em Paris, a partir de 1835, tornou-se funcionário público como secretário do

escritor Alexis de Tocqueville, nomeado ministro, em 1849. Como diplomata,

Gobineau serviu em Berna, Hanover, Frankfurt, Teerã, Rio de Janeiro e Estocolmo.

Tinha pretensões artísticas, tendo tentado ser escultor e romancista, entretanto,

celebrizou-se como ensaista ao escrever Ensaio sobre a desigualdade das raças

humanas (1855), seu livro mais célebre, um dos primeiros trabalhos sobre a eugenia

e o racismo publicados no século XIX. Segundo ele, a mistura de raças

(miscigenação) era inevitável e levaria a raça humana a graus sempre maiores de

degenerescência física e intelectual. É-lhe atribuída a frase:"Não creio que viemos

dos macacos mas creio que vamos nessa direção."

Outros europeus marcaram este ideiário racista, tal é o caso do inglês Lord

Joseph Chamberlain (Londres – 1836; Birmingham – 1914). Proeminente político

britânico das colónias, foi um dos promotores do movimento imperialista universal,

foi Ministro das colónias, de 1895 a 1903).

Mais tarde, o livro “Mein kampf “ de Adolf Hitler, alemão foi também muito

marcante nesse sentido. Mein Kampf, que em português significa Minha Luta, é o

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título do livro de dois volumes da sua autoria, no qual expressa as suas ideias anti-

semitas, racistas e nacionalistas, então adoptadas pelo partido nazi. O primeiro

volume foi escrito na prisão e editado em 1925, o segundo foi escrito fora da prisão

e editado em 1926. ‘Mein Kampf’ tornou-se um guia ideológico e de acção para os

nazis e ainda hoje influencia os neo-nazis, sendo chamado por alguns de "Bíblia

Nazi".

É importante ressaltar que as ideias propostas em ‘Mein Kampf’ não surgiram com

Hitler, mas são oriundas de teorias e argumentos então correntes na Europa.

Pode-se acrescentar ainda o filósofo e sociólogo francês Levi Bruhl (Paris, 1857 -

1939). Doutorou-se em filosofia em 1884, com a tese A ideia de responsabilidade.

Sob influência da teoria sociológica de Émile Durkheim, procurou elaborar uma

ciência dos costumes. Acreditava que a moral era determinada pelas épocas

históricas e pelos grupos sociais. Assim, afirmava que ela era relativa, passível de ser

aceite ou não pelos homens, constituindo um meio — variável de acordo com as

diferentes culturas — que os homens utilizam para relacionar-se com o mundo.

Para comprovar as suas teses, dedicou-se principalmente ao estudo das sociedades

primitivas. Segundo Lévy-Bruhl, os homens das sociedades pouco diferenciadas

teriam uma mentalidade pré-lógica, que não estaria submetida aos princípios de

contradição e causalidade, mas seria baseada em representações míticas.

Entre suas obras, destacam-se: A filosofia de Auguste Comte, de 1900; A moral e a

ciência dos costumes, de 1903; As funções mentais nas sociedades inferiores, de

1910; A mentalidade primitiva, de 1922; A alma primitiva, de 1927; Sobrenatural e a

natureza na mentalidade primitiva, de 1931; A experiência mística e os símbolos

entre os primitivos, de 1938.

Alguns dos seus estudos pretendiam confirmar que havia uma compreensão dos

factores irracionais no pensamento e nas religiões primitivas e fez a distinção entre

mentalidades primitivas e povos evoluidos.

Vejam-se alguns excertos exemplificativos de obras da Literatura Colonial:

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“É um Homem na forma, mas os instintos são de fera” (O Sertão d’África, 1908:87).

“Era um negro esguio, que dava a impressão de um excelente animal de corrida”

(Henrique Galvão, O Velo d’Oiro”, 1936:22).

“Consiguirei escutar nesta viagem a voz da raça negra?” (José Osório de Oliveira,

Roteiro de África, 1936:55).

Como se pode constatar nos exemplos acima, nem todos os europeus ridicularizavam

o Homem africano ou a realidade do continente; alguns reconheciam desconhecê-la

e demonstravam interesse em conhecê-la (veja-se o caso do último exemplo).

De forma sintética, pode-se afirmar que as literaturas africanas e as

oitocentistas reduzem-se basicamente a um lirismo amoroso, à fraternidade, à

recordação familiar, à amizade, mais ou menos na linha das temáticas do

Romantismo.

Alguns aspectos a ter em conta na abordagem das literaturas africanas

Universalidade/Especificidade

A literatura tem tendência a procurar a sua especificidade numa determinada

sociedade e época. Isto advém, entre outros, de factores extra-literários, como por

exemplo, políticos, sociais, económicos, etc.; em relação aos africanos, advém

da tomada de consciência da sua africanidade. Esta especificidade é

gerada pela situação colonial. A tendência para a especificidade tanto pode ser

motivada (voluntária) como pode ser expontânea. É de salientar que esta linha de

pensamento não obedece a uma certa orientação temática teórica, é ocasionada, por

certas contigências sociais.

Conceito de universalidade

Tem a ver com a preocupação em ultrapassar barreiras nacionais. É uma literatura

que se pode integrar, em termos de recepção, em qualquer quadrante; integra-se na

universalidade, focando-se, por exemplo, o homem numa perspectiva universal. É de

notar que a literatura pode ter um carácter específico, mas ser de dimensão

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universal, aliás, um dos factores da universalidade é a sua especificidade, desde que

a obra transcenda o regional.

A especificidade, assim como a universalidade, têm factores subjectivos. As

instâncias receptoras ou, de uma maneira geral, as instituições literárias é

que tornam a obra universal, promovem-na, neste sentido, são estas

instituições, basicamente, que definem a universalidade da obra.

Na abordagem da problemática das literaturas africanas é preciso ter ainda em conta

as seguintes problemáticas:

1. Questão histórica: a) as literaturas em África são consequência da

dominação colonial - passado comum (colonização) no mesmo espaço (africano);

b) a abolição da escravatura, o estabelecimento da imprensa e da tipografia e, mais

tarde, do ensino. Segundo Salvato Trigo, as Literaturas Africanas são produto do

processo de urbanização em África, como consequência da assimilação dos modelos

ocidentais. Importa referir ainda a este propósito que a actividade literária nas ex-

colónias portuguesas está intimamente relacionada com a prática de ensino, com o

grau de desenvolvimento cultural, com o progresso social e, necessariamente, com a

criação da imprensa.

2. Questão filosófica: a) tem a ver com o compromisso profundo destas literaturas

com a realidade cultural, histórica, antropológica, o que determina certa filosofia; b)

tem a ver com a expressão duma forte manifestação (projecção) da tradição oral. É

por isso que, em muitos casos, os textos têm um discurso oralizante.

3. Questão cultural: a) africanidade: tem em conta o hibridismo, o sincretismo

cultural, numa perspectiva intra e intercontinental; b) originalidade: tem a ver com

factores que incluem a criatividade.

4. Questão linguística - tem a ver com o facto de esta literatura ser e estar numa

língua comum (do colonizador) para diferentes espaços.

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5. Outras questões - os Mitos e os Símbolos :

Mito do eterno retorno: reflecte a consciência, na escrita, de ausência de uma

tradição literária, o que torna necessária a perspectiva de regresso à terra mãe. É

uma preocupação na linha psicanalítica (de regresso ao ventre materno).

Mito da idade do ouro: tem a ver com o regresso a um certo tempo, com a

evocação de um certo passado (de felicidade) anterior à presença colonial.

Mito de identidade: sugere uma referência à questão da especificidade da

nacionalidade e da crioulidade; liga-se a um síndroma de busca de uma série de

valores de harmonia. Há uma certa idealidade em relação à questão da busca das

origens.

Nos mitos tem-se em referência igualmenmte o factor tempo: passado (anterior

à colonização) visto como positivo; “presente” visto de forma negativa (tem a ver

com a colonização); e o futuro (que culminaria com as independências) numa

perspectiva positiva.

Ainda nos mitos é importante ter em conta também o factor espaço:

a) lugar de nascimento - tem a ver com a dicotomia campo vs cidade, com

maior referência para os subúrbios, onde se desenvolvem as grandes oposições

sociais, económicas e ideológicas das personagens; por exemplo as seguintes obras

e/ou autores reflectem isso: José Craveirinha, João Dias (Godido e Outros Contos),

Luís Bernardo Honwana (Nós Matámos o Cão Tinhoso), Rui de Noronha e Orlando

Mendes (Portagem), entre outras ;

b) dicotomia África vs Europa - coloca-se a questão de “escrever para quem?, para

quê?, o quê, quem escreve?, em que língua?” Em relação à última questão, é preciso

notar que em Moçambique a língua portuguesa manifesta-se como (i) gregária, (ii)

veicular, (iii) institucional, oficial, (iv) pedagógica e (v) literária.

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Na sequência do exposto acima, pode-se afirmar que as literaturas nacioanis

africanas procuram representar o sentimento africano e decorrem de uma

sensibilidade comum de africanidade. Em grande medida, estas literaturas

processam-se segundo ideologias históricamente determinadas. O seu

código ideológico reflecte grandemente a história das suas gentes. Em

termos políticos e culturais, essa ideologia acarreta grandes relações com

a Negritude e o Pan-Africanismo.

Em termos temáticos vão desde o heroísmo, o amor, a gratidão, o enlevo

rústico ou paisagístico, até uma postura mais ou menos romântica de um

sentimento nacionalista ou pátrio. O nacionalismo é um sentimento universal;

como inspiração, é uma atitude romântica.

Como se pode constatar, há factores incortornáveis a ter sempre em atenção, no

estudo do fenómeno literário (sobretudo emergente) em Moçambique, que têm a ver

não só com as características endógenas dessa literatura, mas também com a

relação existente entre esta e a literatura Universal.

Neste sentido, estas ideologias historicamente marcadas vão marcar o início de uma

nova fase da literatura moçambicana, que é a fase que podemos designar de

Realismo Nacionalista.

Realismo Nacionalista (Sécs. XIX e XX)

Para analisar o conceito de “Realismo Nacionalista” é necessário e pertinente

começar por reflectir sobre algumas correntes de pensamento como o Pan-

africanismo e a Negritude, o seu aparecimento, a sua evolução e os seus

mentores, pois elas pertencem a uma fase do renascimento africano.

De um modo geral, considera-se que o renascimento é uma fase histórica que

todos os continentes tiveram; em África surge, de forma marcada, no século XIX.

As próprias lutas de libertação nacionalista são manifestações que advêem do

renascimento africano. O renascimento é uma atitude humanista de

regeneração de valores e de renovação.

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Condições históricas da emergência do renascimento africano

A sua emergência está relacionada com o fenómeno da colonização. A colonização

trouxe um impacto negativo na questão cultural e étnica dos povos africanos, pois

estes, no século XVI, desenvolviam uma grande civilização e a colonização provocou

o atraso ou condicionou a evolução dessas civilizações. A colonização trouxe a

imposição de uma cultura estranha, através da sufocação das culturas nativas.

Noção de “Renascimento Africano”

Humanismo Africano: é um projecto de reconquista do espaço cultural, de

equilíbrio do homem africano; um espaço de actualização e de integração na

modernidade; uma reacção às hegemonias culturais europeias. Este

Humanismo implica o assumir, pelo africano, de um património cultural e

institucional de uma visão do mundo própria, de uma expressão cultural, linguística

próprias, factores condicionantes à expressão do específico, através da arte simbólica

e literária.

Duplo sentido de “Renascimento Africano” (redescoberta dos valores e

renovação):

Redescoberta: tem a ver com o culto dos antepassados, o regresso às

origens e a revalorização do património cultural africano, das tradições e

da ideologia cosmogónica africana, isto quer dizer que as tradicões e as

mitologias sempre existiram em África, só que foram sufocadas pelo fenómeno de

colonização e, por isso, nessa altura estavam latentes, tendo ficado patentes nesta

fase.

Renovação: consiste na supressão dos entraves da tradição e na libertação de

energias e da imaginação (pode-se incluir a Negritude que constituiu uma ruptura

com as literaturas oitocentistas. Ela tinha uma temática própria – a exaltação das

qualidades da raça negra, o exotismo – e em termos formais também tinha aspectos

inovadores diferentes).

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Características do renascimento africano

Traduziu-se por reacções nacionalistas, por tentativas de edificar liberdades, escolas,

instâncias sócio-culturais e artísticas, através da promoção de poderes e de uma

visão própria do mundo, isto contra as construções culturais estrangeiras, de

pretensões universalistas e implicitamente hegemónicas.

Pretende dar menor peso às experiências universalizantes e dar maior relevância à

capacidade de criação de meios de expressão da plenitude de uma cultura, de um

pensamento, em suma, dos feitos africanos.

A geração literária dos anos 50 (depois da II Guerra mundial)

O marco “guerra” revolucionou o aparecimento de uma poesia (sobretudo) nova,

de pós-guerra. O fim da Guerra criou certas espectativas em África e representa

uma viragem, de que Moçambique não ficou alheio.

Os factores que contribuíram para o aparecimento desta geração foram,

sobretudo, o final da 2ª Guerra mundial; entretanto, como factores externos

mencionam-se, como já referimos, o Pan-africanismo e o Movimento da

Negritude; nos factores internos, a campanha para as eleições presidenciais da

República Portuguesa, em 1948-9, protagonizada pelo General Norton de Matos.

Entretanto, importa recordar que, nos anos 37-38 o Brado Africano fracassara

totalmente. A sua dinâmica anterior esgotara-se e a divisão no seu seio foi um dos

factores.

1948 – Início da campanha para a presidência da República. Nestes períodos

eleitorais, por norma e em seguimento do preceituado na Constituição republicana

portuguesa de então, estabelece-se uma certa liberdade de imprensa (limitada).

Assim, em Moçambique dá-se uma certa abertura política, aproveitada pela

pequena burguesia negra, através do MUD (Movimento de Unidade Democrática).

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Este movimento organiza um núcleo que tenta ter um carácter anti-fascista. Foi

liderado por João Mendes. Os elementos ligados a este grupo foram: Noémia de

Sousa, Beirão e Sofia Pomba Guerra. Mais tarde integra-se Aníbal Aleluia. Este

grupo criou uma certa agitação na então cidade de Lourenço Marques. Noémia de

Sousa foi presa; os outros, Beirão, João e Sofia foram deportados para a Guiné

Estas situações constituíram o prelúdio ou a razão de ser dos textos

literários de Noémia de Sousa, que publicou o seu primeiro poema em 1948; foi

a primeira voz a fazer-se ouvir no ramo literário desta geração de novo

carácter.

Recepção do Pan-africanismo por esta geração

Histório da Pan-africanismo

O Pan-africanismo e a Negritude podem ser sinónimos, quando significam uma

ideologia, com um plano cultural forte e essa ideologia caracteriza-se pela ideia de

pertença a um espaço étnico-cultural em África; são, entretanto, de significados

diferentes na realização histórica : o Pan-africanismo surge nos EUA e a

Negritude, em França, nos anos 30, entre os intelectuais africanos que estavam

em Paris. Deste ponto de vista, pode-se considerar que o Pan-africanismo é um

fenómeno geral e a Negritude, um fenómeno particular.

Pan-africanismo

1776 – Declaração da independência da América. Posteriormente elabora-se uma

constituição que consagra direitos iguais para todos os cidadãos. Entretanto, importa

recordar que o princípio de direitos iguais adveio da Revolução Francesa (1789) que

trouxe ideias de liberdade, fraternidade e igualdade. O sul dos EUA era dominado

por uma sociedade escravocrata.

A ideia de direitos iguais não teve aplicação imediata. Os escravos, mesmo libertos,

não encontravam emprego que lhes permitisse igualar-se a outros cidadãos brancos.

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Os escravos foram-se organizando em pequenas associações profissionais e

comerciais e muito mais tarde conseguiram formar uma pequena burguesia (os seus

descendentes). Por causa dessa falta de inserção social dos escravos, começa a

formar-se, a partir daí, uma cultura própria, que tem por centro a ideia de pertença à

África. Esta ideia teve algumas consequências: 1784 – os escravos dos EUA fundam

a Serra Leoa; 1804 – proclama-se a Independência do Haiti; 1822 – uma

comunidade de negros norte-americanos funda a Libéria e em 1847 proclama-se a

Independência.

É precisamente esta ideia de pertença à raça negra que foi teorizada e se designo

Panafricanismo. Um dos teorizadore foi Edward Wilmot BLYDEN. Este desenvolve

as principais ideias de africanismo, defendendo o seguinte: África – terra-mãe dos

africanos e dos seus descendentes; África para os negros; respeito pelos valores

culturais africanos; personalidade africana, etc.

Blyden é natural das Ilhas Ocidentais (Haiti pretence a uma destas ilhas) e

naturalizou-se liberiano. Haiti torna-se independente em 1804, a partir de uma

rebilião. Este facto deu mais força às ideias de Blyden. Nos anos 30, do Haiti saiem

muitos intelectuais que vão estudar em Paris.

A ideia de africanismo estabiliza-se e cria-se, a partir daí, uma espécie de Programa.

Cria-se na Europa (Inglaterra – 1897) a Associação Africana. Esta associação, em

1900, realiza a 1ª Conferência Pan-africana. O seu dinamizador foi Sylvester

Williams. Nesta conferência destaca-se o pai do Pan-africanismo, DU BOIS. Em

1903 escreveu o livro “Almas Negras”. De 1919 a 1945 foi secretário do movimento.

Neste período, todos os encontros do movimento realizavam-se na Inglaterra. Du

Bois morreu em 1966, no Gana; era um politico e tinha já a sua estratégia: a solução

do negro dos EUA não é a sua saída da América, mas a sua integração na sociedade

americana, lutando pelos direitos civis. Em relação à América, era de opinião de que

os negros africanos deviam fazer exigêncies. A sua fundamentação para isso era a

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de que os negros na América já haviam dado uma contribuição cultural e que ela era

influente e estava já assente no país.

O clima de regresso à África, nos EUA, não terminou. Em 1919, MARCUS GARVEY

(das Antilhas) lança um apelo, de certo modo radical: “Back to ÁFRICA”. A data

coincide com a da deportação de escravos africanos, há 300 anos. À ideia de

regresso a África, Marcus Garvey acresce uma dose de resistência. Fundou a Igreja

Negra Africana: “Deus Negro e Diabo Branco”. Adquiriu uma companhia de

navegação “Black Star”, com a qual pretendia fazer regressar todos os negros a

África. Numa manifestação, em Nova Yorque, ele consegue chamar a si muitos

apoiantes negros.

A partir dos anos 1920, no Harlém (nos EUA), surge uma dinâmica cultural

através de músicos, escritores, etc. O seu mentor continuava a ser Marcus Gravey.

Este movimento cultural, mesmo depois da desintegração de Garvey, continuou a

desenvolver-se (entre 1919 e 1930) e teve o nome de Renascença Negra.

Na América, o movimento continuou a lutar pelos direitos cívicos. Paralelo ao que se

passou na América, na Inglaterra (Manchester) realiza-se o 5° Congresso do

Panafricanismo, em 1945. A partir deste congresso, a liderança do movimento

Panafricano passou para África, através de Kwame Nkrumah. Este membro do Pan-

africanismo é autor de um livro com o título: “África must united”, no Gana.

O Nigeriano Nuambi Azikiwi, o Queniano Jomo Kenyata e o Ganês Sekou Touré,

faziam parte do Pan-africanismo emergente na Inglaterra (a partir do 5° Congresso).

Estes juntam-se para promoverem as independências dos países africanos.

Nesse 5° Congresso, aprovam-se as seguintes resoluções: denúncia da balcanização

de África (recorte do continente); denúncia da exploração económica; exigência de

direito sindical e de criação de cooperativas; independências dos países como a

Argélia, a Tunísia, o Marrocos e das colónias da África Oriental (Quénia).

-

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Adoptou-se uma “Declaração dos povos colonizados”, redigida por Kwame Nkrumah,

cujo lema era: “…Nós proclamamos o direito, para todos os povos colonizados, de

assumirem o seu próprio destino. Povos colonizados e povos oprimidos de todo o

mundo, uní-vos!”

Todos estes movimentos históricos criaram um clima de contestação em

África, que transita para a literatura e, no caso de Moçambique, pela

primeira vez.

É assim que nos poemas de Noémia de Sousa surge e se desenvolve a temática da

africanidade e do desejo angustiante de emancipação do africano. Noémia vai

alimentar uma poesia militante, com tendência nacionalista, entretanto, é em José

Craveirinha que a ideia de nação aparece definida de forma clara.

Importa recordar que Rui de Noronha vai funcionar como um antecessor de apoio

para os escritores posteriores, que se tornaram nacionalistas: ex: José Craveirinha,

da Noémia de Sousa (por exemplo).

Moderna Literatura Moçambicana

Esta já se pode designar de moderna literatura moçambicana. Os poemas desta

geração são muito influencidos pelos movimentos atrás referidos, ou seja, esta

geração «leu» e «inspirou-se» sobremaneira nestes movimentos, incluindo

o Movimento da Renascença Negra de Harlém (1919), numa aliança simbiótica

com o Romantismo e, sobretudo, com o Neo-Realismo português (e a sua

ideologia Marxista-Leninista), outro vector de influência que caracterizou esta

geração.

Para elucidação, leiam-se os poemas de Noémia de Sousa, “Se me quiseres

conhecer” (este, dedicado a Antero) e “Deixa passar o meu povo”, cujo título

(traduzido) e o refrão (ipsis verbis) glosam a canção Let my people go, inspirada

no musical JAZZ, do renascentista negro norte americano, Paul Robeson,

membro do Partido Comunista Americano, criador da canção com título homónimo

que é, por sua vez, um empréstimo de uma ideia Bíblica (de José):

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Deixa passar o meu povo

Para João Silva

Noite morna de Moçambique

e sons longíquos de marimbas chegam até mim

- certos e constantes -

vindo não sei donde.

Em minha casa de madeira e zinco,

abro e deixo-me embalar...

Mas vozes da América remexem-me a alma e os nervos.

E Robeson e Marian cantam para mim

spirituals negros de Harlém.

“Let my people go”

- oh deixa passer o meu povo,

deixa passar o meu povo! –

dizem.

E eu abro os olhos e já não posso dormir.

Dentro de mim, soam-me Anderson e Paul

e não são doces vozes de embalo.

“Let my people go”!

Nervosamente,

eu sento-me à mesa e escrevo...

Dentro de mim,

deixa passar o meu povo (...). (25/01/1950)

Noémia de Sousa, Sangue negro, Maputo, 1988, pág. 57.

Se me quiseres conhecer

Para Antero

Se me quiseres conhecer,

Estuda com os olhos bem de ver

Esse pedaço de pau preto

Que um desconhecido irmão maconde

De mãos inspiradas

Talhou

Em terras distantes lá do Norte.

Ah, essa sou eu:

Órbitas vazias no desespero de possuir a vida,

Boca rasgada em feridas de angústia,

Mãos enormes, espalmadas,

Erguendo-se em jeito de quem implora e ameaça,

Corpo tatuado de feridas visíveis e invisíveis

Pelos chicotes da escravatura...

Torturada e magnífica,

Altiva e mística,

África da cabeça aos pés,

Ah, essa sou eu:

Se quiseres compreender-me

Vem debruçar-te sobre minha alma de África,

Nos gemidos dos negros no cais (...) (25.12.1949)

Noémia de Sousa, Sangue negro, Maputo, 1988, pág. 49.

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Leiam-se, na mesma pespectiva, o “Grito Negro” e o “Poema do futuro Cidadão”, de

José Craveirinha:

Grito Negro

Eu sou carvão!

E tu arrancas-me brutalmente do chão

E fazes-me tua mina

Patrão!

Eu sou carvão!

E tu acendes-me, patrão

Para te servir eternamente como força motriz

Mas eternamente não

Patrão!

Eu sou carvão!

E tenho que arder, sim

E queimar tudo com a força da minha combustão.

Eu sou carvão!

Tenho que arder na exploração

Arder até às cinzas da maldição

Arder vivo como alcatrão, meu irmão

Até não ser mais tua mina

Patrão!

(...)

Sim!

Eu serei o teu carvão

Patrão! in Xigubo , Maputo, 1995, pág. 9.

Poema do futuro cidadão

Vim de qualquer parte

de uma Nação que ainda não existe.

Vim e estou aqui!

Não nasci apenas eu

nem tu nem outro...

mas irmão.

Mas

tenho amor para dar às mãos-cheias.

Amor do sou

e nada mais.

E

tenho no coração

gritos que não são meus somente

porque venho de um País que ainda não existe.

Ah! Tenho meu Amor a todos para dar

do que sou.

Eu!

Homem qualquer

cidadão de uma Nação que ainda não existe.

in Xigubo , Maputo, 1995, pág. 13.

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Também ao nível do teatro americano figura o nome da Miriam Anderson,

muito glosada, como se constatou nos exemplos acima, pelos poetas desta geração.

Na literatura (poesia) negra americana são ainda referenciados os nomes de

Langston Hughs, Claude Mekay e Sterling Brown. Estes, por sua vez, inspiram-

se nos folclores dos “spirituals” de música americana negra e transportam-nos para a

literatura, inspiram-se igualmente no musical “blue” (canção de trabalho e de

lamento).

Como se pode constatar, ainda que de forma sintética (só para efeitos de

elucidação), os temas propostos nos musicais, nos textos literários, nos teatrais (e

noutros) e os propósitos conteudísticos dos poemas, vão igualmente inspirar estas

«vozes» emergentes da literatura modena moçambicana da época, numa

simbiose insanável.

Para resumir, podemos destacar as seguintes tendencias literárias dessa

moderna literatura moçambicana dos 50:

. em Orlando Mendes (1940 – “Trajectória”, Coimbra; 1947, “Cinco poesias do Mar

Índico”: o Negrismo (visão negra por fora); o Movimento português da Presença e

o Neo-Realismo português;

. em oémia de Sousa (1948 – 1951 – período de publicação): A Negritude e o

Neo-Realismo português ;

. em José Craveirinha – a Negritude, o Neo-Realismo e a profecia do

nacionalismo.

Como referimos, é principalmente (mas não apenas) com a escrita de Craveirinha

que a literatura moçambicana vai ganhar um novo impulso e vai «caminhar» para

um comprometimento com a causa e com os ideiais de emancipação territorial. É

uma escrita que profetiza e projecta, antes dos ideiais políticos desenvolvidos

nos 60, pelos movimentos independistas africanos, a nação futura, a sua

ansiedade e angústia (como pudemos constatar nos poemas lidos).

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Esta é já uma escrita claramente divorciada dos cânones literários portuguses e dos

dítames temáticos da Metrópole. Neste sentido, o percurso poético de Craveirinha

confunde-se, de certo modo, com o percurso do homem político. Craveirinha dá,

por isso, testemunho a uma vaga de escritores e poetas do seu tempo e da

geração seguinte (da Independência e da geração do pós-independência) ou,

como se diz na terminilogia actual, da pós-colonialidade, que introduz novos

paradigmas literários, aos quais nos referimos mais adiante.

De forma sintética, vamos dar conta dos escritores/poetas das gerações referidas no

parágrafo anterior (incluindo Rui de Noronha, por ser considerado o precursor desta

geração), numa sequência que não tem pretensões hierarquizadoras, mas apenas

metodológicas. Dado o limite do espaço, faremos apenas referência aos títulos mais

significativos das suas obras:

Rui de Noronha - Sonetos (1946), editado pela tipografia Minerva Central; Os Meus

Versos, Texto Editores, 2006 (Organização, Notas e Comentários de Fátima

Mendonça); Ao mata-bicho: Textos publicados no semanário «O Brado Africano»

Pesquisa e Organização de António Sopa, Calane da Silva e Olga Iglésias Neves.

Maputo, Texto Editores, 2007.

Geração da pós-colonialidade (alguns poetas transitaram da anterior para esta)

José João Craveirinha - É considerado o poeta maior de Moçambique. Em 1991,

tornou-se o primeiro autor africano galardoado com o “Prémio Camões”, o mais

importante prémio literário da língua portuguesa. Como jornalista, colaborou nos

periódicos moçambicanos “O Brado Africano”, “Notícias”, “Tribuna”, “Notícias da

Tarde”, “Voz de Moçambique”, “Notícias da Beira”, “Diário de Moçambique” e “Voz

Africana”.

Publicou os seguintes livros: Xigubo. Lisboa, Casa dos Estudantes do Império, 1964.

2.ª ed. Maputo, Instituto Nacional do Livro e do Disco, 1980; Cantico a un dio di

Catrame (bilingue português/italiano). Milão, Lerici, 1966 (trad. e prefácio Joyce

Lussu); Karingana ua karingana. Lourenço Marques, Académica, 1974. 2.ª ed.,

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Maputo, Instituto Nacional do Livro e do Disco, 1982; Cela 1. Maputo, Instituto

Nacional do Livro e do Disco, 1980; Maria. Lisboa, África Literatura Arte e Cultura,

1988; Izbranoe. Moscovo, Molodoya Gvardiya, 1984 (em língua russa); Prémio

Cidade de Lourenço Marques (1959); Prémio Reinaldo Ferreira do Centro de Arte e

Cultura da Beira (1961); Prémio de Ensaio do Centro de Arte e Cultura da Beira

(1961); Prémio Alexandre Dáskalos da Casa dos Estudantes do Império, Lisboa,

Portugal (1962); Prémio Nacional de Poesia de Itália (1975); Prémio Lotus da

Associação de Escritores Afro-Asiáticos (1983); Medalha Nachingwea do Governo de

Moçambique (1985); Medalha de Mérito da Secretaria de Estado da Cultura de São

Paulo, Brasil (1987); Prémio Camões (1991).

Noémia de Sousa - Publicou Sangue Negro (1988), Edicação da Associação de

Escritores Moçambicanos, Maputo.

Orlando Mendes -Trajectória (1940), Portagem (1966), Um minuto de Silêncio

(1970) e A Fome das Larvas (1975). Trajectória (1940), Portagem (1966), Um

minuto de Silêncio (1970) e A Fome das Larvas (1975).

Rui Knopfli - Temas e motivos poéticos: intimismo; procura de identidade; amor-

melancolia; erotismos e afectos; simbologias (homens e natureza); meditação do

lugar; consciência da escrita estética.

Bibliografia: O País dos Outros, 1959; Reino Submarino, 1962; Máquina de Areia,

1964; Mangas Verdes com Sal, 1969; A Ilha de Próspero, 1972; O Escriba

Acocorado, 1978; Memória Consentida: 20 Anos de Poesia 1959-1979, 1982; O

Corpo de Atena, 1984; O monhé das cobras (Poesia), 1997 ; 2005; Obra Poética,

2003.

Sebastião Alba - Poesias, Quelimane, Edição do Autor, 1965; O Ritmo do

Presságio, Maputo, Livraria Académica, 1974; O Ritmo do Presságio, Lisboa, Edições

70, 1981; A Noite Dividida, Lisboa, Edições 70, 1982; A Noite Dividida,(O Ritmo do

Presságio / A Noite Dividida / O Limite Diáfano), Lisboa, Assírio e Alvim, 1996; Uma

Pedra Ao Lado Da Evidência, (Antologia: O Ritmo do Presságio / A Noite Dividida / O

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Limite Diáfano + inédito), Porto, Campo das Letras, 2000; Albas, Quasi Edições,

2003.

Luis Bernardo Honwana - Publicou Nós Matámos o Cão-Tinhoso em 1964. Em

1969, ainda em pleno colonialismo e com a guerra colonial no auge, a obra é

publicada em língua inglesa (com o título de We Killed Mangy-Dog and Other Stories)

e obtém grande divulgação e reconhecimento internacional, vindo a ser traduzida

para vários outros idiomas. O aparecimento desta obra estabeleceu um novo

paradigma para o texto narrativo moçambicano. Na escrita dos contos que compõem

o volume, Honwana favorecia um estilo simples e econômico, prestando atenção aos

aspectos visuais das histórias.

Luís Carlos Patraquim - Monção. Lisboa e Maputo. Edições 70 e Instituto Nacional

do Livro e do Disco, 1980; A inadiável viagem. Maputo, Associação dos Escritores

Moçambicanos, 1985; Vinte e tal novas formulações e uma elegia carnívora. Lisboa,

ALAC, 1992. Prefácio de Ana Mafalda Leite Mariscando luas. Lisboa, Vega, 1992, com

Chichorro (ilustrações) e Ana Mafalda Leite ; Lidemburgo blues. Lisboa, Editorial

Caminho, 1997. O osso côncavo e outros poemas (1980-2004). Lisboa, Editorial

Caminho, 2005; Antologia de poemas dos livros anteriores e poemas novos, com um

texto de Ana Mafalda Leite: O que sou de sobrepostas vozes.

Peças de teatro - Karingana; Vim-te buscar; D'abalada; Tremores íntimos anónimos

(com António Cabrita)

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Mia Couto (Influências: Realismo mágico e ficção histórica)

Poesia: Raiz de Orvalho, publicado em 1983. Em 1999, a Editorial Caminho (que

publica as obras de Couto em Portugal) relançou Raiz de Orvalho e outros poemas

que teve asua 3ª edição em 2001.

Contos - Nos meados dos anos 80, Couto estreou-se nos contos e numa nova

maneira de falar - ou "falinventar" - português, que continua a ser o seu "ex-libris".

Nesta categoria de contos publicou: Vozes Anoitecidas (1ª ed. da Associação dos

Escritores Moçambicanos, em 1986; 1ª ed. Caminho, em 1987; 8ª ed. em 2006;

Grande Prémio da Ficção Narrativa em 1990, ex aequo); Cada Homem é uma Raça

(1ª ed. da Caminho em 1990; 9ª ed., 2005); Estórias Abensonhadas (1ª ed. da

Caminho, em 1994; 7ª ed. em 2003); Contos do Nascer da Terra (1ª ed. da

Caminho, em 1997; 5ª ed. em 2002); Na Berma de Nenhuma Estrada (1ª ed. da

Caminho em 1999; 3ª ed. em 2003); O Fio das Missangas (1ª ed. da Caminho em

2003; 4ª ed. em 2004).

Crónicas - Publicou em livros algumas das suas crónicas, que faziam coluna num dos

semanários publicados em Maputo, capital de Moçambique: Cronicando (1ª ed. em

1988; 1ª ed. da Caminho em 1991; 7ª ed. em 2003; Prémio Nacional de Jornalismo

Areosa Pena, em 1989); O País do Queixa Andar (2003); Pensatempos. Textos de

Opinião (1ª e 2ª ed. da Caminho em 2005); E se Obama fosse Africano? e Outras

Interinvenções (1ª ed. da Caminho em 2009).

Romances

• Terra Sonâmbula (1ª ed. da Caminho em 1992; 8ª ed. em 2004; Prémio

Nacional de Ficção da Associação dos Escritores Moçambicanos em 1995;

considerado por um juri na Feira Internacional do Zimbabwe um dos doze

melhores livros africanos do século XX);

• A Varanda do Frangipani (1ª ed. da Caminho em 1996; 7ª ed. em 2003)

• Mar Me Quer (1ª ed. Parque EXPO/NJIRA em 1998, como contribuição para o

pavilhão de Moçambique na Exposição Mundial EXPO '98 em Lisboa; 1ª ed. da

Caminho em 2000; 8ª ed. em 2004);

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• Vinte e Zinco (1ª ed. da Caminho em 1999; 2ª ed. em 2004) ;

• O Último Voo do Flamingo (1ª ed. da Caminho em 2000; 4ª ed. em 2004;

Prémio Mário António de Ficção em 2001)

• O Gato e o Escuro, com ilustrações de Danuta Wojciechowska (1ª ed. da

Caminho em 2001; 2ª ed. em 2003);

• Um Rio Chamado Tempo, uma Casa Chamada Terra (1ª ed. da Caminho em

2002; 3ª ed. em 2004; rodado em filme pelo português José Carlos Oliveira);

• A Chuva Pasmada, com ilustrações de Danuta Wojciechowska (1ª ed. da Njira

em 2004);

• O Outro Pé da Sereia (1ª ed. da Caminho em 2006) ;

• O beijo da palavrinha, com ilustrações de Malangatana (1ª ed. da Língua Geral

em 2006) ;

• Venenos de Deus, Remédios do Diabo (2008);

• Antes de nascer o mundo (2009).

Prémios - 1999 - Prémio “Vergílio Ferreira”, pelo conjunto da sua obra; 2001 -

Prémio “Mário António”, pelo livro O último voo do flamingo; 2007 - Prémio “União

Latina de Literaturas Românicas”; 2007 - Prémio “Passo Fundo Zaffari e Bourbon de

Literatura”, na Jornada Nacional de Literatura.

Leite de Vasconcelos - Publicações póstumas: 1997 - "Resumos, Insumos e Dores

Emergentes" (poesia); 1999 - "Pela Boca Morre o Peixe" (crónicas); 2000 - "As

Mortes de Lucas Tadeu" (teatro).

Albino Magaia - Assim no tempo derrubado, Maputo, Instituto Nacional do Livro e

do Disco, 1982 (poesia); Yô Mabalane!, Maputo, Cadernos Tempo, 1983 (novela),

Prefácio de Gilberto Matusse; Malungate, Maputo, Associação dos Escritores

Moçambicanos, 1987, Colecção Karingana (novela).

Calane da Silva - Dos meninos da Malanga, Maputo, Cadernos Tempo, 1982

(Poesia); Xicandarinha na lenha do mundo, Maputo, Associação dos Escritores

Moçambicanos, 1988. Colecção Karingana (Contos) Capa de Chichorro, Gotas de Sol.

Maputo, Associação dos Escritores Moçambicanos, 2006. Vencedor do concurso

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literário «Prémio 10 de Novembro», organizado conjuntamente pelo Conselho

Municipal da Cidade de Maputo e pela Associação dos Escritores Moçambicanos

quando do aniversário da capital de Moçambique.

A Pedagogia do Léxico. O Estiloso Craveirinha. As escolhas leixicais bantus, os

neologismos luso-rongas e a sua função estilística e estético-nacionalista nas obras

Xigubo e Karingana wa Karingama. Maputo, Imprensa Universitária, 2002, Publicação

da tese de mestrado. Prefácio de Mário Vilela, Nyembêtu ou as Cores da Lágrima.

Romance. Lisboa. Texto Editores. 2008.

Eduardo White - Amar sobre o Índico (1984); Homoíne (1987); País de Mim

(1990); Prémio Gazeta revista Tempo; Poemas da Ciência de Voar e da Engenharia

de Ser Ave (1992); Prémio Nacional de Poesia; Os Materiais de Amor Seguido de O

Desafio à Tristeza (1996); Janela para Oriente (1999); Dormir com Deus e um Navio

na Língua (2001); bilingue português/inglês; Prémio Consagração Rui de Noronha

(Editora Labirinto) As Falas do Escorpião (novela; 2002); O Homem a Sombra e a

Flor e Algumas ;Cartas do Interior (2004). A sua poesia está exposta no Museu Val-

du-Marne em Paris desde 1989. Em 2001 foi considerado em Moçambique a figura

literária do ano.

Marcelo Panguana - As Vozes que Falam de Verdade. Maputo, Associação dos

Escritores Moçambicanos, 1987; A Balada dos Deuses. Maputo, Associação dos

Escritores Moçambicanos, 1991; Fazedores da Alma. 1999. Com Jorge Oliveira,

colectânea de entrevistas a personalidades da cultura moçambicana; Os ossos de

Ngungunhana, João Kuimba, Chico Ndaenda e outros contos. 2006.

Aldino Muianga - Xitala Mati (contos), (1987); Magustana (novela), (1992); A

Noiva de Kebera (contos), (1999); Rosa Xintimana (romance), (2001); (Prémio

Literário TDM); O Domador de Burros (contos), (2003); (Prémio Literário Da Vinci);

Meledina ou história de uma prostituta (romance),(2004); A Metamorfose (contos),

(2005); Contos Rústicos (contos), (2007) e Contravenção - uma história de amor em

tempo de guerra (romance), (2008);(Prémio José Craveirinha de Literatura).

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Suleiman Cassamo - O regresso do morto. (Contos), Prefácio de Marcelo

Panguana, Maputo, Associação dos Escritores Moçambicanos, 1989. Colecção

Karingana; Lisboa, Editorial Caminho, 1997; Tradução para francês com o título

Le retour du mort. Paris, Chandeigne/Unesco, 1994; Amor de Baobá.

(Crónicas), Lisboa, Editorial Caminho, 1997; Maputo, Ndjira, 1998, Palestra para Um

Morto. (Romance), Lisboa, Editorial Caminho, 1999, Maputo, Ndjira, 2000. Prémio

Guimarães Rosa da Radio France Internacionale pelo conto O Caminho de Phati

(1994).

Armando Artur - Publicou Espelho dos Dias (1986), O Hábito das Manhãs (1990),

Estrangeiros de Nós Próprios (1996), Os Dias em Riste (2002) – prémio Consagração

FUNDAC -, A Quintessência do Ser (2004) – prémio Nacional de Literatura José

Craveirinha -, No Coração da Noite (2007) e Felizes as Águas (antologia de poemas

de amor).

João Paulo Borges Coelho - Banda Desenhada: Akapwitchi Akaporo. Armas e

Escravos, Maputo, Ed. do Instituto Nacional do Livro e do Disco, 1981; No Tempo do

Farelahi, Maputo, Ed. do Instituto Nacional do Livro e do Disco, 1984 (o autor assina

apenas João Paulo).

Romance e Novela - As Duas Sombras do Rio, Editorial Caminho, 2003; As Visitas do

Dr. Valdez, Editorial Caminho, 2004; Índicos Indícios I. Setentrião, Editorial Caminho,

2005; Índicos Indícios II. Meridião, Editorial Caminho, 2005; Crónica da Rua 513.2,

Editorial Caminho, 2006; Campo de Trânsito, Editorial Caminho, 2007; Hinyambaan,

Editorial Caminho, 2008; O Olho de Hertzog, LeYa, 2010.

Lília Momplé - Ninguém matou Suhura. Maputo, Associação dos Escritores

Moçambicanos, 1988, Colecção Karingana, n.º 7 - Cinco contos baseados em factos

verídicos da época colonial; Neighbours. Maputo, Associação dos Escritores

Moçambicanos, 1995. 2.ª ed., 1999. Colecção Karingana, n.º 16 - Ilustração da

capa: óleo de Catarina Temporário; Os olhos da cobra verde. Maputo, Associação

dos Escritores Moçambicanos, 1997. Colecção Karingana, n.º 18.

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Ungulani Ba Ka Khosa - vencedor do Prémio José Craveirinha de Literatura de

2007, com a obra Os sobreviventes da noite; 2002 Ualalapi considerado um dos 100

melhores romances africanos do século XX; 1990 ganhou o Grande Prémio de Ficção

Moçambicana com Ualalapi

Obras publicadas: Ualalapi, 1987 (romance; ganhou o grande prémio de ficção

Moçambicana em 1990); Orgia dos Loucos, 1990 (edição da Associação dos

Escritores Moçambicanos); Histórias de Amor e Espanto, 1999; No Reino dos

Abutres, 2002; Os sobreviventes da noite, 2007.

Paulina Chiziane - Balada de Amor ao Vento:, 1.ª edição, 1990; Lisboa, Caminho,

2003. Ventos do Apocalipse, Maputo, edição do autor, 1993; Lisboa, Caminho, 1999;

O Sétimo Juramento. Lisboa, Caminho, 2000; Niketche: Uma História de Poligamia,

Lisboa, Caminho, 2002, Maputo, Ndjira, 2009, 6ª edição. O Alegre Canto da Perdiz.

Lisboa, Caminho, 2008.

Prémio “José Craveirinha” de 2003, pela obra Niketche: Uma História de Poligamia

Podemos afirmar que, na tendência actual da leitura, a poesia é relativamente pouco

procurada pelos moçambicanos, preferindo estes a prosa. No entanto, nesta

categoria destacam-se brilhantes escritores como Campos Oliveira, Rui de Noronha,

José Craveirinha, Noémia de Sousa, vencedor do Prémio Camões, Eduardo White,

Armando Artur, etc.

Para teminar, sem concluir e, tendo em conta os títulos das obras literárias ao nosso

dispor, podemos considerar que na prosa moçambicana - esta sim, embora jovem,

considerada um elemento vital e prodigioso na Literatura Lusófona – se destacam,

primeiramente, Mia Couto, talvez o mais influente autor moçambicano, vencedor do

Prémio União Latina de Literaturas Românicas de 2007, Ungulane Ba ka Khosa,

Suleiman Cassamo, Paulina Chiziane, Calane da Silva, Aldino Muianga, Marcelo

Panguane, entre outros.

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BIBLIOGRAFIA

1. ANDRADE, Mário de, Prefácio à Antologia Temática de Poesia Africana I, na noite grávida de punhais. Livraria Sá da Costa, 2ª ed., Lisboa, 1977. 2. ANDRADE, Mário de, Prefácio a Cadernos de Poesia Negra de Expressão Portuguesa, C.E.I., Lisboa, 1953. 3.- CARRILHO, Maria, Sociologia da Negritude, Edições 70, Lisboa, 1976. 4. MARGARIDO, Alfredo, Estudos sobre literaturas das Nações Africanas de Língua Portuguesa, A regra do Jogo, Lisboa, 1980. 5. MARTINHO, Fernando J. B, “Karingana ua Karingana de José Craveirinha”, Cadernos de Literatura, Coimbra, (1982?), p.p. 34-41. 6. MATUSSE, Gilberto, “A Subida em aproximação à morte – o progresso tecnológico num poema de Craveirinha e dois de Knopfli”, Limani 4, Maio, 1988, p. 75-82. 7. MENDES, Orlando, Sobre Literatura Moçambicana, INLD, Maputo, 1978. 8. MENDONÇA, Fátima, Literatura Moçambicana – A Histótia e as Escritas, Faculdade de Letras e Núcleo Editorial da UEM, Maputo, 1988. 9. MOSER, Gerald. Essays in Portugues African Literature, University Park, Pennsylvania State University, 1969. 10. TENREIRO, F.J. e ANDRADE, Mário Pinto, Poesia Negra de Expressão Portuguesa, África, Lisboa, 1982. 11. ROCHA, Ilídio, “Sobre as origens de uma literatura moçambicana de expressão portuguesa: raízes e consciencialização”, In Les Litteratures Africaines de langue portugaise – À la recherche de l’ identité individuelle et nationale (Actes du colloque in international), Paris, Foundation Calouste Gulbenkian. Centre Culturel Portugais, 1985, p.p. 407-410. 12. FANON, Frantz, Peles Negras, Máscaras Brancas, Paisagem, Porto, 1975. 13. FERREIRA, Manuel, O Mnacebo e Trovador Campos Oliveira, Imprensa Nacional – Casa da Moeda, Lisboa, 1985. 14. FERREIRA, Manuel, Literaturas Africanas de Expressão Portuguesa, Instituto de Cultura Portuguesa, VOL. 2, Lisboa, 1977. 15. HAMILTON, Russel G, Literatura Africana, Literaura Necessária II. Edições 70, Lisboa, 1984. 16. FERREIRA, Manuel, No Reino de Caliban I, II e III, Plátano, Lisboa, 1985. 17. LEITE, Ana Mafalda, A Poética de José Craveirinha, Colecção “Palavra Africana”, Vega, Lisboa, 1991. 18. KNOPFLI, Rui, “Breve relance sobre a actividade literária”, Facho, nrº 30. Ed. Sonap, Lourenço Marques, Set/Outubro, 1974.

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TEMA C: Panorama da Literatura Moçambicana depois da Independência

Os autores africanos que se iniciaram na escrita literária ou que escreveram a partir

de África, subsidiários da língua e da literatura portuguesas, vão ao encontro da

produção textual que normalmente se inicia e se desenvolve no jornalismo, como

referimos nos apontamentos iniciais desta brochura, que depois transita para o texto

literário tradicional, como é o caso do poema, da crónica e do romance.1

A primeira literatura escrita produzida em Moçambique é essencialmente de

descendentes e/ou de portugueses, com todas as características, na temática e na

forma, da que então se produzia em Portugal.

A introdução nessas obras de alguns elementos do exotismo, bebidos na observação

artificial, quase sempre desdenhosa da paisagem humana e física de Moçambique,

não altera o carácter estrangeiro dessa literatura, que se designa por colonial (ou

ultramarina, ou ainda portuguesa em África).

Esta literatura incumbe-se também de veicular os alibis morais da ocupação colonial,

deturpando, de certa forma, e mistificando as relações entre colonizadores e

colonizados e criando a ilusão de uma interacção cultural pacífica entre as duas

partes, numa contradição insanável.

Só nos meados do século XX a literatura africana atingiu a consciência do

mundo exterior e isso porque uma nova geração de escritores reconhecidos (casos

de João Dias, autor de Godido e outros contos, Orlando Mendes, com Portagem e

poemas vários, de José Craveirinha, com Karingana ua Karingana, Xigubo e outras

1. São três as condições prévias ao aparecimento de todas as literaturas africanas: (i) a

eliminação do tráfico de escravos; (ii) a introdução da Tipografia e, consequentemente, da Imprensa e (iii) a criação de uma rede escolar. A evolução da literatura escrita em Moçambique tem uma ligação directa com o surgimento da Imprensa. Como anotou Margarido, a imprensa da época «aborda os problemas da burguesia do momento, a qual (…) se vê muito depressa ultrapassada pelo aparecimento de fenómenos económicos consecutivos à exploração intensiva do país (…). A imprensa colocará, então, o problema da colonização de Moçambique (…). Em torno do Jornal Brado Africano, reunir-se-ão com esse objectivo negros, mestiços, às vezes indianos e mesmo, embora raramente, brancos.» (Alfredo MARGARIDO, 1980: 67)

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colectâneas, de Noémia de Sousa, em Sangue Negro, de Luis Bernardo Honwana,

com Nós Matámos o Cão Tinhoso, etc.) escolheu recorrer às línguas europeias. Por

mais paradoxal que possa parecer, as línguas africanas não se constituiram como

veículos de escrita literária pelo facto de serem línguas ágrafas e, por isso, de matriz

oral e também por razões políticas (para prevenir, por exemplo, conflitos de natureza

étnico-tribal).

Sem se pretender alimentar polémicas em torno desta questão da nacionalidade

literária (porque, ainda está longe de se achar uma solução de consenso), é

deveras importante levantar algumas questões e recordar velhos problemas que

sempre se colocaram em torno de escritores que partilharam, tanto emocional,

afectiva, como literariamente, o espaço e a vida espiritual portugueses e o espaço e

a vida material e espiritual africanos.

Eugénio Lisboa, criticando a questão abusiva da moçambicanidade, apresenta as

seguintes interrogações suspensas e as respectivas reflexões:

«O que é afinal ser-se moçambicano, enquanto poeta? Ter os problemas mais comuns à gente de Moçambique? Quais problemas? Serã o esses os únicos legítimos para um poeta que cá se exprime? Então os problemas universais serão porventura apátridas? (…). (…) Os problemas universais são problemas de todas as pátrias. É simplesmente ridículo, em relação a alguns génios, por natureza universalistas e não demasiado radicados a um húmus específico, andar a levantar d eslocadas questões de problemática local, a pretexto de um comportamento social que a este tipo de homens precisamente se não deve pretender impor. Literatura não é sociologia: reflecte, quando muito , emocionalmente, em poetas de certo tipo, uma realidade social que profundamente os marcou. Podemos pessoalmente, por temperamento e formação, preferir (uma ou outra); trata-se de razões pessoais. Poder-se-ia, quando muito, avançar um julgamento de natureza moral que conferiria ao poeta comprometido as palmas merecidas por uma g enerosidade mais aberta» .

As independências dos países africanos de expressão portuguesa vieram, a seu

tempo e até à actualidade, agitar novamente um velho problema: o da atribuição

da nacionalidade literária, que muitas vezes se verificou e se verifica não coincidir

com a nacionalidade política ou com a civil.

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Literatura escrita moçambicana do período pós-independência

A literatura moçambicana deste período não se mostra distante do que são as

manifestações literárias dos restantes Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa

(PALOP). De uma maneira particular, pode-se afirmar que, para o estudo desta

literatura (moçambicana), na actualidade, é importante ter-se em atenção alguns

factores de natureza endógena, como os seguintes:

(i) a diversidade estilística das escritas da literatura moçambicana: se no período

anterior à Independência (e até lá) Moçambique era conhecido como o país dos

poetas, depois desse marco histórico-político, a escrita literária passou (não de

forma linear, nem excluisivista, sublinhe-se) a ser dominada pela prosa. Podemos

citar os casos de Mia Couto, Paulina Chiziane, Calane da Silva, Ungulane Ba Ka Kosa,

Suleimane Cassamo, Aníbal Aleluia, Albino Magaia, Marcelo Panguana, entre outros.

(ii) a não existência, até ao momento de uma teorização consolidada da História

da Literatura Moçambicana, numa relação com as correntes de pensamento

académico, político, social, histórico e literário das hipotéticas diferentes épocas.

Este vazio na História Literária associa-se a uma outra situação, que tem a ver com

a abordagem tardia (e ainda muito incipiente) da Teoria da Literatura

Moçambicana, o que resulta numa insuficiência da ciência literária virada para a

Literatura Moçambicana, facto que se verifica na actualidade, como se pode

constatar a seguir:

(iii) a ausência de uma política de edição/publicação de textos literários.

Qualquer sujeito que tome a iniciativa de escrita literária, com ou sem critérios, pode

patrocinar (a pedido ou não) edições para a publicação, sem que se tenha avaliado a

qualidade da proposta de escrita do candido a texto literário. Esta situação deve-se

ao facto de não existir uma espécie de instância reguladora nesta área, que

não deve ser confundida com censura. Esta instância podia assumir a forma de

crítica literária (também ausente);

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(iv) a inexistência de uma crítica literária regular e, de certo modo, reguladora,

seja popular (de senso comum) jornalística, académica (universitária), ou de outro

tipo, permite a proliferação de tipos de escrita mais ou menos ao gosto de quem

escreve.

Neste momento, tem-se a percepção de existência de uma espécie de um caos ao

nível da crítica literária moçambicana. É uma das áreas do saber que necessita,

com alguma urgência, de um impulso, de uma dinamização e até, se possível, de

uma institucionalização.

Neste sentido, está-se em crer que organismos como a Associação de Escritores

Moçambicanos, os jornais de especialidade (ou as páginas culturais dos jornais

generalistas), os académicos estudiosos dos fenómenos literários e das ciências

sociais, da linguagem, de outras manifestações culturais em geral e outros

organismos afins, como os Ministérios da Cultura e da Educação, através das

Escolas, por exemplo, deviam unir esforços no sentido da materialização deste

projecto de criação de uma dinâmica em torno das acções inerentes à crítica literária,

no sentido de regulação. Não há jogo sem regras!

Não se propõe, de maneira nenhuma, uma espécie de censura ou de espurga de

qualquer espécie de escrita, antes pelo contrário, deseja-se que propostas de textos

de qualidade sejam dados ler ao público e que textos sem qualidade mínima

desejável sejam propostos para melhoramentos.

Considera-se ainda que seria nesseé âmbito que a crítica teria um papel

preponderante pois não só constituiria um instrumento de regulação e de orientação

do leitor, mas contribuiria igualmente para o cultivo do bom gosto estético, de leitura

e para a melhoria de qualidade das novas produções literárias.

(v) O problema da definição das grandes linhas de força temáticas e formais (de

uma espécie de ‘escolas, de pensamentos literários’ que integram a Literatura

de Moçambique. Neste tópico, pareceram efémeras as iniciativas tidas para um certo

‘balizamento’ estético-temáticos, particularmente nas décsdas de 80 e 90 do século

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passado, em torno de Nsaho, da revista da UEM-(Universidade Eduardo Mondlane –

Maputo), do NELIMO (Núcleo de Estudos de Línguas Moçamicanas) entre outras.

Estas iniciativas deviam ter continuado, mas minguaram pouco depois de brotarem.

Vários factores poderão ter contribuido para este estado de coisas, desde a falta de

académicos, intelectuais, de homens das artes e letras, em geral, especializados ou

interessados nestas matérias, à falta de uma cultura de leitura, tanto em ambiente

familiar, como em ambiente institucional, associados à ausência de motivação para o

efeito e, do ponto de vista social, ao desfocamento no país de uma classe média

culta significativa. Dos poucos integrantes desta classe, a preocupação, em geral, é a

satisfação das necessidades básicas existênciais.

Associa-se a estes factores, a situação de carências de vária ordem que caracterizou

o país depois da Independência Nacional em 1975, associada à guerra civil que

eclodiu quase em simultâneo, após o abandono do país dos quadros portugueses.

Nesta perspectiva, salvo algumas excepções, podem ser constatados, de uma

maneira geral, alguns aspectos que se podem considerar comuns aos PALOP’S

(Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa), ao nível da produção e da dinâmica

literárias:

Temáticos:

Antes das independências

Para além da literatura subsidiária da estética literária da Metrópole (Portugal) e

marcada pelo gosto pelo exótico das terras, das gentes e da cultura indígena

africanas (a chamada Literatura Colonial), pontificou, sobretudo através da poesia,

uma forma de expressão literária de aspiração libertadora, esta última foi

fortemente influenciada por factores de natureza ideológica (Marxismo) e política

(pretensão da Indenpendência).

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Depois das independências (meados da década de 70 do século findo)

Imediatamente após as Independências políticas dos países africanos, na

metade da década de 70 do século passado e aliado ao abandono das colónias

africanas em massa de intelectuais portugueses, reflecte-se e manifesta-se um tipo

de escrita, por parte dos poucos escritores e intelectuais que permaneceram no país

e por parte de outros nacionais (quase residuais, emergentes, ou com pretensões a

tal) que tinham uma expectativa elevada em relação aos processos de emancipação

e de construção das novas nações africanas, um certo desencanto e distopia.

Esta desilusão vai surgir na sequência dos processos de euforia independentista

criados pelo momento histórico-político, o que no imediato se revelou de

expectativas frustradas (sobretudo por parte dos intelectuais e dos homens das

letras – muito poucos, refira-se – nacionais e dos portugueses indecisos que tinham

permanecido no país).

Esta situação de angústia e de desencanto originou, de certo modo, uma queda

de quantidade e de qualidade na escrita literária, em resultado, é importante

que se refira também, da saída em massa dos intelectuais para Portugal, na

sequência das revoluções independentistas. Até ao final da década de 80, pouco ou

quase nada foi escrito, no género literário, particularmente em Moçambique.

Como nos refrimos antes, logo após a Independência, outra situação político-social

condicionou a actividade sócio-económica e artística, de uma forma muito marcada,

referimo-nos à guerra civil que eclodiu de imediato. Neste sentido, esta situação

político-social condiciou uma certa escrita (ao nível da temática) que se pode

caracterizar como da angústia da guerra, na fase da vigência desta; (Mia Couto,

com Vozes Anoitecidas, pode ser um dos exemplos da eleição desta temática).

Formais

Antes da independências:

As expressões literárias eram maioritariamente líricas e a poesia era a modalidade

eleita.

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Depois das independências:

Pontifia a prosa, sendo o conto, o género mais cultivado, talvez porque se

constitui como um subgénero próximo da riquíssima fonte da escrita africana, que é

o património cultural e social, de transmissão e perpetuação orais, aliás, a maior

parte da escrita moçambicana em prosa procura, nalguns processos estilísticos e

discursivos, estabelecer uma simbiose com os processos inerentes às manifestações

culturais autóctones Bantu, tais são os casos de lendas, fábulas (muito produtivas

nas culturas africanas, que são, maioritariamente de tradição oral).

Aliam-se ainda a esse património cultural, as adivinhas, os adágios populares, as

canções das mulheres na fonte (de água), no cultivo da terra ou ainda as canções

para embalar a criança, para lembrar (matar saudades) do homem que partiu (por

exemplo, para o trabalho duro nas Minas da África do Sul) e que não se sabe se

voltará ou, se voltar, se estará ainda vivo, entre outras manifestações. Este legado

do património cultural popular é muito marcado na produção literária em prosa,

tome-se o exemplo, de Suleimane Cassamo, com O Regresso do Morto, O

Niketche, de Paulina Chiziane, entre outros).

Após os dois períodos anteriores, marcados, basicamente por um sentimento de

disforia, pelas razões a que nos referimos (isto desde 1975 até aos finais dos anos

80 do século passado), verifica-se, a partir dos anos 90 do referido século, uma

certa mudança de paradigma, na escrita literária moçambicana. Na verdidade,

consolida-se, em termos formais, a eleição da prosa como processo estilístico

de bandeira e intoduzem-se, na perspectiva de MARTINHO, Ana Maria, novas

combinações entre as diferentes áreas do Conhecimento He a Literatura, a saber,

entre:

Literatura e Conhecimento em África (Jesusalém, p. 69, de Mia Couto, é um dos

exemplos):

«Andámos horas , ignorando perigos. Quando chegámos , enfim, ao portão da saída, o meu coração sobrepulou. Estremeci, aterrado. Nunca nos aventurámos tão longe. Era

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ali que ficava a cabana em que vivia Tio Aproximado . Entrámos: estava vazia. (...) Quando o portão se escancarou, vimos que a tão proc lamada estrada não passava de um magro trilho, quase indistinto, invadido pelo ca pim e pelos morros de muchém. Todavia, para Ntunzi o atalhozito surgia como uma a venida cruzando o centro do universo. Aquele estreito fiozinho alimentava a ilu são de haver um lado de lá».

Literatura e História (Ualalapi, de Ungulani Ba Ka Khosa, é o exemplo):

«Estes homens da cor de cabrito esfolado que hoje ap laudis entrarão nas vossas aldeias com o barulho das suas armas e o chicote do comprimento da jibóia. Chamarão pessoa por pessoa, registando-vos em papéi s que … vos aprisionarão. Os nomes que vêm dos vossos antepassados esquecidos mo rrerão por todo o sempre, porque dar-vos-ão os nomes que bem lhes aprouver (. ..) como se não bastasse a palavra, a palavra que vem dos nossos antepassados, a palavra que impôs a ordem nestas terras sem ordem, a palavra que tirou crianç as dos ventres das vossas mães e mulheres. O papel com rabiscos norteará a vossa vid a e a vossa morte, filhos das trevas ».

- Outro exemplo de Mia Couto, desta feita de O Outro Pé da Sereia, p. 61:

«A nau Nossa Senhora da Ajuda acaba de sair do port o de Goa rumo a Moçambique. Cinco semanas depois, em Fevereiro de 1560, chegará à costa africana. Com a Nossa Senhora da Ajuda seguem mais duas naus: São Jerónimo e São Marcos. Nos barcos viajam marinheiros, funcionários do rein o, deportados, escravos. Mais do que todos, porém, a nau conduz D. Gonçalo da Silvei ra, o provincial dos jesuítas na Índia Portuguesa. Homem santo, dizem. O jesuíta faz -se acompanhar pelo padre Manuel Antunes, um jovem sacerdote que se estreava nas andanças marítimas. O propósito da viagem é realizar a primeira incursã o católica na corte do Império do Monomotapa. Gonçalo da Silveira prometeu a Lisboa q ue baptizaria esse imperador Negro cujos domínios se estendiam até ao Reino de P restes João. Por fim, África inteira emergiria das trevas e os africanos caminha riam iluminados pela luz cristã. A estátua de Nossa Senhora, benzida pelo Papa, é o símbolo maior desta peregrinação».

Literatura e Cultura (O Regresso do Morto, de Suleimane Cassamo)

Ficção Etnográfica e Crítica Cultural (Nicketche, de Paulina Ciziane, é a

ilustração):

«Vou visitar a tia Maria e la conta-me histórias da poligamia. Casada pela primeira vez aos dez anos, o casamento foi encomendado antes do seu nascimento. O pai tinha uma dívida, não consegui pagar impostos e disse ao cobrador de impostos: a minha mulher está grávida, se nascer uma menina entregá-l a-ei como pagamento. Eassim foi. Aos dez anos tornou-se vigésima quinta esposa de um rei».Niketche, Paulina Chiziane, p.72.

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Memória e Discussão da Condição Pós-colonial (O Outro pe da Sereia, de Mia

Couto e Choriro, de Ungulani) Ba Ka Khosa)

Literatura, Regionalismo e Universalismo (nas Crónicas de Mia Couto em O

País do Queixa Andar)

Para concluir, podemos referir que no paronama da literatura moçambicana que se

produz no período pós-independência, um novo paradigma se impõe: o de uma certa

escrita que, se poderia designar etnográfica, por ser subsidiária da voz colectiva

popular, ou melhor, do patrimómio cultural colectivo, da memória ancestral, que tem

nos escritores uma espécie de ‘porta-vozes’ desse património e não necessariamente

de autores textuais (pois estes textos de património colectivo são seculares e de

‘autoria’ vária e indeterminada, ou indefinida), mas sim do discurso, ou melhor, da

textura dos mesmos.

A este propósito, Martinho, A. M., in Memória e experiência etnográfica (op. cit.)

refere ainda que é importante referir que, ao olharmos para a literatura póscolonial

em África, aquilo que vemos são na verdade autores que transportam diferentes

graus de exposição sob o regime colonial e que se relacionam com o novo sistema

de acordo com formas de identificação também de exposição em tudo diferenciada.

Ainda assim, necessitam ser entendidos sob um paradigma que muda apenas

na medida em que permite ao sistema sobreviver e ficar activamente engajado nas

políticas colectivas.

Os escritores africanos sempre aspiraram escrever em nome de uma voz colectiva e

pretenderam ser reconhecidos como essa voz colectiva. Isto foi frequentemente

traduzido por ansiedade sobre limites de legibilidade e legitimidade.

De facto, a sociedade marxista, ao tornar-se o sistema póscolonial, embora

contraditória em muitas instâncias com o vernáculo, permitiu a inscrição de múltiplas

vozes, sob a imagem homogénea de comunidade. É perfeitamente adequada a ideia,

uma vez que facilitou os instrumentos para a identificação colectiva com o espaço

memorial. Os intelectuais conceberam a sua participação através dessa aspiração. A

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mimetização do outro colectivo foi explorada extensivamente através do seu

trabalho.

BIBLIOGRAFIA

FERREIRA, Manuel (1979), Literaturas Africanas de Expressão Portuguesa. – s/l:

Instituto de Cultura Portuguesa, (2º vol.: Intróito Angola, Moçambique).

FERREIRA, Manuel (1985-1988), No Reino de Caliban: Antologia Panorâmica da poesia africana de expressão portuguesa. – Lisboa: Plátano, D.L. 1985 - D.L. 1988 – 3º vol. (Moç.) – D.L.1985. FERREIRA, Manuel (1989), O Discurso no Percurso Africano I; contributo para uma estética africana. – Lisboa: Plátano, D.L.. GOENHA, Agostinho, A Função Simbólica da personagem, Maputo,AMOLP/Instituto Camões, 2002. LISBOA, Eugénio (1984), Crónica dos Anos da Peste. – Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda. MARGARIDO, Alfredo (1980), Estudos sobre Literaturas das Nações Africanas de Língua Portuguesa. – Lisboa: A Regra do Jogo. MARTINHO, Ana Maria Mão de Ferro Martinho,(Ensaios não editados) Berkeley,

Setembro de 2009.

Fonte da Internet: www.lusoafrica.net

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TEMA D: A Situação Linguística em Moçambique e o Ensino da Língua Portuguesa

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Línguas de Moçambique

De acordo com o artigo 5.º da Constituição (revisão de 1990), na "República de

Moçambique, a língua portuguesa é a língua oficial", no entanto, os resultados

do Recenseamento Geral da População e Habitação, realizado em 1997, indicam que

o português é língua materna de apenas seis por cento da população -

número que, na cidade de Maputo, atinge os 25 por cento -, apesar de cerca de 40

por cento dos moçambicanos ter declarado que a sabia falar. O mesmo artigo 5.º da

Constituição diz ainda que o "Estado valoriza as línguas nacionais e promove o

seu desenvolvimento e uso crescente como línguas veiculares e na

educação dos cidadãos".

Segundo estudos realizados, em Moçambique foram identificadas diversas línguas

nacionais, todas de origem bantu, sendo as principais, as seguintes: cicopi,

cinyanja, cinyungwe, cisena, cisenga, cishona, ciyao, echuwabo, ekoti, elomwe,

gitonga, maconde (ou shimakonde), kimwani, macua (ou emakhuwa), memane,

suaíli (ou kiswahili), suazi (ou swazi), xichangana, xironga, xitswa e zulu. Devido à

considerável comunidade asiática radicada em Moçambique, são também faladas

(residualmente) e consideradas o urdu e o gujarati, de origem asiática.

Subdivisões de Moçambique

Em termos administrativos, Moçambique está dividido em Províncias, Distritos,

Postos Administrativos e Localidades, este, o nível mais elementar de representação

do Estado Central. A estas divisões juntam-se, desde 1998, 33 autarquias locais,

denominadas Municípios (23 cidades, mais uma vila em cada província), excepto

Maputo, com uma unidade administrativa (o município e a cidade do mesmo nome,

respectivamente). O país está também dividido em 128 distritos.

A divisão administrativa sofreu, com a independência nacional, algumas alterações,

tanto em termos de nomenclatura, como das unidades administrativas (designadas

muitas, delas com nomes anteriores de origem locail e removidas as conotações

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coloniais). Houve, contudo, uma certa continuidade quanto à divisão territorial,

embora tenha havido uma certa evolução desde 1975, com a criação de novos

distritos e de municípios. Pode-se dizer que os “distritos”, que constituíam a divisão

administrativa colonial passaram a “províncias”, as “circunscrições” e os “concelhos”

passaram a “distritos”. Muitos dos “concelhos coloniais” (as povoações mais

importantes) correspondem actualmente aos “municípios”.

Províncias

Moçambique está dividido em 11 províncias, incluindo a cidade de Maputo, com

estatuto de província, por isso, com um Governo Provincial, contudo, é muito

frequente, mesmo a nível oficial, fazer referência a 10 províncias, devido à não

distinção nítida entre a cidade e a província de Maputo. As províncias são

administradas por Governadores nomeados pelo Presidente da República. 2007 foi o

ano de realização das primeiras eleições para as Assembleias Provinciais,

consagradas na Constituição de 2004. As onze províncias de Moçambique são, por

ordem alfabética: Cabo Delgado, Gaza, Inhambane, Manica, Maputo (cidade),

Maputo (província), Nampula, Niassa, Sofala, Tete, Zambézia.

Para uma abordagem mais autorizada da questão da situação linguística em

Moçambique, vamos basear a nossa análise, tendo como sustentáculo científico e

teórico, os estudos e as investigações de alguns dos mais conceituados linguistas

Bantu de Moçambique, na actualidade, a saber: LIPHOLA, M. (1988); KATHUPA, A.

(1988); LOPES, A. J.( 2004) e FIRMINO, G. (2005) respectivamente.

Localização

Moçambique é banhado pela imensidão do Oceano Índico (cerca de 2 470 Km de

comprido e de costa) e é habitado por povos de língua bantu. Segundo LOPES

(2004), o território que actualmente se designa por Moçambique experimentou

activas comunicações marítimas que, desde os primeiros séculos da nossa Era,

puseram diversas regiões em contacto. Os Árabes, navegadores pioneiros no

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Oceano Índico, já por volta do Século VIII, foram os primeiros a monopolizar

o comércio marítimo entre o Oriente e o Ocidente. Seguiram-se-lhes neste

papel os indianos, os chineses e os indonésios. As rotas de especiarias e de produtos

de luxo, associados ao mito de riquezas inimagináveis, atraíram o interesse dos

ocidentais.

Foi nesse contexto que, em finais do século XV, os portugueses chegaram a

Moçambique, a caminho da Índia, na viagem de descoberta da rota do

Cabo realizada por Vasco da Gama, entre 1497 e 1499. O sistema comercial

introduzido, que já existia quando os portugueses chegaram a Moçambique,

funcionou certamente até ao século XIX, tendo os portugueses, indianos, povos

falantes da língua Kiswahili, árabes e outros europeus concorrido entre si. Durante

este período, o Porto de Moçambique, na Ilha do mesmo nome – confundida com o

país inteiro – transformou-se em escala obrigatória para a travessia do Oceano

Índico.

Interesses comerciais atraíam os portugueses que se iam fixando ao longo do

Rio Zambeze e também na costa, onde se estabeleceram algumas feitorias

até finais do século XIX. Somente a aprtir desta altura é que Portugal

passou a manter em Moçambique uma presença efectiva e crescente. A

colonização portuguesa seria exercida até aos dias em que Moçambique alcançou a

Independência, em 1975, através da guerra de libertação.

Para KATHUPA (1988), Moçambique pode ser caracterizado, do ponto de vista sócio-

linguístico, por uma multiplicidade de meios linguísticos na expressão da sua

interacção social. O substracto deste plurilinguismo resulta da confluência

de povos cuja primeira vaga (de) que a História (nos) reporta e a realidade

linguística nos confirma, foi constituída pelas migrações Bantu. Estas migrações

eram compostas de grupos de indivíduos cujas línguas eram tão semelhantes que

levaram a que os linguistas europeus as classificassem numa mesma subfamília de

Línguas Bantu (Bleek 1862-9, Meinhof 1932 e outros). Na sua extensão

geográfica elas ocupam a maior parte da África austral, a sul de uma linha

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divisória que vai desde os montes Camarões (África ocidental até à foz do rio Tana,

na África oriental) .

Moçambique é dos países da África Austral em cujo território não existem outras

línguas africanas que não sejam as da sub-família Bantu. Usando a terminologia de

Guthrie (Guthrie 1967/ 71), as línguas Bantu de Moçambique distribuem-se em

quatro zonas e oito grupos, a saber:

(i) Zona G:

G40: Ki-Swahili;

(ii) (ii) Zona P:

P20: Chi-yao e Chi-Makonde

P30: e- Makhuwa (+e-Lomwe e e-Chuwabo)

(iii) Zona N:

N30: Chi-Nyanja

N40: Chi-Sena

(iv) Zona S:

S10: Chi-Shona

S50: Shi-Tsonga (+Shangana, Ronga, Twa)

S60: Chi-Chopi

Cada um destes grupos pode ser considerado mais um conjunto de variantes

dialectais de uma mesma língua, dado que existe um certo grau de

intercompreensão. Pode-se, por isso, dizer que existem oito línguas Bantu no

território moçambicano. Em termos numéricos (percentuais) da população falante

destacam-se quatro grandes línguas, sendo as outras faladas dentro das zonas de

influência daquelas (Censo Geral da População, 1980):

(1) Língua e-Makhua – 41% (incluindo e-Lomwe e e-Chuwabo)

(2) Língua Shi-Tsonga – 19% (incluindo Shi-Twa)

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(3) Língua Shi-Nyanja – 10% (incluindo Chi-Sena)

(4) Língua Chi-Shona- 8%

Na perspectiva de LIPHOLA (1988), o agrupamento das línguas baseado

essencialmente no número de falantes não faz coincidir, muitas vezes, as

fronteiras linguísticas com as geográficas, estas últimas, parcelando pelo

meio grandes comunidades possuidoras da mesma forma de expresssão

linguística; (...) socorremo-nos por exemplo das línguas Chi-Yao e Chi- Makonde,

entre outras tidas como «minoritárias»; estas poderiam reclamar o seu

reconhecimento de línguas maioritárias se se tomasse em conta o facto de que elas

línguas «violam» as fronteiras geográficas a sul da República Unida da

Tanzânia.

Há uma área de investigação que ainda está fértil (ou estéril?), segundo

LIPHOLA, op. cit., a dos estudos das chamadas formas dialectais e grupos

linguísticos (“maiores/menores”), para uma classificação mais representativa e

menos contrastiva dessas línguas com o fim de se decidir numa base cientificamente

fundamentada sobre os possíveis agrupamentos, de acordo com o grau de

intercomunicabilidade.

Breve perfil linguístico

Na perspectiva de LOPES, op. cit. e na concordância de estudiosos a que temos

vindo a fazer refrência, Moçambique é um país multilingue e multicultural

(não apenas multi-étnico). Para além do Portugués, que é a língua oficial e

das línguas asiáticas (como o Gunjarate, Mename, Hindi e Hurdu) que são também

faladas nativamente por vários moçambicanos (de origem asiática), a grande

maioria das línguas faladas em Moçambique pertence ao grupo bantu.

Estas são línguas indígenas e constituem o principal estrato linguístico, tanto com

respeito ao número de falantes, como em termos da distribuição das línguas pelo

território. Os dados linguísticos de 2002 (do INE) indicam que a população é

estimada em 18.082.523 (entretanto, ass projecções actuais apontam para uma

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população de 25.000).

Papel da língua portuguesa

A língua portuguesa é o meio de comunicação nas áreas da administração

e da educação e tem sido referida como símbolo de unidade nacional. Os

falantes do português como língua materna representam cerca de 4,8% da

população total. Mais de 90% dos falantes do português como língua primeira (L1)

a nível nacional são urbanos (ou semi-urbanos).

Os falantes das línguas Bantu, como L1, são principalmente do campo e constituem

cerca de 78%.

A língua portuguesa permite o acesso a diferentes níveis de poder e à elite,

especialmente, à elite dirigente.

As línguas bantu de Moçambique, segundo Guthrie, Malcolm, citado por LOPES, op.

cit., compreeendem quatro zonas e oito agrupamentos linguísticos principais,

nomeadamente:

1. Zona G – G40: Swahili;

2. 2. Zona P - P20: Yao e Makonde e P30: makua (+Lomwe, Cwabo;

3. 3. Zona N – N30: Nyanja e N40: Nsenga-Sena;

4. Zona S – S10: Shona e S50: Tsonga (Shanganaa, Ronga, Twa e S60: Copi.

Para este estudioso, ninguém foi ou é capaz de dizer exactamente quantas

línguas e variantes bantu são faladas em Moçambique, principlamente,

porque ainda não foi realizado um estudo dialectaológico de grande escala

nesta parte do mundo. Outros estudiosos que temos vindo a citar neste ensaio

constatam, aliás, o mesmo.

Dos grupos linguísticos mais amplos numericamente, as línguas Emakwhua-

Elomwwe correspondem a 33.5% da população total falante de línguas

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maternas no país. Segue-se em ordem de grandeza o Xichangana, com 11,3%.

É interessante observar igualmente a dimensão da cobertura linguística para além

das fronteiras nacionais. Moçambique partilha grupos linguísticos que violam

seis fronteiras geográficas, (alguns dos quais de volume considerável), como se

pode observar abaixo:

- As línguas Kiswahili e Shimakonde difundem-se a norte, em direcção ao estado

vizinho da Tanzânia;

- O Ciyao espande-se para o Malawi e a Tanzânia;

- O Cinyanja estende-se para o Malawi, Tanzânia e Zâmbia;

- O Elomwe e o Cisena são também línguas do Malawi;

- O Cishona difunde-se para o Zimbabwe;

- O Xichangana é partilhado pela África do Sul.

Comunicação de Moçambique com o Mundo

Para efeitos de realizões oficiais e de negócios, a comunicação de Moçambique com

o mundo exterior é realizada sobretudo através de duas línguas, o Português e o

Inglês, com predomínio claro para o Português, como língua oficial, da

administratação, do ensino, da unidadede nacional.

Observe-se, de seguida, o mapa linguístico apresentado por LOPES, op. cit., com a

distribuição das línguas pelo território nacional e as percentagens respectivas:

scan Armando Lopes.pdf

Numa abordagem mais ou menos similar e, de certo modo, complementar, FIRMINO

(2005) constata que, para a validação dos estudos desta área, é importante ter-se

em conta a política linguística que emergiu depois da independência em 1975.

Política linguística em Moçambique

Este investigador refere que quando Moçambique se tornou independente em 1975,

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o Português foi adoptado como língua oficial e como símbolo da unidade

nacional. A definição destes papéis para o Português foi um resultado natural. O

Português já tinha assumido esses papéis, tanto no Moçambique colonial,

em que era a língua oficial, como na FRELIMO, onde foi adoptado como

instrumento da unidade nacional. Para além disso, a atmosfera ideológica

prevalecente nos anos que se seguiram à independência também favoreceu e

legitimou a oficialização do Português e o seu uso como símbolo de unidade

nacional.

Nesse período, a ideologia oficial entendia as divisões étnicas e regionais

como grandes ameaças à consolidação da nova Nação-Estado

moçambicano. O Português apareceu como um instrumento adequado não só para

se sobrepor às diferenças linguísticas entre os moçambicanos, mas também para

promover a consciência da unidade nacional.

Como as línguas autóctones estavam associadas a filiações étnicas divisionistas, tais

como tribalismo e regionalismo, as autoridades do Estado não contemplaram o

seu uso em domínios oficiais, excepto nas transmissões radiofónicas (...). O

discurso oficial, no entanto, frequentemente reconhecia o seu papel como criadoras,

veículos e parte integrante daquilo que era considerado como sendo a cultura

moçambicana genuína.

É interessante determo-nos na seguinte reflexão que FIRMINO: 165 faz: desta

visão das línguas autóctones, como a marca genuína da moçambicanidade,

surge uma das maiores contradições da política oficial que emergiu em

Moçambique depois de 1975 (...). O Português nunca era, no entanto,

associado à expressão da «moçambicanidade» autêntica, nem às línguas

autótones era permitido o acesso às actividades oficiais.

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Observemos, desta feita, o mapa linguístico apresentado por FIRMINO, op. cit., as

correspondências linguísticas apresentadas, a localização das línguas pelo espaço

nacional e as respectivas tabelas:

Scans Gregório Firmino.pdf Pode-se afirmar que «é nas línguas (bantu) moçambicanas onde residem, se

preservam e se transmitem os principais elementos constitutivos da identidade

cultural moçambicana, mas é a língua portuguesa que detêm o valor de língua de

unidade nacional, de prestígio, de poder e, sobretudo, de escolarização. Esta

situação, por paradoxal que pareça, cria uma situação de segregação e de exclusão

social pois, quem não a fala, não tem acesso aos meios e benefícios do poder, aos

direitos consagrados na Constituição, porque está à margem, desconhe esses

direitos, não tem a acesso a esse «mundo» misterioso da escrita.

De qualquer modo, é preciso reconhecer o esforço do Governo em introduzir

as línguas nativas no ensino primário (processo que está em curso no Novo

Curriculum intriduzido recentemente no Ensino Básico, em algumas escolas), na

medida em que traz vantegens, no que diz respeito à identificação do aluno com a

sua alma e o seu património culturais (a sua língua materna), mas parece merecer

outra atenção, esta abordagem, na medida em que se verifica uma modesta

qualificação do corpo docente para o ensino destas e nestas línguas.

Outro problema associado a este é o que tem a ver com a mobilidade das

famílias, das suas zonas de origem (por várias razões, como por exemplo, as

secas cíclicas e as inundações, para o caso dos camponeses e as transferências dos

funcionários), para zonas onde se falam línguas maternas nativas diferentes

das suas. Isto pode criar um clima de rejeição ou de conflito, se a família emigrante

pretender conservar a sua língua, veículo de preservação, por sua vez, da sua

cultura.

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Pode-se concluir, desta feita que, na política linguística prevalecente em

Moçambique, na actualidade, o Português é oficializado mas não

nacionalizado, enquanto as línguas autóctones são nacionalizadas mas não

oficializadas, por isso, considera ainda FIRMINO, o principal problema da actual

política linguística deriva desta contradição.

Ensino (bilingue)

Em Moçambique, o ensino primário, com dois ciclos compreendendo sete anos

de escolaridade, corresponde à educação obrigatória. O primeiro ciclo (EP1) inclui

cinco anos de estudo, que ensinam a alfabetização e conhecimentos básicos; o

segundo (EP2) inclui apenas dois anos. Depois desta fase, os alunos podem integrar

o ensino secundário.

Sendo a questão linguística fundamental, ao mexer com a esfera social – que

pode (in)conscientemente ser receptiva ou não ao EB e outros fenómenos inerentes

–, a componente sociolinguística deve ser considerada; ou seja, para além do

fortalecimento do Portuguê e da própria valorização das línguas bantu, a abertura

para o uso destas no contexto oficial seria uma forma de potenciar a

participação de diversas pessoas na vida pública através da expressão das

suas ideias pela língua que melhor dominam, isto se se pensar que uma vez

valorizadas através do seu ensino formal, lado a lado com o Português (e as outras

como o Inglês e o Francês) e o reconhecidas oficialmente como meio de interacção

na vida pública, terão já beneficiado da padronização, por isso, serão fáceis de ser

usadas e aprendidas.

Dificuladades na implementação do ensino bilingue:

Um dos grandes obstáculos a ultrapassar neste processo é, sem dúvida, a

concepção de programas que abarquem as especificidades das línguas

bantu, cujo enfoque deve adaptar-se ao Português (tendo em conta o papel auxiliar

que vão desempenhar), sem perder de vista que este quadro deverá estar em

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consonância com aquilo que são as expectativas do Estado em relação aos padrões

nacionais de educação. A não existência de professores formados para o Ensino

Básico constitui outro constrangimento, isto se se pensar que os professores que

vão manipular estes programas de ensino devem dominar ambas línguas de modo a

não evidenciar dificuldades no processo de ensino/aprendizagem. Acrescida a esta

necessidade, estes professores devem dominar as metodologias do Ensino Básico de

modo a providenciar um ensino adequado. A falta de meios materiais é outro dos

obstáculos a contornar.

De uma forma geral reconhece-se que a elevação do estatuto das línguas bantu,

através da sua utilização no ensino e na administração do estado, será motivadora

para os professores, os alunos e as comunidades em geral.

BIBLIOGRAFIA: AAVV, Luanova, Edição: Associação dos Escritores Moçambicanos (Editor: Albino Magaia), Maputo, 1988; Artigo de Marcelino Liphola: «As línguas banto de Moçambique: uma pequena abordagem do ponto de vista sócio-linguístico». AAVV, Luanova, Edição: Associação dos Escritores Moçambicanos (Editor: Albino Magaia), Maputo; 1988. Artigo de A. Kathupa: «O panorama linguístico de Moçambique e a contribuição da linguística na definição de uma política linguística apropriada». FIRMINO, Gregório, A «Questão linguística» na África Pós-colonial: O Caso do Português e das Línguas Autóctones em Moçambique, Texto Editores, Maputo, 2005. LOPES, Armando Jorge, A Batalha das Línguas, Imprensa Universitária (UEM), Maputo, 2004.

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Breve Biografia

Nome: Agostinho Matias Goenha Local de Nascimento: Maputo – Moçambique Local de Trabalho: Universidade Pedagógica de Moçambique – Faculdade de Ciências da Linguagem, Comunicação e Artes – Departamento de Português. Endereço do Trabalho : Rua Comandante Augusto Cardoso, 135, Caixa Postal, 3276 Telef.: 420860/2; 430761, Fax nº 422113 Maputo – Moçambique.

. Grau Académico: DOUTORAMENTO EM ESTUDOS PORTUGUESES Área de Especialização: Literaturas Africanas de Expressão Portuguesa. Instituição: Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa (2006).

. Grau Académico: Mestrado em Literaturas Românicas Área de Especialização: Literatura Portuguesa Moderna e Contemporânea. Instituição: Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (2000). . Docente de Literaturas em Língua Portuguesa. . Coordenador do Mestrado em Educação/Ensino de Português . Área de Pesquisa : Literatura e Ensino. . Vencedor do 1º Prémio Ensaio Literário, instituído pela Associação Moçambicana de Língua Portuguesa (AMOLP), com o trabalho de ensaio intitulado «As manifestações semânticas das personagens em Portagem e em A Estranha Aventura, de Orlando Mendes e de Guilherme de Melo, respectivamente». . Colaboração na elaboração do Dicionário Temático da Lusofonia, na Associação de Cultura Lusófona (ACLUS), com sede na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (FLUL), sob a direcção do Prof. Dr. Fernando Cristóvão, com os seguintes verbetes (entradas): “Associações e instituições moçambicanas” e “Educação em Moçambique”. . Apresentação na FCSH – Universidade Nova de Lisboa - de uma comunicação sobre “A literatura moçambicana no período anterior à Independência Nacional”. . Participação no II SIMELP (Simpósio Mundial de Estudos de Língua Portuguesa) – Évora – Portugal, de 6 de Outubro a 11 de Outubro de 2009. . Arguição de dissertaões de Licenciatura e de Mestrado. Etc. Endereço Electrónico: [email protected]