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COLEÇÃO ENSINO DA CIÊNCIA E DA TECNOLOGIA TécnicaS MaTeMáTicaS da FíSica RUI DILÃO miolo Técnicas Matemáticas da Física.qxp_miolo 01/07/19 17:43 Page 1

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C O L E Ç Ã O E N S I N O D A C I Ê N C I A E D A T E C N O L O G I A

TécnicasMaTeMáTicas da Física

RUI DILÃO

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C O L E Ç Ã O • E N S I N O DA C I Ê N C I A E DA T E C N O L O G I A

07 introdução à Programação em Mathematica • 3ª edição José Carmo, Amílcar Sernadas, Cristina Sernadas, F. Miguel Dionísio, Carlos Caleiro

25 Funções de Variável complexa: Teoria e aplicaçõesAntónio H. Simões de Abreu

30 análise complexa e equações diferenciais • 3ª ediçãoLuís Barreira

37 Grupos e álgebras de LieJosé Carlos Oliveira Santos

39 análise Funcional LinearBryan P. Rynne, Martin A. Youngson

43 Vibrações e Ondas João Paulo Silva

45 cálculo diferencial e integral em Rn • 3ª ediçãoGabriel Pires

49 cálculo numa Variável Real • 2ª ediçãoJoão Paulo Santos

50 Mecânica Quântica, 2º edição Revista e aumentada Marco Cardoso, Marta M. Correia, Samuel F. Martins, Ricardo Monteiro, Miguel Paulos, Joao G. Rosa, Jorge E. Santos, Pedro Bicudo, Pedro Sacramento

53 introdução à analise complexa, series de Fourier e equacões diferenciaisPedro Martins Girao

52 elementos de eletrodinâmica clássica • 2ªediçãoJorge Loureiro

60 simulação computacional clássicaVítor Maló Machado

63 eletromagnetismo e ÓticaJorge Loureiro

C O L E Ç Ã O • A P O I O AO E N S I N O

a exercícios de análise Matemática i e ii • 3ª ediçãoDepartamento de Matemática do ISt

b Métodos numéricos, complementos e Guia PráticoCarlos Lemos, Heitor Pina

c Matemática experimentalMário M. Graça, Pedro trindade

d exercícios de cálculo integral em Rn • 2ª ediçãoGabriel Pires

f exercícios sobre análise complexa e equações diferenciais • 2ª ediçãoLuís Barreira,Claudia Valls

m exercícios de eletromagentismo e ÓticaJorge Loureiro

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C O L E Ç Ã O E N S I N O D A C I Ê N C I A E D A T E C N O L O G I A

TécnicasMaTeMáTicas da Física

RUI DILÃO

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F I C H A T É C N I C A

editora: isT Pressdiretor: Pedro Lourtie

coleção: ensino da ciência e da Tecnologiacoordenador editorial: F. Miguel dionísio

Título: Técnicas Matemáticas da Físicaautor: Rui Manuel a. dilão

Produção: Manuela Moraisdesign capa: antónio Faria, designerRevisão de Texto: csc. Reticências, Unipessoal, Lda.

impressão /acabamento: europress, empresa Gráfica, Lda. isBn: 978-989-8481-73-3depósito Legal: 458257/191ª edição: julho 2019

Tiragem: 500 exemplares

isT Press instituto superior Técnicoav. Rovisco Pais,1049-001 Lisboa, [email protected].: 351 218417686 / 21 8417659istpress.tecnico.ulisboa.pt

copyright © 2019, Rui M. a. dilão e instituto superior TécnicoReservados todos os direitos. esta publicação não pode ser reproduzida, nem transmitida, no todo ou em parte, por qualquer processo eletrónico, mecânico,fotocópia, gravação ou outros, sem prévia autorização escrita da editora.

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ÍNDICE

PREFÁCIO v

1 MEDIDA E INTEGRAÇÃO: O INTEGRAL DE LEBESGUE 11.1 Conjuntos e funções mensuráveis 31.2 Medida de Lebesgue 91.3 Conjuntos de medida nula 121.4 O integral de Lebesgue 151.5 A dimensão de Hausdorff 17

2 ESPAÇOS DE FUNÇÕES E ESPAÇOS DE HILBERT 212.1 Espaços pré-hilbertianos 232.2 Espaços de Hilbert 272.3 Espaços de Lebesgue 312.4 Operadores 34

3 BASES DE ESPAÇOS DE HILBERT 373.1 Bases de espaços de Hilbert 393.2 Polinómios de Legendre 423.3 Teoremas fundamentais 44

4 OPERADORES 514.1 Operadores 534.2 Operadores adjuntos, hermíticos e unitários 544.3 Operadores de Sturm-Liouville 57

5 SÉRIES DE FOURIER 635.1 Séries de Fourier 655.2 Fenómeno de Gibbs 705.3 Convergência das séries de Fourier 73

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i i ÍNDICE

6 DISTRIBUIÇÕES 796.1 Funcionais lineares e distribuições 816.2 Derivadas de distribuições 86

7 A EQUAÇÃO DAS ONDAS I: OSCILAÇÕES TRANSVERSAIS 937.1 A equação das ondas 957.2 Soluções de equilíbrio da equação das ondas 987.3 Soluções estacionárias da equação das ondas 1007.4 Teorema de d’Alembert 1067.5 Energia de ondas transversais 1107.6 Ressonância 1127.7 Equilíbrio de uma membrana retangular 1157.8 Oscilações de uma membrana circular 1167.9 A equação das ondas e a transformação de Lorentz 1207.10 Soluções fortes e fracas da equação das ondas 121

8 A TRANSFORMADA DE FOURIER E AS FUNÇÕES DE GREEN 1278.1 A transformada de Fourier 1298.2 A relação de incerteza de Heisenberg 1398.3 A fórmula da soma de Poisson 1418.4 Funções de Green 142

9 A EQUAÇÃO DO CALOR 1519.1 A equação do calor em meios infinitos 1539.2 A equação do calor em meios finitos 1589.3 Uma simetria da equação do calor 160

10 A TRANSFORMADA DE LAPLACE 16310.1 A transformada de Laplace 16510.2 Funções de Green 172

11 REFLEXÃO, REFRAÇÃO E DISPERSÃO DE ONDAS 17711.1 Reflexão e refração de ondas transversais 17911.2 Lei de Snell 18211.3 Velocidade de fase 18411.4 Velocidade de grupo 187

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ÍNDICE i i i

12 A TRANSFORMADA DE FOURIER DISCRETA 19112.1 A transformada de Fourier discreta 193

13 EQUAÇÕES ÀS DERIVADAS PARCIAIS DE SEGUNDA ORDEM 20113.1 Equações às derivadas parciais de segunda ordem 20313.2 Curvas caraterísticas 20913.3 O efeito Doppler 211

14 FONÕES E SOLITÕES 21714.1 Ondas solitárias 21914.2 Ondas lineares em redes: fonões 21914.3 Ondas não lineares em redes: solitões 224

A O MÉTODO DOS RESÍDUOS 229

B GUIA PARA A RESOLUÇÃO DOS EXERCÍCIOS 235

BIBLIOGRAFIA 245

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PREFÁCIOA análise funcional dá-nos um conjunto de ferramentas matemáticas importantes para ex-plorar do ponto de vista teórico, experimental e numérico os sistemas da Física e da Enge-nharia. As suas técnicas são particularmente úteis na determinação e no estudo de soluçõesde equações às derivadas parciais, na teoria dos operadores e das funções generalizadas oudistribuições, na construção de algoritmos de integração numérica e de processamento eanálise de sinais.

Os primeiros seis capítulos deste livro são uma introdução informal à análise funcional,incluindo a análise de Fourier. O objetivo foi o de fazer um primeiro contacto com a teoriada medida e da integração, sem alguns dos seus aspetos mais formais. Do capítulo 7 aocapítulo 13, estudam-se as equações das ondas, do calor e a classe das equações de Laplace,assim como as técnicas mais usadas na obtenção das suas soluções. No último capítulo,estudam-se os solitões, como exemplo de ondas não lineares. No Apêndice A resumem-sealguns resultados da teoria dos resíduos e no Apêndice B dão-se indicações para a resoluçãodos exercícios.

Este texto resultou do ensino das Técnicas Matemáticas da Física no curso de EngenhariaFísica do Instituto Superior Técnico. É um texto básico e que serve de fundação às técnicasmodernas da Física que se desenvolveram a partir dos anos vinte do século xx. A escolha dasmatérias teve em conta as necessidades técnicas básicas e a linguagem das várias disciplinasda Física e da Engenharia. Os assuntos lecionados são comuns a todas as áreas da Físicaque se faz dos nossos dias e não se sobrepõem a assuntos mais específicos, como sejam oestudo das equações de Maxwell, de Schrödinger ou de Navier-Stokes. O estudo destasequações é feito em detalhe em cadeiras mais especializadas.

Finalmente, agradeço aos editores da IST Press pelas revisões cuidadas dos vários assuntosaqui abordados. Agradeço ainda a todos os alunos que, ao longo dos anos, me deramsugestões importantes relativamente aos textos e às matérias aqui expostas. A todos elesestou sinceramente agradecido. Falhas ou gralhas que ainda tenham resistido são daminhainteira responsabilidade.

Lisboa, julho de 2019

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1MEDIDA E INTEGRAÇÃO: O INTEGRAL DE LEBESGUE

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MEDIDA E INTEGRAÇÃO: O INTEGRAL DE LEBESGUE 3

Introduzem-se os conceitos de álgebra-σ, medida de um conjunto, conjunto de medida nula, funçãomensurável, medida de Lebesgue e de Hausdorff. Faz-se uma revisão de alguns resultados da teoriada integração de Lebesgue e são discutidos o teorema de Lusin, o teorema de Lebesgue da convergênciadominada e o teorema de Fubini para integrais múltiplos. Introduz-se o conceito de dimensão fractal.

1.1 CONJUNTOS E FUNÇÕES MENSURÁVEIS

O conceito de medida de um conjunto generaliza as definições de comprimento, área evolume, está na base da construção dos espaços de funções e da teoria da integração deLebesgue.

Em linhas gerais, o conceito de medida introduz-se através de um conjunto de axiomasque caraterizam as famílias de conjuntos mensuráveis de um espaço. Este conjunto de axio-mas define uma estrutura designada por álgebra-σ. Um processo axiomático idêntico estána origem do conceito de conjunto aberto que é fundamental no estudo das funções con-tínuas. Neste caso, a caraterização dos conjuntos abertos é feita através da introdução deaxiomas que definem uma topologia sobre o espaço. Este tipo de construções axiomáticassão familiares da álgebra e estendem-se, naturalmente, à análise.

Topologia Axiomas Álgebra − σ

↓ ↓

Conjuntos Abertos Definições Conjuntos Mensuráveis

↓ ↓

Funções contínuas Definições Funções mensuráveis

Comece-se por relembrar o que é uma topologia e como se chega naturalmente aos con-ceitos de conjunto aberto, de conjunto fechado e de função contínua. Consideremos umconjunto X e uma família de subconjuntos de X que se designa por T . Representa-se oconjunto vazio pelo símbolo ∅.1 Diz-se que T é uma topologia sobre X se se verificaremas condições ou axiomas:

i) X, ∅ ∈ T .1O conjunto vazio não tem elementos.

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4 CONJUNTOS E FUNÇÕES MENSURÁVEIS

ii) Se A,B ∈ T , então A ∩B ∈ T .

iii) Se Aα é uma família arbitrária de elementos de T , então ∪αAα ∈ T .

Verificados os três axiomas anteriores para a família T , diz-se que T é uma topologia sobreX ou que (X,T ) é um espaço topológico. Quando se subentende uma topologia sobre X,diz-se simplesmente que X é um espaço topológico. Por definição, os elementos de T sãodesignados por conjuntos abertos.

Na topologia dos abertos, podem-se definir conjuntos fechados. Um conjunto C é fechadono espaço topológicoX, seC− := X−C é aberto. O conjuntoC− designa-se por conjuntocomplementar de C emX. Deste modo, tem-se queX e ∅ são simultaneamente conjuntosabertos e fechados.

Por exemplo, em R2 como espaço métrico, para a família de bolas abertas de centro 0 eraio 1/n, B(0,1/n) = x ∈ R2 : x2

1 + x22 < 1/n2, tem-se que ∩∞

n=1B(0,1/n) = 0 e∩mn=1B(0,1/n) = B(0,1/m). Então, a interseção infinita de abertos pode não ser abertamas a interseção finita de abertos é sempre um conjunto aberto. Estão assim justificadasas escolhas feitas nos axiomas ii) e iii) para a distinção entre conjuntos abertos e fechados.

A continuidade de uma função é uma propriedade topológica. Seja uma função f : X →Y em que X e Y são espaços topológicos, diz-se que f é uma função contínua num pontox0 ∈ X, se a pré-imagem de qualquer conjunto aberto que contenha f(x0) é um conjuntoaberto que contém x0. Isto é, f−1(V ) é um aberto deX , sempre que V é um aberto de Y ,desde que f−1(V ) e V contenham x0 e f(x0), respetivamente. Pode-se demonstrar que estadefinição de função contínua é equivalente, para funções reais de variável real, à definiçãousual dos εε e δδ (Exercício 1.2).2 O inverso da definição anterior não é verdadeiro. Isto é,pode-se ter uma função contínua cuja imagem de um conjunto aberto não é um conjuntoaberto. Tome-se, por exemplo, a função constante sobre o conjunto dos reais.

Analogamente ao que foi feito para os conjuntos abertos, introduza-se o conceito de con-junto mensurável. Seja um conjuntoX e uma família de subconjuntos deX que se designaporA. A família de conjuntosA é uma álgebra-σ sobreX se se verificarem as três condições:

i) X ∈ A.2Uma função f(x) : X = Rn → Y = Rm é contínua no ponto x0 ∈ X se, para todo o ε > 0, existe um δ > 0,

tal que, |x− x0| < δ, implica que |f(x) − f(x0)| < ε. É usual escrever esta definição do seguinte modo,

(∀ε>0)(∃δ>0)(∀x∈X )|x− x0| < δ =⇒ |f(x) − f(x0)| < ε

e δ ≡ δ(ε). A função f é contínua no espaço topológico X se é contínua em todos os pontos do seu domínio.

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MEDIDA E INTEGRAÇÃO: O INTEGRAL DE LEBESGUE 5

ii) Se A ∈ A, então A− ∈ A.

iii) Se An é uma família finita ou numerável de elementos de A, então ∪nAn ∈ A.

Um conjuntoX juntamente com uma álgebra-σ designa-se por espaço mensurável e represen-ta-se por (X,A). Por definição, os elementos deA designam-se por conjuntos mensuráveis.Se existirem subconjuntos de X que não pertencem a A, este conjuntos não são mensurá-veis. Muitas vezes, designa-se por X o espaço mensurável sem indicar a álgebra-σ.

Das três condições anteriores decorre que o conjunto vazio ∅ pertence a A, pois X− = ∅.Nas álgebras-σ, as interseções finitas ou numeráveis estão sempre em A. Ora veja-se. SeAn é uma família finita ou numerável de elementos de A, então

∩nAn = (∩nAn)−− =(∪nA−

n

)− ∈ A,

pois ∪nA−n ∈ A.

Em geral, é difícil caracterizar os elementos de uma álgebra-σ e, por isso, recorre-se a téc-nicas construtivas. Pode-se gerar uma álgebra-σ a partir de uma família de subconjuntosde X, juntando novos elementos através de uniões, interseções e de passagens ao comple-mentar, no máximo numa infinidade numerável. Isto motiva a definição de gerador de umaálgebra-σ: uma álgebra-σ é gerada por um conjunto S se todos os elementos da álgebra-σse podem obter por operações de união e interseção, no máximo numeráveis, e passagensao complementar de elementos de S.

Designando por S uma família de subconjuntos deX , escolhem-se todas as algebras-σ quecontêm S. De facto, existe pelo menos uma álgebra-σ que contém S que é o conjunto detodos os subconjuntos deX. A álgebra-σ gerada por S é a menor álgebra-σ que contém S epode ser obtida pelas interseções de todas as álgebras-σ que contêm S.

SeX é um espaço topológico, designe-se por B a álgebra-σ gerada pelos conjuntos abertosde X — álgebra-σ de Borel. Assim, B contém conjuntos abertos e fechados. Os elementosde B são designados por Borelianos.

Se X = R, a álgebra-σ dos Borelianos pode ser gerada pela família de conjuntos abertos

S = (a,+ ∞) : a ∈ R .

Se X = Rn ou X = Cn, a álgebra-σ canónica é a álgebra-σ de Borel gerada pelos abertos“semi-infinitos” de X .

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6 CONJUNTOS E FUNÇÕES MENSURÁVEIS

No conjunto dos números reais R, com a topologia canónica, o intervalo [a,b] é fechado,o conjunto (a,b) é aberto e (a,b] não é nem aberto nem fechado. O conjunto (−∞,b) éaberto e (−∞,b] é fechado.

Qualquer intervalo ou família de intervalos da reta pode ser obtido através de interseções,uniões ou passagens ao complementar de elementos de S:

[a,+ ∞) =∞∩n=1

(a− 1n,+∞)

(−∞, a) = [a,+∞)−

(a,b) = (−∞,b)∩

(a,+∞)

[a, b] = [a,+ ∞)∩

(−∞,b] = [a,+ ∞)∩

(b,+ ∞)− .

Mostrou-se, assim, que [a,+ ∞), (−∞, a), (a,b) e [a, b] pertencem à álgebra-σ de Borel deR, sendo, portanto, conjuntos mensuráveis.

Uma função real, f : X → R, em que X é um espaço mensurável, diz-se mensurável se,para todo o real a, os conjuntos

Aa = x : f(x) > a

são mensuráveis. Isto é, Aa pertence à álgebra-σ de X .

Se, para todo o a ∈ R, os conjuntos Aa estão na álgebra-σ de X, então os conjuntos,x : f(x) ≥ a, x : f(x) < a e x : f(x) ≤ a também pertencem à álgebra-σ de X.Pode-se partir de qualquer dos conjuntos anteriores para definir a mensurabilidade de umafunção, pois

x : f(x) ≥ a =∞∩n=1

x : f(x) > a− 1n

x : f(x) < a = x : f(x) ≥ a−

x : f(x) ≤ a = x : f(x) > a− .

Vejam-se exemplos de funções mensuráveis.

Função caraterística ou função indicatriz de um conjunto. Seja (X,A) um es-paço mensurável e seja A um subconjunto de X . Seja a função

χA(x) = 1A(x) :=

1 se x ∈ A

0 se x ∈ A .

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MEDIDA E INTEGRAÇÃO: O INTEGRAL DE LEBESGUE 7

Então, tem-se que

x : χA(x) > a =

∅ se a ≥ 1A se 0 ≤ a < 1X se a < 0

e χA(x) é mensurável se, e somente se, A pertence à álgebra-σ de X . Se o conjunto Aé mensurável, χA(x) é uma função mensurável. A função χA(x) designa-se por funçãoindicatriz do conjunto A.

Função simples. Seja f : X → R ou C e suponha-se que f(x) assume um númerofinito de valores a1, . . . ,an, quando x percorre X . Nestas condições, existem conjuntosA1, . . . , An, definidos por

Ai = x ∈ X : f(x) = ai .

Então, pode-se representar a função f(x) por

f(x) =n∑i=1

aiχAi(x)

e f(x) designa-se por função simples. A função simples f(x) é mensurável se, e somentese, os conjuntos Ai pertencem à álgebra-σ de X.

Se f e g são funções mensuráveis e fnn≥0 é uma sucessão de funções mensuráveis queconverge para f , ponto a ponto, é fácil mostrar que:

a) |f | é mensurável.

b) supn fn(x), infn fn(x), limn fn(x), limn sup fn(x) = infn≥1(supk≥n fk) e

limn

inf fn(x) = supn≥1

infk≥n

fk(x)

são funções mensuráveis.

c) fg, f + g e 1/f , com f(x) = 0, são funções mensuráveis.

Estas propriedades decorrem dos axiomas que definem as álgebras-σ e das relações entreas operações da teoria dos conjuntos. Por exemplo, com

x : |f(x)| > a = x : f(x) > a ∪ x : f(x) < −a

x : sup fn(x) > a =∞∪n=1

x : fn(x) > a,

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8 CONJUNTOS E FUNÇÕES MENSURÁVEIS

-

-

+

-

-

Figura 1.1 Decomposição de uma função como uma diferença de funções positivas,f(x) = f+(x) − f−(x).

a mensurabilidade de |f(x)| e de x : sup fn(x) > a decorre dos axiomas das álgebras-σ.As restantes propriedades demonstram-se de maneira análoga (Exercício 1.3).

Seja f uma função real, f : X → R, e definam-se as funções f+(x) = max0,f(x)e f−(x) = − min0,f(x). Assim, tem-se que f(x) = f+(x) − f−(x), em que f+(x)e f−(x) são ambas funções positivas (figura 1.1). No que se segue e se refere a funçõesreais mensuráveis, sem perda de generalidade, pode-se restringir a análise às funções reaispositivas.

Estabeleça-se uma relação entre funções simples e funções mensuráveis. É sempre possíveldeterminar uma sucessão de funções simples fn que converge para f , limn→∞ fn(x) =f(x), para todo o x ∈ X . Suponha-se que f ≥ 0 não é uma função simples e escolham-seos conjuntos

En,i =x : i− 1

2n≤ f(x) < i

2n

, i = 1,2, . . . n2n

Fn = x : f(x) ≥ n,(1.1)

com n = 1,2, . . .. Seja a função

fn(x) =n2n∑i=1

i− 12n

χEn,i(x) + n χFn

(x) . (1.2)

Por construção, fn → f , ponto a ponto. Por outro lado, se f é mensurável, também asfunções fn o são e fn é uma sucessão de funções simples que converge para a funçãopositiva f(x). No caso em que a função f toma valores positivos e negativos, a decomposi-ção em funções simples é aplicada às funções positivas f+ e f−. Assim, dada uma funçãomensurável f , é sempre possível construir uma sucessão de funções simples, convergenteponto a ponto para uma função mensurável f .

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MEDIDA E INTEGRAÇÃO: O INTEGRAL DE LEBESGUE 9

- -

/|| =)

()

- -

/|| =)

()

Figura 1.2 Aproximações à função f(x) = 1/|x|, com x ∈ R, através das funções simples fn(x) definidasem (1.1) e (1.2). Em a), escolheu-se n = 1. Em b), escolheu-se n = 3.

Na figura 1.2 estão representadas aproximações com funções simples à função f(x) =1/|x|.

1.2 MEDIDA DE LEBESGUE

Seja o espaço mensurável (X,A) e seja uma função de conjuntos µ : A → R+0 em que

R+0 = R+

0 ∪ +∞ — µ é uma função não negativa. A função µ é aditiva-σ em relação àálgebra-σ A se se verificarem os axiomas seguintes:

a) µ(∅) = 0.

b) Se An ∈ A e Ai ∩Aj = ∅, para todo o i = j, então µ (∪nAn) =∑n µ(An).

Nestas condições, µ é uma medida sobre A e (X,A,µ) é um espaço de medida. A álgebra-σ Aé o domínio da medida µ.

Uma consequência imediata da definição de medida é que, seA ⊂ B, então µ(A) ≤ µ(B).Como B = A ∪ (B −A), tem-se que µ(B) = µ(A) + µ(B −A) ≥ µ(A).

Seja o espaço euclidiano Rk. Um k-intervalo ou k-cubo I é um conjunto de pontos de Rk

cujas coordenadas verificam

ai ≤ xi ≤ bi, com i = 1,2, . . . ,k .

Um k-cubo pertence à álgebra-σ de Borel de Rk, sendo, portanto, um conjunto mensurá-vel. Por definição, o k-volume de I ou volume a k dimensões é

ℓ(I) =k∏i=1

(bi − ai) .

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10 MEDIDA DE LEBESGUE

Uma família de conjuntos Ij é uma cobertura de A, se A ⊆ ∪jIj . Seja então A umsubconjunto de Rk e suponha-se que A ⊂ ∪jIj , em que os Ij são k-cubos de uma coberturade A, no máximo contável. A medida exterior de A é

µ∗(A) = infcoberturas

∑j

ℓ(Ij),

em que o ínfimo é tomado sobre todas as coberturas finitas ou numeráveis de A.

Designando por K um subconjunto fechado contido em A, então a medida interior de Aé

µ∗(A) = supK⊂A

µ∗(K),

onde o supremo é tomado sobre todos os conjuntos fechados contidos em A. Diz-se que oconjunto A é mensurável à Lebesgue se

µ∗(A) = µ∗(A) = µ(A)

e µ(A) designa-se por medida de Lebesgue de A. A medida de Lebesgue de um conjunto éinvariante para translações, µ(x+A) = µ(A). Desta propriedade resulta:

Teorema 1.1 ([Stein e Shakarchi, 2005])Na álgebra-σ de Borel de Rk existe uma medida única µ, tal que, para qualquer k-intervalo I ,

µ(I) =k∏i=1

(bi − ai) .

A função positiva µ é a medida de Lebesgue e todos os conjuntos de Borel são mensuráveis à Lebesgue.

Todos os Borelianos são mensuráveis à Lebesgue, mas nem todos os subconjuntos de Rk

são mensuráveis à Lebesgue. De igual modo, existem conjuntos mensuráveis que não sãoBorelianos.

Para a construção da medida de um conjunto qualquer recorre-se à noção de conjunto ele-mentar. Um conjunto deRk é elementar se pode ser descrito como a união finita de k-cubos,disjuntos dois a dois.

Um conjunto A ⊂ Rk é mensurável à Lebesgue se, para todo o ε > 0, existe um conjuntoelementar B tal que

µ∗(A∆B) := µ∗ ((A−B) ∪ (B −A)) < ε,

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MEDIDA E INTEGRAÇÃO: O INTEGRAL DE LEBESGUE 11

em que A∆B é a diferença simétrica entre A e B. Então, os conjuntos mensuráveis àLebesgue são os conjuntos que são bem aproximados por uniões de k-cubos.

Os espaços euclidianos (Rk,B, µ), em que B é a álgebra-σ de Borel e µ é a medida deLebesgue, são espaços de medida com as noções gerais de comprimento, área, volume, etc..

Outro exemplo de espaços de medida são os espaços de probabilidade.

Seja (X,A,µ) um espaço de medida sujeito à condição µ(X) = 1. Assim, (X,A, µ) é umespaço de probabilidade e µ é uma medida de probabilidade.3 Por exemplo,

([0,1],B, µL

um espaço de probabilidade, em que µL é a medida de Lebesgue e a álgebra-σ de Borel Bé gerada por todos os intervalos abertos, fechados ou semi-abertos de [0,1].

Seja o espaço de probabilidade([0,1],B, µL

)e [a,b] um intervalo contido em [0,1]. Uma

variável aleatória xt é uma função do tempo, discreto ou contínuo, que assume valores numcerto conjunto. A variável aleatória xt que assume valores no intervalo [0,1] é equidistribuída,se a probabilidade de ocorrência de xt ∈ [a,b] é igual à medida de Lebesgue do intervalo[a,b]: P (xt ∈ [a,b]) = (b− a) (veja-se também o teorema 5.6). Sendo p(x) a densidade deprobabilidade da variável aleatória xt, tem-se que

P (xt ∈ [a,b]) =∫ b

a

p(x)dx =∫ b

a

1dx = b− a

e a função p(x) = 1 está associada àmedida de Lebesgue. Muitas vezes associa-se a medidada Lebesgue, µL([a,b]) = (b− a), com a densidade de probabilidade p(x) = 1.

Com estas definições, pode-se construir um algoritmo para a determinação de áreas. SejaN o número de pontos equidistribuídos no interior de um retânguloQ, com lados de com-primento a e b. A área ou medida de Lebesgue de Q é

µL(Q) =∫ a

0

∫ b

0dxdy = ab .

Seja S um subconjunto de Q. Dada uma sequência de pontos aiNi=1 equidistribuídos noretângulo Q, no limite N → ∞, tem-se que

P (ai ∈ S) =∫ ∫

Sdxdy∫ a

0∫ b

0 dxdy.

3Probabilidade é a medida da possibilidade de ocorrência de um acontecimento.

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12 CONJUNTOS DE MEDIDA NULA

SejaNS o número de pontos da sucessão ai que estão no interior de S (figura 1.3). Então,

área de S = µL(Q)P (ai ∈ S) ≃ abNSN

.

S

Q

0 a

b

Figura 1.3 Método de Monte Carlo para a determinação de áreas e integrais em Rk. A razão entre onúmero de pontos no interior de S e o número total de pontos no retângulo Q é proporcional à razão entre as

áreas de S e de Q.

Esta técnica designa-se por método de Monte Carlo e é particularmente útil para a de-terminação numérica de integrais em Rk. Por exemplo, seja f : Rk → R+

0 uma fun-ção não negativa, o seu integral sobre um conjunto mensurável A ⊂ Rk pode ser de-terminado da seguinte maneira: seja a sequência de pontos a = a1,a2, . . . , aN comai = (ai,1, . . . ,ai,k,yi) ∈ Rk+1, em que (ai,1, . . . ,ai,N ) ∈ A, C1 ≤ yi ≤ C2, C1 = minA fe C2 = maxA f . Se a é uma sequência de pontos equidistribuída em A × [C1,C2], sejaN1 o número de elementos de a para os quais f(ai,1, . . . ,ai,N ) ≤ yi. Então, tem-se que∫Af ≈ µ(A)(C1 + (C2 − C1)N1/N).

1.3 CONJUNTOS DE MEDIDA NULA

Os conjuntos de medida nula têm um papel importante na construção do integral de Le-besgue (secção 1.4) e na teoria dos espaços de funções (Capítulo 2).

É possível encontrar conjuntos de medida de Lebesgue nula e com a potência do contínuo.Um exemplo deste tipo de conjuntos é o conjunto ternário de Cantor.

Para construir o conjunto ternário de Cantor, subdivide-se o intervalo [0,1] em três partesiguais e retira-se o conjunto aberto (1/3,2/3) (figura 1.4). A cada um dos intervalos [0, 13 ] e[ 2

3 ,1] retira-se um intervalo aberto de comprimento igual a um terço do comprimento do

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MEDIDA E INTEGRAÇÃO: O INTEGRAL DE LEBESGUE 13

0 1

1/3 2/3

1/9 2/9

C0

C1

C2

Figura 1.4 Construção iterativa do conjunto ternário de Cantor, C∞ =∩∞

n=0 Cn.

intervalo inicial. Repetindo este procedimento, obtém-se a sucessão de conjuntos

C0 = [0,1]

C1 =[0, 13]∪ [ 2

3 ,1]

C2 =[0, 19]∪ [ 2

9 ,13]∪ [ 2

3 ,79]∪ [ 8

9 ,1]

...

Designando cada subintervalo deCn por Inj , com j = 1, . . . ,2n, tem-se queCn =∪2n

j=1 Inj .O conjunto ternário de Cantor é o conjunto

C∞ =∞∩n=0

Cn .

A medida de Lebesgue de Cn é µ(Cn) = 2n

3n =( 2

3)n e a medida de Lebesgue de C∞ é

limn→∞

µ(Cn) = µ(C∞) = 0.

Por outro lado, C∞ não é vazio, pois, por exemplo, 0, 1/3 ∈ C∞. Assim, o conjuntoternário de Cantor C∞ tem medida de Lebesgue zero.

Mostre-se que o conjunto ternário de Cantor tem a potência do contínuo. Isto é, C∞ temtantos elementos como o intervalo [0,1], ou tantos elementos como o conjunto dos númerosreais. Por construção, o desenvolvimento ternário de x ∈ C∞ é

x =∞∑i=1

ai3i,

em que ai = 0 ou 2. Fazendo a correspondência biunívoca, (ai = 0) → (bi = 0) e(ai = 2) → (bi = 1), todo o número x ∈ C∞ é bijetivamente aplicado num número

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14 CONJUNTOS DE MEDIDA NULA

x′ ∈ [0,1] através de

x =∞∑i=1

ai3i

→ x′ =∞∑i=1

bi2i.

Como∑∞i=1

bi

2i , com bi = 0 ou 1, representa o desenvolvimento binário de um númerodo intervalo [0,1], x′ pode ser qualquer número no intervalo [0,1]. Assim, o conjunto deCantor C∞ tem a mesma potência que o intervalo [0,1] ou seja, C∞ tem a potência docontínuo.

Concluiu-se, assim, que existem conjuntos de medida de Lebesgue nula que têm tantoselementos como o intervalo [0,1]. No entanto, a medida de Lebesgue do intervalo [0,1] é 1e a medida de Lebesgue do conjunto ternário de Cantor é 0.

Um conjunto A é de medida nula, se existir um conjunto mensurável B tal que, A ⊂ B eµ(B) = 0. É intuitivo ver que certas propriedades se mantêm para conjuntos que diferempor conjuntos de medida nula. É o caso dos conjuntos [a,b] e (a,b), em que µ([a,b]) =µ((a,b)). Pois, como [a,b]∆(a,b) = a,b, tem-se que, µ([a,b]∆(a,b)) = 0.

Quando uma propriedade não é válida apenas sobre conjuntos de medida nula, diz-se quea propriedade é válida quase por toda a parte (q.t.p.). Assim, (q.t.p.) define uma relação deequivalência em medida.

Por exemplo, em relação à medida de Lebesgue, as funções f,g : [0,1] → [0,1] definidaspor

f(x) = x e g(x) =

x se x é irracional1 se x é racional

são iguais quase por toda a parte, isto é, f(x) = g(x) (q.t.p.), ou ainda, f e g diferem apenasnum conjunto de medida nula do domínio comum (Exercício 1.4).

No caso de funções definidas na reta real, podem-se relacionar funções mensuráveis comfunções contínuas:

Teorema 1.2 (Lusin, [Kolmogoroff e Fomin, 1977])Seja µ a medida de Lebesgue em R. Uma função f(x) : [a,b] → R é mensurável no intervalo [a,b] se, esomente se, para todo o ε > 0, existe uma função φ(x), contínua em [a,b], tal que

µ(x ∈ [a,b] : f(x) = φ(x)) < ε .

Assim, pelo Teorema de Lusin, uma função é mensurável num intervalo [a,b] se ela diferede uma função contínua sobre um conjunto de medida arbitrariamente pequena. Emparticular:

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MEDIDA E INTEGRAÇÃO: O INTEGRAL DE LEBESGUE 15

Corolário 1.3Todas as funções contínuas são mensuráveis.

1.4 O INTEGRAL DE LEBESGUE

Seja (X,A,µ) um espaço de medida e f : X → R uma função simples,

f(x) =n∑i=1

aiχAi(x) , ai ∈ R,

em que Ai ∈ A, i = 1, . . . n e µ é a medida de Lebesgue. Como os conjuntos Ai ∈ A, i =1, . . . n, são mensuráveis, o integral de Lebesgue de f(x) é∫

X

f(x)dµ(x) =n∑i=1

aiµ(Ai) .

Também se utilizam as notações∫X

f(x)µ(dx) ou∫X

f(x)µ(x)dx .

Como se viu, dada uma função mensurável f , é sempre possível construir uma sucessão defunções simples que convergem ponto a ponto para f . Assim, é possível estender a defi-nição de integral de Lebesgue para uma classe mais geral de funções. Uma consequênciaimediata da definição de integral é que se duas funções simples e mensuráveis diferem umada outra num conjunto de medida nula, então os seus integrais de Lebesgue são iguais.

Se f(x) : X → R é uma função não negativa e mensurável e fn(x) é uma sucessão defunções simples convergentes para f(x) (q.t.p.), o integral de Lebesgue de f em relação àmedida µ é ∫

X

fdµ = limn→∞

∫X

fn(x)dµ(x)

e pode-se mostrar que esta definição é independente da sucessão escolhida. Se este limiteé finito, a função mensurável f diz-se integrável em relação à medida µ.

No caso em que f(x) não é uma função positiva, pode-se aplicar a decomposição, f =f+ − f− e, devido à aditividade do integral, todos os resultados se mantêm válidos.

Um dos teoremas mais importantes da teoria da integração de Lebesgue é o teorema daconvergência dominada:

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16 O INTEGRAL DE LEBESGUE

Teorema 1.4 (convergência dominada de Lebesgue, [Kolmogoroff e Fomin, 1977])Seja fn uma sucessão de funções mensuráveis de X para R ou C e suponha-se que fn converge paraf (q.t.p.). Se existir uma função g, integrável em relação à medida de Lebesgue µ e tal que, para todo on ≥ 0, |fn| ≤ g, então

limn→∞

∫X

fndµ =∫X

fdµ < ∞ .

Por exemplo, seja f(x) = limn→∞ xn, com x ∈ [0,1]. Então, como |xn| ≤ 1 = g, peloteorema da convergência dominada, a função f é integrável à Lebesgue e

limn→∞

∫ 1

0xndx =

∫ 1

0f(x)dx = 0.

Nas condições do teorema da convergência dominada, pode-se sempre permutar o sinalde limite com o sinal de integral.

Na teoria da integração de Riemann, uma condição suficiente para que o integral de umafunção exista num intervalo limitado, a função integranda tem de ser contínua e limitadanesse intervalo. Por outro lado, o limite de uma sucessão de funções integráveis à Rie-mann não é necessariamente integrável. Ora, esta situação levanta problemas ao construiros espaços de funções da análise funcional. Na teoria de Lebesgue, as condições de inte-grabilidade são menos restritivas do que na teoria de Riemann (Exercício 1.6), podendo-sesempre passar ao limite, desde que se verifiquem as hipóteses do teorema da convergênciadominada de Lebesgue, ou seja, desde que |fn| < g, com g integrável. Pelo teorema daconvergência dominada de Lebesgue, fazendo g = |f |, a integrabilidade de |f | implica aintegrabilidade de f .4 Assim, pode-se caraterizar o conjunto das funções integráveis noespaço de medida X como o conjunto das funções para as quais∫

X

|f |dµ < ∞ . (1.3)

Em tudo o que se segue, os integrais deverão ser entendidos no sentido de Lebesgue e todosos espaços são mensuráveis, estando definida implicitamente uma álgebra-σ canónica. Nosespaços euclidianos considera-se sempre a álgebra-σ dos Borelianos.

Quando se estende a teoria de Lebesgue para funções a duas variáveis, tem-se:

4A função sinx/x não é integrável à Lebesgue em R+0 , no entanto, o seu integral impróprio de Riemann existe.

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MEDIDA E INTEGRAÇÃO: O INTEGRAL DE LEBESGUE 17

Teorema 1.5 (Fubini, [Kolmogoroff e Fomin, 1977])Seja f(x,y) : X × Y → R uma função mensurável e suponha-se que∫

f(x,y)dµ(x) e∫f(x,y)dν(y)

são ambas funções integráveis, isto é, os integrais∫dν(y)

∫|f(x,y)|dµ(x) e

∫dµ(x)

∫|f(x,y)|dν(y)

são finitos. Então, ∫ ∫f(x,y)dµ(x)dν(y) =

∫ (∫f(x,y)dµ(x)

)dν(y)

=∫ (∫

f(x,y)dν(y))dµ(x) .

1.5 A DIMENSÃO DE HAUSDORFF

A medida exterior de Hausdorff generaliza o conceito de medida de Lebesgue e é utilizadapara comparar conjuntos de medida de Lebesgue nula. A necessidade deste novo conceitoresulta do facto de a construção de uma medida depender da dimensão dos conjuntos. Porexemplo, o intervalo [0,1] como subconjunto de R tem medida de Lebesgue 1. Quandoconsiderado como subconjunto de Rk, com k ≥ 2, a sua medida de Lebesgue é 0.

SejaA um subconjunto de Rk e defina-se o diâmetro deA como |A| := sup|x−y| : x,y ∈A. Seja Ij uma família finita de subconjuntos de Rk, em que A ⊂ ∪jIj . Se |Ij | < ε,para todo o j, então Ij é uma ε-cobertura finita de A. A medida exterior de Hausdorff de Aé definida como

H∗d (A) = lim

ε→0inf

coberturas

∑j

|Ij |d,

em que o ínfimo é tomado sobre todas as ε-coberturas finitas de A. Esta definição só fazsentido quandoH∗

d (A) é finito, isto é, quando existe uma constante d tal que 0 < H∗d (A) <

∞. Como se verá, a constante d tem o significado de uma dimensão.

Por exemplo, se I é um intervalo de comprimento ℓ, e os conjuntos Ij forem escolhidoscomo intervalos, |Ij | = µ(Ij), tem-se que

H∗d (I) = lim

ε→0inf

coberturas

∑j

µ(Ij)d.

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18 A DIMENSÃO DE HAUSDORFF

Se os elementos Ij da cobertura Ij são tomados com comprimento ε = ℓ/N , tem-se que

H∗d (I) = lim

N→∞

N∑j=1

(ℓ

N

)d= limN→∞

N

(ℓ

N

)d= limN→∞

ℓdN1−d

e, portanto,

H∗d (I) =

+∞ se d < 1ℓ se d = 10 se d > 1.

Como se conclui deste exemplo, o expoente d tem o significado de uma dimensão — di-mensão de Hausdorff ou dimensão fractal.

Nos casos em que d é um inteiro, H∗d (A) = µ∗(A), em que µ∗ é a medida exterior de

Lebesgue em dimensão (inteira) d = n.

Quando é possível encontrar uma partição regular de um conjunto em subconjuntos demedida de Lebesgue igual, pode-se facilmente determinar a dimensão de Hausdorff doconjunto. Assim, para A ⊂ Rk, cada elemento Ij da cobertura em k-cubos, de lado ε, temdiâmetro |Ij | =

√kε, e

H∗d (A) ∼

N grandeN(

√kε)d,

em que N é o número de elementos da cobertura de A. Então,

d = limε→0

lnH∗d (A)

ln(√kε)

− limε→0

lnNln(

√kε)

= limε→0

lnNln 1√

.

Claro está que, por hipótese, lnH∗d (A) é finito e N ≡ N(ε). O número d, assim determi-

nado, também se designa por capacidade ou dimensão fractal do conjunto A.

Calcule-se a dimensão e a medida de Hausdorff do conjunto ternário de Cantor. Assuma--se que H∗

d (C∞) é uma constante positiva e cubram-se os conjuntos Cn com 2n intervalosde comprimento 1/3n. Então,

H∗d (C∞) = lim

n→∞2n(

13n

)d= limn→∞

(23d

)n= constante .

Para que este limite seja positivo, 2/3d = 1, e, portanto,

d = ln 2/ ln 3 = 0,6309 . . . .

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MEDIDA E INTEGRAÇÃO: O INTEGRAL DE LEBESGUE 19

Assim, em dimensão d = 0,6309 . . ., a medida exterior de Hausdorff do conjunto ternáriode Cantor é H∗

d (C∞) = (2/3d)n = 1n = 1. Por exemplo, a medida de Hausdorff deA = C∞ ∩ [0,1/2] é zero em dimensão 1 mas, em dimensão ln 2/ ln 3, é

Hln 2/ ln 3(A) = limn→∞

2n−1(

13n

)ln 2/ ln 3

= 12.

-

-

-

=

-

-

-

=

Figura 1.5 Gráficos da função de Weierstrass-Mandelbrot (1.4), paraD = 1,5 eD = 1,8, com γ = 1,5. AconstanteD é a dimensão de Hausdorff do gráfico de f .

Os gráficos de funções também podem ter dimensões não inteiras. É o caso da funçãocontínua e não diferenciável de Weierstrass-Mandelbrot

f(x) =+∞∑

n=−∞

(−1)n sin γnxγ(2−D)n , (1.4)

em que γ > 1 e 1 < D < 2. Na figura 1.5, estão representados os gráficos de f(x) paraD = 1,2 e D = 1,5, com γ = 1,5. A constante D é a dimensão de Hausdorff do gráfico def .

EXERCÍCIOS

1.1 Seja o conjunto finito X = a,b,c e sejam T1 = X,∅, a,b,b, c e T2 =X,∅, a,b, b,c,b duas famílias de subconjuntos de X. Qual das estruturas(X,T1) ou (X,T2) é um espaço topológico?

1.2 Mostre que a definição usual de função contínua é equivalente à seguinte definição:sejamX e Y espaços topológicos e, para simplificar, faça-seX = Y = R. Uma funçãof : X → Y é contínua, se f−1(V ) é um aberto de X, sempre que V é um aberto deY .

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20 A DIMENSÃO DE HAUSDORFF

1.3 Sejam f,g : X → R funções mensuráveis. Mostre que f +g, f2, fg e 1/f são funçõesmensuráveis. Neste último caso, suponha que f(x) = 0, para todo o x ∈ X .

1.4 Mostre que a medida de Lebesgue de qualquer conjunto finito ou numerável da retaé zero. Em particular, determine a medida de Lebesgue dos conjuntos dos númerosracionais e irracionais do intervalo [0,1].

1.5 Faça uma estimativa de π usando apenas papel e lápis. Comece por esboçar à mãoum quadrado com uma circunferência inscrita. Coloque vários pontos no interior doquadrado, distribuídos uniformemente. Faça a contagem e calcule uma aproximaçãoa π.

1.6 Considere a função simples (função de Dirichlet) f(x) : [0,1] → R, em que,

f(x) =

0 se x é racional1 se x é irracional

Calcule o integral∫ 1

0 f(x)dx, no sentido de Lebesgue. Use resultados do Exercício1.4). Mostre ainda que a função f(x) não é contínua em nenhum ponto.

1.7 Determine a dimensão de Hausdorff do conjunto do plano obtido através das ope-rações indicadas na figura (curva de Koch). Em cada iteração, os comprimentos dossegmentos de reta que constituem a curva são os mesmos.

0 1 0 1

1/3

0 1

1/3

...

1.8 Quais as dimensões de Hausdorff dos conjuntos dos números reais do intervalo [0,1]que não contêm dígitos pares nas bases decimal, ternária e quaternária?

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2ESPAÇOS DE FUNÇÕES E ESPAÇOS DE HILBERT

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ESPAÇOS DE FUNÇÕES E ESPAÇOS DE HILBERT 23

Relembram-se as definições de corpo e de espaço vetorial, e faz-se a construção dos espaços de Banach,Lebesgue, Hilbert e Sobolev. Introduz-se o primeiro exemplo de operador e chega-se à necessidade doconceito de base de um espaço vetorial de dimensão infinita.

2.1 ESPAÇOS PRÉ-HILBERTIANOS

Na mecânica quântica e na teoria dos campos, os observáveis físicos estão associados aoperadores que atuam sobre funções que caraterizam o estado dos sistemas. Destas açõesresultam os valores numéricos do estado de um sistema. A análise funcional dá-nos asferramentas necessárias para abordar este tipo de problemas.

A análise funcional é um formalismo muito semelhante ao da álgebra linear em que osespaços aritméticos reais ou complexos são substituídos por espaços de funções. Embora osespaços da álgebra linear sejam de dimensão finita e os espaços da análise funcional sejamde dimensão infinita, muitos dos resultados da álgebra linear podem ser transportados paraa análise funcional com as modificações inerentes à mudança de dimensão. Assim, muitada intuição gerada pela estrutura da álgebra linear pode ser transportada para o estudodos espaços de funções.

Relembre-se o conceito de espaço vetorial sobre um corpo K. Em tudo o que se segue, esem especificação em contrário, considera-se que K = C.

Um conjunto K, juntamente com as duas operações associativas “+” e “.”, é um corpo sese verificarem as condições:

i) Se x, y ∈ K, então x+ y = y + x ∈ K e x.y = y.x ∈ K.

ii) 0 e 1 ∈ K.

iii) Se x = 0, então −x ∈ K e 1/x ∈ K.

iv) Para todo x, y, z ∈ K, x.(y + z) = x.y + x.z.

Por outras palavras, um corpo é um conjunto fechado relativamente às quatro operações(+,.,−, /).

Um conjuntoH tem uma estrutura de espaço vetorial sobre um corpoK se se verificarem ascondições:

i) H é um grupo abeliano (comutativo) em relação à operação “+”:11Um conjunto G, com uma operação binária é um grupo se: 1) Para todo o a,b ∈ G, a b ∈ G (fecho). 2) Para

todo o a,b,c ∈ G, a (b c) = (a b) c (associatividade). 3) Existe um elemento e ∈ G tal que, para todo o a ∈ G,e a = a e = a (identdade). 4) Para todo o a ∈ G, existe um elemento b ∈ G tal que, a b = b a = e (inverso).

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24 ESPAÇOS PRÉ-HILBERTIANOS

i1) Se f,g ∈ H , então, f + g = g + f ∈ H .

i2) Existe em H o elemento 0, tal que f + 0 = 0 + f = f , para todo o f ∈ H .

i3) Para todo o f ∈ H , existe −f ∈ H , tal que f − f = 0.

ii) Multiplicação por elementos do corpo K. Se c1,c2 ∈ K então,

ii1) Para todo o f ∈ H , c1.f ∈ H .

ii2) Distributividade:(c1 + c2).f = c1.f + c2.f

c1.(f + g) = c1.f + c1.g

ii3) Associatividade: (c1.c2).f = c1.(c2.f).

ii4) 1.f = f .

No que se segue, a operação de multiplicação deixará de ser indicada pelo símbolo “.”.

São exemplos de espaços vetoriais de dimensão finita o conjunto dos n-tuplos de númerosreais Rn e o conjunto dos n-tuplos de números complexos Cn. No primeiro caso, o corpoé K = R. No segundo caso, K = C.

Seja H um espaço vetorial de dimensão finita n, diz-se que os elementos ei ∈ H , comi = 1, . . . ,n, formam uma base de H , se todo o elemento u ∈ H se escreve de uma formaúnica como

u =n∑i=1

λiei, em que λi ∈ K .

Seja o conjunto de todas as funções analíticas, definidas no intervalo [−1,1] e com valoresemR ouC. Designe-se este conjunto porCω([−1,1]). Considere-se que [−1,1] é um espaçotopológico e um espaço de medida, com a topologia canónica e a medida de Lebesgue.Definindo a operação de adição em Cω([−1,1]) e a multiplicação por escalares, verifica-sefacilmente que Cω([−1,1]) é um espaço vetorial sobre R ou C (Exercício 2.1). Fazendo aanalogia com a álgebra linear, o problema que se levanta agora é o de saber qual a dimensãode Cω([−1,1]). Seja a função ex ∈ Cω([−1,1]). Como se sabe,

ex =∞∑n=0

1n!xn .

Como, para todo o x ∈ [−1,1], não é possível escrever a função xp como uma combinaçãolinear de potências de x diferentes de p, os polinómios xp são linearmente independentes.Nestas condições, pode-se dizer informalmente que Cω([−1,1]) não tem dimensão finita,

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ESPAÇOS DE FUNÇÕES E ESPAÇOS DE HILBERT 25

mas sim, dimensão infinita numerável. Isto é, o conjunto infinito numerável de funçõesxnn≥0 é um candidato a uma base do espaço vetorial Cω([−1,1]).2 No entanto, esteconceito informal de “base funcional” necessita de uma definição mais precisa (Capítulo3).

Veja-se como definir a operação de produto interno num espaço vetorialH sobre um corpoK.

Um produto interno ou produto escalar é uma função < ·,· > : H ×H → K, que verifica:

a) Para todo o f, g ∈ H , < f,g >=< g,f >∗ (simetria ou hermiticidade).

b) < f,f > ≥ 0, e se < f,f >= 0, então f = 0 (positividade).

c) Se f, g, h ∈ H e a1,a2 ∈ K, então < a1f + a2g,h >= a∗1 < f,h > +a∗

2 < g,h >

(K-linearidade).

Um espaço vetorial H sobre um corpo K com um produto interno é um espaço pré-hilber-tiano, eventualmente de dimensão infinita.

Das propriedades do produto interno decorre que

< f, a1g + a2h >= a1 < f,g > +a2 < f,h >,

em que a, a1, a2 ∈ K e f, g ∈ H .

As funções

< x,y > :=n∑i=1

xnyn

< z,w > :=n∑i=1

z∗nwn

são exemplos de produtos internos em Rn e Cn, respetivamente. Assim, Rn e Cn sãoespaços pré-hilbertianos.

Exemplo de espaço pré-hilbertiano de dimensão infinita. Designa-se por ℓ2 oconjunto de todas as sucessões de elementos de C que obedecem a

∞∑i=1

|ci|2 < ∞,

2Não se vai poder dizer que o conjunto de funções xnn≥0 formam uma base de Cω([−1,1]). O que se verámais à frente é que Cω([−1,1]) é um subconjunto de um espaço que tem como base numerável o conjunto de funçõesxnn≥0.

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26 ESPAÇOS PRÉ-HILBERTIANOS

em que cn ∈ C, por todo o n ≥ 1. Os elementos de ℓ2 escrevem-se como listas infinitas denúmeros, c = (c1,c2, . . .).

Definindo as operações sobre sucessões da seguinte forma

(c1,c2, . . .) + (d1,d2, . . .) := (c1 + d1,c2 + d2, . . .)λ(c1,c2, . . .) := (λc1,λc2, . . .),

em que λ ∈ C, o espaço ℓ2 é um espaço vetorial sobre C. De facto, todas as propriedadesdos espaços vetoriais são facilmente verificadas, bastando mostrar que as propriedades i1)e ii2) são verdadeiras. Se f,g ∈ ℓ2 e λ1, λ2 ∈ C, veja-se que (λ1f + λ2g) ∈ ℓ2. Ora,∑

|λ1fi + λ2gi|2 ≤ 2λ21

∑|fi|2 + 2λ2

2

∑|gi|2 < ∞,

em que se usou a desigualdade (a+ b)2 ≤ (a+ b)2 + (a− b)2 = 2a2 + 2b2.

Definindo em ℓ2 o produto interno

< c,d >=∞∑i=1

c∗i di,

ℓ2 é um espaço pré-hilbertiano de dimensão infinita. Mais à frente, ver-se-á que ℓ2 é umespaço de Hilbert.

Através de um produto interno pode-se definir uma norma. A norma de uma função f ∈ H

é uma função não negativa, || · || : H → R0+, definida por

||f || : =√< f,f >.

As relações entre produto interno e norma são dadas pelo seguinte teorema:

Teorema 2.1Seja H um espaço vetorial sobre um corpo K com um produto interno, < ·,· > : H ×H → K. Então,têm-se as desigualdades:

a) | < f,g > | ≤ ||f ||.||g|| Desigualdade de Cauchy-Schwarz.

b) ||f + g|| ≤ ||f || + ||g|| Desigualdade triangular ou de Minkovski.

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ESPAÇOS DE FUNÇÕES E ESPAÇOS DE HILBERT 27

DEMONSTRAÇÃO.

Desigualdade de Cauchy-Schwarz. Se f = 0, a desigualdade é trivialmente verificada. Sejaentão λ = <f,g>

<f,f> , com, f = 0. Ora,

0 ≤ < g − λf,g − λf >=< g,g − λf > −λ∗ < f,g − λf >

=< g,g > −λ < g,f > −λ∗ < f,g > +λ∗λ < f,f >

= ||g||2 − | < f,g > |2

< f,f >− | < f,g > |2

< f,f >+ | < f,g > |2

< f,f >

e, portanto, | < f,g > |2 ≤ ||g||2.||f ||2.

Desigualdade triangular ou de Minkovski. Como

Real < f,g >≤ | < f,g > |,

pela desigualdade de Cauchy-Schwarz, Real < f,g >≤ ||f ||.||g||. Nestas condições, tem--se que

||f + g||2 =< f + g,f + g >

=< f,f > + < f,g > + < g,f > + < g,g >

= ||f ||2 + ||g||2 + 2Real < f,g >

≤ ||f ||2 + ||g||2 + 2||f ||.||g|| = (||f || + ||g||)2

e, portanto, ||f + g|| ≤ ||f || + ||g||.

Em espaços vetoriais sobre o corpo dos números reais e de dimensão finita, tem-se que

< f,g >= ||f ||.||g|| cos θ, (2.1)

em que θ é o ângulo entre os dois vetores f e g. Como | cos θ| ≤ 1, tem-se que, | < f,g >

| ≤ ||f ||.||g||. Assim, a desigualdade de Cauchy-Schwarz afirma que, em espaços vetoriaisde dimensão infinita, ainda faz sentido definir o ângulo entre dois vetores através de (2.1).Nestas condições, pode-se dizer que dois vetores f e g de um espaço pré-hilbertiano sãoortogonais se < f,g >= 0.

2.2 ESPAÇOS DE HILBERT

Introduziu-se uma norma através da noção de espaço vetorial e da definição de produtointerno. Pode-se agora partir de uma estrutura de espaço vetorial normado, definindo umanorma e ver em que condições é que é possível definir um produto interno.

Suponha-se que H é um espaço vetorial sobre um corpo K e seja uma função || · || : H →R+

0 , que verifica as propriedades:

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28 ESPAÇOS DE HILBERT

a) ||λf || = |λ|.||f ||.

b) ||f + g|| ≤ ||f || + ||g||.

c) Se ||f || = 0, então f = 0.

Nestas condições, H é um espaço vetorial normado, ou simplesmente espaço normado.

Num espaço vetorial normado H , define-se distância como

d(f,g) := ||f − g|| .

Claro que a norma definida à custa do produto interno obedece às condições a), b) e c). Estáassim estabelecida a relação entre espaços normados e espaços com produto interno. Todoo espaço vetorial sobre um corpo K com produto interno é um espaço vetorial normado.

SejaH um espaço vetorial normado ou um espaços pré-hilbertiano. Uma sucessão fnn∈N

de elementos de H converge na norma para f ∈ H se

||fn − f || → 0 quando n → ∞ .

Uma sucessão fn é de Cauchy no sentido da norma se, para todo o ε > 0, existe uminteiro Nε tal que, para todo o n,m > Nε,

||fn − fm|| < ε .

Um espaço vetorial H com uma norma ou com um produto interno é completo, se toda asucessão de Cauchy é convergente no sentido da norma. São exemplos de espaços vetoriaiscompletos os conjuntos Rn e Cn. Por exemplo, o espaço vetorial Q sobre o corpo Q não écompleto.

Um espaço de Hilbert é um espaço vetorial sobre um corpo K com produto interno e com-pleto. Um espaço de Banach é um espaço vetorial normado e completo. Muitas vezes omite-sea referência a K, assumindo-se que K = R, ou K = C.

Veja-se que o espaço de dimensão infinita ℓ2 é completo. Seja c(n)n uma sucessão deCauchy em ℓ2. Então, para todo o ε > 0, existem inteiros n e m, com n,m > Nε, e taisque, ||c(n) − c(m)|| < ε. Ou seja,

||c(n) − c(m)||2 =∞∑i=1

|c(n)i − c

(m)i |2 < ε2 .

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ESPAÇOS DE FUNÇÕES E ESPAÇOS DE HILBERT 29

Assim, |c(n)i −c(m)

i | < ε para todo n,m > Nε. Daqui conclui-se que para cada i, a sucessãoc(n)i n é de Cauchy emC e, portanto, é uma sucessão convergente. Seja ci = limn→∞ c

(n)i

e c = (c1,c2, . . .). Quer-se agora mostrar que c(n) → c e que c ∈ ℓ2. Da desigualdadeanterior decorre que

k∑i=1

|c(n)i − c

(m)i |2 < ε2,

para todo o inteiro positivo k e n,m > Nε. No limite m → ∞, c(m)i → ci, e como ε não

depende de k,∞∑i=1

|c(n)i − ci|2 ≤ ε2,

com n > Nε. Desta última condição, decorre que (c(n) − c) ∈ ℓ2. Como, c = c(n) −(c(n) − c), pela desigualdade de Minkovski, ||c|| ≤ ||c(n)|| + ||c(n) − c|| ≤ ||c(n)|| + ε < ∞e, portanto, c ∈ ℓ2 e c(n) converge para c. Conclui-se assim que ℓ2 é completo, sendo,portanto, um espaço de Hilbert e um espaço de Banach (teorema de Riesz-Fischer).

No que se segue, vão-se considerar apenas espaços de Hilbert ou de Banach separáveis: umespaço de Hilbert ou de Banach é separável se contém um subconjunto numerável e denso.Neste contexto, a densidade de um subconjunto de H define-se da seguinte maneira: sejaum espaço de Hilbert H e S um subconjunto de H . O subconjunto S é denso em H se,para todo o f ∈ H e δ > 0, existe um g ∈ S, tal que

||f − g|| < δ.

Quando nos referimos a espaços de Hilbert, estamos a considerar implicitamente espaçosde Hilbert separáveis.

Quando uma norma pode ser definida através de um produto interno, podem-se estabele-cer algumas propriedades desta relação.

Sejam f e g elementos de um espaço de Hilbert H . Então, tem-se que

||f + g||2 + ||f − g||2 =< f + g,f + g > + < f − g,f − g >

=< f,f > + < f,g > + < g,f > + < g,g >

+ < f,f > − < f,g > − < g,f > + < g,g >

= 2||f ||2 + 2||g||2.

(2.2)

A relação (2.2) designa-se por igualdade do paralelogramo, figura 2.1. Assim, um espaço deHilbert de dimensão infinita herda naturalmente algumas das caraterísticas geométricasdos espaços euclidianos de dimensão finita.

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30 ESPAÇOS DE HILBERT

||g||

||f||

||f+g||

||f-g||

Figura 2.1 Significado geométrico da igualdade do paralelogramo (2.2).

Num espaço de Hilbert, pode-se determinar o produto interno em função da norma —igualdade da polarização. Sejam f e g elementos de um espaço de Hilbert. Calculando, ||f +g||2 − ||f − g||2, tem-se que

||f + g||2 − ||f − g||2 = 2 < f,g > +2 < g,f >= 4 Real < f,g >

e, portanto,

Real < f,g >= 14(||f + g||2 − ||f − g||2

).

Com||f + ig||2 − ||f − ig||2 = 2 < f,ig > +2 < ig,f >

= 2i(< f,g > − < f,g >∗)= −4 Im < f,g >,

vem que

Im < f,g >= −14(||f + ig||2 − ||f − ig||2

).

Combinando as duas igualdades anteriores, obtém-se a igualdade da polarização

< f,g >= 14

||f + g||2 − 14

||f − g||2 − i

4||f + ig||2 + i

4||f − ig||2 .

A igualdade da polarização permite determinar o produto interno através da norma.

Da definição de norma a partir da definição de produto interno e da desigualdade deMinkovski, decorre que todo o espaço de Hilbert é um espaço de Banach. No entanto,nem todo o espaço de Banach é um espaço de Hilbert. Veja-se um exemplo de um espaçode Banach que não é um espaço de Hilbert. Seja ℓp, com p ≥ 1, o conjunto de todas assucessões (c1,c2, . . .) tais que

∞∑i=1

|ci|p < ∞ .

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ESPAÇOS DE FUNÇÕES E ESPAÇOS DE HILBERT 31

Em ℓp, seja a norma

||c|| =

( ∞∑i=1

|ci|p)1/p

. (2.3)

O espaço ℓp assim construído é um espaço de Banach para 1 ≤ p < ∞. Sejam os elementosde ℓp, x = (1,1,0,0, . . .) e y = (1,− 1,0, . . .). Por (2.3), vem que

||x+ y|| = ||x− y|| = 2 ; ||x|| = ||y|| = 21/p

||x+ y||2 + ||x− y||2 = 82||x||2 + 2||y||2 = 4.22/p

e, 8 = 4.22/p para p = 2, ou seja, a igualdade do paralelogramo só é verificada para p = 2.Então, ℓp, com p = 2, não é um espaço de Hilbert embora seja um espaço de Banach. Poristo, para p = 2, a norma (2.3) não está associada a um produto interno.

2.3 ESPAÇOS DE LEBESGUE

Os espaços de Lebesgue são exemplos de espaços de Banach. Seja (X,A,µ) um espaço demedida e considere-se o conjunto das funções µ-mensuráveis em X e que obedecem àcondição ∫

X

|f |pdµ < ∞,

em que p é um número real e 1 ≤ p < ∞ (veja-se (1.3)). Assume-se sem especificar que asfunções tomam valores no corpo K. Este espaço é designado por Lpµ(X) e tem a norma

||f ||p =(∫

X

|f |pdµ)1/p

. (2.4)

Sejam f1 e f2 funções de Lpµ(X). Diz-se que f1 e f2 são equivalentes (q.t.p.), isto é, f1 ∼ f2,se,

||f1 − f2||p =(∫

X

|f1 − f2|pdµ)1/p

= 0 .

O espaço de Lebesgue Lpµ(X) é o espaço que resulta de Lpµ(X) por introdução da relaçãode equivalência ” ∼ ”, isto é, Lpµ(X) = Lpµ(X)/ ∼.3 Assim, os elementos dos espaços de

3Seja X um conjunto e ∼ uma relação de equivalência em X. A classe de equivalência de um elemento a ∈ X

é o conjunto x ∈ X : x ∼ a. Ora esta classe de equivalência induz uma partição de X. Esta partição designa-sepor X/ ∼ — conjunto quociente. Por exemplo, R/Z é formado por conjuntos da forma x ∈ R : x− y ∈ Z. Destemodo, cada elemento da partição de R por Z pode ser representado por x ∈ [0,1), ou seja, R/Z = [0,1).

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32 ESPAÇOS DE LEBESGUE

Lebesgue são classes de equivalência de funções que diferem por conjuntos de µ-medidanula. Em geral, representa-se cada classe de equivalência por um elemento da classe.

Se p = ∞, a norma (2.4) deixa de fazer sentido. No entanto, definindo a norma do supremoessencial como

||f ||∞ = ess supx∈X |f(x)|:= inf α : |f(x)| ≤ α (q.t.p.) em X,

o espaço L∞(X) é um espaço de Lebesgue com a norma ||f ||∞. No entanto, L∞(X) nãoé separável. Nesta norma, |f(x)| ≤ ||f ||∞ (q.t.p.).

Teorema 2.2 (Riesz-Fischer generalizado, [Adams e Fournier, 2003])Seja Ω ⊂ Rn um espaço de medida, o espaço Lpµ(Ω), com 1 ≤ p < ∞, é completo e separável, donde umespaço de Banach separável. O espaço L2

µ(Ω) é um espaço de Hilbert. Se 1 ≤ p ≤ q < ∞ e µ(Ω) = 1,então Lqµ(Ω) é um subespaço vetorial de Lpµ(Ω).

A relação entre os vários espaços Lp(Ω) depende das propriedades da medida do conjuntoΩ. Por exemplo, se Ω = [1,∞), tem-se simultaneamente Lp(Ω) ⊂ Lq(Ω) e Lq(Ω) ⊂Lp(Ω), para todo 1 ≤ p < q < ∞. É fácil mostrar que, para a medida de Lebesgue,1/x ∈ L2([1,∞)) e 1/x ∈ L1([1,∞)). No entanto, se µ(Ω) = 1, Lq(Ω) ⊂ Lp(Ω), paratodo 1 ≤ p < q < ∞. Neste caso, tem-se que

||f ||1 ≤ ||f ||p ≤ ||f ||q ≤ ||f ||∞ .

Por exemplo, seja f ∈ L2(I), em que I é um intervalo. Então, ||f ||2 < ∞. Calcule-se||f ||1. Seja χI a função indicatriz do intervalo I , assim,

||f ||1 =∫I

|f |dx =∫I

χI |f |dx =< χI ,|f | >≤ ||χI ||2||f ||2 < ∞.

Por isto, f ∈ L1(I), ou seja, L2(I) ⊂ L1(I).

No que se segue, Ω ⊂ Rn é simultanemante um espaço de medida e um espaço topológico.

O espaço das funções de quadrado somável em relação à densidade de medida ρ(x) —L2ρ(Ω) — é o espaço das funções para as quais∫

Ω|f(x)|2ρ(x)dx =

∫Ωf∗(x)f(x)ρ(x)dx < ∞ .

O conjunto L2ρ(Ω) com o produto interno

< f,g >=∫

Ωf∗(x)g(x)ρ(x)dx =

∫Ωf∗(x)g(x)dµ(x)

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ESPAÇOS DE FUNÇÕES E ESPAÇOS DE HILBERT 33

é um espaço de Hilbert e de Banach. Por exemplo, a função f(x) = e−x2 é de quadradosomável em relação à medida de Lebesgue dx— f(x) ∈ L2

1(R) = L2(R), pois,∫ +∞

−∞|e−x2

|2dx =∫ +∞

−∞e−2x2

dx =√π/2 < ∞ .

O espaço de Hilbert L2 é designado por espaço das funções de quadrado somável. Oespaço de Lebesgue Lp, com p ≥ 1, é um espaço de Banach.

A caraterização funcional dos elementos de um espaço de Banach pode ser feita atravésde funções contínuas. Seja Cr(Ω) o conjunto das funções com r derivadas contínuas emΩ. O conjunto das funções contínuas em Ω designa-se por C0(Ω). Como a continuidade éfechada para a multiplicação por números reais ou complexos e para a adição de funçõescontínuas, C0(Ω) é um espaço vetorial. Uma função f ∈ Cr(Ω) tem suporte compacto seo fecho do conjunto x : f(x) = 0 é compacto. O espaço Crloc(Ω) é o espaço das funçõesde suporte compacto contidas em Cr(Ω) e C∞(Ω) = ∩∞

r=0Cr(Ω).

Teorema 2.3 ([Adams e Fournier, 2003])Crloc(Ω) com r ≥ 0 e C∞

loc(Ω) são densos em Lpµ(Ω), com 1 ≤ p < ∞.

Na teoria das equações às derivadas parciais e na análise numérica surgem os espaços deSobolevW k,p(Ω) definidos à custa das normas

||f ||k,p =

(k∑i=0

∫Ω

|f (i)|pdµ

)1/p

,

em que f (i) é a derivada de ordem i de f . Em geral, os conjuntosW k,p(Ω) são espaços deBanach. No caso particular em que p = 2, os espaços de Sobolev W k,2(Ω) = Hk(Ω) sãoespaços de Hilbert. Se f,g ∈ Hk(Ω), então o produto interno é definido como

< f,g >Hk =k∑i=0

< f (i),g(i) >L2 .

No caso particular em que f,g ∈ H1(Ω), tem-se

< f,g >H1=< f,g >L2 + < grad f,grad g >L2 .

Por exemplo, a função f(x,y) = sin x+cos y pertence ao espaço de SobolevW 1,2([0,2π]2) =

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34 OPERADORES

H1([0,2π]2). Como∫ ∫[0,2π]2

|f(x,y)|2 dxdy ≤∫ ∫

[0,2π]2|1 + 1|2dxdy = 16π2 < ∞∫ ∫

[0,2π]2

∣∣∣∣∂f(x,y)∂x

∣∣∣∣2 dxdy ≤∫ ∫

[0,2π]2|1|2dxdy = 4π2 < ∞∫ ∫

[0,2π]2

∣∣∣∣∂f(x,y)∂y

∣∣∣∣2 dxdy ≤∫ ∫

[0,2π]2|1|2dxdy = 4π2 < ∞,

tem-se que f,∂f∂x ,∂f∂y ∈ L2([0,2π]2), pelo que f ∈ W 1,2([0,2π]2) = H1([0,2π]2). De igual

modo, pode-se mostrar que g(x) =√x ∈ L2([0,1]), mas g ∈ H1([0,1]).

2.4 OPERADORES

No que se segue, vai-se estudar a técnica de representação dos elementos de um espaço deHilbert. Isto é, em que condições se pode construir uma base para estes espaços de funções.Como preparação, introduzem-se os conceitos de operador e de base de um espaço vetorialde dimensão infinita.

Um espaço vetorial tem dimensão infinita se existir um conjunto de elementos fi∞i=1,

todos linearmente independentes. Isto é, todos as combinações lineares finitas de vetoresfi com coeficientes não nulos são diferentes de zero. Como se viu, as funções do conjunto1,x, . . . ,xn, . . . são linearmente independentes.

Considere-se o espaço das funções de quadrado somável do intervalo [0,1] e com valorescomplexos — funções do espaço de Hilbert L2([0,1]). Seja T : H → H (H ⊂ L2([0,1])) ooperador definido através de

Tϕ = 1i

d

dxϕ,

com domínio

Dom(T ) = ϕ ∈ C1([0,1]) ∩ L2([0,1]) : ϕ(0) = ϕ(1) .

Claramente, o operador T assim definido é linear — T (c1ϕ1 + c2ϕ2) = c1Tϕ1 + c2Tϕ2,em que c1 e c2 são constantes.

Por analogia com a álgebra linear, pode-se escrever a equação aos valores próprios Tϕ =αϕ, isto é,

1i

d

dxϕ = αϕ,

que tem soluçãoϕ(x) = Aeiαx . (2.5)

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ESPAÇOS DE FUNÇÕES E ESPAÇOS DE HILBERT 35

Como se procuram soluções restringidas aDom(T ), impondo em (2.5) a condição fronteiraϕ(0) = ϕ(1), obtém-se

αn = 2πn,

com n = 0, ± 1, ± 2, . . .. Assim, o operador T , restringido a Dom(T ), tem os valorespróprios, αn = 2πn, a que correspondem os vetores próprios

ϕn(x) = e2πinx,

em que n é um inteiro positivo ou negativo. Mas, por (2.1), ϕn(x) = e2πinxn∈Z é umsistema de funções ortonormais em L2([0,1]), pois,

< ϕn,ϕm >=∫ 1

0ϕ∗nϕmdx =

∫ 1

0e2πix(m−n)dx =

0 se m = n

1 se m = n

e ϕn(x)n∈Z é um sistema de elementos linearmente independentes do espaço de HilbertL2([0,1]). No próximo capítulo, ver-se-á que o conjunto de funções ϕn(x)n∈Z é umabase do espaço de Hilbert L2([0,1]).

EXERCÍCIOS

2.1 Seja Cω([−1,1]) o conjunto de todas as funções analíticas do intervalo [−1,1]. Mostreque Cω([−1,1]) é um espaço vetorial.

2.2 Mostre que o espaço L1(R) das funções reais integráveis à Lebesgue é um espaçovetorial.

2.3 Seja L2e−x2/

√π(R,C) o espaço das funções f : R → C que verificam

1√π

∫ +∞

−∞|f(x)|2e−x2

dx < ∞.

Mostre que L2e−x2/

√π(R,C) é um espaço vetorial sobre o corpo dos complexos. Mos-

tre ainda que

< f,g >= 1√π

∫ +∞

−∞f∗(x)g(x)e−x2

dx

é um produto interno.

2.4 Seja a função f(x) = xα, em que x ∈ [0,1] e α ∈ R. Para que valores de α se temf ∈ L2([0,1]) e f ∈ W 1,2([0,1])?

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3BASES DE ESPAÇOS DE HILBERT

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BASES DE ESPAÇOS DE HILBERT 39

Mostra-se que num espaço de Hilbert separável é sempre possível construir uma base ortonormalnumerável. Introduz-se o método de ortonormalização de Gram-Schmidt, constroem-se as bases dospolinómios de Legendre e de Fourier. Demonstram-se os teoremas fundamentais dos espaços de Hilbert.

3.1 BASES DE ESPAÇOS DE HILBERT

Seja H um espaço de Hilbert separável. Uma família numerável de funções ϕi, comϕi ∈ H , é linearmente independente, se qualquer combinação linear da forma

λ1ϕ1(x) + . . .+ λnϕn(x)

só é nula se todos os λi são nulos.

Viu-se, em exemplos anteriores, que é possível encontrar conjuntos numeráveis de funçõeslinearmente independentes em H . Por exemplo,

1, x, x2, . . . e ϕn = e2πinxn=0,±1,±2,..

são famílias de funções linearmente independentes em L2([−1,1]) e L2([0,1]), respetiva-mente. Estes espaços de Hilbert têm dimensão infinita numerável.

Em dimensão infinita, é fácil mostrar que existem famílias de funções com a potência docontínuo e que são linearmente independentes. Por exemplo, no espaço de Hilbert ℓ2,a família de sucessões (c, c2, c3, . . .)c∈(0,1) tem a potência do contínuo e é linearmenteindependente. No entanto, a família de sucessões (0, . . . ,0,ei = 1,0, . . .)i≥1 é uma basedo espaço de Hilbert ℓ2. Nos espaços euclidianos de dimensão finita n, toda a família devetores linearmente independentes tem no máximo n elementos. Em dimensão infinitanão é assim.

Veja-se que é sempre possível ortonormalizar uma família de funções fi pelo método deGram-Schmidt. Seja fii∈N uma família de funções linearmente independentes de umespaço de Hilbert H e suponha-se que fi = 0, para todo o i ∈ N. À custa das funçõesfi, constroem-se novas funções ortonormais entre si. Sejam as novas funções do espaço deHilbert H

ϕ1 = f1

||f1||,

vk = fk −k−1∑i=1

< ϕi,fk > ϕi, k ≥ 2

ϕk = vk||vk||

.

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40 BASES DE ESPAÇOS DE HILBERT

Como f1 = 0, < ϕ1,ϕ1 >= 1 e ϕ1 gera um subespaço vetorial de H . Calcule-se v2. Ora,< v2,ϕ1 >=< f2,ϕ1 > − < ϕ1,f2 >

∗< ϕ1,ϕ1 >= 0 e v2 é ortogonal a ϕ1.

Suponha-se que se mostrou que, para todo o j < k, as funções ϕj são linearmente inde-pendentes e ortonormais duas a duas. Por hipótese, os fj são linearmente independentes.Faça-se a indução e mostre-se que as funções ϕ1, . . . ,ϕk são ortonormais duas a duas eindependentes. Ora,

< vk,ϕj > =< fk −k−1∑i=1

< ϕi,fk > ϕi,ϕj >

=< fk,ϕj > −k−1∑i=1

< ϕi,fk >∗ < ϕi,ϕj >︸ ︷︷ ︸

δij

=< fk,ϕj > − < ϕj ,fk >∗= 0 .

Como < ϕk,ϕj >= 0, para todo o j < k, e < ϕk,ϕk >= < vk,vk > /||vk||2 = 1, do con-junto de elementos linearmente independentes fii∈N, é sempre possível construir umasucessão de funções ortonormais. Como os ϕj são combinações lineares dos f1, . . . ,fj,ambos os conjuntos de funções geram o mesmo subespaço vetorial de H . Conclui-se, as-sim, que é sempre possível obter uma sucessão de funções ortonormadas num espaço deHilbert.

Teorema 3.1 (Desigualdade de Bessel)SejamH um espaço pré-hilbertiano e ϕi um conjunto de funções ortonormais. Então, para todo o f ∈ H ,

||f ||2 ≥∞∑i=1

|< ϕi,f >|2 .

DEMONSTRAÇÃO.

Seja g =∑ni=1 λiϕi. Então,

0 ≤ ||f − g||2 =< f −∑

λiϕi, f −∑

λiϕi >

= ||f ||2 −∑

λi < f,ϕi > −∑

λ∗i < ϕi, f > +

∑λiλ

∗i .

Como ∑|< ϕi,f > −λi|2 =

∑(< ϕi,f > −λi)(< f,ϕi > −λ∗

i )

=∑

|< ϕi,f >|2 −∑

λ∗i < ϕi,f >

−∑

λi < f,ϕi > +∑

|λi|2,

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BASES DE ESPAÇOS DE HILBERT 41

tem-se que

0 ≤ ||f − g||2 = ||f ||2 −∑

|< ϕi,f >|2 +∑

|< ϕi,f > −λi|2 .

Ora, esta relação é minimizada para λi =< ϕi,f >, e, portanto,

||f ||2 −n∑i=1

| < ϕi,f > |2 ≥ 0 .

Como a desigualdade anterior é independente de n, no limite quando n → ∞, mantém--se a desigualdade. Está assim demonstrada a desigualdade de Bessel para espaços pré--hilbertianos.

Da desigualdade de Bessel decorre que, se ϕii∈I é um sistema ortonormado no espaço deHilbert H , em que o conjunto I é, no máximo, contável, então,

∑i < ϕi,f > ϕi pertence

ao espaço de HilbertH , para todo o f ∈ H . De facto, assumindo que ϕii∈I é um sistemade funções ortonormadas,

||∑i

< ϕi,f > ϕi||2 = <∑i

< ϕi,f > ϕi,∑j

< ϕj ,f > ϕj >

=∑i

| < ϕi,f > |2 ≤ ||f || < ∞,

pelo que∑i < ϕi,f > ϕi ∈ H .

Num espaço de Hilbert H , um conjunto de funções ortonormadas ϕii∈Q, em que Q éum conjunto numerável, é completo se todas as combinações lineares da forma

∑i∈Q ciϕi

formam um conjunto denso emH . Esta asserção é equivalente a dizer que ϕii∈Q é umabase completa de H se não existirem funções ψ ∈ H , com ψ = ϕi para todo o i ∈ Q, paraas quais < ϕi,ψ >= 0 e ψ = 0.

Uma família de funções ortonormadas ϕii∈Q é uma base completa de um espaço deHilbert H sobre um corpo K se, para todo o f ∈ H , existem constantes ci ∈ K tais que

f =∑i∈Q

ciϕi ,

no sentido em que ||f −∑i∈Q ciϕi|| = 0. Em geral, tem-se:

Teorema 3.2 ([Higgins, 1977])Num espaço de Hilbert separável existe sempre uma base ortonormada numerável e completa.1

1No caso dos espaços de dimensão infinita, a existência de uma base numerável completa decorre da separabilidadedo espaço vetorial.

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42 POLINÓMIOS DE LEGENDRE

Uma questão deixada em aberto até agora é saber quais as famílias de funções ϕi(x)i∈Q,linearmente independentes, que formam uma base de um espaço de Hilbert.

Teorema 3.3 (Vitali-Dalzell, [Higgins, 1977])Uma família de funções ortonormadas ϕi(x)i∈Q, em que Q é um conjunto numerável, é completa emL2([a,b]) se, e somente se (critério de Vitali),

∑i∈Q

∣∣∣∣∫ y

a

ϕi(x)dx∣∣∣∣2 = y − a,

para todo o y ∈ [a,b], ou (critério de Dalzell)

∑i∈Q

∫ b

a

∣∣∣∣∫ y

a

ϕi(x)dx∣∣∣∣2 dy = (b− a)2

2.

Por exemplo, a família de funções de Rademacher

rn(x) = Sinal (sin 2nπx),

com x ∈ [0,1] e n ≥ 1, não é uma base completa de L2([0,1]). No entanto, a família defunções ϕn = e2πinxn∈Z é uma base completa de L2([0,1]). Ora,

∞∑n=−∞

∫ 1

0

∣∣∣∣∫ y

0e2πinxdx

∣∣∣∣2 dy = 13

+ 4∞∑n=1

∫ 1

0

1(2πn)2 (1 − cos 2πy)dy

= 13

+ 1π2

∞∑n=1

1n2 = 1

2,

em que se utilizou a relação de Euler,∑∞n=1

1n2 = π2/6 (Capítulo 5). A família de funções

ϕn = e2πinxn∈Z do espaço de Hilbert L2([0,1]) designa-se por base de Fourier.

3.2 POLINÓMIOS DE LEGENDRE

Seja o espaço de Hilbert H = L2 ([−1,1]) das funções f : [−1,1] → C, com o produtointerno

< u,v >=∫ 1

−1u∗v dx .

Seja a sucessão de funções linearmente independentes, 1,x,x2, . . .. Veja-se então comodeterminar, pelo método Gram-Schmidt, uma base completa ortonormal do espaço deHilbert L2 ([−1,1]).

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BASES DE ESPAÇOS DE HILBERT 43

Com, f0 = 1,f1 = x, . . . ,fn = xn, vem que

Q0 = f0

||f0||= 1√

2, pois ||1|| =

(∫ 1

−11dx

)1/2

=√

2,

v1 = f1− < Q0,f1 > Q0 = x− < Q0,f1 >1√2

= x,

Q1 = v1

||v1||=√

32x = 1

2

√32d

dx(x2 − 1),

v2 = x2− < Q0,f2 > Q0− < Q1,f2 > Q1 = . . . = x2 − 13,

Q2 = v2

||v2||= 3

2

√52

(x2 − 1

3

)= 1

8

√52d2

dx2 (x2 − 1)2.

Os polinómios Qn(x) assim obtidos são uma família de funções ortonormadas do espaçode Hilbert L2 ([−1,1]). Pode-se mostrar que os polinómios Qn(x) são dados por

Qn = cndn

dxn(x2 − 1)n := cn Rn(x) =

√2n+ 1n!2n

√2Rn(x),

em que as funções Rn(x) são os polinómios de Rodrigues (Exercício 3.1).

Os polinómios de LegendrePi(x) são definidos à custa dos polinómiosQi(x), pelas relações

P0(x) = 1 =√

2 Q0, P1(x) = x =√

23Q1

P2(x) = 32x2 − 1

2=√

25Q2, P3(x) = 5

2x3 − 3

2x =

√27Q3.

Como, por construção, ∫ 1

−1Qn(x)Qm(x)dx = δnm,

vem que ∫ 1

−1Pn(x)Pm(x)dx =

0 se n = m2

2n+1 se n = m.

Em geral, mostra-se que (Exercício 3.1)

Pn(x) = 12nn!

dn

dxn(x2 − 1)n,

em que Pi(x)i≥0 e Qi(x)i≥0 formam bases completas de L2([−1,1]). Na figura 3.1,estão representados os gráficos dos primeiros cinco polinómios de Legendre.

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44 TEOREMAS FUNDAMENTAIS

()

()

()

() ()

- -

-

-

Figura 3.1 Gráfico dos polinómios de Legendre até à ordem 4.

3.3 TEOREMAS FUNDAMENTAIS

Teorema 3.4Seja L2 um espaço de Hilbert separável sobre um corpo K com uma base ortonormal completa ϕii≥0.Se f ∈ L2, existe uma sucessão cii≥0, com

∑i≥0 |ci|2 < ∞ e ci ∈ K (K = C), tal que:

a) f =∑i≥0 ciϕi, no sentido da convergência na norma, isto é

||f −n∑i

ciϕi|| → 0, quando n → ∞ .

b) ci =< ϕi,f >.

DEMONSTRAÇÃO.

a) Seja, fL =∑Li=0 ciϕi, em que ci é uma sucessão de escalares que satisfaz

∑i |ci|2 <

∞. Com L > M ,

||fL − fM ||2 = < fL − fM ,fL − fM >

= <∑Li=M+1 ciϕi,

∑Lj=M+1 cjϕj >=

∑Li=M+1 c

∗i ci .

Para L e M arbitrariamente grandes,∑Li=M+1 c

∗i ci < ε2, e, por isto, ||fL − fM || < ε.

Assim, fL é uma sucessão de Cauchy e, portanto, convergente. Seja então

f := limL→∞

L∑i=0

ciϕi .

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BASES DE ESPAÇOS DE HILBERT 45

b) Como ||f −∑Ni=0 ciϕi|| → 0, quando N → ∞, seja, fN :=

∑Ni=0 ciϕi. Então,

< ϕj ,f >=< ϕj ,fN > + < ϕj ,f − fN >= cj+ < ϕj ,f − fN > .

Pela desigualdade de Cauchy-Schwarz,

| < ϕj ,f − fN > | ≤ ||f − fN || · ||ϕj || → 0, quando N → ∞,

e, portanto,cj =< ϕj ,f > .

Como ϕii≥0 é uma base completa de L2, seja f =∑i≥0 ciϕi. Então, < f − f,ϕk >=<

f −∑i≥0 ciϕi,ϕk >= 0, para todo o k ≥ 0. Desta igualdade resulta que < f,ϕk > − <

ϕk,f >∗= c∗

k − c∗k = 0, para todo o k ≥ 0, ou seja, f = f .

Por exemplo, no espaço de Hilbert L2([a,b]), o teorema 3.4 afirma apenas que

limN→∞

∫ b

a

∣∣∣∣∣f(x) −N∑i=0

ciϕi(x)

∣∣∣∣∣2

dx = 0 .

Em geral, é falsa a seguinte afirmação: ∀x ∈ [a,b], f(x) =∑∞i=0 ciϕi(x). Isto significa que

a convergência de∑ciϕi(x) é na norma ou na média quadrática e não ponto a ponto.

Do teorema 3.4 decorre ainda que todos os espaços de Hilbert separáveis são isomorfos aℓ2 e portanto são isomorfos entre si.

Seja o espaço de Hilbert L2([−1,1]), com a base ortogonal e não normada dos polinómiosde Legendre Pi(x)i≥0. Seja a função

f =∞∑i=0

ciPi(x) .

Então,

< Pn, f >=< Pn,

∞∑i=0

ciPi >= cn < Pn,Pn >= 22n+ 1

cn

ecn = 2n+ 1

2

∫ 1

−1Pn(x)f(x)dx . (3.1)

Assim, os cn em (3.1) são os coeficientes do desenvolvimento de f na base dos polinómiosde Legendre Pi(x)i≥0.

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46 TEOREMAS FUNDAMENTAIS

Veja-se um exemplo de desenvolvimento em polinómios de Legendre. Com φ(x) = ex ∈L2([−1,1]), ex =

∑∞i=0 ciPi(x), e, por (3.1),

c0 = 12

∫ 1

−1exdx = 1

2(e− 1

e) = 1.1752

c1 = 32

∫ 1

−1xexdx = 3

e= 1.1036

c2 = 52

· 32

∫ 1

−1x2exdx− 5

212

∫ 1

−1exdx = 5

2e− 35

2e= 0.3578 .

Por conseguinte, até à ordem 2, tem-se que

ex ≃ 1.1752 + 1.1036x+ 0.3578(

32x2 − 1

2

)≃ 0.9963 + 1.1036x+ 0.5367x2 .

Comparando com o desenvolvimento de Taylor, ex ≃ 1+x+0.5x2, conclui-se que a apro-ximação de Taylor é osculante, enquanto que a aproximação em polinómios ortogonais éenvolvente, figura 3.2.

Para a função f(x) = cos(πx), o desenvolvimento em polinómios de Legendre até à ordemdois é

cos(πx) ≃ − 15π2P2(x) = 15

2π2 − 452π2x

2 = 0.759 − 2.797x2 .

- -

- -

-

-

-

Figura 3.2 Aproximação em polinómios de Legendre das funções ex e cos(πx), no intervalo [−1,1].

Para espaços de Hilbert de funções, muitas vezes as funções da base podem ser obtidasatravés da resolução de uma equação diferencial. As bases geradas a partir da família de

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BASES DE ESPAÇOS DE HILBERT 47

polinómios 1, x, x2, . . . têm as equações geradoras

L2([−1,1]) L2e−x2 ((−∞,+ ∞))

Polinómios de Legendre Polinómios de Hermite

Pn(x) = 12nn!

dn

dxn(x2 − 1)n Hn(x) = (−1)nex

2 dn

dxne−x2

(1 − t2)x′′ − 2tx′ + n(n+ 1)x = 0 x′′ − 2tx′ + 2nx = 0

L2e−x([0,+ ∞)) L2

1/√

1−x2([−1,+ 1])Polinómios de Laguerre Polinómios de Tchebichev

Ln(x) = ex

n!dn

dxnxne−x Tn(x) = cos(n arccos(x))

tx′′ + (1 − t)x′ + nx = 0 (1 − t2)x′′ − tx′ + n2x = 0

e os produtos internos são

L2([−1,1]) : < f,g >=∫ 1

−1f∗(x)g(x) dx

L2e−x2 ((−∞,+ ∞)) : < f,g >= 1√

π

∫ +∞

−∞f∗(x)g(x) e−x2

dx

L2e−x([0,+ ∞)) : < f,g >=

∫ +∞

0f∗(x)g(x) e−xdx

L21/

√1−x2([−1,+ 1]) : < f,g >=

∫ 1

−1f∗(x)g(x) 1√

1 − x2dx .

Teorema 3.5Seja L2 um espaço de Hilbert separável com uma base ortonormal completa ϕii≥0. Se f,g ∈ L2, então,

a) ||f ||2 =∑∞i=0 |ci|2, em que f =

∑∞i=0 ciϕi (Igualdade de Bessel).

b) < f,g >=∑∞i=0 c

∗i bi, em que g =

∑∞i=0 biϕi (Igualdade de Parseval).

c) A melhor aproximação a f por f ′ =∑Ni=0 βiϕi, no sentido da norma e dos desvios quadráticos

médios, ∆2 =< f − f ′, f − f ′ >, é quando βi = ci.

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48 TEOREMAS FUNDAMENTAIS

DEMONSTRAÇÃO.

a) Ora,

< f − fN ,f − fN > = < f,f > − < f,fN >

− < fN ,f > + < fN ,fN >

= ||f ||2 −N∑i=0

c∗i ci −

N∑i=0

c∗i ci +

N∑i=0

c∗i ci

= ||f ||2 −N∑i=0

|ci|2 .

No limite quando N → ∞, ||f − fN || → 0, e, portanto, ||f ||2 =∑∞i=0 |ci|2.

b) De igual modo,

< f − fN ,g − gN >=< f,g > −N∑i=1

c∗i bi → 0

e, quando N → ∞, < f,g >=∑c∗i bi.

c) Seja, f ′ =∑Ni=0 βiϕi e f =

∑∞i=0 ciϕi. Então,

∆2 :=< f − f ′,f − f ′ >=N∑i=1

cic∗i −

N∑i=1

ciβ∗i −

N∑i=1

βic∗i +

N∑i=1

βiβ∗i .

Minimizando ∆2 em ordem a βi e β∗i , vem que

∂∆2

∂βi= −c∗

i + β∗i = 0

∂∆2

∂β∗i

= −ci + βi = 0

e, portanto, βi = ci.

EXERCÍCIOS

3.1 SejaL2([−1,1]) o espaço deHilbert das funções de quadrado somável. Os polinómiosde Rodrigues em [−1,1] são definidos como Rn(x) = dn

dxn (x2 − 1)n. Mostre que:

a) O polinómiodk

dxk(x2 − 1)n

anula-se nos pontos x = ±1 para todo o k < n.

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BASES DE ESPAÇOS DE HILBERT 49

b) Para toda a função real ϕ ∈ C∞([−1,1]),

< Rn(x),ϕ(x) >= (−1)n∫ 1

−1(x2 − 1)nϕ(n)(x)dx .

Conclua que Rn(x) é ortogonal a xm para todo o m < n.

c) Com o resultado anterior, calcule ||Rn(x)||2, sabendo que∫ π/2

0cos(θ)2n+1dθ = (2nn!)2

(2n+ 1)!.

d) Defina os polinómios de Legendre impondo a condição

||Pn(x)||2 = 2/(2n+ 1).

3.2 Encontre pelo método de Gram-Schmidt os primeiros três elementos de uma baseortonormal do espaço de Hilbert L2

e−x([0,∞)) (base dos polinómios de Laguerre).

3.3 Qual o polinómio de grau 2 mais próximo de sin πx em L2([0,1])?

3.4 Mostre que a família de funções sinnxn∈N não é uma base completa de L2([0,2π]).

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4OPERADORES

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OPERADORES 53

Introduzem-se os conceitos de operador linear limitado, contínuo, hermítico, unitário e autoadjunto.Derivam-se algumas propriedades espetrais dos operadores.

4.1 OPERADORES

Seja T um operador que atua sobre funções de um espaço de Hilbert H ,

T : Dom(T ) ⊂ H → H,

em queDom(T ) é o domínio de T . Ao construir a teoria dos operadores, é sempre necessá-rio especificar explicitamente o domínio e o contradomínio dos operadores em causa. Mui-tas vezes, os operadores podem aplicar elementos de um espaço de Hilbert em funções quenão estão no espaço de Hilbert original. Por exemplo, no espaço de HilbertH = L2([0,1]),||√x||H = 1/

√2 e || ddx

√x||H = ∞. Assim,

√x ∈ L2([0,1]) e d

dx

√x ∈ L2([0,1]).

Um operador T é linear se T (λ1f + λ2g) = λ1Tf + λ2Tg, para todo o f,g ∈ Dom(T ).

Um operador T é limitado se||Tf || ≤ c||f ||,

para todo o f ∈ Dom(T ) e onde c é uma constante real.

Em particular, quando um operador aplica um elemento do espaço de Hilbert no corpoK, T : H → K, o operador designa-se por funcional linear.

Pode-se definir a norma de um operador através de

||T ||op = supf(x) =0

||Tf(x)||||f(x)||

= sup||f(x)||=1

||Tf(x)||,

em que f percorre o domínio de T . Pode-se mostrar que o conjunto de todos os operadoreslineares limitados T : A → B, L(A,B), é um espaço de Banach desde que A e B sejamespaços normados e B seja completo.

Da definição de norma de um operador resulta que

||Tf(x)|| ≤ ||T ||op||f(x)||

||ST ||op ≤ ||S||op||T ||op,

em que S e T são ambos operadores num espaço vetorial normado. A primeira desigual-dade decorre de

||Tf(x)|| = ||Tf(x)||||f(x)||

||f(x)|| ≤ supf(x)=0

||Tf(x)||||f(x)||

||f(x)|| .

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54 OPERADORES ADJUNTOS, HERMÍTICOS E UNITÁRIOS

A segunda desigualdade decorre de

||ST ||op = supf(x)=0

||STf(x)||||f(x)||

= supf(x) =0

||STf(x)||||Tf(x)||

||Tf(x)||||f(x)||

≤ supf(x)=0

||STf(x)||||Tf(x)||

supf(x)=0

||Tf(x)||||f(x)||

≤ ||S||op||T ||op .

Em geral, um operador linear não é necessariamente limitado, contrariamente ao queacontece em dimensão finita. Por exemplo, o operador de derivação é não limitado. SejaT = d

dx e suponha-se que T atua no subespaço das funções diferenciáveis do espaço deHilbert L2([0,1]). Como xn ∈ L2([0,1]), Txn = nxn−1 e ||Txn|| = n||xn−1||. Assim,||Txn||/||xn|| = n||xn−1||/||xn||. Com ||xn|| =

√1/(2n+ 1), vem que

||Txn||/||xn|| = n√

(2n+ 1)/(2n− 1),

pelo que o operador de derivação é linear mas não é limitado. Em geral, os operadoresT = dn

dxn são lineares mas não são limitados.

Um operador T : H → H é contínuo em f ∈ H , se Tfn → Tf , sempre que fn → f . Umoperador T é contínuo, se é contínuo em todo o f ∈ H .

Lema 4.1 ([Kreyszig, 1978])Seja H um espaço de Hilbert e T : Dom(T ) ⊂ H → H um operador linear e limitado. Então, T écontínuo se, e somente se, é limitado. Se T é contínuo num ponto f ∈ Dom(T ), então T é contínuo.

Por exemplo, como o operador de derivação em L2([0,1]) é linear mas não é limitado,também não é contínuo.

4.2 OPERADORES ADJUNTOS, HERMíTICOS E UNITÁRIOS

Se T é um operador sobre um espaço de Hilbert, define-se T+, o operador adjunto de T ,através de

< φ,T+ψ >:=< Tφ,ψ > .

Como a definição de operador adjunto é válida para quaisquer funções φ e ψ do espaçode Hilbert, o operador adjunto T+ é único.

Lema 4.2Seja T um operador limitado num espaço de Hilbert e T+ o operador adjunto de T . Então, ||T+||op =||T ||op.

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OPERADORES 55

DEMONSTRAÇÃO.

Pela definição de operador adjunto e pela desigualdade de Cauchy-Schwarz,

| < φ,T+ψ > | = | < Tφ,ψ > | ≤ ||Tφ|| ||ψ|| ≤ ||T ||op ||φ|| ||ψ|| .

Como, por outro lado,

||T+ψ||2 = | < T+ψ,T+ψ > | = | < TT+ψ,ψ > |,

fazendo φ = T+ψ, pela desigualdade anterior obtém-se

||T+ψ||2 = | < Tφ,ψ > | ≤ ||T ||op ||φ|| ||ψ|| = ||T ||op ||T+ψ|| ||ψ||,

ou seja, ||T+ψ|| ≤ ||T ||op ||ψ||. Assim, ||T+||op ≤ ||T ||op.

De igual modo,| < ψ,T+φ > | ≤ ||T+||op ||ψ|| ||φ|| .

Com ||Tψ||2 = | < Tψ,Tψ > | = | < ψ, T+Tψ > | e φ = Tψ,

||Tψ||2 = | < ψ, T+φ > | ≤ ||T+||op ||φ|| ||ψ|| = ||T+||op ||Tψ|| ||ψ||

e, portanto, ||T ||op ≤ ||T+||op. Como ||T ||op ≥ ||T+||op, vem que ||T+||op = ||T ||op.

Se T é um operador entre espaços vetoriais, diz-se que o operador B é o operador inversode T se BT = TB = 1. Nestas condições, usa-se a notação B = T−1. Em geral, ooperador inverso de um operador linear é ainda linear.

Se T = T+, diz-se que o operador T é autoadjunto ou hermítico.1 Se T+ = T−1, então T éum operador unitário.

Por exemplo, se A é uma matriz com elementos em C, a matrix A pode ser consideradacomo um operador linear A : Cn → Cn. Seja o produto interno em Cn definido por

< x,y >= x∗T y,

em que os vetores x,y ∈ Cn se escrevem como matrizes coluna de 1 × n. Então, como

< Ax,y >= (Ax)∗T y = x∗TA∗T y = x∗T (A∗T y) =< x,A∗T y >,

1Um operador T é hermítico se < Tf,g >=< f,Tg > (simetria). Para operadores não limitados faz-se a dis-tinção entre operador hermítico e operador autoadjunto. Designando por Dom(T ) o domínio do operador T , e seDom(T ) ⊂ Dom(T+), o operador é hermítico. Se Dom(T ) = Dom(T+), o operador é autoadjunto.

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56 OPERADORES ADJUNTOS, HERMÍTICOS E UNITÁRIOS

o operador adjunto deA éA+ = A∗T . Assim, amatrizA é hermítica se aii ∈ R e aij = a∗ji.

A equação aos valores próprios de um operador T : H → H é a equação

Tϕ = αϕ,

em que ϕ ∈ H . Se H é um espaço de Hilbert sobre o corpo K, quando a equação aosvalores próprios tem soluções para α ∈ K e ϕ ∈ H , diz-se que α é o valor próprio a quecorresponde o vetor próprio ϕ. Em geral, se ϕk é uma base ortonormal de um espaçode Hilbert e se Tϕk = λkϕk, então tem-se que ||T ||op = supk |λk|.

Num espaço de dimensão infinita, o conjunto dos valores próprios de um operador designa--se por espetro pontual ou espetro discreto do operador. O espetro pontual de um operadorou é discreto ou é vazio.

Lema 4.3Seja H um espaço de Hilbert e Dom(T ) ⊂ H o domínio do operador T . Se T : Dom(T ) → H éum operador autoadjunto ou hermítico, então, os seus valores próprios são reais e a valores próprios distintoscorrespondem vetores próprios ortogonais.

DEMONSTRAÇÃO.

Por hipótese, Tϕ = λϕ e Tψ = µψ, em que ϕ e ψ são vetores próprios distintos. Então,

< Tϕ, ϕ >=< ϕ, Tϕ >

e, portanto, λ∗ = λ. Se, µ = λ,

< Tϕ,ψ > = λ∗ < ϕ,ψ >= λ < ϕ,ψ >

< ϕ,Tψ > = µ < ϕ,ψ > .

Como, por hipótese, < Tϕ, ψ >=< ϕ,Tψ >, tem-se que λ < ϕ,ψ >= µ < ϕ,ψ >. Comoλ = µ, vem que < ϕ,ψ >= 0.

Lema 4.4Seja H um espaço de Hilbert e Dom(T ) ⊂ H o domínio do operador T . Se T : Dom(T ) → H é umoperador unitário, então:

a) ||Tϕ|| = ||ϕ|| e ||T ||op = 1.

b) Se λ é valor próprio de T , então, |λ| = 1.

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OPERADORES 57

DEMONSTRAÇÃO.

Como T é unitário, < Tϕ,ψ >=< ϕ, T−1ψ >. Assim,

||Tϕ||2 =< Tϕ,Tϕ >=< ϕ,T−1Tϕ >=< ϕ,ϕ >= ||ϕ||2

e a) está demonstrado.

Como, < Tϕ,Tϕ >=< λϕ,λϕ >= λλ∗ < ϕ,ϕ >= λλ∗||ϕ||2, e, portanto, λλ∗ = 1 e|λ| = 1.

Do lema anterior decorre que todo o operador linear unitário é limitado, sendo, portanto,contínuo.

Veja-se que a caraterização de um operador pode depender das condições fronteira ou con-dições aos limites. Seja o operador T = −i ddx e calcule-se o operador adjunto. Suponha-seque T atua no espaço L2([a,b]) ∩ C1

loc([a,b]). Ora,

< Tϕ,ψ > =∫ b

a

id

dxϕ∗(x)ψ(x)dx

= iϕ∗(x)ψ(x)|ba −∫ b

a

iϕ∗(x) ddxψ(x)dx :=< ϕ,T+ψ > .

Se a = −∞ e b = ∞, para que ϕ, ψ ∈ L2(R)∩C1loc(R), tem de se terϕ(±∞) = ψ(±∞) = 0

e T+ = −i ddx . Portanto, T é um operador autoadjunto em L2(R) ∩ C1loc(R). Se a e b

são ambos finitos, a hermiticidade de T é apenas compatível com as condições fronteira,ϕ(a) = ϕ(b) e ψ(a) = ψ(b). Assim, conclui-se que as condições fronteira determinam ahermiticidade do operador T .2

4.3 OPERADORES DE STURM-LIOUVILLE

Designa-se por equação de Sturm-Liouville a equação diferencial

d

dx

[p(x)dy

dx

]− q(x)y + λr(x)y = 0, (4.1)

em que p(x) e r(x) são funções reais e positivas, q(x) é uma função real e λ é uma constante.Tanto a equação diferencial como as funções associadas estão definidas no intervalo I =[a,b], e a e b podem tomar valores infinitos.

2A condição ϕ ∈ L2(R) não é suficiente para garantir que ϕ se anula no infinito. Por exemplo, ϕ(x) =∑∞n=1 max(0,1 − 2n|x− n|) ∈ L2(R), no entanto, supx→∞ ϕ(x) = 1 e infx→∞ ϕ(x) = 0. Como consequência

do teorema 2.3, pode-se garantir o anulamento no infinito de ϕ(x), desde que ϕ ∈ L2(R) ∩ C1loc

(R).

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58 OPERADORES DE STURM-LIOUVILLE

A equação de Sturm-Liouville (4.1) pode-se escrever na forma

Ly + λr(x)y = 0,

em que

L = d

dx

[p(x) d

dx

]− q(x) (4.2)

é o operador linear de Sturm-Liouville. A constante λ que aparece em (4.1) é muitas vezesdesignada por valor próprio da equação de Sturm-Liouville.

Chama-se problema de Sturm-Liouville à determinação das soluções da equação (4.1) queobedecem a determinadas condições fronteira.

Comece-se então por determinar algumas propriedades do operador de Sturm-Liouville(4.2).

Lema 4.5Seja o espaço de Hilbert L2([a,b]), em que o intervalo [a,b] pode ser finito ou infinito. Suponha-se queo operador de Sturm-Liouville (4.2) tem como domínio um dos subconjuntos de L2([a,b]) ∩ C2([a,b])definido pelas condições seguintes:

a) y(a) = y(b) = 0, com y ∈ L2([a,b]) ∩ C2([a,b]).

b) y′(a) = y′(b) = 0, com y ∈ L2([a,b]) ∩ C2([a,b]).

c) p(a) = p(b), y(a) = y(b) e y′(a) = y′(b), com y ∈ L2([a,b]) ∩ C2([a,b]).

Então, o operador de Sturm-Liouville é autoadjunto.

DEMONSTRAÇÃO.

Por definição, o operador L é autoadjunto se < Lf,g >=< f,Lg >, em que f,g ∈L2([a,b]) ∩ C2([a,b]). Como

< Lf,g > − < f,Lg >=∫ b

a

(gd

dx

[p(x) df

dx

]− f

d

dx

[p(x)dg

dx

])dx,

tem-se que ∫ b

a

(gd

dx

[p(x) df

dx

]− f

d

dx

[p(x)dg

dx

])dx

= g(x)p(x) dfdx

− f(x)p(x)dgdx

]ba

−∫ b

a

(g′p(x)f ′(x) − f ′p(x)g′) dx

= g(x)p(x) dfdx

− f(x)p(x)dgdx

]ba

.

(4.3)

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OPERADORES 59

Com as condições a)-c),

g(x)p(x) dfdx

− f(x)p(x) dgdx

]ba

= 0 (4.4)

e, portanto, < Lf,g >=< f,Lg >.

Nas condições do lema anterior, os valores próprios do operador de Sturm-Liouville, aexistirem, são reais.

Suponha-se então que se procuram soluções da equação de Sturm-Liouville (4.1) numdomínio [a,b] do eixo real e que se encontram soluções y1(x) e y2(x) a que correspondemos valores próprios λ1 e λ2, no sentido em que

d

dx

[p(x)dy1

dx

]− q(x)y1 + λ1r(x)y1 = 0

d

dx

[p(x)dy2

dx

]− q(x)y2 + λ2r(x)y2 = 0.

Multiplicando a primeira equação por y2(x), a segunda por y1(x), subtraindo ambas asequações termo a termo e integrando entre a e b, obtém-se∫ b

a

[y2

d

dx

(p(x)dy1

dx

)− y1

d

dx

(p(x)dy2

dx

)]dx

+(λ1 − λ2)∫ b

a

y1(x)y2(x)r(x)dx = 0 .

Por (4.3) e (4.4), tem-se então que

(λ1 − λ2)∫ b

a

y1(x)y2(x)r(x)dx = 0 .

Como λ1 = λ2, y1(x) e y2(x) são ortogonais no espaço de Hilbert L2r([a,b]), em que

r(x) > 0 é uma densidade de medida no intervalo [a,b].

Em geral, tem-se:

Teorema 4.6 ([Hassani, 1999])Se p(x) e q(x) são funções contínuas no intervalo [a,b] e r(x) > 0. Então, para qualquer das condiçõesfronteira,

a) y(a) = y(b) = 0;

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60 OPERADORES DE STURM-LIOUVILLE

b) y′(a) = y′(b) = 0;

c) p(a) = p(b), y(a) = y(b) e y′(a) = y′(b),

o operador de Sturm-Liouville é autoadjunto em L2r([a,b]) ∩ C2([a,b]) e os valores próprios da equação

de Sturm-Liouville (4.1) formam uma sucessão crescente e não limitada, λ1 < λ2 < . . .. Os vetorespróprios ϕii∈N formam uma base ortonormada de um subespaço vetorial de L2

r([a,b]).

É importante salientar que a base ortonormada do teorema anterior pode não ser completa.

EXERCÍCIOS

4.1 Mostre que a definição usual de função contínua é equivalente à seguinte definição:SejamX e Y espaços topológicos. Uma função f : X → Y é contínua em x∗ ∈ X, separa toda a sucessão xn convergente para x∗, com xn ∈ X , então f(xn) → f(x∗).

4.2 Seja o espaço de Hilbert L2([a,b]) e seja K(x,y) : [a,b] × [a,b] → C uma funçãocontínua. Que condições se devem impôr a K(x,y) para que o operador

Tϕ =∫ b

a

K(x,y)ϕ(y)dy

seja hermítico?

4.3 Encontre os valores e os vetores próprios do operador,

T = d2

dx2

supondo que:

a) ϕ ∈ C2([−a,a]) ∩ L2([−a,a]) e ϕ(−a) = ϕ(a).b) ϕ ∈ C2([0,a]) ∩ L2([0,a]) e ϕ(0) = ϕ(a) = 0.c) ϕ ∈ C2([0,a]) ∩ L2(0,a]), ϕ′(0) = 0 e ϕ′(a) = 0.d) ϕ ∈ C2([0,a]) ∩ L2(0,a]), ϕ(0) = 0 e ϕ(a) = a.

Analise a hermiticidade do operador T nos casos indicados.

4.4 Seja o operador T : ϕ(x) → xϕ(x) no espaço de Hilbert L2([0,1]). Chama-se repre-sentação de um operador numa base ϕn do espaço de Hilbert à matriz infinita deelemento genérico

Anm =< ϕn,Tϕm > (outra notação < ϕn|T |ϕm >) .

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OPERADORES 61

A matriz infinita A é um operador linear que atua em ℓ2.

a) Dê uma condição de hermiticidade em função dos Anm.

b) Determine a representação do operador T na base de Fourier e2πinxn∈Z deL2([0,1]) e analise a hermiticidade do operador.

c) Mostre que o operador T não tem valores próprios.

4.5 Seja o operador T = 1iddx que actua sobre funções do espaço de Hilbert L2([0,1]) ∩

C1([0,1]), com a base de Fourier, e2πinxn∈Z. Determine a representação de T nabase de Fourier de L2([0,1]). Justifique o facto de T não ser um operador limitado.

4.6 Seja o operadorTϕ =

√2xϕ(x2),

em que ϕ(x) ∈ L2([0,1]). Calcule o operador adjunto de T . Mostre que T é umoperador unitário.

4.7 Seja T um operador autoadjunto (ou hermítico) num espaço de Hilbert H . Mostreque Tn também é hermítico. Em seguida, mostre que, se λ é um número real, osoperadores

U1 = eiλT e U2 = 1 − i T

1 + i T

são unitários, em que as funções de operadores são definidas através das séries deTaylor correspondentes.

4.8 Seja M a representação matricial de um operador e suponha que M é uma matrizdiagonal de dimensão n× n, real ou complexa. Mostre que

det(eM ) = eTrM .

4.9 Seja ϕ um elemento de um espaço de Hilbert H(X) e seja µ a medida canónica deH . Seja o funcional linear (operador) definido através de

Pf =< ϕ,f >,

em que f ∈ H . Mostre que, se µ(X) < ∞, P é um operador linear e limitado, sendoportanto contínuo.

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62 OPERADORES DE STURM-LIOUVILLE

4.10 Seja o espaço de Hilbert L2(R) e T : L2(R) → L2(R) um operador. O operador Té anti-hermítico, se < Tϕ1,ϕ2 >= − < ϕ1,Tϕ2 >, para todas as funções ϕ1, ϕ2 ∈L2(R). Mostre que os valores próprios de T são imaginários puros.

4.11 A equação de Schrödinger a uma dimensão escreve-se na forma SΨ = iℏ∂Ψ∂t , em que

S = − ℏ2

2m∂2

∂x2 + V (x)

é o operador de Schrödinger e V : R → R. Encontre as condições de modo a que ooperador S : Dom(S) ⊂ L2(R) → L2(R) seja autoadjunto.

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5SÉRIES DE FOURIER

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SÉRIES DE FOURIER 65

Introduzem-se as séries de Fourier e derivam-se algumas das suas propriedades. Estuda-se o fenómenode Gibbs. São demonstrados os teoremas da convergência das séries de Fourier e de Fejér.

5.1 SÉRIES DE FOURIER

Seja L2([0,1]) o espaço das funções φ : [0,1] → C, para as quais∫ 1

0|φ(x)|2dx =

∫ 1

0φ∗(x)φ(x)dx < ∞ .

Como se viu no capítulo 3, o espaço das funções de quadrado somável L2([0,1]) é umespaço de Hilbert separável e tem como base ortonormal completa a família de funções

ϕn(x) = e2πinx, com n ∈ Z .

Isto foi verificado pelo critério de Vitali-Dalzell (teorema 3.3). Como o sistema de funçõese2πinxn∈Z é uma base ortonormal completa de L2([0,1]), para qualquer função f ∈L2([0,1]), pelo teorema 3.4, tem-se que

f =+∞∑

n=−∞cne

2πinx, (5.1)

no sentido da convergência na média quadrática, e

cn =< ϕn,f >=∫ 1

0e−2πinxf(x)dx . (5.2)

As relações (5.1) e (5.2) definem a série Fourier de f(x) ∈ L2([0,1]) e as constantes cn são oscoeficientes de Fourier da função f .

Veja-se a notação real para a série de Fourier. Seja f : [0,1] → R, com

c−n =< ϕ−n,f >=∫ 1

0e2πinxf(x)dx = c∗

n,

sejam as constantes reais an e bn definidas porcn = 1

2 (an − ibn)

c0 = 12 a0

c−n = 12 (an + ibn) .

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66 SÉRIES DE FOURIER

Por substituição na série de Fourier,

f(x) =+∞∑

n=−∞cne

2πinx

= 12a0 +

∞∑n=1

12

(an − ibn)e2πinx + 12

(an + ibn)e−2πinx

= 12a0 +

∞∑n=1

an cos 2πnx+ bn sin 2πnx .

(5.3)

Comcn =

∫ 1

0e−2πinxf(x) dx = 1

2(an − ibn)

c−n =∫ 1

0e2πinxf(x) dx = 1

2(an + ibn)

vem que

an = 2∫ 1

0f(x) cos 2πnx dx n ≥ 0

bn = 2∫ 1

0f(x) sin 2πnx dx n ≥ 1 .

(5.4)

As relações (5.3) e (5.4) definem a forma real da série de Fourier.

Muitas vezes, a série de Fourier é representada no intervalo [−π,π], isto é, para funçõesdo espaço de Hilbert L2([−π,π]). Neste caso, com a nova variável y = −π + 2πx, comx ∈ [0,1], tem-se que y ∈ [−π,π], e, por (5.3), a série de Fourier na variável y é

g(y) = f

(y + π

)= a0

2+

∞∑n=1

an cos(ny + nπ) + bn sin(ny + nπ)

= a0

2+

∞∑n=1

an cosnπ. cosny + bn cosnπ. sinny

= a0

2+

∞∑n=1

a′n cosny + b′

n sinny,

(5.5)

em que

a′n = an cosnπ = 2 cosnπ

∫ 1

0f(x) cos 2πnx dx

= 1π

cosnπ∫ π

−πg(y) cosnπ. cosny dy = 1

π

∫ π

−πg(y) cosny dy

b′n = bn cosnπ = 2 cosnπ

∫ 1

0f(x) sin 2πnxdx = 1

π

∫ π

−πg(y) sinny dy .

(5.6)

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SÉRIES DE FOURIER 67

Assim, se g ∈ L2([−π,π]), a sua série de Fourier é definida por (5.5), com os coeficientesde Fourier (5.6).

No caso geral em que f ∈ L2([a,b]), tem-se o desenvolvimento de Fourier

f(x) = 12a0 +

∞∑n=1

an cos 2πb− a

nx+ bn sin 2πb− a

nx,

em que

an = 2b− a

∫ b

a

f(x) cos 2πb− a

nx dx n ≥ 0

bn = 2b− a

∫ b

a

f(x) sin 2πb− a

nx dx n ≥ 1 .

Neste caso, a base ortonormada de Fourier de L2([a,b]) na forma complexa é a família defunções

ϕnn∈Z = e2πinx/(b−a)/√b− an∈Z . (5.7)

Pelo teorema 3.4,

cn =< ϕn,f >=∫ b

a

e−2πinx/(b−a) 1√b− a

f(x)dx, (5.8)

e, portanto, cn =

√b− a 1

2 (an − ibn)

c0 =√b− a 1

2 a0

c−n =√b− a 1

2 (an + ibn) .

(5.9)

Propriedades das séries de Fourier:

i) A série de Fourier de f ∈ L2([a,b]) estende-se em R como uma função periódica deperíodo (b− a).

ii) Se f(x) ∈ L2([−a,a]) é uma função par no intervalo [−a,a], tem-se que

f(x) = a0

2+

∞∑n=1

an cos πanx .

Se f(x) é ímpar,

f(x) =∞∑n=1

bn sin πanx .

Assim, o desenvolvimento de Fourier de uma função é naturalmente a soma de umafunção par com uma função ímpar.

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68 SÉRIES DE FOURIER

iii) Se ∈ L2([a,b]), pela igualdade de Bessel (teorema 3.5) e por (5.7), (5.8) e (5.9), tem-seque

||f ||2L2 =+∞∑

n=−∞|cn|2 = 1

4(b− a)a2

0 + 12

(b− a)∞∑n=1

(a2n + b2

n

).

Exemplo de cálculo de uma série de Fourier. Seja a função f(x) = x2, com x ∈[−π,π]. Então, f(x) ∈ L2([−π,π]). Como f(x) é uma função par no intervalo [−π,π],tem-se que bn = 0, para todo o n ≥ 1, e

a0 = 1π

∫ π

−πx2dx = 1

3π(π3 + π3) = 2

3π2

an = 1π

∫ π

−πx2 cosnx dx = 1

nπx2 sinnx |π−π − 2

∫ π

−πx sinnx dx

= 2nπ

1nx cosnx|π−π = (−1)n 4

n2 .

Portanto,

f(x) = x2|[−π,π] = 13π2 +

∞∑n=1

(−1)n 4n2 cosnx . (5.10)

Na figura 5.1, está representado o gráfico da série de Fourier de f(x) = x2|[−π,π], prolon-gada a todo o eixo real.

- -

Figura 5.1 Gráfico da série de Fourier de f(x) = x2|[−π,π].

Assim, a série de Fourier de uma função restringida a um intervalo de comprimento finitoconverge para uma função periódica sobre toda a reta. Isto significa que o desenvolvimentode Fourier de uma função não é único, ou seja, depende do intervalo escolhido.

Nalguns casos, os desenvolvimentos de Fourier de funções dão informação sobre a soma deséries. Por exemplo, com o desenvolvimento de Fourier da função, f(x) = x2, no intervalo

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SÉRIES DE FOURIER 69

[−π,π], pode-se calcular a soma de séries. Como f(π) = π2 e usando a série de Fourier(5.10), obtém-se (ver secção 5.3)

f(π) = π2 = 13π2 +

∞∑n=1

(−1)n 4n2 cosnπ = 1

3π2 + 4

∞∑n=1

1n2 .

Fazendo o rearranjo dos termos da igualdade anterior, obtém-se a fórmula de Euler

∞∑n=1

1n2 = π2

6. (5.11)

Até aqui, consideraram-se séries de Fourier de funções de uma variável. No caso mais geralde funções f : Rn → R, estes resultados generalizam-se facilmente. Seja f(x,y) : [0,1] ×[0,1] → R ouC, com f ∈ L2([0,1]×[0,1]). As condições de convergência da série de Fourierpara dimensão 2 são iguais às de dimensão 1, mas agora tomadas independentemente nasvariáveis x e y. Desenvolvendo f(x,y) em série de Fourier na variável x, obtém-se

f(x,y) =+∞∑

k=−∞

cke2πikx e ck =

∫ 1

0f(x,y)e−2πikxdx,

em que ck = ck(y). Desenvolvendo ck(y) em série de Fourier, vem que

ck(y) =+∞∑

n=−∞ckne

2πiny e ckn =∫ 1

0ck(y)e−2πinydy .

Isto é,

ckn =∫ 1

0

∫ 1

0f(x,y)e−2πi(kx+ny)dxdy

e

f(x,y) =+∞∑

k=−∞

+∞∑n=−∞

ckne2πi(kx+ny) .

Obteve-se, assim, o desenvolvimento de Fourier de uma função de duas variáveis.

Para funções de n variáveis o procedimento é idêntico. Com a notação, r = x1e1 + · · · +xnen e k = k1e1 + · · · + knen, a série de Fourier multidimensional é

f(r) =∑k

cke2πik.r, com ck =

∫[0,1]n

e−2πik.rf(r)dr,

desde que f ∈ L2([0,1]n).

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70 FENÓMENO DE GIBBS

5.2 FENÓMENO DE GIBBS

Analise-se o comportamento das séries de Fourier na vizinhança de descontinuidades. Sejaa função

f(x) =

1 se 0 < x < π

−1 se − π < x < 0.(5.12)

Como f ∈ L2([−π,π]), pode-se calcular o seu desenvolvimento de Fourier.

Como f(x) é ímpar, tem-se que an = 0, para todo on ≥ 0, bn = 0, paran par, e bn = 4/nπ,para n ímpar. Assim,

f(x) =∞∑k=1

bk sin kx = 4π

∞∑k=0

1(2k + 1)

sin(2k + 1)x . (5.13)

Sejam então as somas parciais da série de Fourier (5.13),

S2n+1(x) = 4π

n∑k=0

sin(2k + 1)x(2k + 1)

= 4π

n∑k=0

∫ x

0cos(2k + 1)y.dy

= 4π

∫ x

0

(n∑k=0

cos(2k + 1)y

)dy .

(5.14)

Na figura 5.2, estão representadas as somas parciais S1, S3, S5 e S43 da série de Fourier(5.13). Na vizinhança da descontinuidade em x = 0, as somas parcias parecem não con-vergir. Este fenómeno, correntemente observado em osciloscópios e dispositivos de análisede sinais, designa-se por fenómeno de Gibbs.

- - -

-

-

Figura 5.2 Somas parciais S1, S3, S5 e S43 da série de Fourier da função (5.12).

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SÉRIES DE FOURIER 71

Calcule-se a soma parcial S2n+1(x). Ora,

n∑k=0

cos(2k + 1)y = 12

n∑k=0

ei(2k+1)y + e−i(2k+1)y =

= 12

n∑k=0

eiy(ei2y

)k + 12

n∑k=0

e−iy (e−i2y)k .Com 1 + z + . . .+ zn = (1 − zn+1)/(1 − z),

n∑k=0

cos(2k + 1)y = 12eiy

1 − e2iy(n+1)

1 − e2iy + 12e−iy 1 − e−2iy(n+1)

1 − e−2iy

= sin y(n+ 1) · cos y(n+ 1)sin y

= 12

sin 2y(n+ 1)sin y

.

Assim, substituindo estas expressões em (5.14), obtém-se

S2n+1(x) = 2π

∫ x

0

sin 2y(n+ 1)sin y

dy . (5.15)

Na vizinhança de x = 0 e para n finito, com sin y ∼ y, a soma parcial da série de Fourier(5.14) fica mais simples, obtendo-se

S2n+1(x) = 2π

∫ x

0

sin 2y(n+ 1)sin y

dy ≃ 2π

∫ x

0

sin 2y(n+ 1)y

dy . (5.16)

Introduzindo em (5.16) a nova variável, u := 2y(n+ 1), vem que dudy = 2(n+ 1), e

S2n+1(v) ≃ 2π

∫ v

0

sin uu

du,

em que v := 2x(n+ 1). Assim, para x na vizinhança de 0 e em primeira ordem, as somasparciais são independentes de n. Na figura 5.3, estão representados os gráficos de sin u/ue de S2n+1(v).

Como S2n+1(v) tem um máximo para sin v = 0, ou seja, para v = π, o seu valor no pontov = π é

S2n+1(π) ≃ 2π

∫ π

0

sin uu

du ≃ 2π

1.851 ≃ 1.18,

independentemente de n. Assim, na vizinhança de x = 0 e para n finito, o valor dafunção f(x) no ponto x = π/2(n + 1) é f(π/2(n + 1)) ∼ 1.18, independentementede n. Na vizinhança de uma descontinuidade, a não convergência da série de Fourier

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72 FENÓMENO DE GIBBS

-

+()

Figura 5.3 Gráficos das funções sinu/u e S2n+1(v).

- -

-

-

Figura 5.4 Fenómeno de Gibbs na vizinhança da descontinuidade da função (5.12).

em primeira ordem em n designa-se por fenómeno de Gibbs (figura 5.4). No entanto,por cálculo direto da série de Fourier da função considerada, tem-se que f(0) = 0. Ofenómeno de Gibbs afirma apenas que a convergência da série de Fourier na vizinhançade uma descontinuidade é lenta, no sentido em que, em primeira ordem, as somas parciaisde uma série de Fourier são independentes de n. Foi esta aproximação que se fez em (5.16).

A convergência lenta da série de Fourier na vizinhança de descontinuidades aparece emtodas as funções e não é uma particularidade da função (5.12). Por exemplo, na figura 5.5,está representada uma soma parcial da série de Fourier da função f(x) = −x/2, se, 0 ≤x < π, e f(x) = −x/2 + π, se, π < x ≤ 2π.

Em geral, tem-se:

Teorema 5.1Seja f ∈ L2([0,ℓ]) e suponha-se que:

1. a) Existe x∗ ∈ (0,ℓ), em que f(x∗+) = f(x∗−), |f(x∗+)| < ∞ e |f(x∗−)| < ∞,

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SÉRIES DE FOURIER 73

-

-

Figura 5.5 Soma parcial da série de Fourier da função f(x) = −x/2, se 0 ≤ x < π, e f(x) = −x/2 + π,se π < x ≤ 2π. Para valores de n elevados, os valores das somas parciais da séries de Fourier de f na

vizinhança de x = 0 são f(±0) ≃ ±1.18π/2.

ou

1. b) f(0) = f(ℓ), em que |f(0)| < ∞ e |f(ℓ)| < ∞.

Então, no caso a), a série de Fourier de f no ponto x = x∗ converge para (f(x∗+) + f(x∗−))/2. Nocaso b), a série de Fourier de f nos pontos x = 0 ou x = ℓ converge para (f(0+) + f(ℓ−))/2.

5.3 CONVERGÊNCIA DAS SÉRIES DE FOURIER

Estabelecido o critério de convergência em média quadrática das séries de Fourier, atravésdo teorema 3.4, quer-se encontrar condições para que a convergência da série de Fourierseja uniforme.

Seja f(x) : X → R. Diz-se que uma sucessão fn(x) converge uniformemente para f(x) se,para todo o ε > 0, existe um N tal que, para n > N ,

|f(x) − fn(x)| < ε

independentemente de x.

Uma série,∑fn, é uniformemente convergente se a sucessão das somas parciais sn =

∑nk=1 fk

converge uniformemente. A mesma série é absolutamente convergente se∑

|fn| é convergente.

Teorema 5.2 (Weierstrass)Seja fn(x) é uma sucessão de funções limitadas, em que fn(x) : X → R, |fn(x)| < Mn, para todoo n, e a série

∑Mn é convergente. Então,

∑fn(x) converge uniformemente em X .

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74 CONVERGÊNCIA DAS SÉRIES DE FOURIER

Uma das consequências do teorema de Weierstrass 5.6 é o teorema da convergência deFourier.

Teorema 5.3 (convergência de Fourier)Seja f(x) uma função diferenciável em toda a reta real e periódica de período P . Se f ′(x) ∈ L2([0,P ]),então, a série de Fourier de f(x) converge uniforme e absolutamente para f(x).

DEMONSTRAÇÃO.

Considere-se que f é uma função contínua e diferenciável em toda a reta real. Assim,f(x) ∈ L2([0,P ]), pois f(x) é contínua e limitada em [0,P ]. Seja cn é o coeficiente deFourier de ordem n de f . Por (5.7) e (5.8), os coeficientes de Fourier da derivada de f são

cn = 1√P

∫ P

0f ′(x)e−2πinx/P dx

= 1√Pf(x)e−2πinx/P

∣∣∣∣P0

+ 2πinP 3/2

∫ P

0f(x)e−2πinx/P dx

= f(P ) − f(0)√P

+ 2πinP

cn .

Como f é periódica de período P , f(0) = f(P ), então, cn = 2πincn/P . Pelo critério deWeierstrass, se a série ∑

|cne2πinx/P | =∑

|cn|

é convergente, então a série de Fourier é uniforme e absolutamente convergente. Ora, comcn = 2πincn/P e |cn| = |c−n|, obtém-se

+∞∑n=−∞

|cn| = |c0| + P

π

+∞∑n=1

|cn| 1|n|

.

Como (a− b)2 ≥ 0, tem-se a desigualdade, |a|.|b| ≤ (|a|2 + |b|2)/2, e

+∞∑n=−∞

|cn| ≤ |c0| + P

+∞∑n=1

(|cn|2 + 1

|n|2

).

Como, por hipótese, f ′(x) ∈ L2([0,1]), tem-se que∑+∞n=1 |cn|2 < ∞ e como

∑1/|n|2 < ∞

(fórmula de Euler), vem que+∞∑

n=−∞|cn| < ∞ .

Assim, a convergência uniforme da série de Fourier decorre do teorema deWeierstrass 5.6.

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SÉRIES DE FOURIER 75

Existe um teorema mais geral de convergência das séries de Fourier para o caso em quef(x) é periódica e contínua. O procedimento que permite recuperar uma função contínuada sua série de Fourier baseia-se na convergência do valor médio das somas parciais dasérie de Fourier. Sejam

Sn(x) = a0

2+

n∑k=1

ak cos kx+ bk sin kx

e

σn = S0(x) + S1(x) + . . .+ Sn−1(x)n

,

a soma parcial e o valor médio das somas parciais de uma função periódica de período 2π.Sem perda de generalidade, f ∈ L2([−π,π]). Então, tem-se:

Teorema 5.4 (Fejér)Se f é uma função periódica e contínua sobre toda a reta real, a sucessão das somas de Fejér σn convergeuniformemente para f em todo o eixo real.

DEMONSTRAÇÃO.

Veja-se o exercício 5.7 para o cálculo de σn(x). Com a técnica da teoria das distribuiçõesdo Capítulo 6, decorre facilmente que |σn(x) − f(x)| → 0.

O teorema 3.4 garante-nos a convergência na norma da série de Fourier sob a condição def ∈ L2. No entanto para se ter convergência uniforme é necessário introduzir as condiçõesde continuidade e de periodicidade para f e pedir que ambas as funções f e f ′ pertençamao espaço de Hilbert L2. Isto é, f ∈ H1 = W 1,2, em que W 1,2 é um espaço de Sobolev.As condições de continuidade e de periodicidade eliminam a possibilidade de existência dofenómeno de Gibbs, responsável pela quebra de convergência uniforme da série de Fourier.Em geral, tem-se que

Convergência uniforme =⇒ Convergência em média quadrática,

mas a implicação inversa não é verdadeira.

A teoria das séries de Fourier permite ainda deduzir alguns resultados importantes:

Teorema 5.5 (desigualdade isoperimétrica, [Stein e Shakarchi, 2003])Seja γ : [a,b] → R2 uma curva fechada simples. Seja ℓ o comprimento da imagem de γ em R2 e seja Aa área da região delimitada por γ. Então,

A ≤ ℓ2

4π.

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76 CONVERGÊNCIA DAS SÉRIES DE FOURIER

A igualdade ocorre se, e somente se, a imagem de γ é uma circunferência.

Teorema 5.6 (teorema de Weyl, [Stein e Shakarchi, 2003])Uma sucessão de números reais ξnn≥1 é equidistribuída no intervalo [0,1) se, e somente se, para todo ointeiro k = 0,

limN→∞

1N

N∑n=1

e2πikξn = 0.

EXERCÍCIOS

5.1 Mostre que a série de Fourier de uma função f(x), no intervalo [−π,π], se pode es-crever na forma

f(x) = A0

2+

∞∑n=1

An sin(nx+ ϕn)

e determine os coeficientes An e ϕn.

5.2 Escreva a função sin(x) no intervalo (0,π) como uma série de cosenos.

5.3 Determine as séries de Fourier das funções:

a) f(x) = |x|, em [−π,π].

b) f(x) = x, em [−π,π].

c) f(x) = cos3 x, em [0,2π].

d) f(x) = 1, em [0,1].

e) f(x) = 1 se x é irracional e f(x) = 0 se x é racional, em [0,1].

5.4 Qual a soma das séries∑∞n=1 1/n4 e

∑∞n=0(−1)n/(2n+ 1)?

5.5 Determine o desenvolvimento de Fourier da função f(x,y) = cos(2y). sin(x), na baseϕnm = ei(nx+my)/2π de L2([−π,π] × [−π,π]).

5.6 Seja f(x) uma função periódica de período 2π e seja,einx /

√2πn∈Z uma base de

L2([−π,π]). Com

fN =N∑

n=−N< ϕn,f > ϕn,

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SÉRIES DE FOURIER 77

mostre que

fN (x) = 12π

∫ π

−πDN (x− y)f(y)dy,

em que

DN (x) = sin((N + 1/2)x)sin(x/2)

é o núcleo de Dirichlet. Estude o gráfico da função DN (x).

5.7 Seja f(x) ∈ L2([−π,π]) uma função periódica de período 2π. Com, fN =∑Nn=−N <

ϕn,f > ϕn, seja a soma de Fejér

σn = f0(x) + f1(x) + . . .+ fn−1(x)n

.

Mostre que

σn(x) =∫ π

−πΦn(x− y)f(y)dy,

em que

Φn(x) = 12nπ

(sin(nx/2)sin(x/2)

)2

é o núcleo de Fejér. Estude o gráfico da função ΦN (x).

5.8 Seja o operador Tϕ(x,y) = ϕ(y,x) com ϕ ∈ L2([−π,π] × [−π,π]). Qual a represen-tação do operador T na base de Fourier de L2([−π,π]× [−π,π])? Os elementos destabase são ϕnm = ei(nx+my)/2πn,m∈Z. Verifique que o operador T é autoadjunto.

5.9 Sejam f(t) e g(t) duas funções periódicas de período 2π. Assuma que f,g ∈ L2([0,2π]).Determine o desenvolvimento de Fourier da convolução entre f e g, definida por

f ∗ g :=∫ 2π

0f(t− x)g(x)dx .

5.10 Seja o funcional linear f : ℓ2 → R, em que f(x) =∑n≥1

xn

n . Mostre que f defineum operador linear e limitado e determine a norma de f(x).

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6DISTRIBUIÇÕES

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DISTRIBUIÇÕES 81

Introduzem-se os conceitos de espaço de funções de teste, de distribuição e de função generalizada.Estudam-se algumas das propriedades das distribuições e estuda-se a distribuição delta de Dirac.Introduz-se a derivação no sentido das distribuições e relacionam-se as distribuições com as séries deFourier.

6.1 FUNCIONAIS LINEARES E DISTRIBUIÇÕES

O conceito de distribuição generaliza o de função. As distribuições ou funções generali-zadas surgem no estudo de interações fortemente localizadas. É o caso, por exemplo, doestudo de campos elétricos produzidos por partículas pontuais carregadas.

Seja φ uma função com domínio em R (ou Rn) e de suporte compacto, isto é, o fecho doconjunto x : φ(x) = 0 é compacto. Suponha-se ainda que existem todas as derivadas deφ(x) e que são contínuas. Esta classe de funções é designada por C∞

c (R). Para abreviar anotação escreve-se D := C∞

c (R). O conjunto D tem uma estrutura de espaço vetorial e édesignado por espaço de base das distribuições ou espaço das funções de teste.

Um exemplo de uma função φ ∈ D é

φ(x) =

e

a2x2−a2 |x| ≤ a

0 |x| > a .(6.1)

Na figura 6.1, estão representados os gráficos das funções de teste φ(x) e φ′(x), para a = 1.

Uma sucessão φn, com φn ∈ D, converge para φ ∈ D, se:

a) Os suportes de todos os φn estão contidos num conjunto limitado de R.

b) As derivadas de todas as ordens de φn — φ(p)n — convergem uniformemente para

as derivadas de φ, φ(p)n → φ(p), quando n → ∞.

Seja D o espaço das funções de teste. Um funcional linear contínuo ou distribuição é uma apli-cação F : D → C que obedece a:

a) F (aφ) = aF (φ), com a ∈ C, e φ ∈ D.

b) F (φ+ ψ) = F (φ) + F (ψ), com φ,ψ ∈ D (linearidade).

c) F (φn) → F (φ), sempre que φn → φ ∈ D (continuidade).

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82 FUNCIONAIS LINEARES E DISTRIBUIÇÕES

φ()

- -

φ()

- -

-

Figura 6.1 Gráficos das funções de teste φ(x) e φ′(x), em que φ(x) está definida em (6.1), com a = 1.

O conjunto das distribuições sobre D designa-se por D′. Se φ ∈ D, então F ∈ D′. Muitasvezes também se usam as notações, D(R), D′(R), D(Ω) e D′(Ω), em que Ω é um conjuntoaberto de R.

Veja-se um exemplo de distribuição — distribuição regular. Seja f uma função localmenteintegrável em R, isto é, f é integrável sobre qualquer conjunto limitado de R, f ∈ L1

loc(R).O funcional linear contínuo (ou distribuição) gerado por f é definido como

Ff (φ) =∫ +∞

−∞f(x)φ(x)dx . (6.2)

O funcional Ff designa-se por distribuição regular. A linearidade decorre da linearidade dointegral, bastando verificar a continuidade de Ff (φ). Suponha-se que φn → φ, e que osuporte das funções φn está contido num conjunto limitado [a,b] ⊂ R. Então

|Ff (φn) − Ff (φ)| =

∣∣∣∣∣∫ b

a

f(x)(φn(x) − φ(x))dx

∣∣∣∣∣≤∫ b

a

|f(x)|.|φn(x) − φ(x)|dx → 0,

quando n → ∞ e pelo teorema da convergência dominada (teorema1.4). Através de(6.2), mostrou-se que uma função localmente integrável e contínua define uma distribuição.Muitas vezes, por abuso de linguagem, identifica-se a distribuição (Ff (φ)) com a funçãoque a gera (f ).

No entanto, existem funcionais lineares contínuos ou distribuições que não podem ser pos-tos na forma (6.2). É o caso das distribuições não regulares.

Veja-se um exemplo de distribuição não regular — a distribuição δ de Dirac. Suponha-se

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DISTRIBUIÇÕES 83

φ ∈ D e seja o funcional definido por

F (φ) = φ(0) . (6.3)

Esta relação define uma distribuição, pois

a) F (aφ) = aφ(0) = a F (φ).

b) F (φ+ ψ) = (φ+ ψ)(0) = φ(0) + ψ(0) = F (φ) + F (ψ).

c) Se, φn → φ em D, F (φn) = φn(0) → φ(0), ou seja, F (φn) → F (φ).

A relação (6.3) define uma distribuição não regular que se designa por distribuição δ de Dirac.

No que se segue, Ff (ϕ) ou Ff referem-se a distribuições regulares. F (ϕ) ou F referem-sea distribuições não regulares.

Veja-se como obter uma interpretação funcional para a distribuição definida por (6.3). Deacordo com a definição de distribuição, diz-se que uma sucessão de distribuições Fn =Ffn converge para uma distribuição Ff se, para todo o φ ∈ D, a sucessão de integrais

Fn(φ) =∫ +∞

−∞fn(x)φ(x)dx

é convergente. Sendo esta sucessão de integrais convergente, usa-se a notação∫ +∞

−∞fn(x)φ(x)dx −→

∫ +∞

−∞f(x)φ(x)dx,

mas f(x) pode não definir uma função no sentido usual do termo.

Seja, então, a sucessão de funções (figura 6.2)

fn(x) =√n

πe−nx2

(6.4)

e a sucessão de distribuições regulares

Fn(φ) =∫ +∞

−∞fn(x)φ(x)dx =

√n

π

∫ +∞

−∞e−nx2

φ(x)dx, (6.5)

em que φ(x) ∈ D.

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84 FUNCIONAIS LINEARES E DISTRIBUIÇÕES

()

()

- -

Figura 6.2 Gráficos de elementos da família de funções fn, definidas em (6.4), que converge para afunção generalizada ou distribuição delta de Dirac.

Como √n

π

∫ +∞

−∞e−nx2

dx =√n

π

1√n

∫ +∞

−∞e−(

√nx)2

d(√nx)

= 1√π

∫ +∞

−∞e−y2

dy = 1√π

√π = 1,

pode-se mostrar que limn→∞ |Fn(φ) − φ(0)| = 0. De facto,

|Fn(φ) − φ(0)| =∣∣∣∣∫ +∞

−∞fn(x)φ(x)dx− φ(0)

∣∣∣∣=

∣∣∣∣∫ +∞

−∞fn(x)φ(x)dx−

∫ +∞

−∞φ(0)fn(x)dx

∣∣∣∣=

∣∣∣∣∫ +∞

−∞fn(x)(φ(x) − φ(0))dx

∣∣∣∣≤

∫ +∞

−∞|φ(x) − φ(0)| .|fn(x)|dx .

Mas como, |φ(x) − φ(0)| = ϕ′(ξ)|x| ≤ M |x|, pois φ ∈ D, tem-se que

|Fn(φ) − φ(0)| ≤ M

∫ +∞

−∞|x|.|fn(x)|dx = 2M

√n

π

∫ +∞

0xe−nx2

dx

= −2M√n

π

12ne−nx2

∣∣∣∣+∞

0= M√

nπ.

Assim, quando n → ∞,

|Fn(φ) − φ(0)| ≤ M√nπ

−→ 0 .

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DISTRIBUIÇÕES 85

Então, a distribuição limite de Fn(φ) obedece a F (φ) = φ(0). Comofn(x) → 0 se x = 0fn(0) → +∞ se x = 0,

define-se simbolicamente a função generalizada delta de Dirac por

limn→∞

fn(x) := δ(x) =

0 se x = 0+∞ se x = 0 .

A distribuição assim construída é o funcional linear

Fδ(φ) = limn→+∞

∫ +∞

−∞fn(x)φ(x)dx =

∫ +∞

−∞δ(x)φ(x)dx = φ(0) .

AdistribuiçãoFδ(φ) designa-se por distribuição delta de Dirac. Como é uso corrente, confunde--se a distribuição Fδ(φ) com a função generalizada δ(x) e, por abuso de linguagem, diz-seque δ(x) é a distribuição delta de Dirac.

Por exemplo, com fn(x) =√

nπ e

−nx2 , tem-se que

limn→∞

∫ x

−∞fn(y)dy =

∫ x

−∞δ(y)dy =

0 (x < 0)1/2 (x = 0)1 (x > 0)

= H(x)

e faz sentido escrever simbolicamente, δ(x) = H ′(x). Por outro lado, fazendo x → ∞ nointegral anterior, obtém-se ∫ ∞

−∞δ(y)dy = 1,

e a distribuição δ(x) tem o significado de uma densidade de medida concentrada numponto. Daí o nome de distribuição, fazendo recordar distribuição de cargas ou distribuiçãode massas.

A abordagem da teoria das distribuições que se apresentou é uma simplificação devido aofacto de as funções de teste terem sido consideradas como funções de suporte limitado.No entanto, os resultados apresentados continuam a ser válidos quando, no limite em quex → ±∞, as funções de teste decrescem muito rapidamente para zero. Neste caso, asdistribuições construídas designam-se por distribuições temperadas.

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86 DERIVADAS DE DISTRIBUIÇÕES

6.2 DERIVADAS DE DISTRIBUIÇÕES

Pode-se definir a distribuição derivada de uma distribuição regular Ff (φ) como

d

dxFf (φ) : =

∫ +∞

−∞f ′(x)φ(x)dx, (6.6)

em que φ ∈ D e f ′(x) tem apenas um carácter simbólico. Se Ff (φ) é uma distribuiçãoregular e a função f é diferenciável, então a definição anterior faz sentido. Neste caso,tem-se

d

dxFf (φ) =

∫ +∞

−∞f ′(x)φ(x)dx = f(x)φ(x)|+∞

−∞ −∫ +∞

−∞f(x)φ′(x)dx

= −∫ +∞

−∞f(x)φ′(x)dx,

(6.7)

pois, como φ ∈ D, φ(±∞) = 0. Vai-se então utilizar (6.7) para definir a derivada de umadistribuição.

A derivada da distribuição Ff (φ) é o funcional linear contínuo definido por

d

dxF (φ) := −F (φ′) (6.8)

e, no caso das distribuições regulares, a derivada da função que gera a distribuição nãointervém na definição. Isto elimina os problemas que se encontram quando se deriva umafunção generalizada ou uma função com descontinuidades e localmente integrável.

Para que a derivação no sentido das distribuições faça sentido com o significado de derivada, temde se verificar que, para distribuições regulares, a definição (6.8) é consistente com (6.6).Então, se f(x) é uma função contínua e diferenciável,

d

dxFf (φ) := −

∫ +∞

−∞f(x)φ′(x)dx

= − f(x)φ(x)|+∞−∞ +

∫ +∞

−∞f ′(x)φ(x)dx

=∫ +∞

−∞f ′(x)φ(x)dx = Ff ′(x).

Isto é, a derivada da distribuição regular gerada por f é igual à distribuição gerada por f ′.

Tem-se, assim, o resultado elementar:

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DISTRIBUIÇÕES 87

Lema 6.1a) Uma distribuição tem derivadas de todas as ordens,

dn

dxnF (φ) = (−1)nF (φ(n))

em que φ ∈ D.b) Se uma sucessão de distribuições Ffn converge para a distribuição Ff, então, Ff ′

n converge para

a distribuição Ff ′ .

Veja-se um exemplo. Seja a função de Heaviside

Heav (x) =

1 se x ≥ 00 se x < 0 .

Então, a distribuição regular associada é

FHeav(φ) =∫ +∞

−∞Heav (x)φ(x)dx =

∫ +∞

0φ(x)dx

ed

dxFHeav(φ) = −

∫ +∞

0φ′(x)dx = −φ(x)|+∞

0 = φ(0) .

Donde se conclui que ddxFHeav(φ) é a distribuição δ de Dirac. Então, a derivada da distri-

buição gerada pela função de Heaviside é a distribuição delta de Dirac, ou seja

d

dxFHeav(φ) =

∫ +∞

−∞δ(x)φ(x)dx . (6.9)

A expressão (6.9) escreve-se simbolicamente na forma ddx Heav(x) = δ(x).

Veja-se o que se passa para funções com uma infinidade numerável de descontinuidades.

Suponha-se que f possui derivada contínua exceto num número finito ou numerável dedescontinuidades isoladas (figura 6.3), nas quais possui limites laterais. Isto é, nos pontosxi, f(xi+) = f(xi−), em que i ∈ Q e Q é um conjunto finito ou numerável. Calcule-se a

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88 DERIVADAS DE DISTRIBUIÇÕES

- + +

-

Figura 6.3 Gráfico de uma função com uma infinidade numerável de descontinuidades isoladas.

derivada de f(x) no sentido das distribuições:

d

dxFf (φ) = −

∫ +∞

−∞f(x)φ′(x)dx = −

∑i∈Q

∫ xi

xi−1

f(x)φ′(x)dx

= −∑i∈Q

f(x)φ(x)∣∣∣xi−xi−1+ +

∑i∈Q

∫ xi

xi−1

f ′(x)φ(x)dx

= −∑i∈Q

(f(xi−)φ(xi) − f(xi−1+)φ(xi−1)) +∫ +∞

−∞f ′(x)φ(x)dx

=∑i∈Q

φ(xi) (f(xi+) − f(xi−)) +∫ +∞

−∞f ′(x)φ(x)dx

=∑i∈Q

(f(xi+) − f(xi−))∫ +∞

−∞δ(x− xi)φ(x)dx+ Ff ′(φ).

Isto é, no sentido das distribuições,

d

dxf(x) = f ′(x) +

∑i∈Q

hiδ(x− xi),

em que hi = (f(xi+) − f(xi−)) são constantes.

Por exemplo, seja a função

f(x) =

π−x

2 0 ≤ x ≤ π

− π+x2 − π ≤ x < 0 .

(6.10)

Como f(x) é uma função ímpar (figura 6.4), os únicos coeficientes de Fourier não nulos

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DISTRIBUIÇÕES 89

são os coeficientes bn = 1/n, com n ≥ 1, e

f(x) =+∞∑n=1

1n

sinnx . (6.11)

A série (6.11) é convergente em todo o eixo real para uma função periódica de período 2π,e tem uma infinidade numerável de descontinuidades em x = 2πn, com n ∈ Z. Então, aderivada de f(x), no sentido das distribuições, é

d

dxf(x) = −1

2+

+∞∑k=−∞

πδ(x− 2πk) =+∞∑n=1

cosnx,

donde resulta que1

2π+ 1π

∞∑n=1

cosnx =+∞∑

k=−∞

δ(x− 2πk) . (6.12)

A relação (6.12) define a série de Fourier da distribuição δ de Dirac.

- - - -

-

Figura 6.4 Gráfico da função (6.10).

De facto, a função generalizada ou distribuição δ(x), restringida ao intervalo [−π,π], podeser escrita na forma de uma série de Fourier, no sentido das distribuições. Assim, com

bn = 1π

∫ π

−πδ(x) sin xn dx = 0

an = 1π

∫ π

−πδ(x) cosnx dx = 1

πcos 0 = 1

π,

a série de Fourier da função δ(x) é

δ(x) = 12π

+ 1π

∞∑k=1

cos kx|[−π,π] .

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90 DERIVADAS DE DISTRIBUIÇÕES

Como a função cos(kx) está definida para todo o eixo real, tem-se, então, que

+∞∑k=−∞

δ(x− 2πk) = 12π

+ 1π

∞∑k=1

cos kx . (6.13)

Isto sugere que os desenvolvimentos de Fourier podem ainda ser usados no sentido dasdistribuições. Devido à forma do desenvolvimento de Fourier de δ(x), a distribuição deltade Dirac é uma função generalizada par.

A relação anterior mostra ainda que faz sentido definir distribuições periódicas. O funcio-nal linear contínuo Ff (φ) é uma distribuição periódica de período T se

Ff (φ(x+ T )) = Ff (φ(x)).

É fácil verificar que (6.13) define uma distribuição periódica com período 2π.

Suponha-se que f(x) é uma função de um espaço de Hilbert H e que ϕn é uma baseortonormada de H . Como se viu no capítulo 3, pelo teorema 3.4,

f(x) =∑n

cnϕn(x) =∑n

< ϕn,f > ϕn(x)

=∑n

(∫ϕ∗n(y)f(y)dy

)ϕn(x) =

∫f(y)dy

(∑n

ϕ∗n(y)ϕn(x)

).

(6.14)

Comparando (6.14) com a definição de distribuição delta de Dirac, decorre que∑n

ϕ∗n(y)ϕn(x) = δ(x− y) = δ(y − x) . (6.15)

Assim, mostrou-se que se ϕn é uma base completa do espaço de HilbertH , tem-se neces-sariamente (6.15). Por exemplo, no espaço deHilbertL2([−π,π]), com a base ortonormadacompleta ϕn = einx/

√2πn∈Z, tem-se que

δ(x− y) = δ(y − x) = 12π

∞∑k=−∞

ek(x−y) = 12π

+ 1π

∞∑k=1

cos k(x− y).

Analogamente, no espaço de Hilbert L2([−1,1]), com a base completa dos polinómios deLegendre, tem-se que

δ(x− y) = δ(y − x) =∞∑n=0

2n+ 12

Pn(y)Pn(x) .

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DISTRIBUIÇÕES 91

Todas as propriedades das distribuições definidas no espaço das funções de teste D po-dem ser generalizadas quando o espaço das funções de teste é constituído por funções comdecrescimento rápido quando x → ±∞. Neste último caso, diz-se que se está no con-texto das distribuições temperadas e o espaço das funções de teste designa-se por espaço deSchwartz. Por exemplo, o espaço de Schwartz S(R) é o conjunto das funçõesφ : R → R in-finitamente diferenciáveis que, quando |x| → ∞, decrescem para zero, juntamente com asderivadas de todas as ordens e multiplicadas por qualquer polinónmio. Assim, φ ∈ S(R) seas derivadas de φmultiplicadas por qualquer potência de |x| convergem para zero quando|x| → ∞. Por exemplo, e−x2 ∈ S(R) e 1/(1 + x2) ∈ S(R).

Na maioria das aplicações, usam-se distribuições temperadas. Como do ponto de vistatécnico não existem ganhos significativos com o formalismo das distribuições temperadas,optou-se por expor a abordagem mais simples.

EXERCÍCIOS

6.1 Mostre que a distribuição limite de

Ffn(ϕ) = 1π

∫ +∞

−∞

n

1 + n2x2ϕ(x)dx,

com ϕ no espaço das funções de suporte limitado, é a distribuição delta de Dirac.

6.2 Usando os resultados do Exercício 5.6, conclua que

limN→∞

12π

sin((N + 1/2)x)sin(x/2)

= δ(x)

em que δ(x) é a distribuição delta de Dirac.

6.3 Mostre as seguintes propriedades da função δ de Dirac:

a) δ(x) = δ(−x).

b) δ(ax) = 1|a|δ(x), com a = 0.

c) xδ(x) = 0.

d) xδ′(x) = −δ(x).

e) f(x)δ(x− a) = f(a)δ(x− a).

f)∫δ(x− y)δ(y − z)dy = δ(x− z).

g) Se g(xn) = 0 e g′(xn) = 0 então, δ(g(x)) =∑n

1|g′(xn)|δ(x − xn), em que o

somatório é tomado sobre todos os zeros de g.

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92 DERIVADAS DE DISTRIBUIÇÕES

6.4 Calcule∫δ′(x− a)f(x)dx.

6.5 Seja a função f(x) = sinal(x). Encontre a sua derivada no sentido das distribuições.

6.6 Calcule a segunda derivada no sentido das distribuições de uma função com umainfinidade numerável de descontinuidades.

6.7 Calcule a segunda derivada no sentido das distribuições das funções f(x) = | sin x| eg(x) = |x|, com x ∈ R.

6.8 Uma partícula demassam desloca-se em linha reta e está sujeita a uma força periódicaimpulsiva: F =

∑+∞k=−∞ αkδ(t−kT ). Se no instante t = 0 a partícula tem velocidade

v0, determine a sua velocidade ao fim do tempo nT .

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7A EQUAÇÃO DAS ONDAS I : OSCILAÇÕES TRANSVERSAIS

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A EQUAÇÃO DAS ONDAS I : OSCILAÇÕES TRANSVERSAIS 95

Deriva-se a equação geral das ondas transversais e obtém-se a equação linear das ondas. Determinam--se soluções de equilíbrio e soluções estacionárias com condições fronteira finitas. Deriva-se a soluçãode d’Alembert em meios infinitos e estudam-se casos simples de reflexão de ondas com vários tiposde condições fronteira. É deduzida a expressão geral da energia para a equação das ondas e faz-seuma primeira abordagem à teoria dos campos. Analisa-se o fenómeno de ressonância. Estuda-se ainvariância da equação das ondas para a transformação de Lorentz. Introduzem-se os conceitos desoluções fortes e fracas de uma equação às derivadas parciais.

7.1 A EQUAÇÃO DAS ONDAS

Quando se percute levemente uma corda sob tensão, gera-se um movimento oscilatóriotransversal. Vai-se, então, deduzir a equação do movimento oscilatório transversal de umacorda de densidade linear de massa ρ ≡ ρ(x,y,t).

Num instante t, considere-se um troço de corda entre dois pontos num plano vertical, decoordenadas ra e rb, como se indica na figura 7.1. No plano vertical de coordenadas (x,y),cada ponto da corda tem coordenadas

r = (0,0) + xex + y(x,t) ey

e o vetor tangente a cada ponto da corda é

v = dr

dx= 1ex + ∂y

∂xey,

e ||v|| =√

1 +(∂y∂x

)2.

Figura 7.1 Posição geral de uma corda no plano vertical (x,y), no instante t. A corda passa pelos pontos decoordenadas ra e rb. A corda pode estar sujeita a uma força vertical Fext.

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96 A EQUAÇÃO DAS ONDAS

A força total que atua o segmento de corda [a,b] é igual à soma da força exterior por unidadede comprimento Fext(x,y,t) = Fext(x,y,t)ey com a força de tensão T . A força de tensãomantém a coesão da corda, isto é, a tensão é uma força de ligação, tangente à corda emcada um dos seus pontos. Assumindo que a corda não se parte, a resultante da força detensão é diferente de zero nos extremos da corda. No interior da corda, a força de tensãoé anulada pelas forças de coesão molecular.

Como em cada ponto da corda a tensão atua segundo a tangente à corda, a força total queatua a corda no segmento [a,b] é

Ft(x,y,t) =∫ b

a

Fext(x,y,t) dx+ T (x,y,t)ex + ∂y

∂x ey√1 +

(∂y∂x

)2

∣∣∣∣∣∣∣∣b

a

.

Considerando que não existe movimento longitudinal (segundo x), a componente segundoex da força total é necessariamente nula. Assim, T (x,y,t) ≡ T (y,t) e a componente verticalda força total é

Fy(y,t) =∫ b

a

Fext(x,y,t) dx+ T (y,t)∫ b

a

∂x

∂y

∂x

1√1 +

(∂y∂x

)2

dx, (7.1)

em que, para simplificar a notação, Fy é a componente segundo ey de Ft e Fext é a com-ponente segundo ey da força exterior por unidade de comprimento.

Por outro lado, como a variação do momento linear da corda no segmento [a,b] é

d

dt

∫ b

a

ρ∂y

∂tdx, (7.2)

pela segunda lei de Newton, a força total que atua a corda na região espacial [a,b] é igualà variação do momento linear total, pelo que, igualando (7.1) a (7.2), obtém-se

d

dt

∫ b

a

ρ∂y

∂tdx = T (y,t)

∫ b

a

∂x

∂y

∂x

1√1 +

(∂y∂x

)2

dx+∫ b

a

Fext(x,y,t)dx . (7.3)

Se f é uma função integrável e absolutamente contínua num intervalo [a,b], pelo teoremafundamental do calculo, e se

∫ xaf(t)dt = 0, para todo x ∈ [a,b], então f = 0 (q.t.p.).1 Com

1Uma função definida num intervalo [a,b], integrável e absolutamente contínua é equivalente a dizer que f =f(a) +

∫ xaf ′(t)dt e f ′ existem (q.t.p).

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A EQUAÇÃO DAS ONDAS I : OSCILAÇÕES TRANSVERSAIS 97

este resultado, assumindo ainda que ρ e T são constantes, e como a igualdade (7.3) é válidapara qualquer escolha de a e b, a equação anterior reduz-se a

ρ∂2y

∂t2= T

∂x

∂y

∂x

1√1 +

(∂y∂x

)2

+ Fext(x,y,t), (7.4)

ou seja,

ρ∂2y

∂t2= T

∂2y

∂x21(

1 +(∂y∂x

)2)3/2 + Fext(x,y,t) . (7.5)

A equação (7.5) é a equação das ondas transversais, ou equação das cordas, e descreve o movimentotransversal de uma corda.

Para o caso demovimentos transversais de pequena amplitude relativamente a uma posiçãode equilíbrio, pode-se desenvolver em série o segundo membro da equação (7.5),

1(1 +

(∂y∂x

)2)3/2 = 1 − 3

2

(∂y

∂x

)2

+ O(4)

e a equação (7.5) simplifica-se, obtendo-se

ρ∂2y

∂t2= T

∂2y

∂x2 + Fext(x,y,t) . (7.6)

Como T e ρ são constantes, a equação (7.6) reduz-se a

∂2y

∂t2= c2 ∂

2y

∂x2 + 1ρFext(x,y,t), (7.7)

em que c2 = T/ρ. Com [T ] =kg m s−2 e [ρ] =kg m−1, vem que [c2] =m2 s−2 e a constantec tem as dimensões de uma velocidade. Como se acabou de mostrar, a equação das ondas(7.7) é uma equação de movimento aproximada.

A equação (7.7) designa-se por equação linear das ondas transversais ou, simplesmente, por equa-ção das ondas. Do ponto de vista formal, a equação (7.7) é o protótipo de uma equação àsderivadas parciais do tipo hiperbólico.

No caso dos deslocamentos transversais de uma membrana elástica, a equação que des-creve os pequenos deslocamentos transversais é

∂2ϕ

∂t2= c2

(∂2ϕ

∂x2 + ∂2ϕ

∂y2

). (7.8)

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98 SOLUÇÕES DE EQUILÍBRIO DA EQUAÇÃO DAS ONDAS

As oscilações transversais de corpos extensos são descritas pela equação

∂2ϕ

∂t2= c2

(∂2ϕ

∂x2 + ∂2ϕ

∂y2 + ∂2ϕ

∂z2

). (7.9)

Muitas vezes a equação (7.9) escreve-se na forma sintética ∂2ϕ∂t2 = c2∆ϕ, em que ∆ =(

∂2

∂x2 + ∂2

∂y2 + ∂2

∂z2

)é o operador de Laplace ou laplaciano.

7.2 SOLUÇÕES DE EQUILíBRIO DA EQUAÇÃO DAS ONDAS

Determine-se a forma de uma corda com extremos fixos, em equilíbrio no campo gravítico,e calcule-se a tensão T .

A força exterior por unidade de comprimento que atua uma corda num campo gravíticoé Fext = −ρg, em que g é a aceleração da força da gravidade.2 Supondo que a corda estáem equilíbrio, ∂

2y∂t2 = 0, a equação das ondas (7.7) reduz-se à equação diferencial

d2y

dx2 = ρg

T. (7.10)

A solução desta equação é

y(x) = a+ bx+( ρg

2T

)x2,

em que a e b são constantes a determinar. Introduzindo nesta solução as condições deextremos fixos, y(0) = y(ℓ) = 0, vem que a = 0, b = − ρg

2T ℓ e a solução de equilíbrio dacorda é

y(x) = x(x− ℓ)( ρg

2T

). (7.11)

Assim, no equilíbrio, a corda tem a forma de uma parábola que passa pelos pontos y(0) =y(ℓ) = 0, figura 7.2. Calculando a altura da parábola no ponto y(ℓ/2), a corda tem umvão de altura h = ρgℓ2/8T . Medindo a altura do vão e sabendo a densidade da corda,pode-se determinar a tensão T . Esticando a corda de modo a que o seu comprimento sejaℓ, a tensão na corda torna-se infinita.

Através da equação não linear das ondas (7.5), por analogia com o que se acabou de fazer,a equação que descreve a solução de equilíbrio de uma corda presa nos extremos é

∂2y

∂x21(

1 +(∂y∂x

)2)3/2 = d, (7.12)

2Como o potencial gravítico é V (r) = −GMm/r, vem que, Fext = −GMm/r2er . À superfície da Terra,r = RT , pelo que Fext = −mg, em que g = GM/R2

T.

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A EQUAÇÃO DAS ONDAS I : OSCILAÇÕES TRANSVERSAIS 99

ℓ=ℓρ /

Figura 7.2 Soluções de equilíbrio de uma corda num campo gravítico e presa nos extremos. A solução deequilíbrio parabólica (7.11) (linha fina) foi obtida como solução da equação linear das ondas (7.7). A solução de

equilíbrio circular (7.13) (linha grossa) foi obtida como solução da equação não linear das ondas (7.5).

em que d = ρg/T é constante. Por integração direta desta equação, obtém-se

∂y

∂x

1(1 +

(∂y∂x

)2)1/2 = dx+ α,

em que α é uma nova constante de integração. Resolvendo esta última equação em ordema ∂y∂x , tem-se que

∂y

∂x= dx+ α(

1 − (dx+ α)2)1/2 .

Integrando esta última equação por quadraturas, obtém-se

dy + β = −√

1 − (dx+ α)2

e β é outra constante de integração. A solução de equilíbrio assim obtida pode-se aindaescrever na forma (

y + β

d

)2

+(x+ α

d

)2= 1d2 , (7.13)

donde se conclui que a corda tem a forma de um arco de circunferência, centrada no pontode coordenadas (

x0 = −α

d, y0 = −β

d

),

com raio r = 1/d. Devido às condições fronteira y(0) = y(ℓ) = 0 e por simetria, vem quex0 = ℓ/2 e, portanto,

α = −d ℓ2

e β = −√

1 − d2ℓ2/4.

Assim, a altura do vão da corda no ponto x0 = ℓ/2 é

h = 1d

(1 −

√1 − d2ℓ2/4

)≃ dℓ2

8+ d3ℓ4

128+ · · · , (7.14)

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100 SOLUÇÕES ESTACIONÁRIAS DA EQUAÇÃO DAS ONDAS

em que d = ρg/T . Na figura 7.2 está representada a solução de equilíbrio (7.13) da equaçãonão linear (7.12). Como se vê por (7.14), as alturas do vão da corda para o caso linear enão linear são próximas.

7.3 SOLUÇÕES ESTACIONÁRIAS DA EQUAÇÃO DAS ONDAS

Vai-se obter a solução da equação linear das ondas (7.7), para o caso em que Fext = 0.Considera-se uma corda presa em dois pontos e o movimento transversal da corda decorrenum plano. Os extremos da corda estão fixos nos pontos de coordenadas (x = 0,y = 0) e(x = ℓ,y = 0), e a corda está presa sob tensão (figura 7.3). A forma da corda no instantet ≥ 0 é descrita por uma função y = ψ(x,t), com x ∈ [0,ℓ]. A função ψ(x,t) tem de sersolução da equação das ondas (7.7).

ψ()=()

Figura 7.3 Condição inicial de uma corda presa nos extremos x = 0 e x = ℓ (y = ψ(x,t = 0)).

Assuma-se que a função y = ψ(x,t) está no espaço de Hilbert L2([0,ℓ]) ∩ C2([0,ℓ]), paratodo o t ≥ 0. A determinação de ψ só é possível se forem especificadas a posição inicial dacorda, a sua velocidade inicial e as condições fronteira. Assim, para determinar as soluçõesda equação linear das ondas, introduzem-se as seguintes condições:

1) Posição inicial da corda no instante t = 0: ψ(x,t = 0) = f(x) (figura 7.3).

2) Velocidade transversal inicial da corda no instante t = 0: ∂ψ∂t (x,t) |t=0 = g(x).

3) Condições fronteira: ψ(x = 0,t) = ψ(x = ℓ,t) = 0, para todo o t ≥ 0.

As condições 1)-3) designam-se por condições de Cauchy.

Procure-se, então, a solução da equação das ondas (7.7), comFext = 0 e sujeita às condiçõesde Cauchy 1)-3). Assumindo que, para cada valor de t, ψ(x,t) ∈ L2([0,ℓ]) ∩ C2([0,ℓ]), aequação das ondas pode ser escrita na forma

∂2ψ

∂t2= Tψ,

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A EQUAÇÃO DAS ONDAS I : OSCILAÇÕES TRANSVERSAIS 101

em que T = c2 ∂2

∂x2 : H ⊂ L2([0,ℓ]) ∩ C2([0,ℓ]) → H é um operador num espaço deHilbert. Como se viu no Exercício 4.3 b), para as condições fronteira 3), o operador Ttem um espetro discreto com uma infinidade numerável de valores e vetores próprios.Designem-se por ψn(x) os vetores próprios de T , a que correspondem os valores própriosλn (Tψn = λnψn).3 Estes vetores próprios não geram todo o espaço de Hilbert L2([0,ℓ]),mas sim um subespaço vetorial H ⊂ L2([0,ℓ]) ∩ C2([0,ℓ]) constituído pelas funções duasvezes diferenciáveis e que se anulam em x = 0 e x = ℓ. Para as condições fronteira consi-deradas e devido à linearidade do operador T , a solução da equação das ondas escreve-sena forma ψ(x,t) =

∑n cn(t)ψn(x), em que os cn(t) são funções a determinar. Como se

viu no Exercício 4.3 b), para as condições fronteira consideradas, as soluções da equaçãoaos valores próprios Tψn = λnψn são ψn(x) = sin(nπx/ℓ), a que correspondem os valorespróprios λn = −n2π2/ℓ2, com n ≥ 1. Assim, a solução geral da equação das ondas, queobedece à condição 3), é

ψ(x,t) =∞∑n=1

cn(t) sin nπℓx . (7.15)

Claro que, para t fixo, ψ(x,t) está definida num subespaço H de dimensão infinita doespaço de Hilbert L2([0,ℓ]). Como o termo dentro do somatório em (7.15) é o produto deduas funções nas variáveis x e t, diz-se que as variáveis t e x estão separadas.

Determine-se uma forma explícita para os coeficientes cn. Introduzindo (7.15) na equaçãolinear das ondas (7.7), com Fext = 0, obtém-se

c′′n(t) + c2n

2π2

ℓ2 cn(t) = 0, (7.16)

que tem a solução geral

cn(t) = Anei cnπ

ℓ t +Bne−i cnπ

ℓ t

= (An +Bn) cos cnπℓt+ i(An −Bn) sin cnπ

ℓt,

em que An e Bn são constantes. Como

cn(t)ψn(x) = an sin nπℓx cos cnπ

ℓt+ bn sin nπ

ℓx sin cnπ

ℓt,

em que an e bn são novas constantes a determinar, pelas condições iniciais 1) e 2) e por

3A equação aos valores próprios Tψ = λψ, em que T = ∆, designa-se por equação de Helmholtz.

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102 SOLUÇÕES ESTACIONÁRIAS DA EQUAÇÃO DAS ONDAS

(7.15), a solução da equação das ondas associada às condições de Cauchy 1) – 3) é

ψ(x,t) =∞∑n=1

cnψn(x,t)

=∞∑n=1

(an sin nπ

ℓx cos cnπ

ℓt+ bn sin nπ

ℓx sin cnπ

ℓt)

=∞∑n=1

(an cos cnπ

ℓt+ bn sin cnπ

ℓt)

sin nπℓx.

(7.17)

Impondo a condição inicial 1) à função ψ(x,t),

ψ(x,0) = f(x) =∞∑n=1

an sin nπℓx . (7.18)

Multiplicando por sin nπℓ x a expressão anterior e integrando no intervalo [0,ℓ], obtém-se

an = 2ℓ

∫ ℓ

0f(x) sin nπ

ℓx dx .

Assim, as constantes an da solução (7.17) da equação das ondas determinam-se desenvol-vendo em série de Fourier a função inicial f(x). De igual modo, a condição 2) implicaque

∂tψ(x,t) |t=0 = g(x) =

∞∑n=1

cnπ

ℓbn sin nπ

ℓx . (7.19)

Multiplicando por sin nπℓ x esta expressão e integrando no intervalo [0,ℓ], os coeficientes bn

da solução da equação das ondas determinam-se através da velocidade inicial da corda,

bn = 2cnπ

∫ ℓ

0g(x) sin nπ

ℓx dx . (7.20)

Está assim determinada a solução da equação das ondas com extremos fixos e sujeita àscondições de Cauchy 1)-3).

Nas condições do problema de Cauchy, para cada t, a solução da equação das ondas comextremos fixos pertence ao espaço de HilbertL2([0,ℓ]). Como a equação das ondas envolvesegundas derivadas em ordem ao espaço, tem que se ter necessariamente, para cada t,ϕ(x,t) ∈ L2([0,ℓ]) ∩ C2([0,ℓ]), e, portanto, f,g ∈ L2([0,ℓ]) ∩ C2([0,ℓ]). Nestas condições,diz-se que ϕ(x,t) ∈ L2([0,ℓ]) ∩ C2([0,ℓ]) é uma solução clássica, ou solução forte, da equaçãodas ondas. No entanto, as expressões (7.17)-(7.19) são válidas para o caso mais geral em

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A EQUAÇÃO DAS ONDAS I : OSCILAÇÕES TRANSVERSAIS 103

que ϕ(x,t) ∈ L2([0,ℓ]), obedecendo às condições fronteira 3). Mais à frente, analisaremosalgumas destas situações mais gerais.

A análise feita até aqui pode ser resumida no teorema seguinte:

Teorema 7.1Seja a equação homogénea das ondas (equação (7.7) com Fext = 0). Considerem-se as condições deCauchy 1)-3) com f ∈ L2([0,ℓ]) ∩ C2([0,ℓ]), g ∈ L2([0,ℓ]) ∩ C1([0,ℓ]) e ℓ < ∞. Então asolução (forte) ψ(x,t) da equação das ondas homogénea existe para todo o t ∈ R e, para cada valor de t,ψ(x,t) ∈ L2([0,ℓ]) ∩ C2([0,ℓ]).

DEMONSTRAÇÃO.

A solução para todo o t ∈ R+0 foi construída explicitamente em (7.17). Devido à invariância

da equação das ondas para a transformação t → −t, esta solução é ainda válida para t ≤ 0,obedecendo às mesmas condições fronteira.

Como f,g ∈ L2([0,ℓ]), por (7.18) vem que,∑a2n < ∞. Sejam dn os coeficientes de Fourier

de g(x), por (7.19), tem-se que∑b2n = ℓ2

c2π2

∑ d2n

n2 <ℓ2

c2π2

∑d2n < ∞. Por (7.15) e (7.17) e

pela igualdade de Bessel, tem-se que

||ψ(x,t)||2 =∑n≥1

c2n =

∑n≥1

(an cos cnπ

ℓt+ bn sin cnπ

ℓt)2

≤ 2∑n≥1

a2n + 2

∑n≥1

b2n < ∞,

para todo o t ∈ R, e ψ(x,t) ∈ L2([0,ℓ]).

A diferenciabilidade da solução forte ψ(x,t) decorre das hipóteses e do teorema de d’Alem-bert 7.2 por diferenciação da solução.

Exemplo. Considere-se a condição inicial da corda f(x) = sin πxℓ e a velocidade inicial

g(x) = 0. Assim,

bn = 0 , an = 0 , n ≥ 2 , a1 = 2ℓ

∫ ℓ

0sin2 πx

ℓdx = 1

eψ(x,t) = sin π

ℓx · cos cπ

ℓt = 1

2sin π

ℓ(x− ct) + 1

2sin π

ℓ(x+ ct) . (7.21)

A solução ψ(x,t) escreve-se como a soma de duas soluções do tipo onda progressiva. Omovimento transversal pode ser interpretado como a sobreposição de duas ondas progres-sivas que se propagam em sentidos contrários, com velocidades c e −c. Na figura 7.4, está

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104 SOLUÇÕES ESTACIONÁRIAS DA EQUAÇÃO DAS ONDAS

representada a evolução temporal da solução estacionária (7.21), assim como a evoluçãotemporal das ondas progressivas com velocidades c e −c. No entanto, cada onda progres-siva não obedece às condições fronteira do problema, não podendo ser solução da equaçãodas ondas para as condições de Cauchy especificadas.

= =

=ℓ/ =ℓ/

=ℓ/ =ℓ/

Figura 7.4 Evolução temporal da solução estacionária (7.21) e das ondas progressivas com velocidades c e−c. Neste caso particular, os perfís das duas ondas progressivas coincidem nos instantes t = 0 e t = ℓ/c.

Calcule-se a velocidade transversal de um ponto x = x∗ da corda. Por (7.21),

∂ψ

∂t|x=x∗ = −cπ

ℓsin π

ℓx∗ sin cπ

ℓt .

Consequentemente, a velocidade das oscilações ou velocidade transversal é uma funçãoperiódica no tempo, enquanto que a constante c está relacionada com a velocidade depropagação das ondas progressivas.

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A EQUAÇÃO DAS ONDAS I : OSCILAÇÕES TRANSVERSAIS 105

A solução (7.21) sugere que a solução da equação das ondas se pode decompor na somade duas ondas progressivas. De facto, de (7.17), vem que

ψ(x,t) =∞∑n=1

an sin nπℓx cos cnπ

ℓt+ bn sin nπ

ℓx sin cnπ

ℓt

= 12

∞∑n=1

an sin nπℓ

(x− ct) + bn cos nπℓ

(x− ct)

+12

∞∑n=1

an sin nπℓ

(x+ ct) − bn cos nπℓ

(x+ ct)

:= φ1(x− ct) + φ2(x+ ct)

(7.22)

e a solução da equação das ondas pode ser escrita como a sobreposição de duas ondasprogressivas, φ1(x− ct) e φ2(x + ct), com velocidades c e −c, respetivamente. A soluçãoψ(x,t) em (7.22), designa-se por solução estacionária ou onda estacionária.

As soluções particulares ψn(x,t) da equação das ondas, (7.17), designam-se por modos pró-prios de vibração. Cada modo próprio corresponde a uma frequência de oscilação diferente.Então, da expressão geral de ψ(x,t), (7.22), decorre que a frequência de vibração transver-sal associada ao modo próprio ψn(x,t) é

ωnt = 2πfnt = cnπ

ℓt ⇒ fn = nc

2ℓ(Hertz),

ou ainda

fn = n

2ℓ

√T

ρ(Hertz), (7.23)

em que ρ é a densidade linear da corda e T é a tensão. A relação (7.23) é a lei de Mersenne.Nesta expressão estão contidos os princípios para a construção dos instrumentos musicaisde cordas: a) a frequência de vibração aumenta quando o comprimento da corda diminui;b) a frequência aumenta quando a tensão aumenta; c) quanto mais densa é a corda oumaior a secção da corda, menor é a frequência de vibração.

Para analisar a consistência das soluções da equação das ondas do ponto de vista da suainterpretação física, calcule-se o comprimento da corda em função do tempo (ℓ(t)), parao caso particular da solução (7.21). Com, ψ(x,t) = A sin π

ℓ x · cos cπℓ t, o comprimento da

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106 TEOREMA DE D’ALEMBERT

corda em função do tempo é

ℓ(t) =∫ ℓ

0

√1 +

(∂ψ

∂x

)2

dx

=∫ ℓ

0dx−

∞∑n=1

(−1)n(2n− 3)!!(2n)!!

∫ ℓ

0

(∂ψ

∂x

)2n

dx

= ℓ+ π2A2

4ℓcos2(cπt

ℓ) − 3π4A4

64ℓ3 cos4(cπtℓ

) + · · · .

Como a massa da corda é constante, a densidade linear da corda por unidade de com-primento tem de variar com o tempo. Como c2 = T/ρ é constante, tem de se ter ne-cessariamente c2 = T (t)/ρ(t), ou seja, a tensão e a densidade linear variam ao longo dotempo. Ora, isto contraria as simplificações feitas na dedução da equação das ondas (de(7.2) para (7.4)), pelo que a equação das ondas só é uma boa aproximação para valoresde ℓ muito grandes, quando comparados com a amplitude de vibração. Assumindo queπ2A2/(4ℓ) << ℓ, vem que A << 2ℓ/π = 0.64ℓ.

No caso da equação das ondas a duas dimensões que descreve o movimento oscilatóriode uma membrana, equação (7.8), pode-se fazer uma análise semelhante (Exercício 7.8).Neste caso, os modos próprios de vibração são indexados por dois índices a que corres-pondem vetores próprios do espaço de Hilbert L2([0,ℓ] × [0,ℓ]). Na figura 7.5, estão re-presentados alguns modos próprios de vibração de uma membrana retangular e de umamembrana circular.

7.4 TEOREMA DE D’ALEMBERT

Pode-se determinar a solução da equação linear das ondas para uma corda infinita em quenão são especificadas as condições fronteira.

Teorema 7.2 (d’Alembert)A solução geral da equação das ondas

∂2ψ

∂t2= c2 ∂

∂x2 ,

com x,t ∈ R, éψ(x,t) = φ1(x− ct) + φ2(x+ ct),

em que φ1(x),φ2(x) ∈ C2(R). Em particular,

ψ(x,t) = f(x− ct) + f(x+ ct)2

+ 12c

∫ x+ct

x−ctg(s)ds, (7.24)

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A EQUAÇÃO DAS ONDAS I : OSCILAÇÕES TRANSVERSAIS 107

Figura 7.5 Gráficos de alguns modos próprios de vibração da equação bidimensional das ondas (7.8).Estão representados os primeiros modos próprios de vibração de uma membrana retangular (a) e de uma

membrana circular (b).

em que ψ(x,0) = f(x) ∈ C2(R) e ∂ψ∂t (x,t)|t=0 = g(x) ∈ C1(R) são, respetivamente, a posiçãoinicial e a velocidade inicial da corda.

DEMONSTRAÇÃO.

Comece-se por rescrever a equação das ondas nas novas variáveisu = x− ct

v = x+ ct .(7.25)

Com ∂

∂x= ∂

∂u+ ∂

∂v

∂t= −c ∂

∂u+ c

∂v,

por substituição na equação homogénea das ondas, vem a equação das ondas na formahiperbólica

∂2

∂u∂vψ(u,v) = 0,

cuja solução geral éψ(u,v) = φ1(u) + φ2(v) . (7.26)

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108 TEOREMA DE D’ALEMBERT

Fica, assim, demonstrada a primeira parte do teorema.

Com ψ(x,0) = f(x) e ∂ψ∂t (x,t = 0) = g(x), por (7.25) e (7.26), tem-se que

φ1(x) + φ2(x) = f(x)−cφ′

1(x) + cφ′2(x) = g(x) .

(7.27)

Derivando a primeira equação em (7.27) e resolvendo o sistema em ordem às derivadas deφ1 e φ2, obtém-se

φ′1(x) = 1

2f ′(x) − 1

2cg(x)

φ′2(x) = 1

2f ′(x) + 1

2cg(x),

ou seja φ1(x) = φ1(0) + 1

2(f(x) − f(0)) − 1

2c

∫ x

0g(s)ds

φ2(x) = φ2(0) + 12

(f(x) − f(0)) + 12c

∫ x

0g(s)ds,

(7.28)

para todo o x ∈ R. Com as substituições x → u na primeira equação em (7.28) e x → v

na segunda equação, obtém-se

ψ(x,t) = φ1(u) + φ2(v) = φ1(x− ct) + φ2(x+ ct)

= f(x− ct) + f(x+ ct)2

+ 12c

∫ x+ct

x−ctg(s)ds,

em que, por (7.27), se usou a relação φ1(0) + φ2(0) = f(0).

O teorema de d’Alembert estabelece que a solução geral da equação das ondas é a combi-nação linear de duas soluções que se deslocam com velocidades c e−c. Como já foi referidoatrás, convencionou-se chamar ondas progressivas às soluções φ1(x− ct) e φ2(x+ ct).

A fórmula de d’Alembert para a solução da equação das ondas pode ser aplicada a pro-blemas com condições fronteira finitas. Suponha-se então que se tem a condição fronteiraψ(0,t) = ψ(ℓ,t) = 0. Com, ψ(x,t) = φ1(x − ct) + φ2(x + ct), para x = 0, tem-se queφ1(−ct) = −φ2(ct), para todo o t ∈ R, e, portanto,

φ1(−x) = −φ2(x) .

Para que esta relação se verifique para todo o x ∈ R, por (7.28), obtêm-se as condiçõesf(−x) = −f(x)g(−s) = −g(s) .

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A EQUAÇÃO DAS ONDAS I : OSCILAÇÕES TRANSVERSAIS 109

Assim, dadas as funções f(x) e g(x), com x ∈ [0,ℓ], prolongando-as como funções ímparesnas vizinhanças de x = 0 e x = ℓ, f(x) e g(x) ficam estendidas a todo o eixo real como fun-ções periódicas de periodo 2ℓ. Nestas condições, pode-se aplicar o teorema de d’Alembertàs extensões de f(x) e g(x), obtendo-se uma solução geral para a equação das ondas comcondições fronteira finitas.

Na figura 7.6, está representado o gráfico do prolongamento ímpar de uma função emtorno dos pontos x = 0 e x = ℓ.

ℓ ℓ-ℓ

()

Figura 7.6 Prolongamento ímpar de uma função f(x) em torno dos pontos x = 0 e x = ℓ.

Veja-se o que se passa quando g(x) = 0. Neste caso,

ψ(x,t) = 12f(x− ct) + 1

2f(x+ ct)

e se f(x) representa um deslocamento inicial, fortemente localizado, a solução geral daequação das ondas é a sobreposição de duas ondas progressivas com velocidades c e −c.Estas ondas progressivas são periódicas de período 2ℓ. Quando as ondas progressivas atin-gem as fronteiras em x = 0 e x = ℓ, e como f(x) é ímpar em torno destes pontos, peloteorema de d’Alembert, existe uma imagem de espelho invertida de cada lado de ambasas fronteiras. Do ponto de vista do que se passa no domínio [0,ℓ], as velocidades de propa-gação invertem-se e dá-se a mudança instantânea do sinal da perturbação (figura 7.7).

= =>

=>

Figura 7.7 Reflexão de ondas progressivas nas fronteiras de um domínio. Neste caso, as condições fronteirasão ψ(0,t) = 0 e ψ(ℓ,t) = 0.

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110 ENERGIA DE ONDAS TRANSVERSAIS

Conclui-se, assim, que a reflexão de uma onda progressiva numa fronteira x = ℓ tem oefeito de inverter a velocidade e a fase da onda (fase → fase+π). Então, a lei de reflexãode ondas é uma consequência directa do facto das soluções estacionárias serem a soma deduas ondas progressivas.

7.5 ENERGIA DE ONDAS TRANSVERSAIS

Da equação de Newton para o movimento de uma partícula de massa m, mx = −∂V∂x ,

decorre que mxx + x∂V∂x = 0 e, portanto, ddt

( 12mx

2 + V (x))

= 0. Assim, a energia totalE = 1

2mx2 + V (x) é conservada. Se não existe nenhuma força exterior, V (x) = 0, a

energia cinética também é conservada.

Por analogia com o que foi feito para a equação de Newton, multiplica-se a componentehomogénea da equação das ondas (7.7) por ∂ψ/∂t e integrando em x, entre x = 0 e x = ℓ,obtém-se ∫ ℓ

0

∂ψ

∂t

∂2ψ

∂t2dx− c2

∫ ℓ

0

∂ψ

∂t

∂2ψ

∂x2 dx = 0 .

Rescrevendo o primeiro termo da igualdade anterior e integrando por partes o segundotermo, obtém-se

d

dt

12

∫ ℓ

0

(∂ψ

∂t

)2

dx− c2 ∂ψ

∂t

∂ψ

∂x

]ℓ0

+ c2∫ ℓ

0

∂2ψ

∂t∂x

∂ψ

∂xdx = 0 .

Para condições fronteira com extremos fixos, ∂ψ∂t |x=0 = ∂ψ∂t |x=ℓ = 0, a expressão anterior

reduz-se ad

dt

12

∫ ℓ

0

(∂ψ

∂t

)2

dx+ d

dt

c2

2

∫ ℓ

0

(∂ψ

∂x

)2

dx = 0 . (7.29)

Ou seja, pode-se definir a energia da corda vibrante com extremos fixos em x = 0 e x = ℓ

como

E = 12ρ

∫ ℓ

0

(∂ψ

∂t

)2

dx+ 12ρc2∫ ℓ

0

(∂ψ

∂x

)2

dx, (7.30)

em que, por questões dimensionais, se multiplicaram por ρ os termos da equação (7.29). Oprimeiro termo em (7.30) é a energia cinética da corda. Como ρc2 = T , o segundo termode (7.30) descreve a energia associada à força de coesão ou de tensão da corda.

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A EQUAÇÃO DAS ONDAS I : OSCILAÇÕES TRANSVERSAIS 111

Como, neste caso, a energia é constante ao longo do tempo, no instante t = 0, tem-se que

E = 12ρ

∫ ℓ

0g2(x)dx+ 1

2ρc2∫ ℓ

0(f ′)2(x)dx

= 12ρ

∫ ℓ

0

(g2(x) + c2(f ′)2(x)

)dx

= 12ρ(c2||f ′||2 + ||g||2

),

e se assumiu que f ′, g ∈ L2([0,ℓ]) e as normas são tomadas em L2([0,ℓ]), ||.|| = ||.||2. Comas expressões obtidas anteriormente para a condição inicial f(x) e a velocidade inicial g(x),(7.18) e (7.19), e pela igualdade de Bessel (teorema 3.5), a energia de uma corda vibrante é

E = 12ρ

∞∑n=1

c2π2n2

ℓ2 (a2n + b2

n) = 12ρ

∞∑n=1

ω2n(a2

n + b2n),

em que ωn = nπc/ℓ rad é a frequência do modo próprio de vibração número n.

No caso em que a corda está sujeita a uma força exterior conservativa, tem-se que Fext =−∂V (ψ)

∂ψ . Com um cálculo semelhante ao efetuado acima, a energia total do movimentotransversal de uma corda com extremos fixos é

ET = 12ρ

∫ ℓ

0

(∂ψ

∂t

)2

dx+ ρc2

2

∫ ℓ

0

(∂ψ

∂x

)2

dx+∫ ℓ

0V (ψ(x,t))dx. (7.31)

Da equação (7.31), resulta que se pode construir uma função densidade de energia

E(ψ, ∂ψ∂x

,∂ψ

∂t, x, t) = T + V,

tal que∫ ℓ

0 E(ψ, ∂ψ∂x ,∂ψ∂t , x, t)dx = ET . Deste modo, pode-se introduzir um formalismo la-

grangiano que englobe a classe da equação das ondas. Então, com L = T −V , a densidadelagrangiana associada à equação das ondas é

L = 12ρ

(∂ψ

∂t

)2

− ρc2

2

(∂ψ

∂x

)2

− V (ψ). (7.32)

Como é conhecido da mecânica clássica, as equações do movimento decorrem das equa-ções de Euler-Lagrange, obtidas através do princípio de minimização da ação. Assim,se a densidade lagrangiana depender de várias variáveis de campo ψi(x,t) e ∂ψi

∂xk, com

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112 RESSONÂNCIA

i = 1, . . . , n, x = (x1, . . . xm), as equações de Euler-Lagrange para a determinação dasvariáveis de campo são

d

dt

∂L∂ψi

+m∑k=1

∂xk

(∂L

∂( ∂ψi

∂xk)

)− ∂L∂ψi

= 0, (7.33)

em que ψi é a derivada temporal de ψi. Calculando as equações de Euler-Lagrange (7.33)para a densidade lagrangiana (7.32), obtém-se a equação das ondas (7.7).

A equação das ondas linear é o primeiro exemplo de uma equação de um campo esca-lar. Em geral, as grandezas descritas pelas equações de Lagrange (7.33) designam-se porcampos.

No caso da equação não linear das ondas (7.5), a energia é

E = 12ρ

∫ ℓ

0

(∂ψ

∂t

)2

dx+ ρc2∫ ℓ

0

√1 +

(∂ψ

∂x

)2

dx (7.34)

e o segundo integral em (7.34) é o comprimento da corda com extremos fixos.

7.6 RESSONÂNCIA

Como se viu em (7.15), a solução da equação homogénea das ondas, obedecendo às con-dições de Cauchy 1)-3), é

ψ(x,t) =∑n≥1

cn(t)ψn(x) =∑n≥1

cn(t) sin nπℓx, (7.35)

em que ψn(x) = sin nπℓ x é um vetor próprio do operador T = c2 ∂2

∂x2 , quando restringidoao subespaço de L2([0,ℓ]) formado por todas as funções que se anulam em x = 0 e x = ℓ.Como o vetor próprio ψn = sin nπ

ℓ x está associado ao valor próprio λn = −c2 n2π2

ℓ2 ,

Tψn(x) = c2 ∂2

∂x2ψn(x) = λnψn(x) . (7.36)

Para resolver a equação das ondas não homogénea (7.7), obedecendo às condições de Cau-chy 1)-3), começa-se por desenvolver o termo não homogéneo Fext/ρ na base dos ψn(x).Seja então o desenvolvimento de Fext/ρ na base dos ψn(x),

1ρFext(x,y,t) =

∑n≥1

hn(t,y)ψn(x) . (7.37)

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A EQUAÇÃO DAS ONDAS I : OSCILAÇÕES TRANSVERSAIS 113

Neste contexto, não se pode considerar a dependência de hn(t,y) em y, caso contrário otermo não homogéneo ainda dependeria de y. Assim, no que se segue, vai-se considerarque hn(t,y) = hn(t). Introduzindo (7.37) e (7.35) em (7.7), obtém-se

∑n

ψn(x)d2cndt2

= c2∑n

cn(t)d2ψndx2 +

∑n

hn(t)ψn(x) .

Por (7.36), a equação anterior reduz-se a

∑n

ψn(x)d2cndt2

=∑n

λncn(t)ψn(x) +∑n

hn(t)ψn(x) .

Portanto, para cada n ≥ 1, tem-se a equação diferencial

d2cn(t)dt2

= λncn(t) + hn(t), (7.38)

que pode ser resolvida em função das condições iniciais cn(0) e cn(0). Assim, a solução daequação não homogénea das ondas (7.7) tem soluções da forma (7.35), em que as funçõescn(t) são soluções das equações (7.38).

Mostrou-se assim como resolver a equação não homogénea das ondas, conhecendo a solu-ção do problema homogéneo. Forçando uma corda com uma força exterior periódica notempo, chega-se naturalmente a um problema não homogéneo que tem uma solução emfunção dos vetores próprios e dos valores próprios do problema homogéneo.

Considere-se, então, uma corda presa nos extremos x = 0 e x = ℓ e sujeita a uma forçaexterior periódica no tempo, Fext(t) = A sin(θt), em que A e θ são constantes. Neste caso,a equação das ondas (7.7) é

∂2ψ

∂t2= c2 ∂

∂x2 + 1ρA sin(θt) . (7.39)

A solução geral desta equação não homogénea tem a forma (7.35), em que as funções cn(t)são soluções das equações (7.38) e as funções hn(t) são os coeficientes do desenvolvimentode Fourier de Fext/ρ, na base dos vetores próprios.

Para determinar hn(t), aplica-se a propriedade de ortogonalidade das funções ψn(x). Istoé, multiplica-se por ψn(x) a expressão (7.37) e integra-se no intervalo [0,ℓ]. Como os ele-mentos da base ψn(x) do espaço de Hilbert são ortogonais mas não estão normalizados,

< ψn(x),1ρA sin(θt) >= hn(t)

∫ ℓ

0ψ2n(x)dx,

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114 RESSONÂNCIA

obtendo-seℓ

2hn(t) = A

ρ

1 − (−1)n

nπsin(θt),

ou seja,

hn(t) =

4Aρnπ

sin(θt), n = 1,3,5, . . .

0, n = 2,4,6, . . . .

Assim, as equações diferenciais (7.38) sãod2c2n−1(t)

dt2= −c2 (2n− 1)2π2

ℓ2 c2n−1(t) + 4Aρ(2n− 1)π

sin(θt)

d2c2n(t)dt2

= λ2nc2n(t),(7.40)

com n = 1,2, . . ..

A primeira família de equações em (7.40) tem soluções particulares da forma

c2n−1(t) = B2n−1 sin(θt), (7.41)

em que se consideraram condições iniciais nulas e os B2n−1 são constantes a determinar.Substituindo a solução (7.41) na primeira equação em (7.40), obtém-se

−B2n−1θ2 = −c2B2n−1

(2n− 1)2π2

ℓ2 + 4Aρ(2n− 1)π

,

cuja solução é

B2n−1 = 4Aρ(2n− 1)π

1c2 (2n−1)2π2

ℓ2 − θ2, (7.42)

desde que as constantes |B2n−1| sejam finitas.

Como as soluções das equações em (7.38) são a soma da solução geral do problema homo-géneo com uma solução particular do problema não homogéneo, por (7.15) e assumindoque as constantes |B2n−1| são finitas, a solução geral de (7.39) é

ψ(x,t) =∞∑n=1

cn(t) sin(πnℓx)

+ sin(θt)∞∑n=1

B2n−1 sin(π(2n− 1)

ℓx

).

Por (7.42), se, para algum n, a frequência da força exterior for tal que

θ = c(2n− 1)π

ℓ,

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A EQUAÇÃO DAS ONDAS I : OSCILAÇÕES TRANSVERSAIS 115

a solução particular encontrada do problema não homogéneo não está definida no sentidoem que, para algum n, B2n−1 é infinito. Nestas condições, diz-se que a equação das ondastem uma ressonância. Devido à forma particular das condições fronteira de extremos fixos,as frequências de ressonância são as frequências dos modos próprios ímpares do problemahomogéneo. Assim, quando uma corda com extremos fixos é atuada por uma força exteriorperiódica, com uma frequência igual à frequência de um modo próprio ímpar, no limitet → ∞, a amplitude das oscilações tende para infinito.

Nos capítulos seguintes introduzir-se-ão técnicas gerais para a determinação de soluçõesparticulares de equações diferenciais não homogéneas.

7.7 EQUILíBRIO DE UMA MEMBRANA RETANGULAR

As técnicas de séries de Fourier e de operadores desenvolvidas até aqui podem ser apli-cadas a casos mutidimensionais. Analise-se o problema do equilíbrio de uma membranaquadrada de lado ℓ = 1, no campo gravítico. Analogamente ao que foi feito na secção 7.2,a equação que descreve o estado de equilíbrio no campo gravítico de uma membrana elás-tica de forma quadrada e presa nos bordos é

∂2ϕ

∂x2 + ∂2ϕ

∂y2 = ρg/T, (7.43)

em que ρ é a densidade da membrana, g a aceleração da gravidade e T a tensão tangencialna membrana. As condições fronteira são ϕ(0,y) = ϕ(1,y) = ϕ(x,0) = ϕ(x,1) = 0, emque x,y ∈ [0,1].

A solução da equação (7.43) não é tão simples como o problema correspondente unidimen-sional, descrito na secção 7.2. Neste caso, a equação de equilíbrio (7.43) é uma equaçãode Poisson.4

Para resolver a equação (7.43) com as condições fronteira indicadas, assume-se que a so-lução pertence a um subespaço do Hilbert L2([0,1] × [0,1]), formado pelas funções quesatisfazem as condições fronteira. Como neste caso os vetores próprios do operador deLaplace são ϕnm = sin(πnx) sin(πmy) (Exercício 7.8), a solução geral da equação (7.43)tem a forma

ϕ(x,y) =∑

n≥1,m≥1

bnm sin(πnx) sin(πmy).

4Como se verá no capítulo 13, a equação de Poisson é uma equação do tipo elíptico, enquanto que a equação dasondas é do tipo hiperbólico.

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116 OSCILAÇÕES DE UMA MEMBRANA CIRCULAR

Substituindo esta solução na equação (7.43), obtém-se

−∑

n≥1,m≥1

bnm(n2π2 +m2π2) sin(πnx) sin(πmy) = ρg/T.

Para se obter o valor dos coeficientes bnm, multiplica-se por sin(πnx) sin(πmy) a expressãoanterior e integra-se em x e y no intervalo [0,1]. Com

∫ 10 sin(nπx)dx = (1−(−1)n)/(nπ))

e∫ 1

0 sin2(nπx)dx = 1/2, devido às relações de ortogonalidade, obtém-se

bnm = −4ρgT

(1 − (−1)n)(1 − (−1)m)nmπ2(n2π2 +m2π2)

e a solução da equação (7.43 ) para as condições fronteira escolhidas é

ϕ(x,y) = −4ρgT

∑n≥1,m≥1

(1 − (−1)n)(1 − (−1)m)nmπ2(n2π2 +m2π2)

sin(πnx) sin(πmy).

Por exemplo, para x = y = 1/2 a altura da membrana quadrada é

h = 4ρgT

∑n≥1,m≥1

(1 − (−1)n)(1 − (−1)m)nmπ2(n2π2 +m2π2)

.

Somando a expressão anterior numericamente atén = m = 1000, obtém-se h ≃ 0.35ρg/T .

7.8 OSCILAÇÕES DE UMA MEMBRANA CIRCULAR

Analisem-se as vibrações de uma membrana circular com fronteira imóvel — tambor.Comece-se por introduzir coordenadas polares nas variáveis espaciais. Assim, com x =r cos θ e y = r sin θ, os operadores diferenciais são

∂x= ∂r

∂x

∂r+ ∂θ

∂x

∂θ= cos θ ∂

∂r− sin θ

r

∂θ∂

∂y= ∂r

∂y

∂r+ ∂θ

∂y

∂θ= sin θ ∂

∂r+ cos θ

r

∂θ

∂2

∂x2 = cos2 θ∂2

∂r2 − 2sin θ cos θr

∂2

∂θ∂r+ 2sin θ cos θ

r2∂

∂θ+ sin2 θ

r

∂r

+sin2 θ

r2∂2

∂θ2

∂2

∂y2 = sin2 θ∂2

∂r2 + 2sin θ cos θr

∂2

∂θ∂r− 2sin θ cos θ

r2∂

∂θ+ cos2 θ

r

∂r

+cos2 θ

r2∂2

∂θ2 .

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A EQUAÇÃO DAS ONDAS I : OSCILAÇÕES TRANSVERSAIS 117

Introduzindo os operadores diferenciais na equação (7.7), a equação das ondas em coor-denadas polares é

∂2ϕ

∂t2= c2

(∂2ϕ

∂r2 + 1r

∂ϕ

∂r+ 1r2∂2ϕ

∂θ2

)+ 1ρFext(r,θ), (7.44)

em que c tem as dimensões de uma velocidade e [ρ] =[kg m−2].

Seja então uma membrana circular de raio ℓ em que a deslocação transversal é descritapela função ϕ(r,θ), com r ∈ [0,ℓ] e θ ∈ [0,2π]. Sob a ação da força gravítica, Fext = −ρg,a solução de equilíbrio da membrana circular é ϕ(r,θ) = g(r2 − ℓ2)/(4c2).

Determinem-se as soluções ϕ(r,θ) da equação das ondas (7.44) com Fext = 0 e sujeita àcondição fronteira

ϕ(ℓ,θ) = 0 para θ ∈ [0,2π] . (7.45)

Para isto, começa-se por resolver a equação aos valores próprios associada à parte espacialda equação (7.44) e, em seguida, usa-se a técnica da separação de variáveis. Deste modo,fica assegurado que a condição fronteira é verificada para todo o t ∈ R.

A equação aos valores próprios da parte espacial da equação (7.44) é

∂2ϕ

∂r2 + 1r

∂ϕ

∂r+ 1r2∂2ϕ

∂θ2 = −λϕ, (7.46)

em que o sinal negativo foi escolhido por conveniência de cálculos e λ é um valor próprioa determinar. Com ϕ(r,θ) = F (r)G(θ) e depois de alguma manipulação, a equação (7.46)escreve-se na forma

r2

F

d2F

dr2 + r

F

dF

dr+ λr2 = − 1

G

d2G

dθ2 . (7.47)

Como o primeiro membro de (7.47) depende apenas de r e o segundo membro dependeapenas de θ, a igualdade (7.47) é verificada apenas se

r2

F

d2F

dr2 + r

F

dF

dr+ λr2 = − 1

G

d2G

dθ2 = α, (7.48)

em que α é uma constante. Ora, a equação aos valores próprios em θ tem a solução

G(θ) = Aei√αθ +Be−i

√αθ.

Como, G(0) = G(2π), a solução da equação aos valores próprios é

Gn(θ) = A′n cosnθ +B′

n sinnθ , αn = n2, (7.49)

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118 OSCILAÇÕES DE UMA MEMBRANA CIRCULAR

em que A′n e B′

n são constantes reais arbitrárias, n ≥ 0 e αn é o valor próprio da equaçãoangular. Introduzindo este resultado em (7.48), a equação aos valores próprios da compo-nente radial da equação (7.48) é

r2 d2F

dr2 + rdF

dr+ (λr2 − n2)F = 0 . (7.50)

Com a nova variável x =√λr, a equação (7.50) rescreve-se como

x2 d2F

dx2 + xdF

dx+ (x2 − n2)F = 0 . (7.51)

A equação (7.51) é a equação de Bessel, caso particular da equação de Sturm-Liouville(4.1).

Com técnicas de séries de potências, pode-se mostrar que as soluções da equação de Bessel(7.51) sujeitas à condição |F (0)| < ∞ são as funções

Jn(x) =∞∑m=0

(−1)m

m! Γ(m+ n+ 1)

(12x

)2m+n

= 1π

∫ π

0cos(nτ − x sin(τ))dτ, (7.52)

designadas por funções de Bessel de primeira espécie (figura 7.8). As funções de Bessel deprimeira espécie são funções oscilantes, com infinitos zeros positivos em x = νnm em ≥ 1.No limite em que x → ∞, as funções de Bessel de primeira espécie comportam-se comofunções periódicas, isto é,

Jn(x) ≃√

2πx

cos(x− π

4− n

π

2

).

-

-

Figura 7.8 Gráfico de funções de Bessel de primeira espécie. Os primeiros zeros positivos das funções deBessel de primeira espécie são ν01 ≃ 2.405, ν11 ≃ 3.832 e ν21 ≃ 5.136.

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A EQUAÇÃO DAS ONDAS I : OSCILAÇÕES TRANSVERSAIS 119

Impondo a condição fronteira (7.45), Jn(x) = Jn(√λℓ) = 0, e portanto

√λℓ = νnm, em

que νnm são os zeros da função de Bessel Jn(x). Assim, para a condição fronteira (7.45),os vetores próprios e os valores próprios da equação (7.50) são, respetivamente,

Jn(√λnmr) , λnm = ν2

nm

ℓ2 . (7.53)

Nestas condições, por (7.53) e (7.49), a solução da equação aos valores próprios (7.46) é

ϕn,m(r,θ) = Jn(√λnmr) (A′

nm cosnθ +B′nm sinnθ) , (7.54)

a que corresponde o valor próprio λnm. Com a equação aos valores próprios (7.46) e por(7.44), a solução da equação do movimento de uma membrana circular é

ϕ(r,θ, t) =∑n≥0

∑m≥1

AnmJn(√λnmr) cos(nθ) cos(c

√λnmt)

+∑n≥0

∑m≥1

BnmJn(√λnmr) cos(nθ) sin(c

√λnmt),

+∑n≥0

∑m≥1

CnmJn(√λnmr) sin(nθ) cos(c

√λnmt),

+∑n≥0

∑m≥1

DnmJn(√λnmr) sin(nθ) sin(c

√λnmt),

(7.55)

em que Anm, Bnm, Cnm e Dnm são constantes a determinar pelas condições iniciais.

Para cada n ≥ 0, as funções de Bessel Jn(√λnmr)m≥1 formam uma base completa

do espaço de Hilbert L2µ([0,ℓ]), para a medida dµ = rdr. Assim, para qualquer função

f(r) ∈ L2µ([0,ℓ]), tem-se que

f(r) =∑m≥1

amJn(√λnmr), (7.56)

em que λnm = ν2nm

ℓ2 e∫ ℓ

0Jn

(√λnpr

)Jn

(√λnqr

)rdr = 0 (p = q). (7.57)

Multiplicando (7.56) por Jn(√λnmr) e integrando, obtêm-se os coeficientes do desenvol-

vimento de Fourier-Bessel

am =∫ ℓ

0 f(r)Jn(√λnmr)rdr∫ ℓ

0 J2n(

√λnmr)rdr

. (7.58)

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120 A EQUAÇÃO DAS ONDAS E A TRANSFORMAÇÃO DE LORENTZ

Está-se em condições de determinar os coeficientes Anm e Bnm da solução da equação dasondas. Se ϕ(r,θ,t = 0) = f(r,θ), por (7.55) e (7.58), tem-se que

A0m =∫ 2π

0∫ ℓ

0 f(r,θ)Jn(√λnmr)rdrdθ

2π∫ ℓ

0 J2n(

√λnmr)rdr

Anm =∫ 2π

0∫ ℓ

0 f(r,θ) cos(nθ)Jn(√λnmr)rdrdθ

π∫ ℓ

0 J2n(

√λnmr)rdr

(n ≥ 1)

Cnm =∫ 2π

0∫ ℓ

0 f(r,θ) sin(nθ)Jn(√λnmr)rdrdθ

π∫ ℓ

0 J2n(

√λnmr)rdr

.

(7.59)

Do mesmo modo, com ∂ϕ(r,θ,t=0)∂t = g(r,θ), obtém-se

B0m =∫ 2π

0∫ ℓ

0 g(r,θ)Jn(√λnmr)rdrdθ

c2π√λnm

∫ ℓ0 J

2n(

√λnmr)rdr

Bnm =∫ 2π

0∫ ℓ

0 g(r,θ) cos(nθ)Jn(√λnmr)rdrdθ

cπ√λnm

∫ ℓ0 J

2n(

√λnmr)rdr

(n ≥ 1)

Dnm =∫ 2π

0∫ ℓ

0 g(r,θ) sin(nθ)Jn(√λnmr)rdrdθ

cπ√λnm

∫ ℓ0 J

2n(

√λnmr)rdr

.

(7.60)

Por exemplo, para uma membrana circular de raio ℓ = 1, deslocamento inicial f(r) =(1 − r) e velocidade inicial g = 0, tem-se que A0m = 0, Bnm = Cnm = Dnm = 0 eAnm = 0 para n > 0. Assim,

ϕ(r,θ, t) = A01J0(√λ01r) cos(c

√λ01t) +A02J0(

√λ02r) cos(c

√λ02t) + · · · ,

em que A01 ≃ 0.7848, A02 ≃ 0.0687,√λ01 ≃ 2.4048 e

√λ02 ≃ 5.5201.

7.9 A EQUAÇÃO DAS ONDAS E A TRANSFORMAÇÃO DE LORENTZ

Como é conhecido, a equação de Newton mx = F (x) é invariante para a transformaçãode variáveis x → y = x − vt, em que v é uma velocidade relativa. Isto é, as equaçõesdo movimento têm a mesma forma em referenciais com velocidade relativa constante v(princípio de inércia). Embora a equação das ondas tenha sido deduzida através da equaçãode Newton, esta propriedade não é válida.

Veja-se que a equação das ondas é invariante para a transformação de Lorentz. Seja aequação das ondas

∂2ϕ

∂t2= c2 ∂

∂x2 , (7.61)

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A EQUAÇÃO DAS ONDAS I : OSCILAÇÕES TRANSVERSAIS 121

e sejam as novas variáveisy = x− vt√

1 − v2/c2= x− βct

γ

s = t− vx/c2√1 − v2/c2

= ct− βx

cγ,

(7.62)

em que β = v/c, γ =√

1 − β2 e v é a velocidade relativa entre os dois referenciais deinércia. A constante c é a velocidade das ondas progressivas. A transformação (7.62) é atransformação de Lorentz e não está definida para v ≥ c.

Com as novas variáveis (7.62), os operadores diferenciais são

∂x= 1

γ

∂y− β

∂s∂

∂t= −cβ

γ

∂y+ 1γ

∂s

∂2

∂x2 = 1γ2

∂2

∂y2 − 2 β

cγ2∂2

∂y∂s+ β2

c2γ2∂2

∂s2

∂2

∂t2= c2β2

γ2∂2

∂y2 − 2cβγ2

∂2

∂y∂s+ 1γ2

∂2

∂s2 .

Introduzindo estes operadores na equação (7.61), obtém-se

∂2ϕ

∂s2 = c2 ∂2ϕ

∂y2 .

Conclui-se assim que a equação das ondas é invariante para a transformação de Lorentz(7.62), desde que v < c.

7.10 SOLUÇÕES FORTES E FRACAS DA EQUAÇÃO DAS ONDAS

Considere-se a equação linear das ondas,

∂2ψ

∂t2− c2 ∂

∂x2 = 0 . (7.63)

Como se viu, no caso da corda com extremos fixos, a solução da equação das ondas podeser escrita na forma de uma série de Fourier, (7.17), num subespaço do espaço de HilbertL2([0,ℓ]), e ψ ∈ C2([0,ℓ]) ∩ L2([0,ℓ]). Embora C2([0,ℓ]) seja denso em L2([0,ℓ]) — teo-rema 2.3, escreve-se ψ ∈ C2([0,ℓ])∩L2([0,ℓ]) para realçar que a solução ψ é obtida atravésde técnicas convencionais de derivação. Neste caso, diz-se que ψ ∈ C2([0,ℓ]) ∩ L2([0,ℓ]) éuma solução forte da equação das ondas.

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122 SOLUÇÕES FORTES E FRACAS DA EQUAÇÃO DAS ONDAS

Noutro contexto, se f é a função constante e g a função nula, pela fórmula de d’Alembert,ψ(x,t) = f é solução da equação das ondas. No entanto, f ∈ L2(R). Assim, quer-se saberaté que ponto a equação (7.63) admite soluções em que ψ é uma distribuição, e as derivadasem (7.63) podem ser encaradas como derivadas no sentido das distribuições.

Como a solução geral de (7.63) é da forma ψ(x,t) = F1(x− ct) +F2(x+ ct), calculado em(7.22) ou em (7.24), assume-se, por hipótese, que F1 e F2 são distribuições, isto é F1,F2 ∈D′(R). Se F1 e F2 são distribuições regulares, F1 e F2 podem ser geradas por funçõesf,g ∈ L1

loc(R), e a fórmula de d’Alembert assume um significado mais geral.

Vai-se então mostrar que se ψ(x,t) = F1(x − ct) + F2(x + ct) ∈ D′(R), então ψ é aindauma solução da equação das ondas no sentido das distribuições, e as distribuições F1 e F2

podem ser geradas pela classe mais geral de funções do problema inicial: f,g ∈ L1loc(R).

Vai-se fazer a demonstração apenas para a distribuição F1(x− ct).

Como F1 é uma distribuição, calcule-se o funcional linear contínuo gerado por(∂2

∂t2− c2 ∂

2

∂x2

)F1.

Pelo lema 6.1, tem-se que, no sentido das distribuições,

I =∫ ∫ (

∂2F1

∂t2− c2 ∂

2F1

∂x2

)φ(x,t)dxdt

=∫ ∫

F1(x− ct)(∂2φ(x,t)∂t2

− c2 ∂2φ(x,t)∂x2

)dxdt,

em que φ(x,t) ∈ D(R2), F1(x− ct) é dado pelas funções da fórmula de d’Alembert (7.24)com argumento (x− ct) e construída à custa das funções f e g, tomadas como elementosde L1

loc(R).

Mostrar que a distribuição F1(x − ct) é uma solução da equação das ondas é mostrarque para todo o φ(x,t) ∈ D(R2), se tem sempre I = 0. Assim, com a transformação devariáveis, y = x− ct e z = x+ ct, tem-se que x = (y + z)/2, t = (z − y)/(2c), e

I =∫F1(y)

∫ (∂2φ(y,z)∂y∂z

)12cdzdy =

∫F1(y)

[∂φ(y,z)∂y

]+∞

−∞

12cdy.

Mas como φ(x,t) ∈ D(R2), vem que[∂φ(y,z)∂y

]+∞

−∞= 0, ou seja, I = 0 para todo o φ(x,t) ∈

D(R2).

Está assim demonstrada a validade da fórmula de d’Alembert no sentido das distribuições.Nestas condições, ψ(x,t) = F1(x− ct)+F2(x+ ct) ∈ D′(R) é uma solução fraca da equaçãodas ondas.

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A EQUAÇÃO DAS ONDAS I : OSCILAÇÕES TRANSVERSAIS 123

EXERCÍCIOS

7.1 Qual a velocidade de propagação das ondas progressivas numa corda de densidadeρ = 0,4 kg m−1 e sujeita a uma tensão T = 0,9 N?

7.2 Uma corda é esticada entre dois pontos ra e rb que estão à distância ℓ, como se mostrana figura. A corda está sujeita à ação da gravidade na direção vertical, tem densidadeρ e a tensão é T . Determine a forma de equilíbrio da corda. Esboce um gráfico dasolução de equilíbrio.

7.3 A equação que descreve as oscilações transversais de uma barra é

∂2ϕ

∂t2= c2 ∂

∂x4 ,

em que c2 = EI/ρA, E [Nm−2] é o módulo de elasticidade ou de Young, ρ é a densi-dade da barra, A é a área da secção da barra e I [m4] é o momento de área da secçãoreta da barra, relativamente ao eixo dos xx. A barra está presa nas extremidades, emdois pontos que estão à distância L, e ∂ϕ

∂x (x = 0) = ∂ϕ∂x (x = L) = 0. Determine a

forma de equilíbrio da barra no campo gravítico.

7.4 Estude o movimento de uma corda com extremos fixos a uma distância ℓ e sujeitaa uma força de atrito proporcional à velocidade. Neste caso, a equação das ondasescreve-se na forma

∂2ϕ

∂t2+ 2λ∂ϕ

∂t= c2 ∂

∂x2 ,

em que λ é o coeficiente de atrito. Determine a frequência dos modos próprios devibração e a solução geral da equação.

7.5 Encontre os modos próprios de vibração de uma corda de comprimento ℓ, presa adois anéis de massa muito pequena e que se podem deslocar ao longo de duas barrasparalelas. Use as condições fronteira (∂ϕ/∂x)(0,t) = (∂ϕ/∂x)(ℓ,t) = 0 (condiçõesfronteira de Neumann).

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124 SOLUÇÕES FORTES E FRACAS DA EQUAÇÃO DAS ONDAS

7.6 A corda de um instrumento musical é dedilhada no ponto x = ℓ/2, em que ℓ é adistância entre os extremos fixos da corda. A esta situação corresponde a condiçãoinicial,

f(x) =

2αx/ℓ , se x ≤ ℓ/2−2α(x− ℓ)/ℓ , se x ≥ ℓ/2

e a velocidade inicial é g(x) = 0. Calcule a frequência e a energia cinética dos modospróprios de vibração.

7.7 A corda de um piano tem comprimento ℓ e é percutida com ummartelo retangular naregião [ℓ/2 − δ,ℓ/2 + δ], com velocidade A. Calcule a frequência e a energia cinéticados modos próprios de vibração.

7.8 Determine os valores próprios e os modos próprios de vibração de uma membranaretangular de lados a e b. Suponha que amembrana está presa nos lados do retângulo.

7.9 Considere uma corda vibrante presa nos extremos x = 0 e x = 1. No instante inicial,a forma da corda é ϕ(x,0) = x(1 − x) e a velocidade transversal da corda é zero. Adensidade da corda é ρ = 10 g/m e a tensão é T = 4 N. Calcule o valor de ϕ(x,t)para x = 1/4 e t = 1/20.

7.10 A energia de uma corda vibrante é

E = 12ρ

∫ ℓ

0

(∂ψ

∂t

)2

dx+ ρc2

2

∫ ℓ

0

(∂ψ

∂x

)2

dx := E1 + E2,

em que ψ(x,t) é a solução da equação das ondas. Mostre que, se ψ é uma ondaprogressiva, ψ = ψ(x± ct), então E1 = E2.

7.11 Determine a energia total de uma corda vibrante sujeita à força gravítica.

7.12 Seja ϕ(x,t) a solução da equação linear das ondas. Define-se densidade de energiae densidade de momento como e = (ϕ2

t + c2ϕ2x)/2 e p = c2ϕtϕx, respetivamente.

Nesta notação, ϕx = ∂ϕ/∂x e ϕt = ∂ϕ/∂t.

a) Mostre que ∂e/∂t = ∂p/∂x e que ∂p/∂t = c2∂e/∂x.

b) Mostre que as densidades e(x,t) e p(x,t) obedecem ambas à equação das ondas.

7.13 Determine a solução geral da equação não homogénea das ondas, para uma cordade extremos fixos no campo gravítico.

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A EQUAÇÃO DAS ONDAS I : OSCILAÇÕES TRANSVERSAIS 125

7.14 Seja a equação∂2V

∂x2 + ∂2V

∂y2 = 0,

em que 0 ≤ x ≤ π e 0 ≤ y ≤ ℓ. Considere as condições fronteira

V (0,y) = V (π,y) = 0, V (x,0) = 0 e V (x,ℓ) = x(π − x).

Determine V (x,y).

7.15 Seja a densidade lagrangiana

L = h2

8π2m∇ψ.∇ψ∗ + V (x,t)ψψ∗ + h

4πi(ψ∗ψ − ψψ∗)

em que ψ(x,t) e ψ∗(x,t) são duas variáveis de campo independentes. Determine asequações de campo. Em seguida determina os momentos canónicos e a densidadehamiltoniana.

7.16 Calcule a densidade lagrangiana da equação das cordas.

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8A TRANSFORMADA DE FOURIER E AS FUNÇÕES DE GREEN

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A TRANSFORMADA DE FOURIER E AS FUNÇÕES DE GREEN 129

Constrói-se a transformada de Fourier de uma função e derivam-se as suas propriedades. Demonstra--se o teorema integral de Fourier e o teorema de Plancherel. Analisam-se algumas propriedades datransformada de Fourier de funções gaussianas e derivam-se as relações de incerteza de Heisenberg.Deduz-se a fórmula da soma de Poisson. Introduz-se o conceito de propagador ou função de Greene derivam-se algumas funções de Green associadas a equações diferenciais ordinárias e a equações àsderivadas parciais.

8.1 A TRANSFORMADA DE FOURIER

Seja f uma função definida no intervalo [−ℓ,ℓ]. A série de Fourier de f é uma funçãoperiódica, definida em toda a reta real e de período 2ℓ. Se f não é periódica, é possívelestender o conceito de série de Fourier a funções definidas sobre toda a reta real.

Seja o desenvolvimento de Fourier de uma função definida no intervalo [−ℓ,ℓ],

f(x) =+∞∑

n=−∞cne

i 2πnx2ℓ ,

em que

cn = 12ℓ

∫ ℓ

−ℓf(u)e−i 2πnu

2ℓ du . (8.1)

Introduzindo os coeficientes de Fourier cn dentro do somatório em (8.1), obtém-se

f(x) =+∞∑

n=−∞ei

2πnx2ℓ

(12ℓ

∫ ℓ

−ℓf(u)e−i 2πnu

2ℓ du

)= 2π

2ℓ

+∞∑n=−∞

eiynx F (yn), (8.2)

em que yn = (2πn/2ℓ) e

F (yn) = 12π

∫ ℓ

−ℓf(u)e−iynu du . (8.3)

Como o termo dentro do somatório em (8.2) é da forma de uma soma de Riemann,

f(x) =∑n

hneiynxF (yn),

em que hn = yn+1 − yn = 2π/2ℓ, no limite ℓ → +∞, vem que hn → 0, e, portanto,

f(x) =∫ ∞

−∞eiyxF (y) dy . (8.4)

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130 A TRANSFORMADA DE FOURIER

Assim, de (8.3), vem que

F (y) = 12π

∫ ∞

−∞f(x)e−iyx dx . (8.5)

O integral (8.4) generaliza o desenvolvimento de Fourier a funções definidas sobre todo oeixo real. A relação (8.5) é o coeficiente de Fourier, no limite em que ℓ → +∞.

Definição 8.1Seja f(x) : R → C. O integral

Fxf(ξ) := 1√2π

∫ +∞

−∞f(x)e−iξxdx

é a transformada de Fourier da função f(x), em que ξ é um parâmetro real.

Veja-se uma condição suficiente de existência de transformadas de Fourier.

Lema 8.2Se f ∈ L1(R), então a transformada de Fourier de f é uma função limitada e contínua.

DEMONSTRAÇÃO.

Como, por hipótese, f ∈ L1(R),

|Ff | = 1√2π

∣∣∣∣∫ ∞

−∞f(x)e−iξxdx

∣∣∣∣ ≤ 1√2π

∫ +∞

−∞|f(x)||e−iξx|dx

= 1√2π

∫ +∞

−∞|f(x)|dx < ∞.

Assim, Ff(ξ) é limitada.

Seja ξn uma sucessão convergente para ξ. Como |f(x)e−iξnx| ≤ |f(x)|, pelo teoremada convergência dominada 1.4,

limn→∞

1√2π

∫ ∞

−∞f(x)e−iξnxdx = 1√

∫ ∞

−∞limn→∞

f(x)e−iξnxdx = Ff(ξ)

e Ff(ξ) é contínua (Exercício 4.1).

Claro está que Fxf(ξ) é um operador linear contínuo, pois:

a) F(f + g) = Ff + Fg;

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A TRANSFORMADA DE FOURIER E AS FUNÇÕES DE GREEN 131

b) F(αf) = αFf .

c) Ffn → Ff , desde que fn → f .

Do lema anterior, decorre que Ff(ξ) é majorada por uma constante em todo o seu domí-nio. Então, ||Ff ||L∞ = ess sup |Ff | < ∞ (Capítulo 2), e a tranformada de Fourier podeser considerada como um operador Ff : L1(R) → L∞(R).

Seja f uma função contínua na reta real R. Diz-se que f é rapidamente decrescente noinfinito se, para todo o m > 0, |x|mf(x) é limitada. Ora, como |x|m+1f(x) é limitada,lim|x|→∞ |x|mf(x) = 0. Nestas condições, seja S(R) o conjunto de todas as funções infi-nitamente diferenciáveis para as quais f e todas as suas derivadas decrescem rapidamentepara infinito. S(R) designa-se por espaço de Schwartz e este conjunto já foi encontrado nocapítulo 6, no contexto da teoria das distibuições. Nestas condições é importante referir,sem demonstração, o teorema:

Teorema 8.3 ([Schwartz, 1966])Seja S(R) o espaço de Schwartz ou das funções de teste φ : R → R (Capítulo 6). Então tem-se:

a) S(R) é denso no espaço de Hilbert L2(R).

b) Se φ ∈ S(R), então Fφ ∈ S(R).

c) A transformada de Fourier é uma bijeção em S(R).

Vejam-se algumas propriedades da transformada de Fourier.

A transformada de Fourier da derivada de uma função. Sejam f e f ′ funçõessomáveis, f,f ′ ∈ L1(R) e assuma-se ainda que f é absolutamente contínua. Então, tem-seque

Ff ′ = (iξ) Ff .

Em geral, se f (n) ∈ L1(R),Ff (n) = (iξ)n Ff .

Como, para além de integrável, f é absolutamente contínua,

f(x) = f(0) +∫ x

0f ′(x)dx,

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132 A TRANSFORMADA DE FOURIER

em que f ′ existe (q.t.p). Como f é integrável, o segundo membro terá que ter um limitequando x → ±∞ e este limite só pode ser zero. Caso contrário f não seria integrável emR, e, portanto, limx→±∞ f(x) = 0. Assim,

Ff ′ = 1√2π

∫ +∞

−∞f ′(x)e−iξxdx

= 1√2πf(x)e−iξx

∣∣∣∣+∞

−∞+ 1√

∫ +∞

−∞iξf(x)e−iξxdx = (iξ) Ff .

Transformada de Fourier da translação. Seja f(x) ∈ L1(R), então, com u = x−h,

Fx−hf = 1√2π

∫ +∞

−∞f(x− h)e−iξxdx

= 1√2π

∫ +∞

−∞f(u)e−iξ(u+h)du = e−iξh Fxf.

Derivada da transformada de Fourier. Seja f ∈ L1(R) e xf ∈ L1(R), então

d

dξFf = 1√

2πd

∫ +∞

−∞f(x)e−iξxdx =

= 1√2π

∫ +∞

−∞(−ix)f(x)e−iξxdx = F ((−ix) f(x)) .

Se xnf(x) ∈ L1(R), tem-se que

dn

dξnFf = F ((−ix)n f(x)) .

Convolução ou multiplicação de tranformadas de Fourier. Sejam f e g funçõesde L1(R) e sejam as suas transformadas de Fourier

Ff = 1√2π

∫ +∞

−∞f(u)e−iξudu e Fg = 1√

∫ +∞

−∞g(v)e−iξvdv.

O produto das transformadas de Fourier é

Ff.Fg = 12π

∫ +∞

−∞

∫ +∞

−∞f(u)g(v)e−iξ(u+v)dudv .

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A TRANSFORMADA DE FOURIER E AS FUNÇÕES DE GREEN 133

Introduzindo a transformação de variáveisx = u+ v

t = v⇒

u = x− t

v = t,

e como o jacobiano da transformação é J = 1, o produto das transformadas de Fourier é

Ff.Fg = 12π

∫ +∞

−∞

∫ +∞

−∞f(x− t)g(t)e−iξxdxdt

= 1√2π

∫ +∞

−∞

(1√2π

∫ +∞

−∞f(x− t)g(t)dt

)e−iξxdx .

Definindo a convolução de f com g como

f ∗ g := 1√2π

∫ +∞

−∞f(x− t)g(t)dt,

tem-se, então, que

Ff.Fg = 1√2π

∫ +∞

−∞(f ∗ g) e−iξxdx = F(f ∗ g) .

A convolução de duas funções é o análogo da multiplicação: o produto das transformadasde Fourier é igual à transformada de Fourier da convolução das funções.

Se g = f , então

C(x) := f ∗ f = 1√2π

∫ +∞

−∞f(x− t)f(t)dt,

em que C(x) é a função de correlação, e

FC = (Ff)2 .

Quando x tem as dimensões de um tempo, resulta que ξ tem as dimensões do inverso dotempo ou frequência e |Ff(ξ)|2 é o espectro de frequências ou potência.

Vejam-se dois resultados importantes da teoria de Fourier, o teorema integral de Fourier ea fórmula da reciprocidade das transformadas de Fourier.

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134 A TRANSFORMADA DE FOURIER

Teorema 8.4 (Integral de Fourier)Seja f : R → C uma função somável na reta, f ∈ L1(R). Seja F (ξ) a transformada de Fourier def(x),

F (ξ) = 1√2π

∫ +∞

−∞e−iξxf(x)dx.

Suponha-se ainda que f(x) obedece a uma condição de Dini,1 i.e., f(x) é tal que∫ δ

−δ

∣∣∣∣f(x+ t) − f(x)t

∣∣∣∣ dt < ∞

em cada ponto x e para todo o δ > 0. Então,

f(x+) + f(x−)2

= 1√2π

v.p.

∫ +∞

−∞F (ξ)eiξxdξ ,

em que v.p. se refere ao valor principal de Cauchy.2

Pelo teorema integral de Fourier, as relaçõesF (ξ) = 1√

∫ +∞

−∞e−iξxf(x)dx

f(x) = 1√2π

v.p.

∫ +∞

−∞eiξxF (ξ)dξ

(8.6)

designam-se por fórmulas de reciprocidade de Fourier. Introduzindo F (ξ) na expressão def(x), vem que

f(x) = 12π

∫ +∞

−∞eiξxdξ

∫ +∞

−∞e−iξtf(t)dt

e, portanto,

f(x) = 12π

∫ +∞

−∞f(t)dt

∫ +∞

−∞eiξ(x−t)dξ . (8.7)

1A condição de Dini tem uma interpretação geométrica simples. Assumindo que f é contínua e diferenciável,f(x+ t) ≃ f(x) + tf ′(x), o integral da condição de Dini tem o valor |f ′(x)|2δ. Se f e a sua derivada não são funçõescontínuas em x, mas se os limites laterais existem, então a condição deDini é aproximadamente (|f ′(x−)|+|f ′(x+)|)δ.Assim, a condição de Dini pode ser vista como uma condição de finitude da derivada de f em todos os pontos do seudomínio.

2Suponha-se, por hipótese, que f(x) é uma função contínua emR−x0, exceto no ponto x0. Se limx→x0 f(x) =∞, o integral de f(x) ao longo de R pode não existir. No entanto, pode-se definir o valor principal de Cauchy dointegral, como

I = v.p.

∫ +∞

−∞f(x)dx = lim

ε→0

[∫ x0−ε

−∞f(x)dx+

∫ +∞

x0+εf(x)dx

].

Se, depois de tomado o limite, obtivermos uma quantidade finita, então I é o valor principal de Cauchy do integral,embora o integral da função não exista no sentido de Riemann. Por exemplo, se f(x) = 1/x3, o integral desta funçãoem R não existe no sentido de Riemann, mas o seu valor principal de Cauchy é 0.

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A TRANSFORMADA DE FOURIER E AS FUNÇÕES DE GREEN 135

A relação (8.7) designa-se por fórmula integral de Fourier, sendo válida nas condições do teo-rema integral de Fourier. Da fórmula integral de Fourier decorre que

12π

∫ +∞

−∞eiξ(x−t)dξ = δ(x− t), (8.8)

pois

f(x) =∫ +∞

−∞f(t)δ(x− t)dt = f(x)

e (8.8) é uma representação da distribuição δ de Dirac.

Uma consequência do teorema integral de Fourier é a fórmula para a transformada deFourier do produto de funções. Sejam f e g duas funções nas condições do teorema integralde Fourier e sejam F e G as suas transformadas de Fourier. Então,

F(fg) = 1√2π

∫ +∞−∞ f(x).g(x)e−iξxdx

= 1(2π)3/2

∫ +∞

−∞

∫ +∞

−∞

∫ +∞

−∞F (u)eiuxdu G(v)eivxdv e−iξxdx

= 1(2π)3/2

∫ +∞

−∞

∫ +∞

−∞F (u)G(v)dudv

∫ +∞

−∞eix(u+v−ξ)dx

= 1√2π

∫ +∞

−∞

∫ +∞

−∞F (u)G(v)δ((v + u) − ξ)dudv

= 1√2π

∫ +∞

−∞F (u)du

(∫ +∞

−∞G(v)δ(v − (ξ − u))dv

)= 1√

∫ +∞

−∞F (u)G(ξ − u)du = (Ff) ∗ (Fg)

e tem-se, assim, que F(fg) = Ff ∗ Fg.

Para funções de várias variáveis, as fórmulas de reciprocidade de Fourier escrevem-se

F (ξ) = 1(2π)n/2

∫Rn

f(r)e−iξ.rdr

f(r) = 1(2π)n/2 v.p.

∫Rn

F (ξ)eiξ.rdξ,

em que r = xex+yey+. . ., ξ = ξ1e1+ξ2e2+. . . e tudo o que foi feito até aqui generaliza-sefacilmente. Isto é, os produtos ξx são substituídos pelos produtos internos ξ.r, e a constante√

2π é substituída por (2π)n/2.

DEMONSTRAÇÃO. (teorema integral de Fourier)

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136 A TRANSFORMADA DE FOURIER

Por (8.8), o integral ∫ +∞

−∞eiξ(x−t)dξ,

que surge na fórmula de Fourier (8.7), não está bemdefinido no sentido tradicional. Comece--se então por escrever

eiξ(x−t) = cos ξ(x− t) + i sin ξ(x− t) .

Comf(t)eiξ(x−t) = f(t) cos ξ(x− t) + if(t) sin ξ(x− t),

vem que

v.p.

∫ +∞

−∞f(t) sin ξ(x− t) dξ = 0,

pois sin ξ(x− t) é uma função ímpar da variável ξ. Assim, quer-se demonstrar que

f(x) = 12π

∫ +∞

−∞dξ

∫ +∞

−∞eiξ(x−t)f(t) dt

= 12π

∫ +∞

−∞dξ

∫ +∞

−∞f(t) cos ξ(x− t) dt .

Calcule-se o integral

I(A) = 22π

∫ +∞

−∞f(t) dt

∫ A

0cos ξ(x− t)dξ

= 1π

∫ +∞

−∞f(t) sinA(x− t)

(x− t)dt .

Com a substituição de variáveis z = t− x, vem para o integral anterior

I(A) = 1π

∫ +∞

−∞f(z + x) sinAz

zdz .

Como 1π

∫ +∞−∞

sinAzz dz = 1, tem-se que

I(A) − f(x).1 = 1π

∫ +∞

−∞

f(z + x) − f(x)z

sinAz dz

= 1π

∫ N

−N

f(z + x) − f(x)z

sinAz dz

+ 1π

∫ −N

−∞

f(x+ z) − f(x)z

sinAzdz

+ 1π

∫ ∞

+N

f(x+ z) − f(x)z

sinAz dz .

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A TRANSFORMADA DE FOURIER E AS FUNÇÕES DE GREEN 137

Escolhendo N suficientemente grande, os dois últimos integrais são tão pequenos quantose queira. Como, para φ ∈ L1([a,b]) e diferenciável,

limλ→∞

∫ b

a

φ(x) sinλxdx = limλ→∞

(−φ(x)cosλx

λ

∣∣∣∣ba

+∫ b

a

φ′(x)cosλxλ

dx

)= 0

e atendendo à condição de Dini, f(x+z)−f(x)z é somável no intervalo [−N,N ] e, portanto,

limA→∞

I(A) = f(x),

no sentido do valor principal de Cauchy. Está assim demonstrado o teorema integral deFourier.

Teorema 8.5 (Plancherel)Sejam f1, f2 ∈ L2(R) e suponha-se que as suas transformadas de Fourier também pertencem a L2(R).3

Então, tem-se:

a)∫f∗

1 (x)f2(x)dx =∫F ∗

1 (ξ)F2(ξ)dξ;

b)∫

|f(x)|2dx =∫

|F (ξ)|2dξ (||f(x)|| = ||F (ξ)||).

DEMONSTRAÇÃO.

Como f1, f2 ∈ L2(R),∫ +∞

−∞f∗

1 (x)f2(x)dx = 1√2π

∫ +∞

−∞

∫ +∞

−∞e−iξxF ∗

1 (ξ)dξf2(x)dx

= 1√2π

∫ +∞

−∞F ∗

1 (ξ)(∫ +∞

−∞f2(x)e−iξxdx

)dξ

=∫ +∞

−∞F ∗

1 (ξ)F2(ξ)dξ < ∞

e a) está demonstrado. Fazendo f1 = f2 = f , b) está demonstrado.

Pelo Teorema de Plancherel, a transformada de Fourier pode ser interpretada como umoperador unitário. Se f ∈ L2(R), o operador F : L2(R) → L2(R) é um operador lineare, pelo teorema de Plancherel,

< Ff,Fg >=< f,g > .

3Como se viu no teorema 2.2, f ∈ L1(R) não é suficiente para garantir que f ∈ L2(R). Para uma demonstraçãocompleta e mais técnica, veja-se [Kolmogoroff e Fomin, 1977].

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138 A TRANSFORMADA DE FOURIER

Assim, ||Ff || = ||f || e F é um operador unitário.

Veja-se um exemplo do cálculo de uma transformada de Fourier. Seja a função gaussiana

f(x) = ke−a2x2.

Como f ∈ L1(R), a sua transformada de Fourier existe. Então,

Ff(ξ) = k√2π

∫ +∞

−∞e−a2x2

e−iξxdx = k√2π

∫ +∞

−∞e−a2x2

cos(ξx) dx,

pois f(x) é par e sin(ξx) é uma função ímpar. Derivando esta última expressão em ordema ξ, vem que

d

dξFf = − k√

∫ +∞

−∞xe−a2x2

sin(ξx) dx

= k

2a2√

2πe−a2x2

sin(ξx)∣∣∣∣+∞

−∞− k

2a2√

∫ +∞

−∞ξe−a2x2

cos(ξx) dx

= − 12a2 ξ Ff .

Com ϕ(ξ) = Ff , a relação anterior define a equação diferencial

d

dξϕ = − 1

2a2 ξ ϕ .

Ora, esta equação tem a solução

ϕ(ξ) = Me− ξ2

(2a)2 .

Com a condição

ϕ(ξ = 0) = M = k√2π

∫ +∞

−∞e−a2x2

dx = k√2π

√π

a,

vem que

ϕ(ξ) = k√2π

∫ +∞

−∞e−a2x2

e−iξxdx = k

a√

2e

− ξ2

(2a)2 .

Assim, a transformada de Fourier de uma função gaussiana é ainda uma função gaussiana.

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A TRANSFORMADA DE FOURIER E AS FUNÇÕES DE GREEN 139

8.2 A RELAÇÃO DE INCERTEZA DE HEISENBERG

Decorre do teorema de Plancherel que se φ(x) é um elemento de um espaço de Hilbert e∫φ(x)∗φ(x)dx = 1, então,

∫(Fφ)∗(Fφ)dξ = 1. Isto é, seφ(x)∗φ(x) é uma distribuição de

probabilidades, então (Fφ)∗(Fφ) é ainda uma distribuição de probabilidades. Aplique-seesta propriedade a uma função gaussiana, de quadrado somável e com norma 1. Assim,

φ(x) =(

2a2

π

)1/4

e−a2x2

Fφ = 1(2a2π)1/4 e

−ξ2/4a2.

(8.9)

Como, φ∗φ e (Fφ)∗(Fφ) são distribuições de probabilidade gaussianas, centradas na ori-gem, os seus valores médios são nulos e os desvios quadráticos médios nas variáveis x e ξsão, respetivamente,

(∆x2)1/2 =(∫

Rx2φ∗φdx

)1/2

= 12a

(∆ξ2)1/2 =(∫

Rξ2(Fφ)∗(Fφ)dξ

)1/2

= a .

Assim,(∆x2)1/2.(∆ξ2)1/2 = 1

2= constante . (8.10)

Na figura 8.1 estão representados os gráficos de φ∗φ e de (Fφ)∗(Fφ), para a = 1 e a = 2.

a=1

ϕ*ϕ

(Fϕ)*(Fϕ)

-4 -2 0 2 40.00.20.40.60.81.01.21.4

x

a=2

ϕ*ϕ

(Fϕ)*(Fϕ)

-4 -2 0 2 40.00.20.40.60.81.01.21.4

x

Figura 8.1 Gráficos das funções (φ∗φ) e (Fφ∗Fφ) em que φ é uma função gaussiana, com aparametrização (8.9).

A relação (8.10) exprime o facto de a transformada de Fourier de uma função fortementelocalizada ser uma função com uma grande dispersão e vice-versa.

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140 A RELAÇÃO DE INCERTEZA DE HEISENBERG

A relação de incerteza de Heisenberg da mecânica quântica é uma generalização de (8.10)para distribuições de probabilidade arbitrárias. Veja-se então o caso geral. Assuma-se queφ,φ′ ∈ L2(R) e que

∫R φ

∗φdx = 1. Assim,

1 =∫Rφ∗φdx = xφ∗φ|+∞

−∞ −∫Rxd

dx(φ∗φ)dx

= −∫R(xφ∗′φ+ xφ∗φ′)dx .

Passando a expressão anterior ao módulo e pela desigualdade triangular,

1 ≤∫R

|x| |φ∗′| |φ|dx+∫R

|x| |φ∗| |φ′|dx

= 2∫R

|x| |φ′| |φ|dx .

pois |φ∗′| = |φ′|. Pela desigualdade de Cauchy-Schwarz,

1 ≤ 2(∫

R|x|2 |φ|2dx

)1/2(∫R

|φ′|2dx)1/2

. (8.11)

Aplicando o teorema de Plancherel ao segundo termo do segundomembro da desigualdadeanterior, tem-se que ∫

R|φ′|2dx =

∫R

|Fφ′|2dξ =∫R

|ξ|2|Fφ|2dξ . (8.12)

Introduzindo (8.12) em (8.11), chega-se à desigualdade∫R

|x|2 |φ|2dx∫R

|ξ|2|Fφ|2dξ ≥ 14. (8.13)

Se φ é uma função gaussiana, de (8.13), obtém-se a igualdade (8.10). Calcule-se

(∆(x− x0)2)(∆(ξ − ξ0)2) =∫R(x− x0)2 |φ|2dx

∫R(ξ − ξ0)2|Fφ|2dξ . (8.14)

Como (8.13) é válida para todo o φ,φ′ ∈ L2(R), escolha-se φ = eiξ0xf(x − x0). Como,Fφ = e−ix0(ξ−ξ0)Ff(ξ − ξ0), introduzindo esta expressão em (8.14), por (8.13), obtém-se

(∆(x− x0)2)(∆(ξ − ξ0)2) =∫Ry2 |f |2dy

∫Rη2|Ff |2dη ≥ 1

4, (8.15)

em que y = x−x0 e η = ξ−ξ0. A desigualdade (∆(x−x0)2)(∆(ξ−ξ0)2) ≥ 14 é a relação

de incerteza de Heisenberg, válida para todo o x0, ξ0 ∈ R.

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A TRANSFORMADA DE FOURIER E AS FUNÇÕES DE GREEN 141

8.3 A FÓRMULA DA SOMA DE POISSON

Estabeleça-se uma relação entre as séries e as transformadas de Fourier. Seja f ∈ L2(R) eseja a função

g(x) =+∞∑

n=−∞f(x+ nx0) .

Por construção, a função g(x) é periódica, de período x0. Assim, pode-se desenvolver g(x)em série de Fourier no intervalo [−x0/2,x0/2],

g(x) =+∞∑

m=−∞cme

2πimx/x0 ,

em que

cm = 1x0

∫ +x0/2

−x0/2g(x)e−2πimx/x0dx .

Com y = x+ nx0, tem-se que

cm = 1x0

+∞∑n=−∞

∫ +x0/2

−x0/2f(x+ nx0)e−2πimx/x0dx

= 1x0

+∞∑n=−∞

∫ x0(n+1/2)

x0(n−1/2)f(y)e−2πimy/x0dy

=√

2πx0

Ff(

2πmx0

).

Então,+∞∑

n=−∞f(x+ nx0) =

√2πx0

+∞∑m=−∞

Ff(

2πmx0

)e2πimx/x0 .

Para x = 0, obtém-se a fórmula da soma de Poisson:

+∞∑n=−∞

f(nx0) =√

2πx0

+∞∑m=−∞

Ff(

2πmx0

). (8.16)

Veja-se uma aplicação da fórmula da soma de Poisson. Seja a série

+∞∑n=1

cos an1 + n2 = 1

2

+∞∑n=−∞

eian

1 + n2 − 12.

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142 FUNÇÕES DE GREEN

Assim,+∞∑n=1

cos an1 + n2 = 1

2

+∞∑n=−∞

f(n) − 12,

em que f(x) = eiax/(1 + x2). Como, Ff =√π/2e−|ξ−a| (Exercício 8.7 c)), pela fórmula

da soma de Poisson (8.16) e para 0 < a < 2π, tem-se que

+∞∑n=−∞

f(n) = π

+∞∑m=−∞

e−|2πm−a|

= π

0∑m=−∞

e−(a−2πm) + π

+∞∑m=1

e−(2πm−a)

= πe−a∞∑m=0

(e−2π)m + πea+∞∑m=1

(e−2π)m

= πe−a + ea−2π

1 − e−2π

e, portanto,+∞∑n=1

cos an1 + n2 = π

e−a + ea−2π

1 − e−2π − 12.

8.4 FUNÇÕES DE GREEN

Veja-se uma aplicação das transformadas de Fourier para a obtenção de soluções de equa-ções diferenciais lineares com termos não homogéneos.

Considere-se a equação diferencial que descreve o movimento de um oscilador harmónicocom atrito

d2x

dt2+ 2λ dx

dt+ w2

0x = h(t), (8.17)

em que w0 é a frequência e λ é a constante de atrito. Suponha-se conhecida a solução x(t)e sejam X(ξ) e H(ξ) as transformadas de Fourier de x(t) e de h(t),

X(ξ) = 1√2π

∫ +∞

−∞x(t)e−iξtdt e H(ξ) = 1√

∫ +∞

−∞h(t)e−iξtdt .

Como Ff ′ = (iξ)Ff , pode-se aplicar a transformada de Fourier à equação diferencial(8.17), obtendo-se

−ξ2X(ξ) + 2iξλX(ξ) + w20X(ξ) = H(ξ),

ou seja,X(ξ) = H(ξ) 1

(−ξ2 + 2iξλ+ w20)

:= H(ξ)G(ξ).

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A TRANSFORMADA DE FOURIER E AS FUNÇÕES DE GREEN 143

Assim, a transformada de Fourier da solução x(t) da equação diferencial (8.17) é o produtode duas transformadas de Fourier. Pelas propriedades da convolução, existe uma funçãoG(t) tal que

F(x(t)) = X(ξ) = F(h).F(G) = F(h ∗G) .

Então, a solução da equação diferencial (8.17) é

x(t) = h(t) ∗G(t) = 1√2π

∫ +∞

−∞h(s)G(t− s) ds .

Pela fórmula da inversão da transformada de Fourier,

G(t) = 1√2π

∫ +∞

−∞G(ξ)eiξt dξ = 1√

∫ +∞

−∞

eiξt

(−ξ2 + 2iξλ+ w20)dξ. (8.18)

Analise-se o integral (8.18). Como a função integranda em (8.18) tem polos nos pontos

ξ± = iλ±√w2

0 − λ2, (8.19)

pode-se aplicar o teorema dos resíduos para o cálculo do integral (8.18) (Apêndice A).

Considerando que a variável ξ assume valores no plano complexo, pode-se calcular facil-mente o integral de linha sobre um contorno circular fechado de raio R que contenha noseu interior os pontos ξ+ e ξ−. Primeiro, considere-se o caso em que ω2

0 > λ2 (figura 8.2).

-R R

γ1

γ2

ξ- ξ+

Figura 8.2 Circulação no plano complexo em torno dos polos ξ+ e ξ− da função integranda em (8.18),para ω2

0 > λ2.

Seja o contorno fechado [−R,R] ∪ γ1, com circulação anti-horária, como indicado nafigura 8.2. Com ξ = Reiθ = R cos θ + iR sin θ, sobre a curva γ1 com R fixo, tem-se que

dξ = dξ

dθdθ = Rieiθdθ.

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144 FUNÇÕES DE GREEN

Ao longo da curva γ1,

eiξtdξ = eiRt cos θe−Rt sin θRieiθ dθ .

Se t > 0, no limite quando R → ∞, e−Rt sin θ → 0 e

1√2π

limR→+∞

∫[−R,R]∪γ1

G(ξ)eiξtdξ = 1√2π

limR→+∞

∫ R

−RG(ξ)eiξtdξ = G(t) .

Pelo teorema dos resíduos,

G(t) = 1√2π

∫ +∞

−∞

eiξt

(−ξ2 + 2iξλ+ w20)dξ

= 2πi√2π

Res (f,ξ+) + 2πi√2π

Res (f,ξ−) ,

em que f(ξ) representa a função sob o sinal de integral e Res (f,ξ) é o resíduo de f calcu-lado no ponto ξ.

Como

Res(f,ξ+) = − eiξ+t

(ξ+ − ξ−)e Res(f,ξ−) = eiξ−t

(ξ+ − ξ−),

em que, por (8.19), (ξ+ − ξ−) = 2√w2

0 − λ2. Para t > 0, tem-se, então, que

G(t) = − πi√2π

1√w2

0 − λ2

(eiξ+t − eiξ−t

)=

√2πe−λt 1√

w20 − λ2

sin(t√w2

0 − λ2).

Se t < 0, com ξ = Re−iθ, a circulação é no semiplano inferior (figura 8.2) e como nãoexistem polos no interior do contorno fechado [−R,R] ∪ γ2, tem-se que

G(t) = 0 se t < 0 .

Mostrou-se, assim, que a solução da equação diferencial (9.8) é

x(t) = 1√2π

∫ +∞

−∞G(t− s)h(s)ds = 1√

∫ t

−∞G(t− s)h(s)ds,

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A TRANSFORMADA DE FOURIER E AS FUNÇÕES DE GREEN 145

em que

G(t) =

2πe−λt 1√w2

0−λ2sin(t√w2

0 − λ2)

se t > 0 e ω2 > λ2

0 se t < 0 .

No caso em que ω2 < λ2, o resultado é idêntico, mas o termo

1√w2

0 − λ2sin(t√w2

0 − λ2)

é substituído por1√

λ2 − w20

sinh(t√λ2 − w2

0

).

A função G(t) é a função de Green, propagador ou solução fundamental da equação diferencial(8.17): G(t − s) é a quantidade por que se tem de multiplicar a perturbação h(s) paradeterminar a resposta do sistema no instante t > s. Também se diz que G(t − s) é umafunção causal, pois G(t− s) = 0 para t− s < 0.

No caso particular em que h(t) =√

2πδ(t), a solução da equação diferencial não homo-génea é

x(t) =√

2π√2π

∫ +∞

−∞G(t− s)δ(s)ds = G(t),

e, portanto, a função de Green G(t) obedece à equação diferencial às distribuições

d2G

dt2+ 2λdG

dt+ w2

0G =√

2πδ(t) .

Equação de Poisson a três dimensões. A técnica desenvolvida anteriormente podeser usada para a determinação de funções de Green de algumas equações às derivadas par-ciais com termos não homogéneos. Por exemplo, o potencial criado por uma distribuiçãoespacial de cargas ρ(r) obedece à equação de Poisson

∇2ψ = ∂2ψ

∂x2 + ∂2ψ

∂y2 + ∂2ψ

∂z2 = − 1ε0ρ(r), (8.20)

em que r ∈ R3 e ε0 é a permitividade elétrica do vazio ([ε0] =C2/(Nm2)).

Como se viu no caso da equação do oscilador harmónico com atrito, a solução do problemanão homogéneo pode ser obtida através da solução de uma equação às distribuições em

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146 FUNÇÕES DE GREEN

que o termo não homogéneo é substituído pela distribuição delta de Dirac. A solução daequação às distribuições assim obtida é a função de Green do problema não homogéneo.

A equação para a determinação da função de Green da equação de Poisson é

∇2G(r) = (2π)3/2δ(r) = (2π)3/2δ(x)δ(y)δ(z) . (8.21)

Com ξ = ξ1e1 + ξ2e2 + ξ3e3, ξ = |ξ|, r = xex + yey + zez , a transformada de Fourier daequação (8.21) nas três variáveis x, y e z é

G(ξ) = − 1ξ2 ,

em que G = FG. Invertendo a transformada de Fourier,

G(r) = − 1(2π)3/2

∫ +∞

−∞

∫ +∞

−∞

∫ +∞

−∞

eiξ.r

ξ2 dξ

= − 1(2π)3/2

∫ +∞

0

∫ 2π

0

∫ π

0eiξr cos θ sin θdθdϕdξ

= − 1(2π)1/2

∫ +∞

0

∫ π

0eiξr cos θ sin θdθdξ

= −√

2√π

∫ +∞

0

sin ξrξr

dξ = −√π√2

1|r|,

(8.22)

em que se fez uma transformação para coordenadas polares, com eixo polar r, dξ1dξ2dξ3 =ξ2 sin θdθdϕdξ,4 e se utilizou a igualdade

v.p.

∫ +∞

−∞

eix

xdx = 2i v.p.

∫ +∞

0

sin(x)x

dx = iπ .

A função de Green (8.22) é a solução da equação de Poisson (8.21). Assim, a solução daequação de Poisson (8.20) é

ψ(r) = G ∗ (− 1ε0ρ)(r) = 1

4πε0

∫ +∞

−∞

∫ +∞

−∞

∫ +∞

−∞

1|r − s|

ρ(s)ds,

que é a expressão geral para o potencial gerado por uma distribuição espacial estáticade cargas. Para uma carga pontual q localizada no ponto de coordenadas r0, ρ(r) =qδ(r − r0) = qδ(x− x0)δ(y − y0)δ(z − z0), tem-se que

ψ(r) = q

4πε0

1|r − r0|

.

4Como o eixo polar é r, o ângulo que ξ faz com r é θ, pelo que o ângulo ϕ é medido num plano perpendicular a r.Deste modo, ξ.r = ξr cos θ, e o ângulo de projecção θ coincide com o ângulo de colatitude das coordenadas esféricas.

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A TRANSFORMADA DE FOURIER E AS FUNÇÕES DE GREEN 147

Equação de Poisson a duas dimensões. A técnica desenvolvida anteriormente nãoé válida em dimensão dois. Neste caso, a equação para a determinação da função de Greené

∂2G(x,y)∂x2 + ∂2G(x,y)

∂y2 = 2πδ(x)δ(y), (8.23)

em que (x,y) ∈ R2. Usando a técnica de transformadas de Fourier, chega-se a um integraldificilmente calculável. No entanto, por um cálculo simples, tem-se que(

∂2

∂x2 + ∂2

∂y2

)log(x2 + y2) = 0 , para (x2 + y2) = 0,

pelo que a função G = A log(x2 + y2), em que A é uma constante, é uma boa candidatapara a função de Green da equação de Poisson a duas dimensões.

Assuma-se, então, que a solução de (8.23) no sentido das distribuições éG = A log(x2+y2),em que A é uma constante. Então, o funcional linear associado à distribuição gerada pelaparte homogénea da equação (8.23) é

F = A

∫ ∫log(x2 + y2)

(∂2

∂x2 + ∂2

∂y2

)ϕ(x,y)dxdy, (8.24)

em que ϕ(x,y) ∈ D, eD é o espaço das funções de teste a duas variáveis. SeG = A log(x2+y2) é a função de Green da equação de Poisson a duas dimensões, por (8.23), tem-se que

F = 2πϕ(0,0) . (8.25)

Calcule-se então F . Introduzindo coordenadas polares em (8.24), dxdy = rdrdθ, obtém-se

F = A

∫ ∞

0

∫ 2π

0log(r2)

(∂2

∂r2 + 1r

∂r+ 1r2

∂2

∂θ2

)ϕ(r,θ)rdrdθ . (8.26)

Calcule-se agora os integrais dos três termos em (8.26). O integral do primeiro termo em(8.26) é

limε→0

A

∫ ∞

ε

∫ 2π

0r log(r2)∂

∂r2 drdθ

= limε→0

A

∫ 2π

0

[r log(r2)∂ϕ

∂rdθ

]∞

ε

− limε→0

A

∫ 2π

0

∫ ∞

ε

(log(r2) + 2)∂ϕ∂rdrdθ

= − limε→0

A

∫ 2π

0ε log ε2 ∂ϕ(ε,θ)

∂rdθ + lim

ε→0A

∫ 2π

02ϕ(ε,θ)dθ

− limε→0

A

∫ 2π

0

[log(r2)ϕdθ

]∞ε

+ limε→0

A

∫ 2π

0

∫ ∞

ε

2rϕdrdθ .

(8.27)

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148 FUNÇÕES DE GREEN

O integral do segundo termo em (8.26) é

A

∫ ∞

0

∫ 2π

0log(r2)∂ϕ

∂rdrdθ = lim

ε→0A

∫ ∞

ε

∫ 2π

0log(r2)∂ϕ

∂rdrdθ

= limε→0

A

∫ 2π

0

[log(r2)ϕdθ

]∞ε

− limε→0

A

∫ 2π

0

∫ ∞

ε

2rϕdrdθ

= − limε→0

A

∫ 2π

0log ε2ϕ(ε,θ)dθ − lim

ε→0A

∫ 2π

0

∫ ∞

ε

2rϕdrdθ .

(8.28)

O integral do terceiro termo em (8.26) é

A

∫ ∞

0

∫ 2π

0

1r

log r2 ∂2ϕ(r,θ)∂θ2 drdθ = A

∫ ∞

0

1r

log r2dr

(∂ϕ(r,θ)∂θ

∣∣∣∣2π0

)= 0, (8.29)

pois tanto ϕ como as suas derivadas são contínuas e, portanto, ∂ϕ(r,0)∂θ = ∂ϕ(r,2π)

∂θ .

Introduzindo (8.27), (8.28) e (8.29) em (8.26), obtém-se

F = − limε→0

A

∫ 2π

0ε log ε2 ∂ϕ(ε,θ)

∂rdθ + 2A

∫ 2π

0ϕ(0,θ)dθ . (8.30)

Como, limε→0 ε log ε2 = limε→0 2ε log ε = limε→0 2 log ε/(1/ε) = 0 e ϕ(0,θ) = ϕ(0,0), ointegral (8.30) tem o valor

F = 4πAϕ(0,0) . (8.31)

Comparando (8.31) com (8.25), obtém-se A = 1/2, e a função de Green para a equaçãode Poisson a duas dimensões é

G(x,y) = 12

log(x2 + y2) = log r . (8.32)

Em conclusão, a solução da equação de Poisson não-homogénea

∂2ϕ

∂x2 + ∂2ϕ

∂y2 = f(x,y)

éϕ(x,y) = 1

∫ ∞

−∞

∫ ∞

−∞f(u,v) log((x− u)2 + (y − v)2)dudv .

A função de Green (8.32) designa-se por potencial logarítmico, sendo usada no estudo davorticidade de fluidos.

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A TRANSFORMADA DE FOURIER E AS FUNÇÕES DE GREEN 149

EXERCÍCIOS

8.1 Determine a transformada de Fourier e a potência das funções:

a)

f(x) =

sin(ax) se |x| ≤ 2πn/a0 se |x| > 2πn/a.

b)

f(x) =

1 se |x| ≤ a

0 se |x| > a.

c)

f(x) =

c(1 − |x|/a) se |x| ≤ a

0 se |x| > a.

d)

f(x) =

e−ax se |x| ≥ 00 se |x| < 0.

e) f(x) = sin(ax) e f(x) = cos(ax).

Faça os gráficos de f e Ff e interprete o tipo de informação contido na transformadade Fourier.

8.2 Mostre que se uma função é par, a sua transformada de Fourier é real. Analogamente,a transformada de Fourier de uma função ímpar é imaginária.

8.3 Mostre que f ∗ g = g ∗ f .

8.4 Calcule a transformada de Fourier da função delta de Dirac e da função constante.

8.5 Mostre que o produto δ(x)δ(x) não está bem definido.

8.6 Calcule a transformada de Fourier de uma função periódica.

8.7 Usando o método dos resíduos, determine a transformada de Fourier das funções:

a) f(x) = 1/x.

b) f(x) = 1/(x2 + a2).

c) f(x) = eiax/(1 + x2).

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150 FUNÇÕES DE GREEN

8.8 Com o resultado do exercício 8.1b), calcule o integral∫ +∞

−∞

sin2 x

x2 dx .

8.9 Calcule F4f , em que F é o operador transformada de Fourier e f ∈ L2(R). Deter-mine os valores próprios e os vetores próprios do operador F .

8.10 Determine as representações das distribuições δ(n)(x) no sentido de Fourier.

8.11 Seja a função de correlação

c(f) =∫ +∞

−∞e−|x−y|Sinal(x− y)f(y) dy.

Usando transformadas de Fourier, determine a função ou distribuição f que obedeceà equação c(f) = δ(x).

8.12 Através da transformada de Fourier, obtenha a fórmula de Alembert para a soluçãoda equação das ondas.

8.13 Determine a função de Green da equação

∂2ϕ

∂x2 −m2ϕ = 0,

em que m é uma constante positiva e x ∈ R.

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9A EQUAÇÃO DO CALOR

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A EQUAÇÃO DO CALOR 153

Deduz-se a equação do calor ou da difusão e determinam-se algumas soluções em meios finitos einfinitos.

9.1 A EQUAÇÃO DO CALOR EM MEIOS INFINITOS

Considere-se um corpo homogéneo e bom condutor de calor. Imagine-se no seu interioruma superfície fechada S, bordo de um volume V ⊂ R3. O fluxo de calor através deum elemento de superfície dS e durante o intervalo de tempo dt é proporcional à dife-rença de temperatura entre os dois lados da superfície — hipótese de Fourier — ou seja, éproporcional ao gradiente de temperatura ao longo da normal à superfície S. Isto é,

dQ = χ∂T

∂ndS dt = χ gradT.n dS dt,

em que n é a normal ao elemento de superfície dS e χ é uma constante de proporcio-nalidade, a condutividade térmica do material, com dimensões [χ]=watt m−1 K−1. Entre osinstantes t1 e t2, a quantidade de calor que sai ou entra através da superfície fechada S é

∆Q = Q(t2) −Q(t1) =∫ t2

t1

∮S

χ gradT.n dSdt

=∫ t2

t1

∫∫∫V

div (χ gradT ) dV dt,

em que se utilizou o teorema do fluxo-divergência. Como no interior da superfície Spode haver produção ou dissipação de calor, considera-se um termo adicional de fonteF (x,y,z,t). A função F (x,y,z,t) descreve as fontes e os sumidouros de calor no interior docorpo. Assim, a quantidade total de calor que sai ou entra através da superfície S é

Qtotal = Q1 +Qfonte

=∫ t2

t1

∫∫∫V

div (χ gradT ) dV dt+∫ t2

t1

∫∫∫V

F (x,y,z,t)dV dt.(9.1)

Por outro lado, a variação de calor entre os instantes t1 e t2 está relacionada com a tempe-ratura através da relação (lei de Carnot)1

∆Q = mcV ∆T, (9.2)

1Como ∆U = ∆Q+∆W e ∆U = mcV ∆T , a relação de Carnot decorre do facto de não haver trabalho realizadosobre o sistema (dV = 0).

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154 A EQUAÇÃO DO CALOR EM MEIOS INFINITOS

em que ∆T é a variação de temperatura entre os instantes t1 e t2, cV é o calor específico avolume constante e m é a massa da substância contida no volume V , interior à superfíciefechada S. Assim, por (9.2), a quantidade de calor no interior do volume V é

Q =∫ ∫ ∫

V

ρcV ∆TdV =∫ t2

t1

∫ ∫ ∫V

ρcV∂T

∂tdtdV, (9.3)

em que ρ é a densidade volúmica da substância. Igualando (9.1) a (9.3), obtém-se a equaçãode balanço de calor∫ t2

t1

∫ ∫ ∫V

(ρcV

∂T

∂t− div (χ gradT ) − F (x,y,z,t)

)dtdV = 0,

ou seja, na forma diferencial,

ρcV∂T

∂t= div(χ gradT ) + F (x,y,z,t) . (9.4)

Supondo que χ é uma constante, com cV ρ/χ = 1/k, a equação (9.4) escreve-se na forma

∂T

∂t= k

(∂2T

∂x2 + ∂2T

∂y2 + ∂2T

∂z2

)+ 1cV ρ

F (x,y,z,t), (9.5)

em que k é a difusibilidade térmica do material e tem as dimensões [k]=m2 s−1. A equação(9.5) designa-se por equação do calor ou da difusão e descreve processos termodinâmicosirreversíveis. Estes processos estão em geral associados a fluxos de energia sob a forma decalor ou a fluxos de matéria. No entanto, esta equação não descreve efeitos associadosa dilatações ou contrações do meio causadas por variações locais de temperatura. Nestesentido, a equação do calor (9.5) é uma equação aproximada.

Estude-se a propagação do calor nummeio homogéneo e infinito, com a distribuição inicialde temperatura

T (x,y,z,t = 0) = f(x,y,z). (9.6)

Considere-se ainda que não existem fontes e sumidouros no meio, pelo que F = 0. Paradeterminar a solução da equação do calor (9.5), usa-se a técnica das transformadas deFourier nas variáveis espaciais. Nestas variáveis, a transformada de Fourier da equação docalor (9.5) é

d

dt(Fx,y,zT ) = −k

(ξ2

1 + ξ22 + ξ2

3)

(Fx,y,zT ) ,

em que Fx,y,z = FxFyFz e x,y,z ∈ R. Com, Fx,y,zT := ϕ (ξ1,ξ2, ξ3,t) = ϕ(ξ,t), atransformada de Fourier da equação do calor é

d

dtϕ(ξ,t) + kξ2ϕ(ξ,t) = 0,

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A EQUAÇÃO DO CALOR 155

em que ξ2 = ξ21 + ξ2

2 + ξ23 e ξ1, ξ2 e ξ3 são as variáveis conjugadas (no sentido de Fourier)

de x, y e z, respetivamente. Esta equação diferencial tem a solução

ϕ(ξ,t) = ϕ(ξ,0)e−k(ξ21+ξ2

2+ξ23)t (9.7)

e, por (9.6), a função ϕ(ξ,0) é determinada pela condição

ϕ(ξ,0) = Fx,y,zT (x,y,z,t = 0) = Fx,y,z f(x,y,z) . (9.8)

Introduzindo (9.8) em (9.7), obtém-se

T (x,y,z,t) = F−1ξ

(ϕ(ξ,0)e−kξ2t

)= f(x,y,z) ∗ F−1

ξe−kξ2t .

Como Fxe−a2x2 = 1a

√2e

− ξ2

(2a)2 , vem que F−1ξ e

− ξ2

(2a)2 = a√

2e−a2x2 , e

T (x,y,z,t) = f(x,y,z) ∗[

1(2kt)3/2 e

− x2+y2+z2(4kt)

]= 1

(4πkt)3/2

∫R3f(u,v,w)e− (x−u)2+(y−v)2+(z−w)2

(4kt) dudvdw .

(9.9)

Assim, (9.9) é a solução geral da equação do calor nummeio infinito, para uma distribuiçãoinicial de temperatura f(x,y,z).

Considere-se que no instante t = 0 e na origem das coordenadas existe uma distribuiçãopontual de temperatura de intensidade infinita. Isto é,

T (x,y,z,0) = g(x,y,z) = T0δ(x)δ(y)δ(z) . (9.10)

Então, introduzindo (9.10) em (9.9), a solução da equação do calor é

T (x,y,z,t) = T0

(4πkt)3/2 e− x2+y2+z2

(4kt) . (9.11)

A temperatura média no meio é T0 =∫R3 Tdxdydz, independentemente do tempo. Como

o primeiro momento da distribuição de temperatura é zero, o segundo momento da dis-tribuição de temperatura é

∫R3(x2 + y2 + z2)Tdxdydz = T06kt e a dispersão é

√T06kt.

Ou seja, a dispersão aumenta proporcionalmente a√t. Na figura 9.1, está representada a

distribuição de temperatura (9.11) num meio infinito e para tempos diferentes.

Se a distribuição de temperatura num meio homogéneo e infinito é constante, f(x,y,z) =T0, por (9.9), tem-se que

T (x,y,z,t) = T0

(4πkt)3/2

∫R3e− (x−u)2+(y−v)2+(z−w)2

(4kt) dudvdw = T0

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156 A EQUAÇÃO DO CALOR EM MEIOS INFINITOS

=

=

=

- -

Figura 9.1 Distribuição de temperatura num corpo, para vários valores do tempo t, calculada a partir de(9.11), e em que r =

√x2 + y2 + z2. Os valores dos parâmetros são: k = 1 e T0 = 1.

e a solução da equação do calor é estacionária, como seria de esperar.

A solução da equação de calor foi determinada através de uma técnica de transformadasde Fourier em que a região de integração é o espaço euclidiano tridimensional.

Analise-se o caso da propagação de calor nummeio unidimensional semi-infinito. Assuma--se que a distribuição de temperatura no instante t = 0 é T (x,0) = f(x), com x ≥ 0, e, semperda de generalidade, T (0,t) = f(0) = 0.2 Neste caso tem-se um problema com valorinicial e uma condição fronteira de Dirichlet. Para se usar a técnica das transformadas deFourier, faça-se um prolongamento ímpar da função f(x),

f(x) =

f(x) para x ≥ 0−f(−x) para x < 0.

Assim, por (9.9), a solução da equação do calor unidimensional é

T (x,t) = 1(4πkt)1/2

∫ +∞

−∞f(u)e− (x−u)2

(4kt) du :=∫ +∞

−∞f(u)Φ(x− u,t)du, (9.12)

em que Φ(y,t) é uma função par em y. Nestas condições,

T (0,t) =∫ +∞

−∞f(u)Φ(−u,t)du = 0,

2Com a condição fronteira, T (0,t) = f(0) = T1, em que T1 é uma constante, pode-se fazer T (x,t) = T (x,t)−T1.Assim, T (0,t) = 0 e T (x,t) ainda obedece à equação do calor.

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A EQUAÇÃO DO CALOR 157

pois f é ímpar. Então, (9.12) obedece às condições fronteira do problema e pode-se escrevera solução da equação do calor num meio semi-infinito na forma integral

T (x,t) =∫ +∞

0f(u)Φ(x− u,t)du−

∫ 0

−∞f(−u)Φ(x− u,t)du

=∫ +∞

0f(u)Φ(x− u,t)du−

∫ ∞

0f(u)Φ(x+ u,t)du

=∫ +∞

0f(u)(Φ(x− u,t) − Φ(x+ u,t))du.

(9.13)

Para determinar as soluções da equação do calor em regiões limitadas e com condiçõesfronteira, a transformada de Fourier pode não ser adequada.

Veja-se um exemplo em que as condições fronteira sugerem o uso das séries de Fourier paraa determinação da solução da equação do calor.

Seja uma barra semi-infinita, com uma fonte periódica de calor na extremidade x = 0.Este sistema descreve a propagação de calor na Terra ou num planeta, devido à variaçãode temperatura causada pelo ciclo diurno-noturno. A temperatura na fronteira x = 0 podeser descrita pela função periódica

u(x = 0,t) = a0

2+∑n≥1

an cos(

2πntT

)+ bn sin

(2πntT

). (9.14)

Nestas condições, assuma-se que a solução da equação do calor tem a forma

u(x,t) = a0(x)2

+∑n≥1

an(x) cos(

2πntT

)+ bn(x) sin

(2πntT

).

Substituindo u(x,t) na equação homogénea do calor, obtêm-se as equações diferenciaisa′′

0 = 0

a′′n = 2πn

kTbn

b′′n = −2πn

kTan,

(9.15)

em que as derivadas são tomadas em ordem à variável espacial x. Com as condições fron-teira

an(0) = an

bn(0) = bnlimx→∞ an(x) = 0limx→∞ bn(x) = 0,

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158 A EQUAÇÃO DO CALOR EM MEIOS FINITOS

as soluções das equações (9.15) sãoa0(x) = a0

an(x) = e−x√πn/kT

(an cos(

√πn/kTx) + bn sin(

√πn/kTx)

)bn(x) = e−x

√πn/kT

(bn cos(

√πn/kTx) − an sin(

√πn/kTx)

).

Substituindo estas expressões na série de Fourier de u(x,t), obtém-se

u(x,t) = a0

2+

∞∑n=1

e−x√nπ/kTan cos(2πnt/T + x

√nπ/kT )

+∞∑n=1

e−x√nπ/kT bn sin(2πnt/T + x

√nπ/kT ) .

(9.16)

No caso particular em que os únicos coeficientes não nulos na condição inicial (9.14) sãoa0/2 = T0 e b1 = T1, a condição inicial reduz-se a u(0,t) = T0 +T1 sin 2πt/T e, por (9.16),a temperatura ao longo da barra é

u(x,t) = T0 + T1e−x

√π/kT sin(ωt+ x

√π/kT ),

em que ω = 2π/T . Neste caso, embora não existam condições iniciais, a condição fronteiradetermina que a temperatura inicial ao longo da barra é

u(x,0) = T0 + T1e−x

√π/kT sin(x

√π/kT ). (9.17)

A solução (9.17) da equação do calor modela a propagação de calor no interior da Terraem função da distância à superfície.

9.2 A EQUAÇÃO DO CALOR EM MEIOS FINITOS

Considere-se a equação homogénia do calor num meio unidimensional de comprimento ℓ

∂T

∂t= k

∂2T

∂x2 , (9.18)

com as condições fronteira de Dirichlet

T (0,t) = 0, T (ℓ,t) = 0 (9.19)

e a condição inicial T (x,0), não necessariamente compatível com as condições fronteira.Através da resolução da equação aos valores próprios associada a (9.18), para as condi-ções fronteira (9.19), conclui-se que os vetores próprios do operador d2

dx2 são as funções

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A EQUAÇÃO DO CALOR 159

ϕn(x) = sinnπx/ℓ, a que correspondem os valores próprios λn = −n2π2/ℓ2, com n ≥ 1(Exercício 4.3b)). Assim, a solução de (9.18), para a condição fronteira (9.19), é

T (x,t) =∞∑n=1

bn(t) sin (πnx/ℓ), (9.20)

e as condições fronteira (9.19) são verificadas para todo o t > 0.

Substituindo (9.20) em (9.18), obtém-se a equação

bn = −kπ2n2

ℓ2 bn,

cujas soluções sãobn(t) = bn(0)e−kπ2n2t/ℓ2

. (9.21)

Introduzindo (9.21) em (9.20), a solução da equação do calor com condições fronteira deDirichlet é

T (x,t) =∞∑n=1

bn(0) sin (πnx/ℓ)e−kπ2n2t/ℓ2, (9.22)

em que

bn(0) = 2ℓ

∫ ℓ

0T (y,0) sin (πny/ℓ)dy . (9.23)

Pode-se ainda escrever a solução (9.22) na forma integral. Introduzindo (9.23) em (9.22),obtém-se

T (x,t) =∫ ℓ

0T (y,0)

(2ℓ

∞∑n=1

sin (πnx/ℓ) sin (πny/ℓ)e−kπ2n2t/ℓ2

)dy

=∫ ℓ

0T (y,0)G(x,y,t)dy

(9.24)

e a função G(x,y,t) tem o papel de um propagador da condição inicial T (x,0).

Como aplicação, suponha-se que a temperatura de uma barra de comprimento ℓ = 1 m éT0 = −20C e que, no instante t = 0, a barra é posta em contacto térmico nas suas extre-midades com duas fontes de temperatura que estão à temperatura T1 = 30C. Suponha-seque a difusibilidade térmica do material é k = 1 m2s−1 e que as duas fontes se comportamcomo reservatórios de temperatura. Assim, a condição inicial da barra é T (x,0) = T0 e

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160 UMA SIMETRIA DA EQUAÇÃO DO CALOR

a condição fronteira é T (0,t) = T (ℓ,t) = T1. Prolongando a condição inicial como umafunção ímpar no intervalo [−ℓ,ℓ], o desenvolvimento de Fourier da condição inicial é3

T (x,0) = 2T0∑n≥1

1 − (−1)n

πnsin(nπx/ℓ).

Esta série toma o valor 0 nos pontos x = 0 e x = ℓ, diferindo da função constante T (x,0) =T0, com x ∈ [0,ℓ], sobre um conjunto de medida de Lebesgue nula. Com U = T − T1, afunção U tem a solução (9.22) e, por um cálculo simples, tem-se então que a temperaturano interior da barra é descrita pela função

T (x,t) = T1 + 2(T0 − T1)∑n≥1

e−kπ2n2t 1 − (−1)n

πnsin(nπx/ℓ). (9.25)

Na figura 9.2 está representada a solução (9.25) para t = 0.01 e t = 0.1.

0.0 0.2 0.4 0.6 0.8 1.0-20

-10

0

10

20

30

x

T(x,t)

t=0.01

t=0.1

Figura 9.2 Gráfico da solução (9.25) da equação do calor com condições fronteira de Dirichlet,T (0,t) = T (1,t) = T1 = 30C, para t = 0.01 e t = 0.1. A barra tem comprimento ℓ = 1 e inicialmente a

barra estava à temperatura T (x,0) = T0 = −20C.

9.3 UMA SIMETRIA DA EQUAÇÃO DO CALOR

Seja a equação do calor na sua formamais simples (9.18). Por agora, os limites das variáviesx e t não estão especificados. Seja a nova variável adimensional ξ = x/

√2kt. Como

∂t= − x

2√

2kt3/2

d

dξe ∂

∂x= 1√

2ktd

dξ,

3Note que a família de funções sin(nπx/ℓ)n≥1 forma uma base ortogonal do subespaço das funções ímpares deL2([−ℓ, ℓ]).

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A EQUAÇÃO DO CALOR 161

na nova variável ξ, a equação do calor (9.18) reduz-se a

d2T

dξ2 + ξdT

dξ= 0 , (9.26)

em que T (x,t) = T (ξ). A equação (9.26) é uma equação diferencial ordinária não au-tónoma, com uma única variável independente. A nova variável ξ reduz a dimensão doproblema. Neste caso estamos perante uma simetria entre a variável temporal e a variávelespacial.

Com v = dTdξ , na variável v, a solução da equação (9.26) é v(ξ) = Ae−ξ2 , em que A é uma

constante. Assim, na variável ξ, a solução da equação (9.26) é

T (ξ) = T (ξ0) +A

∫ ξ

ξ0

e−ξ2dξ . (9.27)

Definindo a função de erro como erf(x) = (2/√π)∫ x

0 e−ξ2dξ (figura 9.3), a solução da

equação do calor (9.18) escreve-se na forma

T (ξ) = T (ξ0) +A

√π

2(erf(ξ) − erf(ξ0)) , (9.28)

em que ξ = x/√

2kt.

-4 -2 0 2 4-1.0

-0.5

0.0

0.5

1.0

x

erf(x)

Figura 9.3 Gráfico da função de erro erf(x).

EXERCÍCIOS

9.1 Seja uma distribuição de temperatura T (x) num meio unidimensional de compri-mento ℓ. Suponha-se que o fluxo de calor nos extremos do meio é nulo, isto é,(∂T∂x )x=0 = (∂T∂x )x=ℓ = 0. Determine como varia a temperatura média ao longodo tempo.

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162 UMA SIMETRIA DA EQUAÇÃO DO CALOR

9.2 No instante t = 0, a distribuição de temperatura numa barra de comprimento ℓ éT (x,0) = f(x) ∈ L2([0,ℓ]). Como o sistema está isolado, não existe fluxo de calorpara o exterior, ou seja, (∂T∂x )x=0 = 0 e (∂T∂x )x=ℓ = 0.

a) Determine a temperatura em cada ponto da barra ao longo do tempo.

b) Qual é a temperatura de equilíbrio do material? Relacione a temperatura deequilíbrio com a distribuição inicial T (x,0).

9.3 Uma barra de comprimento ℓ tem os extremos em contacto com dois reservatórios detemperatura. A temperatura dos reservatórios é T1 (x = 0) e T2 (x = ℓ). Determinea temperatura de equilíbrio e o fluxo de calor (ϕ = −χ∂T∂x , primeira lei de Fick ouhipótese de Fourier) ao longo da barra.

9.4 A produção de calor do interior de uma barra de material radioativo é descrita pelaequação

∂T

∂t= k

∂2T

∂x2 + q,

em que k é a difusibilidade térmica do material, T é a temperatura, e q é a taxa deprodução de calor no interior do material. Assuma que q é uma constante e que abarra tem comprimento ℓ. Considere que a barra de material está isolada do exterior,isto é,

∂T

∂x(x = 0,t) = ∂T

∂x(x = ℓ,t) = 0,

para todo o t ≥ 0 — condição fronteira de Neumann, e que no instante t = 0,a distribuição de temperatura no interior da barra é descrita pela função f(x) ∈L2([0,ℓ]), com ∂f

∂x (x = 0) = ∂f∂x (x = ℓ) = 0. Assumindo que T (x,t) ∈ L2([0,ℓ]), para

todo o t ≥ 0, determine como varia a temperatura no interior da barra ao longo dotempo.

9.5 Num certo instante t = 0, a distribuição de temperatura numa barra de comprimentoℓ é T (x,0) = T0 cos(3πx/ℓ) + T1 cos(5πx/ℓ), em que T0 e T1 são constantes, e abarra está isolada do exterior. Depois de escolher as condições fronteira apropriadas,determine a distribuição de temperatura na barra ao longo do tempo para t ≥ 0.

9.6 Uma barra de comprimento ℓ e isolada nos extremos é aquecida instantaneamente noponto x = ℓ/2, no instante t = 0, com uma perturbação de intensidade T0δ(x− ℓ/2).Calcule a distribuição de temperatura na barra ao longo do tempo.

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10A TRANSFORMADA DE LAPLACE

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A TRANSFORMADA DE LAPLACE 165

Constrói-se a transformada de Laplace de uma função e derivam-se as suas propriedades. Demonstra--se o teorema da inversão das transformadas de Laplace e calculam-se algumas funções de Green.

10.1 A TRANSFORMADA DE LAPLACE

A transformada de Laplace é uma transformação integral definida sobre uma certa classede funções e tem propriedades análogas às da transformada de Fourier.

Uma das propriedades mais relevantes da transformada de Laplace está relacionada coma operação de derivação e, como se verá, as técnicas desenvolvidas vão ser importantesna obtenção de soluções explícitas de equações diferenciais ordinárias e de equações àsderivadas parciais.

Seja f(x) : [0,+ ∞) → C. A transformada de Laplace de f é a função

Lf(s) :=∫ +∞

0e−sxf(x)dx,

em que s ∈ R ou s ∈ C. Para obter uma condição suficiente de existência da transformadade Laplace, comece-se por definir o conjunto das funções do tipo exponencial à direita.

Uma função f(x) : [0, + ∞) → R é do tipo exponencial à direita, se existirem constantesM ,α e x0 tais que

|f(x)| < Meαx,

para x > x0 eM > 0.

São exemplos de funções do tipo exponencial à direita:

1) Polinómios: xm, pois xm/ex → 0 quando x → ∞.

2) Funções algébricas localmente somáveis, por exemplo:√

1 + x2; 1/√x; 1/x1+α com

(α > 0).

Seja Λ o conjunto das funções localmente somáveis e do tipo exponencial à direita. Têm-seas propriedades:

a) Se f e g ∈ Λ, então (f + g) ∈ Λ.

b) Se αf ∈ Λ, então αf ∈ Λ.

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166 A TRANSFORMADA DE LAPLACE

O conjunto Λ é um subespaço vetorial do conjunto das funções localmente somáveis,Λ ⊂ L1

loc(R+0 ). O conjunto Λ não é um espaço de Banach, pois não é possível construir

uma norma através do integral de funções localmente somáveis sobre todo o domínio dasfunções.

Teorema 10.1 (Teorema fundamental da transformada de Laplace)Seja a função f : R+ → C, localmente somável e do tipo exponencial à direita. Então, existe umaconstante α, com −∞ < α < ∞, tal que, se Re(s) > α, a transformada de Laplace de f ,

Lf(s) :=∫ ∞

0e−sxf(x)dx,

é holomorfa no semiplano Re(s) > α. Nestas condições, tem-se ainda que

d

dsLf(s) = −L[xf(x)] .

DEMONSTRAÇÃO.

O produto e−sxf(x) é localmente somável no intervalo [0,a], pois f(x) é localmente so-mável e e−sx é limitada em [0,a], isto é,∣∣∣∣∫ a

0e−sxf(x)dx

∣∣∣∣ ≤∫ a

0|e−sx||f(x)|dx ≤ C

∫ a

0|f(x)|dx < ∞,

em que, se Re(s) < 0, C = e−Re(s)a, e se Re(s) ≥ 0, C = 1. Como, por hipótese,|f(x)| < Meαx,∣∣∣∣∫ +∞

0e−sxf(x)dx

∣∣∣∣ ≤∣∣∫ a

0 e−sxf(x)dx

∣∣+∣∣∣∫ +∞a

Me−sxeαxdx∣∣∣

=∣∣∣∣∫ a

0e−sxf(x)dx

∣∣∣∣+∣∣∣∣M ∫ +∞

0ex(α−s)dx

∣∣∣∣=

∣∣∣∣∫ a

0e−sxf(x)dx

∣∣∣∣+

∣∣∣∣∣M ex(α−s)

α− s

]+∞

a

∣∣∣∣∣e, se Re(α− s) < 0, então∣∣∣∣∫ +∞

0e−sxf(x)dx

∣∣∣∣ ≤∣∣∣∣∫ a

0e−sxf(x)dx

∣∣∣∣+∣∣∣∣Mea(α−s)

s− α

∣∣∣∣ < ∞ .

Assim, Lf está bem definida.

Para demonstrar a propriedade da derivação da transformada de Laplace, comece-se porcalcular a sua derivada

d

dsLf(s) =

∫ +∞

0

∂se−sxf(x)dx = −

∫ +∞

0xe−sxf(x)dx = −L[xf(x)] .

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A TRANSFORMADA DE LAPLACE 167

Este cálculo é apenas válido para o caso em que xe−sxf(x) é localmente somável e

|xe−sxf(x)| → 0,

quando x → ∞. Ora, para x suficientemente grande, e como Re(α− s) < 0, tem-se que

|xe−sxf(x)| ≤ |x|e−sxMeαx = M |x|ex(α−s) → 0,

quando x → ∞ e, portanto, xe−sxf(x) é do tipo exponencial à direita. Assim, o teoremaestá demonstrado.

Vejam-se alguns exemplos de cálculo de transformadas de Laplace.

Pelo teorema fundamental da transformada de Laplace, tem-se que

L(xneax) = (−1)n dn

dsnL(eax) ,

em que n ∈ N. Com

L(eax) =∫ +∞

0ex(a−s)dx = ex(a−s)

(a− s)

]+∞

0= 1s− a

> 0,

vem que

dn

dsn1

(s− a)= dn−1

dsn−1 (−1)(s− a)−2 = dn−2

dsn−2 (−1)21.2(s− a)−3

= (−1)nn!(s− a)n+1

e, portanto,

L(xneax) = n!(s− a)n+1 , (10.1)

que existe para Re(s) > a.

Veja-se como calcular a transformada de Laplace de xα, para α ∈ R. Com

L(xα) =∫ +∞

0e−sxxαdx

e a transformação de variáveis t = sx, obtém-se

L(xα) =∫ +∞

0e−ttα

1sα+1 dt = 1

sα+1

∫ +∞

0e−ttαdt . (10.2)

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168 A TRANSFORMADA DE LAPLACE

Comparando (10.2) com (10.1) para a = 0, define-se a função gama como sendo

Γ(α+ 1) :=∫ +∞

0e−ttαdt .

Para α = n ∈ N e por (10.1),Γ(n+ 1) = n! .

Nestas condições, tem-se que Γ(n + 1) = nΓ(n). A função gama generaliza a funçãofactorial, para valores reais de n (figura 10.1).

-4 -2 0 2 4-10

-5

0

5

10

x

Γ(x)

Figura 10.1 Gráfico da função gama.

Vejam-se algumas propriedades da transformada de Laplace.

Transformada de Laplace da derivada. Se f(x) e f ′(x) pertencem ambas a Λ, i.e.,se f(x) e f ′(x) são localmente somáveis e do tipo exponencial à direita,

Lf ′ =∫ +∞

0e−sxf ′(x)dx = e−sxf(x)]+∞

0 + s

∫ +∞

0e−sxf(x)dx

= sLf − f(0),

para Re(s) > α.

Se, f ′′(x), f ′(x), f(x) ∈ Λ,

Lf ′′ = sLf ′ − f ′(0) = s2Lf − sf(0) − f ′(0)

e, por indução,

Lf (n) = snLf − sn−1f(0) − . . .− sf (n−2)(0) − f (n−1)(0).

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A TRANSFORMADA DE LAPLACE 169

Transformada de Laplace da translação. Veja-se o que acontece quando se efetuauma translação no domínio de uma função f(x). Para não haver problemas na definiçãodo domínio de f(t), começa-se por prolongar f(x) como uma função nula para valoresnegativos de x. Isto é, define-se uma nova função

f(x) =

f(x) para x ≥ 00 para x < 0 .

Com a substituição de variáveis u = x− h, tem-se que

L(f(x− h)

)=∫ +∞

−he−s(u+h)f(u)du =

∫ +∞

0e−s(u+h)f(u)du = e−shLf .

Ou seja,L(f(x− h)

)(s) = e−sh(Lf)(s)

e a transformada de Laplace transforma a translação em multiplicação por e−sh.

Inversamente, tem-se que

L(ehxf(x))(s) =∫ +∞

0e−sxehxf(x)dx =

∫ +∞

0e−x(s−h)f(x)dx = (Lf)(s− h).

Como é necessário que Re(s − h) > α, (Lf)(s − h) está definida no semiplano Re(s) >α+Re(h).

Transformada de Laplace da convolução em [0,+∞]: Considere-se que f e g per-tencem ao conjunto Λ. A convolução de f com g (no sentido da transformada de Laplace)é definida como

f ∗ g =∫ +∞

0f(x− t)g(t)dt .

Mas como se pode assumir que x− t ≥ 0, tem-se que t ≤ x, pois no caso em que x− t < 0,isto é, t > x, f(x− t) = 0. Assim,

f ∗ g =∫ +∞

0f(x− t)g(t)dt =

∫ x

0f(x− t)g(t)dt .

A convolução definida desta maneira tem propriedades análogas à convolução definidaatravés da transformada de Fourier, e tem as seguintes propriedades:

a) Se f,g ∈ Λ, então f ∗ g ∈ Λ.

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170 A TRANSFORMADA DE LAPLACE

b) L(f ∗ g) = (Lf).(Lg).

Por exemplo, a propriedade b) demonstra-se como se segue. Com

L(f ∗ g) =∫ +∞

0

∫ +∞

0e−sxf(x− t)g(t)dt dx

e introduzindo as novas variáveis u = x− t e v = t,

L(f ∗ g) =∫ +∞

0e−suf(u)du

∫ +∞

0e−svg(v)dv = (Lf).(Lg) .

Inversão da transformada de Laplace. Deduza-se a fórmula da inversão da trans-formada de Laplace.

Seja f(t) ∈ Λ e prolongue-se f para valores negativos de t. Isto é, seja a nova função,

f(t) =

f(t) se t ≥ 00 se t < 0 .

Então,

(Lf(t))(s) =∫ +∞

−∞e−stf(t)dt .

No domínio de Lf , seja o semiplano Re(s) > α e considere-se a reta vertical de equação,s = c+ iy, com c > α e y ∈ R (figura 10.2).

α c

polos

x

y

Figura 10.2 Construção geométrica para a determinação da transformada de Laplace inversa.

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A TRANSFORMADA DE LAPLACE 171

Nestas condições,

(Lf)(s) =∫ +∞

−∞e−(c+iy)tf(t)dt =

∫ +∞

−∞e−itye−ctf(t)dt

= F(√

2π e−ctf(t))(y) = F (c+ iy),

em que F é o operador transformada de Fourier. Assim,

√2πe−ctf(t) = 1√

∫ +∞

−∞eityF (c+ iy)dy

e a integração é feita ao longo da linha vertical x = c no plano complexo C. Então,

f(t) = 12π

∫ +∞

−∞eityectF (c+ iy)dy

e com s = c+ iy, vem que

f(t) = 12πi

∫ c+i∞

c−i∞etsF (s)ds,

em que F (s) é a transformada de Laplace da função f(t) e c > α. Mas como F (s) éholomorfa para Re(s) > α, as singularidades de F (s) estão na região Re(s) ≤ α. SeF (s) só tem polos isolados, isto é, se F (s) é meromorfa em C, então, pelo teorema dosresíduos A.6 (Apêndice A), tem-se que

f(t) = 12πi

2πi∑

Resíduos de todos os polos de estF (s)

=

Resíduos de todos os polos de estF (s) , se t ≥ 0

0 , se t < 0 .

Assim demonstrou-se:

Teorema 10.2 (teorema da inversão da transformada de Laplace)SejaF (s) uma função meromorfa emC, e suponha-se que os polos deF (s) estão no semiplanoRe(s) ≤ α.Então,

(L−1F (s)

)(t) =

Resíduos de todos os polos de estF (s) , se t ≥ 0

0 , se t < 0 .

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172 FUNÇÕES DE GREEN

Vejam-se alguns exemplos. Seja F (s) = 1s+a . F (s) tem um polo no ponto s = −a ∈ C.

Como, Res(estF (s),s = −a) = e−at, tem-se que

L−1 1s+ a

= e−at .

Seja a função s/(s2 + k2) que tem polos nos pontos s = −ik e s = ik. Como

Res( sest

s2 + k2 , s = ik) = 12eikt , Res( sest

s2 + k2 , s = −ik) = 12e−ikt

pelo teorema da inversão da transformada de Laplace,

L−1 s

s2 + k2 = 12(eikt + e−ikt) = cos kt .

10.2 FUNÇÕES DE GREEN

A técnica das funções deGreen pode ser usada com as transformadas de Laplace. Considere--se a equação diferencial

x+ kx = h(t), (10.3)

com a condição inicial x(0) = 0. Designando porX(s) eH(s) as transformadas de Laplacede x(t) e h(t), respetivamente, a transformada de Laplace da equação diferencial (10.3) é

X(s) = H(s)s+ k

.

Assim,

x(t) = L−1H(s) ∗ L−1 1s+ k

= h(t) ∗ e−kt =∫ t

0e−k(t−τ)h(τ)dτ . (10.4)

A função G(t) = e−kt é a função de Green da equação (10.3). Escolhendo como termonão homogéneo h(t) = δ(t), da expressão anterior, decorre que a função de Green daequação diferencial (10.3) obedece à equação

G(t) + kG(t) = δ(t).

A solução (10.4) é apenas uma solução particular da equação diferencial não homogénea(10.3), sendo a solução geral a soma da solução (10.4) com a solução geral da equação

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A TRANSFORMADA DE LAPLACE 173

homogénea. Isto pode ser facilmente verificado considerando que x(0) = 0. Neste caso, atransformada de Laplace da solução da equação diferencial (10.3) é

X(s) = H(s)s+ k

+ x(0) 1s+ k

e, portanto,

x(t) = L−1X(s) = x(0)e−kt + e−kt∫ t

0ekτh(τ)dτ .

Pode-se utilizar uma técnica mista de transformadas de Fourier e de Laplace para a deter-minação de funções de Green. Isto é particularmente útil quando as variáveis independen-tes das equações têm domínios de variação diferentes.

Função de Green para a equação do calor. A equação do calor não homogéneapara a determinação da função de Green é

∂G

∂t− k

(∂2G

∂x2 + ∂2G

∂y2 + ∂2G

∂z2

)= (2π)3/2δ(x)δ(y)δ(z)δ(t) .

Aplicando a transformada de Fourier às coordenadas espaciais e a transformada de Laplaceàs coordenadas temporais, obtém-se

g(ξ, s) = 1s+ kξ.ξ

,

em que ξ = (ξ1,ξ2,ξ3) e g(ξ, s) é a transformada integral quádrupla de G(r,t). Assim,

G(r,t) = F−1ξ1,ξ3,ξ3

L−1 1s+ kξ2 = F−1

ξ1,ξ3,ξ3e−kξ2t = 1

(2kt)3/2 e− x2+y2+z2

4kt

é a função de Green para a equação do calor num meio infinito e com um termo de fonte.Nestas condições, a equação do calor com um termo não homogéneo e num meio infinito,

∂ϕ

∂t− k

(∂2ϕ

∂x2 + ∂2ϕ

∂y2 + ∂2ϕ

∂z2

)= f(x,y,z,t),

tem a solução particular

ϕ = 1(2π)3/2

∫ +∞

0

∫∫∫G(x− u,y − v,z − w,t− s)f(u,v,w,s) dudvdwds,

em que o integral triplo é calculado entre os limites −∞ e +∞. Esta solução particular éindependente da condição inicial.

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174 FUNÇÕES DE GREEN

Função de Green para a equação das ondas. Considere-se a equação linear dasondas com um termo não homogéneo,

∂2ϕ

∂t2= c2 ∂

∂x2 +√

2πδ(x)δ(t), (10.5)

em que x ∈ R e t ≥ 0. Aplicando a transformada de Fourier à variável espacial e atransformada de Laplace à variável temporal, obtém-se

g(ξ, s) = 1s2 + c2ξ2 ,

em que g(ξ, s) é a transformada dupla de Fourier e de Laplace da função de GreenG(x,t).Como a função g(ξ, s) tem polos em s = ±icξ, pelo teorema da inversão da transformadade Laplace,

g(ξ,t) =

L−1 1s2 + c2ξ2 = eicξt

2icξ− e−icξt

2icξ= sin(ξct)

cξ, t ≥ 0

0 , t < 0.

Assim, para t ≥ 0,

G(x,t) = F−1(

sin(ξct)cξ

)= 1√

∫ +∞

−∞

sin(ξct)cξ

eiξxdξ

= i

2c1√2π

∫ +∞

−∞

eiξ(x−ct)

ξdξ − i

2c1√2π

∫ +∞

−∞

eiξ(x+ct)

ξdξ .

Pelo teorema dos resíduos A.6 (Apêndice A),

G(x,t) =

12c

√π

2(Sinal(x+ ct) − Sinal(x− ct))

= 1c

√π

2(H(x+ ct) −H(x− ct)) , se t ≥ 0

0 , se t < 0,

(10.6)

em que H(x) é a função de Heaviside, H(x) = 1 para x > 0, e H(x) = 0 para x < 0.Na figura 10.3, está representado o gráfico da função de Green (10.6) para a equação dasondas (10.5). Devido à invariância da equação das ondas para uma transformação de tem −t, a função de Green da equação das ondas mantém-se válida para t ≤ 0. A soluçãoG(x,t) = 0, para t < 0, derivou do facto de a transformada inversa de Laplace ser nulapara t ≥ 0.

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A TRANSFORMADA DE LAPLACE 175

x

G(x,t)-ct ct

Figura 10.3 Gráfico da função de Green (10.6) para a equação das ondas.

EXERCÍCIOS

10.1 Encontre as transformadas de Laplace das funções:

a)

f(t) =

sin t se 0 ≤ t ≤ π

0 se t > π .

b)

f(t) =

1 se 2n ≤ t < 2n+ 10 se 2n+ 1 ≤ t ≤ 2(n+ 1)

em que n = 0,1,2, . . ..

10.2 Se f é uma função periódica de período T , mostre que

Lf = F (s) =∫ T

0 e−stf(t)dt1 − e−Ts .

10.3 Sejam P (z) e Q(z) polinómios, em que grau(Q) ≥ grau(P ) + 1. Suponha-se aindaque Q(z) só tem zeros simples em z1, . . . zm. Determine a transformada de Laplaceinversa de P (z)/Q(z).

10.4 Calcule a transformada de Laplace inversa de e−s/s.

10.5 Calcule, no sentido das distribuições, a transformada de Laplace das distribuiçõesδ(n)(x).

10.6 Encontre as soluções das equações diferenciais:

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176 FUNÇÕES DE GREEN

a) x+ 9x = H(t− 1), com x(0) = x(0) = 0, em que H é a função de Heaviside.

b) x+ x = et, com x(0) = 0.

10.7 Determine a solução do sistema de equações diferenciaisx− 2y = 1x+ y − x = 0

com condições iniciais x(0) = y(0) = 0.

10.8 Seja a equação do oscilador harmónico forçado

x+ ω2x = A sinωt,

em que A e ω são constantes positivas. Usando a técnica das transformadas de La-place, calcule a solução desta equação para condições iniciais nulas.

10.9 Seja a equação de Schrödinger não homogénea

− ℏ2

2m∂2ψ

∂x2 − iℏ∂ψ

∂t=

√2πδ(x)δ(t),

em que x ∈ R e t ≥ 0. Determine a solução desta equação com condições iniciaisnulas.

10.10 Calcule a função de Green da equação de transporte

∂ϕ

∂t+ c

∂ϕ

∂x= 0,

em que c é uma constante positiva, x ∈ R e t ≥ 0.

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11REFLEXÃO, REFRAÇÃO E DISPERSÃO DE ONDAS

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REFLEXÃO, REFRAÇÃO E DISPERSÃO DE ONDAS 179

Com técnicas de transformadas de Laplace deriva-se a solução da equação das ondas com umacondição fronteira dependente do tempo. Analisam-se as propriedades de reflexão e refração de ondasprogressivas transversais e deriva-se a lei de Snell da refração e da reflexão. Introduzem-se os conceitosde velocidade de grupo e de velocidade de fase.

11.1 REFLEXÃO E REFRAÇÃO DE ONDAS TRANSVERSAIS

Considere-se uma corda semi-infinita, presa num dos extremos a um dispositivo que a fazoscilar periodicamente. O movimento imposto no extremo é transversal à corda, pelo que,para pequenas amplitudes, a forma da corda ao longo do tempo obedece à equação dasondas

c2 ∂2ψ

∂x2 − ∂2ψ

∂t2= 0 . (11.1)

A condição fronteira no ponto x = 0 é descrita por uma função periódica h(t) e ψ(x,t)descreve a forma da corda ao longo do espaço e durante o tempo.

Seja a condição fronteiraψ(0,t) = h(t) = A sinωt, (11.2)

em que T = 2π/ω é o período da oscilação do extremo da corda.

A transformada de Laplace no tempo da equação das ondas (11.1) é

c2 ∂2

∂x2U(x,s) − s2U(x,s) + sf(x) + g(x) = 0,

em que U(x,s) = Ltψ. Impondo as condições iniciais, ψ(x,t = 0) = f(x) = 0 e ∂ψ(x,t =0)/∂t = g(x) = 0, a equação anterior reduz-se a

c2 ∂2

∂x2U(x,s) − s2U(x,s) = 0 . (11.3)

Com a condição fronteira U(0,s) = Lth(t) := H(s), a equação diferencial (11.3) tem asolução

U(x,s) = Aescx +Be− s

cx,

emqueA eB são funções a determinar. Impondo a regularidade no infinito, limx→∞ U(x,s)= 0, vem que A = 0, U(0,s) = B = H(s) e a solução da equação (11.3) é

U(x,s) = H(s)e− scx .

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180 REFLEXÃO E REFRAÇÃO DE ONDAS TRANSVERSAIS

t=0.3 t=1.8 t=3.6

Figura 11.1 Solução da equação das ondas (11.1) em instantes sucessivos, com a condição fronteiraperiódica no tempo (11.2) e condições iniciais nulas. Parâmetros da simulação: A = 1, c = 1 e ω = 1.

Pela propriedade da translação das transformadas de Laplace, tem-se então que

ψ(x,t) = L−1 (H(s)e− scx)

= h(t− x

c

),

para t− x/c ≥ 0. Assim, a solução da equação das ondas (11.1) com a condição fronteiraperiódica (11.2) é

ψ(x,t) =

A sinω

(t− x

c

)para 0 ≤ x ≤ ct

0 para x > ct .(11.4)

Mostrou-se, assim, que a solução da equação das ondas com a condição fronteira (11.2)propaga-se com velocidade finita c, no sentido positivo do eixo dos xx (figura 11.1).

Considere-se uma corda semi-infinita com densidade ρ1 para x ∈ [0,a] e densidade ρ2 parax ∈ [a,+∞) (figura 11.2). Vai-se mostrar que sempre que existem alterações das grandezascaraterísticas do meio, surgem reflexões e refrações das ondas progressivas.

aI II

ρ1 ρ2

Figura 11.2 Meio não homogéneo de densidades ρ1 e ρ2.

Como foi visto anteriormente, a solução da equação das ondas, com a condição fronteiraψ(0,t) = A sinωt, é

ψI(x,t) =

A sinω

(t− x

c1

)para x ≤ c1t

0 para x > c1t,

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REFLEXÃO, REFRAÇÃO E DISPERSÃO DE ONDAS 181

em que c1 é a velocidade de propagação no meio I. Para x = a e t ≥ a/c1 a oscilação dacorda em x = a é

ψ(a,t) = A sinω(t− a

c1) . (11.5)

Sejam, então, as novas variáveis independentes τ = t− a

c1x′ = x− a.

Assim, na região II, existe uma onda progressiva com a forma

ψII(x′,τ) = B sinω(τ − x′

c2),

em que c2 é a velocidade de propagação no meio II. Como a solução (11.5) pode ser inter-pretada como uma condição fronteira no interior do material, para valores de x < a e porsimetria, existe uma solução que se desloca no sentido negativo do eixo dos x′,

ψ′I(x′,τ) = C sinω

(τ + x′

c1

),

em que o sinal muda devido ao sentido da propagação. Como a equação das ondas é linear,tem-se sobreposição de soluções e, na vizinhança de x = a e de t = a/c1, tem-se que:

Região I: ψI(x,t) = A sinω(τ − (x−a)c1

) + C sinω(τ + (x−a)c1

).

Região II: ψII(x,t) = B sinω(τ − (x−a)c2

).

Para determinar as constantes B e C, impõe-se a continuidade de ψ e de ∂ψ∂x na fronteira

entre as regiões I e II. Então, para x = a, A sinωτ + C sinωτ = B sinωτ

− 1c1A cosωτ + 1

c1C cosωτ = −B

c2cosωτ

e resolvendo esta equação em ordem a B e C obtém-seB = A

2c2

c1 + c2

C = Ac2 − c1

c1 + c2.

(11.6)

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182 LEI DE SNELL

A constanteB é a amplitude da onda transmitida ou refratada e a constanteC é a amplitudeda onda refletida. Se c1 = c2, vem que B = A e C = 0, não existindo onda refletida.

Se c2 → 0, isto é, a densidade na região II é infinita, c2 =√T/ρ2, entãoB = 0 e C = −A.

Neste caso, ψI(a,t) = 0 é uma condição fronteira e a onda refletida tem amplitude desinal contrário relativamente à amplitude da onda incidente. Se convencionarmos que asamplitudes são sempre positivas e devido às propriedades de periodicidade das funçõestrigonométricas, a mudança de sinal na amplitude C pode ser interpretada como uma mu-dança da fase, em que o argumento de ψI tem um acréscimo de π. Contudo, se a situaçãofísica corresponde à passagem de um meio com menor velocidade de propagação para ummeio com maior velocidade de propagação, existe apenas uma alteração da amplitude,não havendo mudança de fase da onda refletida.

11.2 LEI DE SNELL

Uma onda progressiva ao atravessar uma fronteira onde as constantes características domeio mudam, gera uma onda refletida e uma onda refratada. No parágrafo anterior,foram calculadas as amplitudes destas ondas. Quando a onda se propaga num meio bidi-mensional, as ondas refletidas e refratadas mudam de direção. Determinem-se, então, asleis da reflexão e da refração.

Uma onda progressiva numa região bidimensional tem a forma

ψ(r,t) = A sin(ωt− k.r), (11.7)

em que k.r = kxx + kyy. Estas soluções da equação das ondas designam-se por ondasplanas monocromáticas. Como ω = c|k|, pode-se escrever (11.7) na forma

ψ(r,t) = A sin(ωt− k.r) = A sin

(t− kxx

c|k|− kyy

c|k|

))= A sin

(t− n

c.r

)).

(11.8)

O vetor

n =

(kx

|k|,ky

|k|

)

define a direção de propagação da onda progressiva no espaço a duas dimensões. Estasolução é gerada por uma condição fronteira definida ao longo de uma reta perpendicularà direção de propagação.

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REFLEXÃO, REFRAÇÃO E DISPERSÃO DE ONDAS 183

Figura 11.3 Em a), mostra-se o fenómeno de refração de uma onda plana monocromática, em quec1 > c2, e estão apenas representadas a onda incidente e a onda refratada. As zonas escuras correspondem aosmáximos da onda e n1 e n2 são as respetivas direções de propagação. O vetor n é a normal à fronteira entreos dois meios. No lado esquerdo da figura a), está apenas representada a onda progressiva incidente. Em b)

está apenas representada a onda refletida no meio 1. Em c), representa-se a sobreposição das ondas no meio 1.

Considere-se então que no plano (x,y), para valores negativos de x, a velocidade de pro-pagação (de fase) da onda progressiva é c1. Para valores positivos de x, a velocidade depropagação é c2 (figura 11.3). Quando a frente de onda chega à fronteira que separa osdois meios, x = 0, para que haja continuidade da solução, a variável independente dasolução (11.8) tem de ser contínua na fronteira, ou seja,(

t− n1

c1.r

)∣∣∣∣x=0−

=(t− n2

c2.r

)∣∣∣∣x=0+

, (11.9)

em que foram introduzidos os índices 1 e 2 para distinguir as velocidades de fase e asdireções de propagação nos meios 1 e 2.1

Sejam n1 = (cosϕ1, sinϕ1) e n2 = (cosϕ2, sinϕ2), em que ϕ1 é o ângulo que faz a direçãode propagação no meio 1 com a normal à fronteira e ϕ2 é o ângulo que faz a direção depropagação no meio 2 com a normal à fronteira (figura 11.3). Introduzindo n1 e n2 em(11.9), obtém-se

sinϕ1

c1= sinϕ2

c2(11.10)

1Como c1 = c2, tem que se ter n1 = n2, caso contrário nunca poderia haver continuidade da solução da equaçãodas ondas.

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184 VELOCIDADE DE FASE

que é a lei de Snell da refração e n = c1/c2 é o índice de refração.

Ora, a lei de Snell (11.10) tem várias soluções. Como

sinϕ1 = c1

c2sinϕ2,

esta equação tem solução em ϕ2, sempre que c1/c2 ≥ 1.

Se c1/c2 < 1, tem-se quesinϕ2 = c2

c1sinϕ1 (11.11)

e esta equação nem sempre tem soluções em ordem a sinϕ2. Assim, existe um valor de ϕ1,para o qual, se ϕ1 > ϕB , a equação (11.11) não tem soluções e ϕB é definido pela relaçãoc2c1

sinϕB = 1. O ânguloϕB = arcsin c1

c2,

em que c1 < c2, designa-se por ângulo de Brewster ou ângulo crítico de refração.

Se c1 = c2, a lei de Snell (11.10) com ϕ1 ∈ [0,π/2] tem a solução ϕ2 = ϕ1 e ainda

ϕ2 = (π − ϕ1)

que é a lei de reflexão especular.

Em conclusão, quando uma onda incide sobre a fronteira de separação de um meio, emgeral, existe reflexão especular e refração. O ângulo de reflexão obedece à lei especular,ϕ1 → π − ϕ1. Se, c1 ≥ c2, o ângulo de refração é calculado de acordo com (11.11).Se c1 < c2 e ϕ1 > ϕB , não existe refração. Nos caso em que existe reflexão e refração, asamplitudes das ondas refratada e refletida não são dados por (11.6), uma vez que dependemdo ângulo de incidência. A equação (11.6) corresponde ao caso particular da incidêncianormal.

11.3 VELOCIDADE DE FASE

Nas vibrações da corda semi-infinita com condição fronteira h(t) = A sinωt, por (11.4), asolução progressiva é

ψ(x,t) = h(t− x

c) = A sinω(t− x

c) = A sin(ωt− ω

cx),

para t − x/c ≥ 0. A constante ω é a frequência de vibração, expressa em radianos porsegundo. No sistema internacional de unidades, a frequência é f = ω/(2π) expressa em

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REFLEXÃO, REFRAÇÃO E DISPERSÃO DE ONDAS 185

hertz (Hz). O número de ondas por unidade de comprimento é k/(2π). O comprimentode onda é λ = 2π/k e fλ = ω/k = c. A solução ψ(x,t) = A sin(ωt − kx) tem associadauma velocidade c, a que corresponde à velocidade com que se propaga a perturbação dafronteira, no sentido positivo do eixo dos xx. A solução ψ(x,t) é muitas vezes designada porfase. A velocidade de propagação da fase ψ(x,t) é caracterizada pela condição dψ = 0.Pois, para medir a velocidade de propagação da fase é necessário marcar um ponto dereferência na fase e seguir esse ponto no espaço e no tempo. Essa referência é um valorconstante da fase. Assim, com

dψ = ∂ψ

∂xdx+ ∂ψ

∂tdt = 0,

define-se a velocidade de fase como

vf = dx

dt= −

∂ψ∂t∂ψ∂x

. (11.12)

Quandoψ(x,t) = A sin(ωt−kx), a velocidade de fase da onda progressiva é vf = ω/k = c.A velocidade de vibração do meio, num ponto x = x∗, é

∂ψ(x,t)∂t

= Aω cos(ωt− kx∗),

sendo, portanto, a velocidade transversal de uma corda vibrante. A velocidade de fase é avelocidade de propagação da onda progressiva.

No caso das ondas estacionárias, como é o caso das oscilações transversais de uma cordacom os extremos fixos, não faz sentido introduzir o conceito de velocidade de fase.

A solução ψ = A sin(ωt − kx) da equação das ondas linear designa-se por solução pro-gressiva ou por solução do tipo onda plana monocromática. Em geral, uma onda planamonocromática tem uma das formas

A sin(ωt− k.x) ou A cos(ωt− k.x),

em que x, k ∈ Rn. Como a equação das ondas é linear, pode-se passar para a notaçãocomplexa e uma onda plana monocromática escreve-se na forma

ϕ(x,t) = Aei(ωt−k.x), (11.13)

em que A é uma constante e tanto a parte real como a parte imaginária são soluções daequação das ondas.

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186 VELOCIDADE DE FASE

Veja-se uma situação em que a dependência entre a frequência de vibração e o número deondas não é linear.

Um fio condutor semi-infinito é caracterizado pelas seguintes constantes: C (capacidade),L (indutância), R (resistência) e S (condutância de dispersão). A equação que determina aforma de um sinal que se propaga ao longo do fio condutor é (equação da telegrafia)

∂2ψ

∂x2 = CL∂2ψ

∂t2+ (CR+ SL)∂ψ

∂t+RSψ . (11.14)

Introduzindo na equação (11.14) uma solução do tipo onda plana monocromática, ψ =Aei(ωt−kx), e resolvendo em ordem a k, obtém-se

k2 = CLω2 − (CR+ SL)iω −RS . (11.15)

Ora, a equação (11.15) tem duas soluções para k. Com k = Re(k) + i Im(k), e conside-rando, por exemplo, a condição fronteira ψ(x = 0,t) = sinωt, tem-se a solução

ψ(x,t) = Im(ei(ωt−kx)) = Im

(ei(ωt−Re(k)x)eIm(k)x

)= sin(ωt− Re(k)x)eIm(k)x .

Como (11.15) tem duas soluções em k, uma das soluções obedece à condição Im(k) < 0,e, neste caso, existe atenuação do sinal. A solução com Im(k) > 0 é uma solução não físicae corresponderia a uma acumulação de energia no interior do sistema. Se Im(k) < 0, avelocidade de fase é

vf = ω cos(ωt− Re(k)x)Re(k) cos(ωt− Re(k)x) − Im(k) sin(ωt− Re(k)x)

.

Fazendo, por exemplo, C = L = R = S = 1, tem-se k2 = (ω − i)2 (k = (ω − i)),Im(k) = −1 e Re(k) = ω e, portanto,

vf = ω cos(ωt− ωx)ω cos(ωt− ωx) + sin(ωt− ωx)

.

Assim, a velocidade de fase não está bem definida para todos os valores de x e t.

A relação (11.15), que relaciona o número de ondas com os parâmetros do sistema físico,é a relação de dispersão da equação (11.14). De facto, devido à relação (11.12) que define avelocidade de fase, esta só estará bem definida quando a onda não é atenuada ao longo dotempo, ou quando a solução da relação de dispersão é real.

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REFLEXÃO, REFRAÇÃO E DISPERSÃO DE ONDAS 187

11.4 VELOCIDADE DE GRUPO

Considere-se a equação das ondas (11.1) com a condição fronteira ψ(x = 0,t) = sinω1t+sinω2t. Como a equação (11.1) é linear, a sua solução é a soma de duas ondas progressivasda forma

ψ(x,t) = Im(ei(ω1t−k1x) + ei(ω2t−k2x)

)= Im

(2 cos(ω1 + ω2

2t− k1 + k2

2x) cos(ω1 − ω2

2t− k1 − k2

2x)

+ 2i sin(ω1 + ω2

2t− k1 + k2

2x) cos(ω1 − ω2

2t− k1 − k2

2x))

= 2 sin(ω1 + ω2

2t− k1 + k2

2x) cos(ω1 − ω2

2t− k1 − k2

2x) .

(11.16)

Assim, ψ(x,t) é o produto de duas funções periódicas com frequências diferentes. Comω = (ω1 + ω2)/2, k = (k1 + k2)/2, por analogia com a velocidade de fase das ondasprogressivas da equação linear das ondas, a solução (11.16) tem velocidade de fase média

vf = ω

k= ω1 + ω2

k1 + k2.

O termo em coseno tem velocidade

v∗g = ω1 − ω2

k1 − k2= ∆ω

∆k.

Quando ω2 está muito próximo de ω1, a expressão anterior assume a forma mais simples

vg := dω

dk. (11.17)

Por definição, vg como definida em (11.17) é a velocidade de grupo. No caso da equação lineardas ondas, vg = vf .

Na equação da telegrafia (11.14) com a escolha de parâmetros, C = L = R = S = 1,tem-se a relação de dispersão k = ω − i, e portanto, vf = (ω1+ω2)

(ω1+ω2)−2i e vg = dωdk = 1. No

entanto, devido ao facto de a solução da equação (11.14) ser amortecida, Im(k) < 0, nãoé possível atribuir um significado físico preciso às velocidades vf , vf e vg.

Quando a velocidade de propagação de uma onda progressiva depende da frequência,diz-se que a equação às derivadas parciais tem soluções dispersivas.

Muitos autores argumentam que a velocidade de grupo está relacionada com a velocidadede propagação da (densidade de) energia. No entanto, não se conhece nenhuma prova

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188 VELOCIDADE DE GRUPO

desta afirmação. A única dependência conhecida entre a velocidade de grupo e a veloci-dade de propagação da energia é no caso dos fotões. Neste caso, tem-se que E = ℏω ep = ℏk, e, portanto,

vg = dω

dk= d(E/ℏ)

d(p/ℏ)= dE

dp,

em que E é a energia e p é o momento linear. Como E = pc, vem que vg = c. No casoclássico, para partículas materiais com massa m > 0, tem-se que E = mv2/2, p = mv e,portanto, vg = dE

dp = v.

O formalismo das ondas planas monocromáticas desenvolvido justifica a formulação deSchrödinger da mecânica quântica. Considere-se a fórmula de Planck para a energia deum fotão E = ℏω, e a relação de de Broglie para as ondas de matéria k = p/ℏ, em queℏ = h/2π. Assuma-se que a função de onda (de matéria) de uma electrão ligado ao núcleoatómico tem a forma

Ψ(r,t) = Aei(k.r−ωt) = Aei(p.r−Et)/ℏ.

Então, ∂Ψ∂t

= −iEℏ

Ψ

∂2Ψ∂x2

n

= −p2n

ℏ2 Ψ, n = 1,2,3.(11.18)

Como a energia clássica do electrão é E = p2/2m + V (r), em que V (r) é a energiapotencial, substituindo (11.18) na expressão da energia, obtém-se

− ℏ2

2m

(∂2

∂x21

+ ∂2

∂x22

+ ∂2

∂x23

)Ψ + V (r)Ψ = iℏ

∂Ψ∂t

que é a equação de Schrödinger, formalmente idêntica à equação do calor (9.5). Note, noentanto, que esta equação não é invariante para a transformação t → −t.

EXERCÍCIOS

11.1 Uma corda semi-infinita tem três regiões de densidades diferentes, como se mostra nafigura. Supondo a condição fronteira, ϕ(x = 0,t) = A sinωt, determine a amplitude

a bI II III

ρ1 ρ2 ρ3

da onda transmitida à região III.

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REFLEXÃO, REFRAÇÃO E DISPERSÃO DE ONDAS 189

11.2 Determine a intensidade relativa da luz refletida e da luz refratada na superfície daágua do mar, para os ângulos de incidência ϕ1 = 0 e ϕ2 = 30. O índice de refraçãodo ar é nar = 1,0003 e o índice de refração da água salgada é nags = 1,3423. Avelocidade da luz no vácuo é c = 299 792 458 ms−1.

11.3 Seja a equação∂2ϕ

∂t2= c2 ∂

∂x2 + αϕ .

Assuma que a equação tem uma solução do tipo onda plana monocromática e deter-mine a velocidade de fase e a velocidade de grupo.

11.4 Determine a relação de dispersão para a equação de Schrödinger

− ℏ2

2m∂2ϕ

∂x2 = iℏ∂ϕ

∂t.

Mostre que vg = 2vf , em que vf e vg são, respetivamente, a velocidade de fase e avelocidade de grupo.

11.5 A equação para as pequenas oscilações transversais de uma barra é

∂2ϕ

∂t2= c2 ∂

∂x4 ,

em que c2 = EI/ρA, E [Nm−2] é o módulo de elasticidade ou de Young, ρ é adensidade da barra, A é a área da secção da barra e I [m4] é o momento de área dasecção reta da barra, relativamente ao eixo dos xx.

a) Determine a relação de dispersão da equação às derivadas parciais. Resolvaa equação de dispersão em ordem a k e considere apenas as soluções para asquais Re(k) > 0 e Im(k) < 0. Determine a velocidade de fase e a velocidade degrupo.

b) Mostre que se a barra é forçada no ponto x = 0 com uma função harmónica deamplitudeA, a amplitude da perturbação decai para zero em função da distânciaao ponto de forçamento. Sabendo que a amplitude da solução da equação éproporcional a e−λd, em que d é a distância entre um ponto da barra e o pontode forçamento, determine o valor de λ.

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12A TRANSFORMADA DE FOURIER DISCRETA

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A TRANSFORMADA DE FOURIER DISCRETA 193

Constrói-se a transformada de Fourier discreta de uma função e discute-se o teorema da amostragemde Nyquist. Dão-se alguns exemplos de cálculo de tranformadas de Fourier discretas.

12.1 A TRANSFORMADA DE FOURIER DISCRETA

Quando a informação sobre uma função se limita aos seus valores num conjunto discretode pontos, pode-se construir a sua transformada de Fourier. A transformada obtida é umconjunto discreto de pontos.

Se a variável independente de uma função h(t) tem a dimensão de um tempo, a variávelindependente ξ da sua transformada de Fourier tem a dimensão [rad/s]. Introduzindo anova variável f = ξ/(2π) [Hertz], as fórmulas de reciprocidade de Fourier (8.6) escrevem--se na forma

H(f) = 1√2π

∫ +∞

−∞h(t)e−i2πftdt (12.1)

h(t) =√

2π∫ +∞

−∞H(f)ei2πftdf, (12.2)

em que H(f) é a transformada de Fourier de h(t) e f tem a dimensão [ciclos/s = Hz].Neste contexto, a função h(t) é muitas vezes designada por sinal.

h(t)

tΔt 2Δt

Figura 12.1 Amostragem temporal de uma função h(t). O intervalo de amostragem é ∆t.

O objetivo é determinar a decomposição espetral, ou seja, a decomposição de Fourier, dosinal h(t). Assume-se que a função h(t) pode tomar valores reais ou complexos. Como nãoé possível registar continuamente o sinal h(t), pode-se considerar que se faz a amostragemda função h(t) em intervalos de tempo consecutivos, de largura∆t (figura 12.1). Obtém-se,assim, um conjunto de N números h0,h1, . . . ,hN−1, em que hi = h(i∆t). No entanto,

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194 A TRANSFORMADA DE FOURIER DISCRETA

num intervalo de largura 2∆t, podem-se ter comportamentos periódicos, de períodos T ≤2∆t, ou seja, de frequências f ≥ 1/(2∆t). Deste modo, como é intuitivo verificar, nãoé possível determinar sinais de frequências f ≥ 1/(2∆t). Por exemplo, se h(t) = cos t e∆t ≥ π, em geral, não é possível reconstruir a função coseno. Isto é resumido no teorema:

Teorema 12.1 (Teorema da amostragem de Nyquist)Se é feita a amostragem de uma função h(t) em intervalos de tempo ∆t, então existe uma frequência crítica— frequência de Nyquist, dada por

fc = 12∆t

tal que se a transformada de Fourier da função amostrada satiszaz

H(f) = 0 , para |f | ≥ fc ,

então é possível reconstruir h(t) a partir dos valores da amostragem.

Veja-se como calcular a transformada de Fourier discreta de uma função amostrada. Apro-ximando (12.1) por uma soma de Riemann truncada, obtém-se

H(f) ≃ ∆t√2π

N−1∑n=0

h(n∆t)e−i2πfn∆t . (12.3)

Pelo teorema da amostragem de Nyquist, a expressão anterior só faz sentido com f nointervalo [−fc,fc]. Então, assumindo que N é par e introduzindo a partição do intervalode variação de f em frequência,

− 12∆t

, − 12∆t

+ 1N∆t

, − 12∆t

+ 2N∆t

, . . . ,1

2∆t− 1N∆t

,1

2∆t,

por (12.3), tem-se que

H(fk) := H( k

N∆t) ≃ ∆t√

N−1∑n=0

hne−i 2πkn

N , (12.4)

em que, hn = h(n∆t), fk = (k/N∆t) e k = −N/2, . . . ,N/2.

De (12.2), tem-se que

h(tn) ≃√

2π∆fN/2∑

k=−N/2

Hkei 2πkn

N =√

2πN∆t

N/2∑k=−N/2

Hkei 2πkn

N , (12.5)

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A TRANSFORMADA DE FOURIER DISCRETA 195

em que, Hk = H(fk) = H( kN∆t ) e tn = n∆t. Mas por (12.4), H(f−k) = H(fN−k) e

como Hk é periódica de período N , (12.5) escreve-se na forma

h(tn) =√

2πN∆t

N−1∑k=0

Hkei 2πkn

N . (12.6)

Através de (12.4) e (12.6), pode-se definir a transformada de Fourier discreta e a respetiva trans-formada inversa como

Hk :=N−1∑n=0

hne−i 2πkn

N

hn := 1N

N−1∑k=0

Hkei 2πkn

N .

(12.7)

Pelas definições (12.7), tantoHk como hk não dependem do tempo de amostragem ∆t. Oíndice k = 0 corresponde à frequência f = 0. O índice k = 1 corresponde à frequênciaf = 1/(N∆t) e o índice k = N/2 à frequência crítica f = fc = 1/(2∆t). Os índicesk = N/2 + 1, . . . ,N − 1 correspondem a frequências negativas. Assim, para uma funçãoreal, toda a informação relevante no que se refere à decomposição espetral de um sinal estácontida nos índices k do intervalo [0,N/2].

Teorema 12.2 (Igualdade de Parseval para a transformada de Fourier discreta)Nas condições de (12.7) tem-se que

1N

N−1∑k=0

|Hk|2 =N−1∑n=0

|hn|2 .

DEMONSTRAÇÃO.

Por (12.7), tem-se que

1N

N−1∑k=0

|Hk|2 = 1N

N−1∑k=0

(N−1∑n=0

hne−i 2πkn

N

)(N−1∑m=0

h∗me

i 2πkmN

)

= 1N

N−1∑k=0

N−1∑n=0

N−1∑m=0

hnh∗me

i2πk(m−n)

N

= 1N

N−1∑k=0

N−1∑n=0

N−1−n∑p=−n

hnh∗p+ne

i 2πkpN

= 1N

N−1∑k=0

N−1∑n=0

hnh∗n

(1 +

−1∑p=−n

ei2πkp

N +N−1−n∑p=1

ei2πkp

N

),

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196 A TRANSFORMADA DE FOURIER DISCRETA

em que se introduziu o índice inteiro p = m − n. Veja-se que os dois somatórios dentrodo parêntesis da expressão anterior somam zero. Ora, pela fórmula da soma das sériesgeométricas,

N−1∑k=0

ei2πkp

N =N−1∑k=0

(ei

2πpN

)k= 1 − ei

2πpN N

1 − ei2πpN

= 0 .

Passando o somatório em k para dentro do parêntesis, o resultado das somas é zero. Assim,

1N

N−1∑k=0

|Hk|2 = 1N

N−1∑k=0

N−1∑n=0

hnh∗n =

N−1∑n=0

|hn|2 .

Nas condições do teorema anterior, a norma de um sinal e a norma da sua transformadade Fourier discreta contêm a mesma informação.

Pode-se ainda definir a função de correlação para duas funções amostradas h(t) e r(t).Neste caso, chega-se facilmente a

(r ∗ h)j =N−1∑k=0

rj+khk . (12.8)

A importância do conceito de transformada de Fourier discreta reside na possibilidade dedeterminar a composição espetral de um sinal.

Quando N = 2M , Cooley e Tukey desenvolveram um algoritmo que permite o cálculorápido da transformada de Fourier discreta (12.7). Nesse caso, são apenas necessárias Moperações para calcular uma soma com 2M termos. Esta técnica para o cálculo das trans-formadas de Fourier discretas designa-se por Fast Fourier Transform (FFT).

Analisem-se alguns exemplos de transformadas de Fourier discretas. Seja a função h(t) =sin(2πt) sin(πt) e faça-se a amostragem desta função com N = 200 e ∆t = 1/10. Nestecaso, a frequência de Nyquist é fc = 5 Hz. Como se vê na figura 12.2, o módulo datransformada de Fourier discreta apresenta quatro picos pronunciados. Os dois primeirospicos surgem para os inteiros k = 10 e k = 30, ou seja para as frequências f5 = 0,5 Hertze f15 = 1,5 Hertz (fk = k/(N∆t)), respetivamente. Os outros dois picos resultam dasimetria |Hk| = |HN−k| existente em 12.7 e não têm informação adicional relativamenteà decomposição espetral do sinal. Como h(t) = sin(2πt) sin(πt) = (cosπt − cos 3πt)/2,os dois cosenos têm os períodos T1 = 2 s e T2 = 2/3 s. Neste caso, as frequências sãof1 = 1/T1 = 0,5 Hz e f2 = 1/T2 = 3/2 Hz. Na figura 12.2, estão ainda representados

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A TRANSFORMADA DE FOURIER DISCRETA 197

0 50 100 150 200

-0.5

0.0

0.5

k

f=Sin(2 π t)*Sin(π t)

0 50 100 150 2000.0

0.5

1.0

1.5

2.0

2.5

3.0

|Transformada de Fourier|

0 50 100 150 200-4

-3

-2

-1

0

1

2

Ln de |transformada de Fourier|

0 50 100 150 200

-3

-2

-1

0

1

2

3

Função de autocorrelação

Figura 12.2 Módulo da transformada de Fourier discreta e função de autocorrelação da funçãoh(t) = sin(2πt) sin(πt). O período de amostragem é ∆t = 1/10 e N = 200.

0 20 40 60 80 100-1.0

-0.5

0.0

0.5

1.0

k

f=Sin(2 π t)*Aleatório()

0 20 40 60 80 1000.0

0.5

1.0

1.5

2.0

2.5

3.0

|Transformada de Fourier|

0 20 40 60 80 100-3

-2

-1

0

1

2

Ln de |transformada de Fourier|

0 20 40 60 80 100-1.5

-1.0

-0.5

0.0

0.5

1.0

1.5

Função de autocorrelação

Figura 12.3 Módulo da transformada de Fourier discreta e função de autocorrelação da funçãoh(t) = sin(2πt) × (Sinal Aleatório). O período de amostragem é ∆t = 1/10 e N = 100.

os gráficos do logaritmo do módulo da transformada de Fourier discreta, assim como afunção de autocorrelação do sinal, calculada através de (12.8).

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198 A TRANSFORMADA DE FOURIER DISCRETA

0 20 40 60 80 100

-1.0

-0.5

0.0

0.5

1.0

k

Sinal(Sin(3 t))

0 20 40 60 80 1000.0

0.5

1.0

1.5

2.0

2.5

3.0

|Transformada de Fourier|

0 20 40 60 80 100-3

-2

-1

0

1

2

Ln de |transformada de Fourier|

0 20 40 60 80 100

-5

0

5

10

Função de Correlação

Figura 12.4 Módulo da transformada de Fourier discreta e função de autocorrelação da funçãoh(t) = Sinal(sin(3x)). O período de amostragem é ∆t = 1/10 e N = 100.

Seja o sinal h(t) = sin(2πt) ∗ (sinal aleatório), com o período de amostragem ∆t = 1/10 eN = 100 . Neste caso, o módulo da transformada de Fourier discreta tem apenas um pico,adicionado a um sinal de fundo aleatório (figura 12.3). Este exemplo mostra bem como adecomposição espetral pode ser utilizada para extrair ruído de um sinal periódico.

Seja a função h(t) = Sinal(sin(3t)), com o período de amostragem ∆t = 1/10 e N =100. Neste caso, a transformada de Fourier discreta tem vários picos que correspondem àsfrequências harmónicas (figura 12.4). Como se viu no capítulo 5, deveriam existir infinitospicos. Mas como a amostragem é finita, só aparecem picos para frequências menores quea frequência de Nyquist. Por outro lado, a altura dos picos é proporcional à energia decada modo próprio.

EXERCÍCIOS

12.1 Mostre que a trasformada de Fourier discreta de um sinal tem a simetria |Hk| =|HN−k|.

12.2 Determine os valores do índice k para os quais aparecem picos na transformada deFourier discreta de h(t) = sin(t) cos(3t). Escolha N = 100 e ∆t = 0,1.

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A TRANSFORMADA DE FOURIER DISCRETA 199

12.3 Considere um sinal da forma h(t) = 2 sin(2πt). sin(9πt) + 0.5 sin(3πt), em que sefez uma amostragem do sinal em intervalos de tempo ∆t = 0,2 s e guardou-se umaamostra com 512 pontos. Para que valores do índice da transformada de Fourierdiscreta de h(t) é que existem picos no seu espetro de frequências?

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13EQUAÇÕES ÀS DERIVADAS PARCIAIS DE SEGUNDA ORDEM

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EQUAÇÕES ÀS DERIVADAS PARCIAIS DE SEGUNDA ORDEM 203

Introduz-se a técnica das formas canónicas para obter a classificação das equações às derivadasparciais lineares de segunda ordem. Introduz-se o conceito de equação caraterística de uma equaçãoàs derivadas parciais. Faz-se a construção das curvas caraterísticas para as equações às derivadasparciais de segunda ordem e demonstra-se o teorema de Cauchy-Kovalevskaya.

13.1 EQUAÇÕES ÀS DERIVADAS PARCIAIS DE SEGUNDA ORDEM

Até aqui estudaram-se as soluções das seguintes equações às derivadas parciais lineares desegunda ordem:

c2 ∂2ψ

∂x2 − ∂2ψ

∂t2= 0 Equação das ondas (hiperbólica)

k∂2ψ

∂x2 − ∂ψ

∂t= 0 Equação do calor ou da difusão (parabólica)

∂2ψ

∂x2 + ∂2ψ

∂y2 = 0 Equação de Laplace (elíptica).

A estas equações estão associadas soluções que correspondem a comportamentos físicosdiferentes: oscilações, difusão e equilíbrio. Vai-se mostrar que a estes tipos de soluções estáassociada uma classificação das equações às derivadas parciais lineares: equações hiperbó-licas, parabólicas e elípticas.

A forma geral de uma equação às derivadas parciais linear de segunda ordem, com duasvariáveis independentes, é

A∂2ψ

∂x2 + 2B ∂2ψ

∂x∂y+ C

∂2ψ

∂y2 + F

(ψ,∂ψ

∂x,∂ψ

∂y,x,y

)= 0, (13.1)

em que os coeficientes A, B e C são constantes, ou podem ser funções das variáveis inde-pendentes x e y.1 O problema que se vai abordar é o de encontrar uma substituição devariáveis (linear) de modo a reduzir a equação (13.1) a uma forma mais simples, a formacanónica.

Sejam as novas variáveis ξ = ξ(x,y)η = η(x,y),

(13.2)

1Quando A, B e C são funções das variáveis independentes x e y, diz-se que a equação (13.1) é semilinear.

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204 EQUAÇÕES ÀS DERIVADAS PARCIAIS DE SEGUNDA ORDEM

em que o jacobiano da transformação obedece à condição

J = ∂(ξ,η)∂(x,y)

= 0,

em todo o domínio de x e y. Nas novas variáveis ξ e η, os operadores diferenciais são

∂x= ∂ξ

∂x

∂ξ+ ∂η

∂x

∂η

∂y= ∂ξ

∂y

∂ξ+ ∂η

∂y

∂η

∂2

∂x2 =(∂ξ

∂x

)2∂2

∂ξ2 + 2 ∂ξ∂x

∂η

∂x

∂2

∂ξ∂η+(∂η

∂x

)2∂2

∂η2

∂2

∂y2 =(∂ξ

∂y

)2∂2

∂ξ2 + 2∂ξ∂y

∂η

∂y

∂2

∂ξ∂η+(∂η

∂y

)2∂2

∂η2

∂2

∂x∂y= ∂ξ

∂x

∂ξ

∂y

∂2

∂ξ2 +(∂ξ

∂x

∂η

∂y+ ∂ξ

∂y

∂η

∂x

)∂2

∂ξ∂η+ ∂η

∂x

∂η

∂y

∂2

∂η2

e a equação (13.1) escreve-se na forma

A(ξ,η)∂2ψ

∂ξ2 + 2B(ξ,η) ∂2ψ

∂ξ∂η+ C(ξ,η)∂

∂η2 + F

(ψ,∂ψ

∂ξ,∂ψ

∂η, ξ,η

)= 0, (13.3)

em que

A(ξ,η) = A

(∂ξ

∂x

)2

+ 2B ∂ξ∂x

∂ξ

∂y+ C

(∂ξ

∂y

)2

B(ξ, η) = A∂ξ

∂x

∂η

∂x+B

(∂ξ

∂x

∂η

∂y+ ∂ξ

∂y

∂η

∂x

)+ C

∂ξ

∂y

∂η

∂y

C(ξ, η) = A

(∂η

∂x

)2

+ 2B∂η∂x

∂η

∂y+ C

(∂η

∂y

)2

.

(13.4)

Determinem-se as novas variáveis ξ(x,y) e η(x,y) de modo a que a equação (13.3) fique omais simples possível. Por (13.4),

B2 − AC =(∂ξ

∂x

∂η

∂y− ∂ξ

∂y

∂η

∂x

)2 (B2 −AC

)= J2(B2 −AC),

em que J é o jacobiano da transformação de variáveis (13.2). Como, por hipótese, J = 0,o sinal de (B2 − AC) é igual ao sinal de (B2 −AC).

Mediante a escolha das variáveis (13.2), veja-se que é possível simplificar a equação àsderivadas parciais (13.3).

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EQUAÇÕES ÀS DERIVADAS PARCIAIS DE SEGUNDA ORDEM 205

Assumindo que ξ e η são funções lineares em x e y, sejam as constantes

u = ∂ξ

∂xe v = ∂ξ

∂y. (13.5)

Assim, por (13.4), A escreve-se na forma

A = Au2 + 2Buv + Cv2 .

Com u = αv, a equação anterior simplifica-se e obtém-se

A = v2(Aα2 + 2Bα+ C) . (13.6)

A equação (Aα2 +2Bα+C) = 0 designa-se por equação caraterística da equação às derivadasparciais (13.1).

A equação (13.6) tem as raízes

λ = −B ±√B2 −AC

A. (13.7)

Como os valores de λ podem ser reais ou complexos, dependendo do sinal de (B2 −AC),vejam-se os vários casos possíveis.

1) (B2 −AC) > 0. Neste caso, por (13.6), a equação caraterística tem duas raízes reais, λ1

e λ2. Como u = αv, escolhendo α = λ1, por (13.5), vem que

∂ξ

∂x= λ1

∂ξ

∂y, (13.8)

e, por construção, A = 0. De igual modo, com w = ∂η∂x , z = ∂η

∂y e w = βz, escolhendoβ = λ2, obtém-se

∂η

∂x= λ2

∂η

∂y, (13.9)

e a equação em (13.4) que define C também se anula. Assim, com as escolhas (13.8) e(13.9), a equação às derivadas parciais (13.3) fica reduzida à forma canónica

2B ∂2ψ

∂ξ∂η+ F = 0,

ou seja∂2ψ

∂ξ∂η+ F ′ = 0, (13.10)

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206 EQUAÇÕES ÀS DERIVADAS PARCIAIS DE SEGUNDA ORDEM

em que F ′ = F /(2B). Devido à forma do primeiro termo de (13.10), diz-se que a equação(13.10) é do tipo hiperbólico.

A substituição de variáveis que reduz à forma hiperbólica é determinada pelas equações∂ξ

∂x− λ1

∂ξ

∂y= 0

∂η

∂x− λ2

∂η

∂y= 0,

(13.11)

em que λ1 e λ2 são as raízes da equação caraterística da equação às derivadas parciais.Seja então uma função f(x,y) : R2 → R. O diferencial de f sobre as curvas de nível de f édf = ∂f

∂xdx+ ∂f∂y dy = 0. Comparando a expressão de df com as equações (13.11), conclui-

-se que existem funções, ξ = f1(x,y) e η = f2(x,y) para as quais as relações anterioressão verificadas sobre as curvas de nível de f1 e f2, (ξ = f1(x,y) = c1 e η = f2(x,y) = c2).Assim, as curvas de nível das variáveis ξ e η para as quais A e C se anulam são determinadaspelas equações diferenciais

dy

dx= −λ1

dy

dx= −λ2,

(13.12)

obtidas por comparação de (13.11) com a expressão de df = 0. Assim, tem-seξ = y + λ1x (= y0 + λ1x0)η = y + λ2x (= y0 + λ2x0) .

(13.13)

Por exemplo, como na equação das ondas, y = t, A = c2, B = 0 e C = −1, tem-se queB2 −AC = c2 > 0. Por (13.7) e (13.13), a transformação de variáveis que reduz a equaçãodas ondas à forma canónica (13.10) é

ξ = t+ 1cx

η = t− 1cx .

2) (B2 −AC) = 0. Neste caso, as raízes (13.7) da equação caraterística são iguais e escolhe--se

∂ξ

∂x= λ

∂ξ

∂y.

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EQUAÇÕES ÀS DERIVADAS PARCIAIS DE SEGUNDA ORDEM 207

Como A = 0 e B2 − AC = (B2 − AC)J2 = 0, vem que B2 = 0. Assim, a equação àsderivadas parciais (13.3) reduz-se à forma canónica

C∂2ψ

∂η2 + F = 0,

ou seja,∂2ψ

∂η2 + F ′ = 0, (13.14)

em que F ′ = F /C. A equação (13.14) é do tipo parabólico.

A transformação de variáveis que determina a forma canónica (13.14) é obtida através de

dy

dx= −λ ⇒ ξ = y + λx (= y0 + λx0) .

Como o determinante da transformação de variáveis é diferente de zero, pode-se fazer aescolha

ξ = y + λx

η = x .

Por exemplo, para a equação do calor, A = k, B = 0, C = 0 eB2 −AC = 0. Então, λ = 0e a transformação de variáveis que reduz a equação do calor à forma canónica é

ξ = y

η = x.

Assim, a equação do calor já está na forma canónica.

3) (B2 −AC) < 0. Neste caso, as raízes da equação caraterística são complexas conjugadase faz-se

∂ξ

∂x− λ

∂ξ

∂y= 0

∂η

∂x− λ∗ ∂η

∂y= 0

dy

dx= −λ

dy

dx= −λ∗ .

Assim, tem-se uma forma canónica formalmente semelhante ao caso hiperbólico, em queas variáveis ξ e η são complexas conjugadas. Nestas condições, os coeficientes A e Canulam-se, e a equação (13.3) reduz-se a

2B ∂2ψ

∂ξ∂η+ F = 0, (13.15)

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208 EQUAÇÕES ÀS DERIVADAS PARCIAIS DE SEGUNDA ORDEM

que é uma equação complexa. Com as novas variáveis,α = 1

2(ξ + η)

β = 12i(ξ − η)

e os operadores diferenciais∂

∂ξ= ∂α

∂ξ

∂α+ ∂β

∂ξ

∂β= 1

2∂

∂α+ 1

2i∂

∂β

∂η= ∂α

∂η

∂α+ ∂β

∂η

∂β= 1

2∂

∂α− 1

2i∂

∂β,

a forma real da equação diferencial (13.15) é

12B

(∂2ψ

∂α2 + ∂2ψ

∂β2

)+ F ′ = 0,

que é a forma canónica das equações do tipo elíptico.

Está assim demonstrado o teorema da classificação das equações às derivadas parciais deduas variáveis.

Teorema 13.1A equação às derivadas parciais,

A∂2ψ

∂x2 + 2B ∂2ψ

∂x∂y+ C

∂2ψ

∂y2 + F = 0

em que A, B e C são constantes, reduz-se, através de uma tranformação linear de variáveis, a uma dasseguintes formas:

a) Se B2 −AC > 0, ∂2ψ∂ξ∂η + F ′ = 0 (equação hiperbólica).

b) Se B2 −AC = 0, ∂2ψ∂η2 + F ′ = 0 (equação parabólica).

c) Se B2 −AC < 0, ∂2ψ∂α2 + ∂2ψ

∂β2 + F ′ = 0 (equação elíptica).

O teorema 13.1 é ainda válido para o caso em que A, B e C dependem das variáveis inde-pendentes x e y, com a ressalva de que a transformação de variáveis não é necessariamentelinear. Então, uma equação de segunda ordem semilinear pode ter comportamentos dife-rentes em diferentes domínios. Neste caso, diz-se que se tem uma equação mista.

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EQUAÇÕES ÀS DERIVADAS PARCIAIS DE SEGUNDA ORDEM 209

B2-AC<0 B2-AC=0 B2-AC>0elípticas parabólicas hiperbólicas

campos em equilíbrio campos com transientese com soluções assintóticas

de equilíbrio

campos em oscilação

Figura 13.1 Parametrização do comportamento das soluções das equações às derivadas parciais lineares desegunda ordem em função do sinal de (B2 −AC).

A classificação obtida conduz naturalmente a uma parametrização do comportamento dassoluções das equações às derivadas parciais lineares de segunda ordem em função do sinalde (B2 −AC) (figura 13.1).

Por exemplo, a equação às derivadas parciais semilinear

∂2ψ

∂x2 + y∂2ψ

∂y2 + 12∂ψ

∂y= 0

é uma equação hiperbólica para y < 0, parabólica para y = 0 e elíptica para y > 0.

13.2 CURVAS CARATERíSTICAS

A solução da equação às derivadas parciais (13.1) pode ser encarada como definindo umasuperfície no espaço euclidiano de coordenadas (x,y,z), em que z = ψ(x,y) (figura 13.2).Considere-se uma curva Γ no espaço euclidiano (x,y), parametrizada por s, (x(s),y(s)),e admita-se que se conhecem os valores de ψ(Γ). A superfície z = ψ(x,y) contém a curvaψ(Γ). Vai-se mostrar que o problema de valor inicial de Cauchy pode ser construído àcusta do conhecimento de ψ(Γ).

O problema que se vai abordar é o de saber de que maneira se pode construir a soluçãoψ(x,y) da equação (13.1), em torno de ψ(Γ). Isto é, quer-se determinar ψ(x,y), conhe-cendo ψ(Γ) e as suas primeiras derivadas.

Admita-se que ψ(x,y) é uma função analítica em todo o seu domínio. Desenvolvendoψ(x,y) em série de Taylor em torno de ψ(Γ), obtém-se

ψ(x,y) = ψΓ(x,y) +(∂ψ

∂x

(x− xΓ) +(∂ψ

∂y

(y − yΓ)

+12

(∂2ψ

∂x2

(x− xΓ)2 +(∂2ψ

∂x∂y

(x− xΓ)(y − yΓ)

+12

(∂2ψ

∂y2

(y − yΓ)2 + . . . .

(13.16)

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210 CURVAS CARATERÍSTICAS

Figura 13.2 Gráfico da solução z = ψ(x,y) de uma equação às derivadas parciais de segunda ordem. Asolução z = ψ(x,y), a existir, pode ser encarada como uma superfície num espaço a três dimensões.

Impondo como condição o conhecimento das funções

x(s), y(s),(∂ψ

∂x

)Γ,

(∂ψ

∂y

)Γ,

pode-se substituir (13.16) em (13.1). Igualando os termos de segunda ordem em (x − xΓ)e (y − yΓ), obtém-se

A

(∂2ψ

∂x2

+ 2B(∂2ψ

∂x∂y

+ C

(∂2ψ

∂y2

= − F |Γ . (13.17)

Derivando as funções(∂ψ∂x

)Γe(∂ψ∂y

)Γem ordem ao parâmetro s, juntamente com a equa-

ção (13.17), obtém-se o sistema linear de equações

A

(∂2ψ

∂x2

+ 2B(∂2ψ

∂x∂y

+ C

(∂2ψ

∂y2

= − F |Γ(∂2ψ

∂x2

dx

ds+(∂2ψ

∂x∂y

dy

ds= d

ds

(∂ψ

∂x

)Γ(

∂2ψ

∂x∂y

dx

ds+(∂2ψ

∂y2

dy

ds= d

ds

(∂ψ

∂y

)Γ.

(13.18)

Para que se possam determinar os valores das segundas derivadas ao longo da curva Γ, temde se ter a condição∣∣∣∣∣∣∣

A 2B Cdxds

dyds 0

0 dxds

dyds

∣∣∣∣∣∣∣ = A

(dy

ds

)2

− 2Bdxds

dy

ds+ C

(dx

ds

)2

= 0 . (13.19)

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EQUAÇÕES ÀS DERIVADAS PARCIAIS DE SEGUNDA ORDEM 211

Como, por hipótese, o determinante (13.19) é necessariamente diferente de zero, pode-seresolver o sistema (13.18) em ordem às segundas derivadas e determinar a segunda ordemda solução ψ(x,y) como em (13.16).

Veja-se, então, quais as restrições que se devem impôr à curva Γ para que o determi-nante em (13.19) seja diferente de zero. Impondo que o determinante em (13.19) sejanulo, obtém-se a equação

A

(dy

ds

)2

− 2B(dx

ds

)(dy

ds

)+ C

(dx

ds

)2

= 0. (13.20)

Resolvendo (13.20) em ordem a dyds , vem que

dy

ds= dx

ds

1A

(B ±

√B2 −AC

).

Assim,dy

dx= 1A

(B ±

√B2 −AC

)(13.21)

e, por (13.7) e (13.12), as curvas definidas pela equação (13.21) são as curvas caraterísticas daequação às derivadas parciais (13.1). Conclui-se então que, para que o determinante em(13.19) seja diferente de zero, a curva Γ não pode coincidir com as curvas caraterísticas daequação às derivadas parciais (13.1).

Com este método e prosseguindo para a determinação das derivadas de ordem superiorde ψ(x,y), é possível determinar as terceiras derivadas ao longo da curva Γ, obtendo-seuma condição semelhante a (13.19). Desta forma, é possível construir uma solução (lo-calmente) analítica da equação às derivadas parciais, numa vizinhança aberta de ψ(Γ).Tem-se, então:

Teorema 13.2 (teorema de Cauchy-Kovalevskaya)Para que o problema de Cauchy da equação às derivadas parciais (13.1) possa ter uma solução analíticadefinida na vizinhança de uma curva Γ, a curva Γ tem de ser transversal (condição (13.19)) às curvascaraterísticas definidas por (13.21).

O teorema de Cauchy-Kovalevskaya é apenas local nas variáveis independentes, ficandopor estabelecer o raio de convergência da solução (13.16).

13.3 O EFEITO DOPPLER

Veja-se como determinar as famílias de curvas caraterísticas da equação das ondas e qualo seu significado físico. Ora, a equação das ondas é

c2 ∂2ψ

∂x2 − ∂2ψ

∂t2= 0

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212 O EFEITO DOPPLER

e, por comparação com (13.1), vem que A = c2, B = 0 e C = −1. Então, B2 − AC =c2 > 0, e a equação das ondas é uma equação às derivadas parciais do tipo hiperbólicocom duas famílias de curvas caraterísticas. As curvas caraterísticas são determinadas por(13.21), ou seja

dt

dx= 1

c

dt

dx= −1

c,

cujas soluções são ξ := ct− x = ct0 − x0

η := ct+ x = ct0 + x0 .(13.22)

As curvas (13.22) são as curvas caraterísticas da equação das ondas.

Veja-se o significado geométrico das curvas caraterísticas. Sejam dois pontos do domínio daequação das ondas com coordenadas espaciais x1

0 e x20, ambos com coordenada temporal

t = 0 (figura 13.3). Faça-se o gráfico das curvas caraterísticas da equação das ondas noseu domínio de coordenadas (x,t). Como por cada ponto do domínio passam duas curvascaraterísticas, uma da família ξ e outra da família η, as curvas caraterísticas (13.22) definemo domínio de influência ou cone de causalidade das soluções da equação das ondas. Assim,por exemplo, a solução da equação das ondas no ponto (x∗, t∗) (figura 13.3) é determinadapela solução nos pontos (x01,t = 0) e (x02,t = 0). Esta propriedade é consequência dofacto de as soluções das equações hiperbólicas lineares terem a forma ψ(x,t) = ψ1(ξ) +ψ2(η).

x

t

(x *, t*)

x01 x02

ξ1 ξ2η1 η2

Figura 13.3 Famílias de curvas caraterísticas ξ e η da equação das ondas. As famílias de curvascaraterísticas determinam as relações causais da solução da equação das ondas. Por exemplo, a solução naequação das ondas no ponto (x∗,t∗) é determinada pelos valores da solução nos pontos (x01,t = 0) e

(x02,t = 0).

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EQUAÇÕES ÀS DERIVADAS PARCIAIS DE SEGUNDA ORDEM 213

Considere-se uma corda semi-infinita e homogénea que no instante t = 0 está em repouso,ϕ(x,t = 0) = 0 para todo o x ≥ 0. Assuma-se a condição fronteira ϕ(x = 0,t) = A sin(ωt),para t ≥ 0. Como se viu no capítulo 11, para esta condição fronteira, a solução da equaçãodas ondas é ϕ(x,t) = A sin(ωt− kx), para x ≤ ct. Tem-se pois uma onda que se propagacom velocidade de fase vf = c = ω/k. Esta onda tem frequência f = ω/(2π) Hz, medidano referencial em que a fronteira x = 0 está fixa — referencial próprio da corda.

Considere-se um observador que se desloca com velocidade v, relativamente ao referencialpróprio da corda. As coordenadas da corda no referencial do observador são (x′,t′). Assim,tem-se que

x′ = x− vt

t′ = t .(13.23)

No referencial do observador, a solução da equação das ondas é

ϕ(x′,t′) = A sin (ωt(x′,t′) − kx(x′,t′)) = A sin(ω(1 − v

c)t′ − kx′

),

com x′ ≤ (c− v)t′. Assim, a frequência da onda no referencial do observador é

f ′ = ω

2π(1 − v

c) = f(1 − v

c), (13.24)

desde que v < c. A dependência da frequência da onda na velocidade do observadorrelativamente à fonte designa-se por efeito de Doppler. Neste caso, k′ = k. Se v = c, oobservador propaga-se com a velocidade da onda. Se v > c, tem-se que

ϕ(x′,t′) = A sin(ω(1 − v

c)t′ − kx′

)= −A sin

(ω(vc

− 1)t′ + kx′),

e o observador vê a onda a afastar-se com frequência ω2π ( vc − 1) e a fase invertida.

No caso relativista, por (7.61) e (7.62), conclui-se facilmente que

f ′ = ω

2πγ(1 − β) e k′ = k

γ(1 − β), (13.25)

em que β = vc e γ =

√1 − β2.

Analise-se a forma da equação das ondas no referencial móvel do observador. Por (13.23),conclui-se facilmente que a equação das ondas se transforma na equação

(c2 − v2) ∂2ψ

∂x′2 + 2v ∂2ψ

∂x′∂t′− ∂2ψ

∂t′2= 0 . (13.26)

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214 O EFEITO DOPPLER

Ora, por comparação de (13.26) com (13.1), tem-se que A = c2 − v2, B = v e C = −1.Assim,B2−AC = c2 > 0 e a equação (13.26) tem a forma hiperbólica, independentementede v. As equações das curvas caraterísticas de (13.26) são

dt′

dx′ = 1c− v

dt′

dx′ = − 1c+ v

,

cujas soluções são (ξ =) (c− v)t′ − x′ = (c− v)t′0 − x′

0(η =) (c+ v)t′ + x′ = (c+ v)t′0 + x′

0 .(13.27)

As curvas (13.27) são as curvas caraterísticas da equação das ondas (13.26). Na figura 13.4estão representadas as curvas caraterísticas (13.27), para v < c, v = c e v > c. Estas curvasdão informação sobre as relações de causalidade das soluções da equação das ondas.

x'

t'(x' *, t'*)

ξ η

v<c

x'

t'(x' *, t'*)

ηξ

v=c

x'

t'(x' *, t'*)

ξ η

v>c

Figura 13.4 Famílias de curvas caraterísticas ξ e η, ou cone de causalidade das soluções da equação dasondas (13.26), para v < c, v = c e v > c.

EXERCÍCIOS

13.1 Reduza à forma canónica a equação às derivadas parciais

∂2u

∂x2 + ∂2u

∂x∂y+ ∂2u

∂y2 − ∂u

∂x= 0.

13.2 Um fluido move-se com velocidade v no interior de um canal e tem no seu interior umobstáculo fixo. Seja ϕ(x,y) o potencial do campo de velocidades, isto é, v = gradϕ.A equação para o campo de velocidades do fluido é

∂2ϕ

∂x2 + (1 −M2)∂2ϕ

∂y2 = 0,

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EQUAÇÕES ÀS DERIVADAS PARCIAIS DE SEGUNDA ORDEM 215

em queM = v/c, c =√k/ρ, k é a constante de compressibilidade, ρ a densidade do

fluido e c tem as dimensões de uma velocidade. Discuta o tipo de soluções da equaçãopara o campo de velocidades do fluido, para os casos em queM < 1,M = 1 eM > 1.

13.3 Reduza à forma canónica a equação às derivadas parciais

12∂2ϕ

∂x2 + (1 + ε) ∂2ϕ

∂x∂t+ 1

2∂2ϕ

∂t2= 0,

em que ε > 0. Determine a sua solução geral nas variáveis x e t.

13.4 Um campo evolui no tempo de acordo com a equação às derivadas parciais

12∂2ϕ

∂x2 + 2 ∂2ϕ

∂x∂t+ 1

2∂2ϕ

∂t2= 0.

Determine a evolução temporal da perturbação ϕ(x,t = 0) = e−x2 , com

∂ϕ

∂t(x,t = 0) = 0.

Faça um gráfico da evolução temporal da solução encontrada.

13.5 A equação às derivadas parciais semilinear de Black-Scholes é

∂ϕ

∂t− x2 ∂

∂x2 − x∂ϕ

∂x+ ϕ = 0,

em que x > 0. Para reduzir esta equação a uma forma mais simples comece por fazera transformação de variáveis definida pela relação x = ey. Em seguida, introduza anova variável dependente ψ(y,t) = etϕ(y,t). Encontre a equação às derivadas par-ciais para ψ(y,t) e relacione a solução ϕ da equação de Black-Scholes com a soluçãoda equação para ψ.

13.6 Seja a equação às derivadas parciais

y2ϕxx − 2yϕxy + ϕyy = ϕx + 6y,

em que x,y ∈ R.

a) Classifique a equação às derivadas parciais.

b) Reduza a equação à forma canónica, tendo em conta que a transformação devariáveis, assim como a sua inversa, são funções polinomiais.

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216 O EFEITO DOPPLER

13.7 Reduza à forma canónica a equação às derivadas parciais

uxx + 5uxt + 6utt = t− 2x

e determine a sua solução geral.

13.8 Deduza as fórmulas (13.25) do efeito Doppler relativista.

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14FONÕES E SOLITÕES

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FONÕES E SOLITÕES 219

Analisa-se a propagação de uma perturbação longitudinal numa rede unidimensional com interaçõeslineares entre átomos vizinhos. Chega-se ao conceito de fonão. Ao introduzir interações não linearesentre átomos vizinhos, deriva-se a equação de Korteweg-de Vries (KdV) e chega-se ao conceito desolitão. Discutem-se alguns aspetos fenomenológicos associados ao conceito de solitão.

14.1 ONDAS SOLITÁRIAS

As ondas solitárias ou solitões foram observadas pela primeira vez por Scott-Russel, em1834, quando se passeava a cavalo numa região sulcada por canais de água. Scott-Russelseguiu uma onda num canal pouco profundo, ao longo de 4 km. Esta onda propagou-sesem atenuação, mantendo a velocidade constante de 18 km por hora. Em 1895, Kortewege de Vries descobriram uma equação às derivadas parciais não linear, com uma solução dotipo onda progressiva, propagando-se sem atenuação num meio dispersivo.

Os tsunamis são solitões que se propagam milhares de quilómetros, sem atenuação. Porexemplo, no oceano Pacífico, um solitão formado na costa sul do Alasca demora 12h atéchegar à costa norte da Austrália.

No que se segue, deduz-se a equação de Kortweg-de Vries para o estudo da propagaçãode perturbações numa rede com interações não lineares. De um modo geral, a equação deKortweg-de Vries é uma equação de campo não linear e aparece em múltiplos contextos.

14.2 ONDAS LINEARES EM REDES: FONÕES

Considere-se uma rede unidimensional infinita constituída por átomos ou moléculas idên-ticas e equidistantes (figura 14.1). Devido à interação com os vizinhos mais próximos, cadapartícula da rede é atuada por uma força elástica. Este sistema tem uma posição de equi-líbrio, em que as partículas estão espaçadas uniformemente e têm velocidade nula. Doponto de vista termodinâmico, a configuração de equilíbrio corresponde à temperaturaT = 0 K e a distância entre as posições de equilíbrio das partículas é h.

Escolhendo como origem do referencial de observação uma posição de equilíbrio de umadas partículas da rede, a posição da partícula número j, no instante t, é

xj(t) = jh+ yj(t), (14.1)

em que j é um número inteiro (j ∈ Z) e yj(t) é o deslocamento da partícula j em relaçãoà sua posição de equilíbrio jh (figura 14.1).

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220 ONDAS LINEARES EM REDES: FONÕES

0 1 2

... ...

h

Figura 14.1 Modelo para uma rede unidimensional de átomos ou moléculas, com forças de interaçãoelásticas. No equilíbrio, a partícula número j está na posição x = jh, com j ∈ Z.

Para descrever a interação entre átomos vizinhos, assume-se a força elástica

F = −δ(∆ + ε∆2 + · · · ),

em que ∆ é a diferença entre a distância entre duas partículas adjacentes e a sua distânciade equilíbrio, e δ e ε são constantes. Por (14.1) e até à segunda ordem em ∆, a força totalque atua o átomo ou molécula número j é

Fj = −δ(xj − xj−1 − h) − δε(xj − xj−1 − h)2

+δ(xj+1 − xj − h) + δε(xj+1 − xj − h)2

= −δ(yj − yj−1) + δ(yj+1 − yj) − δε(yj − yj−1)2 + δε(yj+1 − yj)2,

(14.2)

em que δ é uma constante positiva e ε pode ser uma constante positiva ou negativa (fi-gura 14.2). No equilíbrio, as forças de interação são nulas.

jh

y j

Figura 14.2 Deslocamento yj do átomo número j, em relação à posição de equilíbrio x = jh.

Por (14.2) e (14.1), a equação de Newton que descreve o movimento do átomo ou moléculanúmero j é

myj = δ((yj+1 − yj) + ε(yj+1 − yj)2)− δ

((yj − yj−1) + ε(yj − yj−1)2) , (14.3)

em que j ∈ Z e m é a massa de cada partícula da rede. Como as forças intermolecularessão conservativas, F = −dV

dx = −V ′, a equação (14.3) escreve-se na forma

myj = −V ′(yj − yj−1) + V ′(yj+1 − yj). (14.4)

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FONÕES E SOLITÕES 221

Calcule-se a energia deste sistema de partículas. Multiplicando a equação (14.4) por yj esomando sobre todos os átomos da rede, obtém-se

12m∑j∈Z

d

dty2j =

∑j∈Z

yj (V ′(yj+1 − yj) − V ′(yj − yj−1)) . (14.5)

Mas como

d

dt

∑j∈Z

V (yj+1 − yj) =∑j∈Z

(yj+1 − yj)V ′(yj+1 − yj)

= −∑j∈Z

yj (V ′(yj+1 − yj) − V ′(yj − yj−1)) ,

a equação (14.5), escreve-se na forma

d

dt

12m∑j∈Z

y2j +

∑j∈Z

V (yj+1 − yj)

= 0. (14.6)

Assim, por (14.6), a energia total do sistema de partículas é

H = 12m∑j∈Z

y2j +

∑j∈Z

V (yj+1 − yj)

= 12m∑j∈Z

y2j + 1

2δ∑j∈Z

(yj+1 − yj)2 + 13δε∑j∈Z

(yj+1 − yj)3,(14.7)

pois, por (14.3), V (x) = δx2/2 + δεx3/3 e a energia total é conservada.

Como o número total de partículas da rede é infinito, para que a energia total seja finita,o número total de partículas deslocadas relativamente à sua posição de equilíbrio e comvelocidades não nulas terá de ser finito. Por outro lado, como o sistema de equações (14.3)é infinito e não linear, não é fácil determinar a sua solução geral. Então, no que se seguevai-se encontrar uma solução particular de (14.3), para ε = 0.

Assuma-se que, num certo instante t = 0, os átomos da rede estão deslocados relativamenteà sua posição de equilíbrio, mas que ao longo da rede existe periodicidade espacial de com-primento ℓ. Isto é, os deslocamentos e as velocidades iniciais repetem-se com periodicidadeℓ. Assim, yj(t = 0) = y(x,t = 0) ∈ L2([0,ℓ]), em que y(hj,t = 0) é o deslocamento dapartícula j relativamente à sua posição de equilíbrio, no instante t = 0. Nestas condições,pode-se assumir que a posição da partícula j, no instante t, é

y(x,t) =∑n∈Z

cn(t)ei2πnx/ℓ =∑n∈Z

cn(t)eiknx (14.8)

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222 ONDAS LINEARES EM REDES: FONÕES

em que kn = 2πn/ℓ.

Substituindo (14.8) em (14.3) com ε = 0 e como x = jh, obtém-se

cn = δ

m

(eiknh + e−iknh − 2

)cn = 2 δ

m(cos knh− 1) cn

= −4 δm

sin2(knh/2)cn = −ω2ncn,

(14.9)

para todo o n ∈ Z e em que ωn = 2√δ/m| sin(knh/2)|. Como (14.9) é a equação do

movimento de um oscilador harmónico, a solução (14.8) é, então,

y(x,t) =∑n∈Z

(Aneiωnt +Bne−iωnt)eiknx,

em que An e Bn são constantes complexas. Como a solução yj(x,t) é real, ter-se-á de terA−n = A∗

n, B−n = B∗n e depois de um rearranjo das constantes, a solução y(x,t) é

y(x,t) = a0

2+

∑n≥1

(an cos knx+ bn sin knx) cosωnt

+∑n≥1

(dn cos knx+ en sin knx) sinωnt,(14.10)

em que x = jh,

an = 2ℓ

∫ ℓ

0f(x) cos 2πnx

ℓdx, bn = 2

∫ ℓ

0f(x) sin 2πnx

ℓdx,

dn = 2ωnℓ

∫ ℓ

0g(x) cos 2πnx

ℓdx, en = 2

ωnℓ

∫ ℓ

0g(x) sin 2πnx

ℓdx,

(14.11)

kn = 2πn/ℓ e ωn = 2√δ/m| sin(knh/2)|. As funções f(x) e g(x) são periódicas de pe-

ríodo ℓ e descrevem, respetivamente, no instante t = 0, o afastamento dos átomos da rederelativamente às respetivas posições de equilíbrio e às suas velocidades. A solução (14.10)só é válida na ausência de colisões entre átomos vizinhos. Uma condição suficiente devalidade da solução (14.10) é que |f(x)| < h/2 e g(x) = 0, para todo o x ∈ [0,ℓ].

Calcule-se a energia para uma partícula genérica. Por (14.7) e (14.10), a energia da partí-cula j da rede é

Hj = 12my2

j + 12δ(yj+1 − yj)2

= 12m||yj ||2 + 1

2δ||yj+1 − yj ||2

= 18∑n≥1

mω2n(d2

n + e2n) + (4mω4

n + δ sin2 hkn)(a2n + b2

n) :=∑n≥0

En.

(14.12)

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FONÕES E SOLITÕES 223

Como a energia por partícula Hj é independente de j, o sistema infinito de osciladoresacoplados pode ser transformado noutro sistema infinito de osciladores desacoplados deenergias En < ∞. Os osciladores desacoplados são uma caraterística da rede e são de-signados por fonões, quase-partículas ou modos próprios de vibração da rede. Cada fonão ou modopróprio de vibração da rede unidimensional tem frequência própria ωn. Na figura 14.3estão representados dois modos próprios de vibração da rede ou dois fonões, um de baixafrequência e outro de alta frequência. Como a energia é conservada ao longo do tempo, aenergia está contida nos fonões, não havendo trocas de energia entre fonões.

Figura 14.3 Fonões de baixa e de alta frequência. Estão representadas as posições de equilíbrio dos átomosda rede (“+”) e os deslocamentos correspondentes a dois modos próprios, um de baixa frequência e outro dealta frequência. Em ambos os casos, as redes têm apenas um único fonão. A rede tem comprimento ℓ = 10h,

em que h é a distância entre as posições de equilíbrio das partículas.

Faça-se outra abordagem a este problema. Considere-se que a distância h entre as posiçõesde equilíbrio dos átomos é muito pequena quando comparada com as dimensões macros-cópicas. Assim, pode-se aproximar yj por uma função analítica y(x). O valor da funçãoy(x) é o deslocamento ou compressão local do átomo no ponto x da rede. Aproximandoyj+1 e yj−1 por y(x+ h) e y(x− h), respectivamente, com

y(x+ h) = y(x) + ∂y

∂xh+ 1

2!∂2y

∂x2h2 + 1

3!∂3y

∂x3h3 + 1

4!∂4y

∂x4h4 + . . .

y(x− h) = y(x) − ∂y

∂xh+ 1

2!∂2y

∂x2h2 − 1

3!∂3y

∂x3h3 + 1

4!∂4y

∂x4h4 − . . . ,

vem que

yj+1 − yj = h∂y

∂x+ h2

2!∂2y

∂x2 + h3

3!∂3y

∂x3 + h4

4!∂4y

∂x4 + . . .

yj−1 − yj = −h ∂y

∂x+ h2

2∂2y

∂x2 − h3

3!∂3y

∂x3 + h4

4!∂4y

∂x4 + . . . .

(14.13)

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224 ONDAS NÃO LINEARES EM REDES: SOLITÕES

Substituindo (14.13) na equação diferencial (14.3) e retendo apenas os termos de primeiraordem em ε, obtém-se a equação às derivadas parciais

∂2y

∂t2= 2δ

m

(h2

2!∂2y

∂x2 + h4

4!∂4y

∂x4 + · · ·)

+ 2δεh3

m

(∂y

∂x

)∂2y

∂x2 + · · ·

= 2δm

(cosh

(h∂

∂x

)− 1)y + 2δεh3

m

(∂y

∂x

)∂2y

∂x2 + · · ·

= h2 δ

m

∂2y

∂x2 + · · · + 2δεh3

m

(∂y

∂x

)∂2y

∂x2 + · · · .

(14.14)

Se ε = 0, a equação (14.14) não é linear. No caso em que a interação entre vizinhos élinear, ε = 0, e retendo apenas os termos em h2, obtém-se a equação linear das ondas

∂2y

∂t2= h2 δ

m

∂2y

∂x2 . (14.15)

A equação linear das ondas (14.15) descreve as oscilações longitudinais de pequena ampli-tude das partículas na rede unidimensional.

14.3 ONDAS NÃO LINEARES EM REDES: SOLITÕES

Analise-se a dinâmica da rede unidimensional infinita com a contribuição do termo nãolinear da força harmónica, ε = 0. Por (14.14) e (14.15), em primeira ordem em ε, a equaçãoàs derivadas parciais não linear que descreve as oscilações longitudinais da rede é

∂2y

∂t2= h2 δ

m

∂2y

∂x2 + 2δεh3

m

(∂y

∂x

)∂2y

∂x2 . (14.16)

O problema que se põe é o de encontrar soluções que se propaguem ao longo da rede, comuma dependência em x e t da forma ξ = x− ct, em que c é uma constante a determinar.

Para analisar o sistema não linear (14.16), começa-se por fazer a substituição de variáveis,ξ = x− ct, τ = ch2t/24, com c2 = δh2/m. Nas novas variáveis, tem-se que

∂2y

∂t2= δh2

m

∂2y

∂ξ2 − δh4

12m∂2y

∂ξ∂τ+ δh6

242m

∂2y

∂τ2

∂y

∂x= ∂y

∂ξ

∂2y

∂x2 = ∂2y

∂ξ2 .

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FONÕES E SOLITÕES 225

Substituindo estes operadores diferenciais em (14.16) e (14.14) e retendo apenas os termosde ordens h3 e h4, obtém-se a equação

∂2y

∂τ∂ξ+ 24ε

h

∂y

∂ξ

∂2y

∂ξ2 + ∂4y

∂ξ4 = 0 . (14.17)

Fazendo, ψ = ∂y∂ξ , a equação (14.17) escreve-se na forma

∂ψ

∂τ+ βψ

∂ψ

∂ξ+ ∂3ψ

∂ξ3 = 0, (14.18)

em que β = 24ε/h. A equação assim obtida é a equação de Korteweg-de Vries (KdV).

Para encontrar uma solução da equação de KdV, supõe-se que existe uma solução do tipoonda progressiva que se desloca com velocidade v no sentido positivo do eixo dos xx. Istoé, assume-se que a solução de (14.18) se escreve na forma

ψ(ξ, τ) = f(ξ − vτ) = f(η),

em que η = ξ − vτ e v é uma constante a determinar. Então, vem que

∂ψ

∂τ= −v df

dη,∂ψ

∂ξ= df

e a equação de KdV (14.18) reduz-se à equação diferencial ordinária

d3f

dη3 − vdf

dη+ βf

df

dη= 0.

Comd3f

dη3 = (−βf + v) dfdη

e integrado em η, obtém-sed2f

dη2 = k1 + vf − β

2f2, (14.19)

em que k1 é uma constante de integração. Multiplicando a equação anterior por dfdη ,

df

d2f

dη2 = (k1 + vf − β

2f2) df

e integrado em ordem a η, obtém-se

12

(df

)2

= k2 + k1f + v

2f2 − β

6f3 .

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226 ONDAS NÃO LINEARES EM REDES: SOLITÕES

Integrando a equação anterior por quadraturas, obtém-se∫ η

0dη =

∫ f

f0

dg√2k2 + 2k1g + vg2 − β

3 g3.

Impondo as condições de decaimento no infinito, f → 0, dfdη → 0 e d2f

dη2 → 0, quandoη → +∞, vem que k1 = k2 = 0. Então,

η = ξ − vτ =∫ f

f0

dg

g√v − β

3 g.

Como∫

dzz

√a−bz = −2arctanh(

√1 − bz/

√a)/

√a, tem-se que

ψ(ξ,τ) = f(η) = 3vβsech2

[√v

2(ξ − vτ)

]. (14.20)

Assim, (14.20) é uma solução particular da equação de Korteweg-de Vries (14.18). A so-lução (14.20) tem a forma de perturbação fortemente localizada e designa-se por solitão. Avelocidade de propagação do solitão ou velocidade de fase é

vf = −(∂ψ

∂τ

)/

(∂ψ

∂ξ

)= v. (14.21)

v=2

v=4

0 1 2 3 4 5 6 70

2

4

6

8

10

12

η=ξ-vt

Ψ(η)

Figura 14.4 Soluções (14.20) do tipo solitão da equação de KdV, para β = 1 e t = 1. A amplitude dosolitão depende linearmente da velocidade v.

Na figura 14.4 estão representadas soluções ψ(ξ,τ), obtidas em (14.20), em função de η =(ξ − vτ), para β = 1, v = 2 e v = 4.

Da solução do tipo solitão (14.20) conclui-se que:

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FONÕES E SOLITÕES 227

1. 1) A amplitude de um solitão da equação de KdV aumenta linearmente com a velo-cidade de propagação.

2. 2) A largura de um solitão da equação de KdV diminui com a raiz quadrada davelocidade.

Voltando à equação aproximada (14.17), como ψ = ∂y∂ξ , vem que a sua solução é

y(x,t) =∫ x−ct

−∞

3vβsech2

[√v

2(ξ − vτ)

]dξ, (14.22)

em que c2 = δh2/m e τ = ch2t/24, (figura 14.5). Assim, o solitão é uma frente de ondaque se propaga com velocidade de fase

v∗f = −

(∂y

∂t

)/

(∂y

∂x

)= c.

Então, por consistência com (14.21), escolhe-se v = c e a velocidade de fase do solitão évf = h

√δ/m, independentemente de ε.

-10 -5 0 5 10024681012

x

y(x,t=1)

Figura 14.5 Solução (14.22) do tipo solitão da equação diferencial (14.17), para v = 1, β = 1 e t = 1.

Em geral, pode-se concluir que um solitão ou onda solitária é uma perturbação fortementelocalizada, propagando-se sem atenuação e com velocidade constante. São exemplos desolitões as perturbações localizadas como representadas nas Figuras 14.4 e 14.5. Por outrolado, os solitões comportam-se como partículas, isto é, mantêm-se localizados e não perdema coerência quando chocam ou interagem com outros solitões.

De um modo geral, os solitões aparecem como soluções de equações às derivadas parciaishiperbólicas emmeios dispersivos ([Scott et al., 1973]). Conhecem-se diversos sistemas comsolitões, nomeadamente:

— Ondas acústicas em plasmas frios não colisionais.

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228 ONDAS NÃO LINEARES EM REDES: SOLITÕES

— Redes cristalinas com interações não lineares.

— Ondas de grande comprimento de onda em canais pouco profundos.

— Ondas dispersivas em meios elásticos.

— Ondas de pressão em misturas de gás-líquido.

— Transporte de energia em sistemas biológicos.

Para além da equação de Korteweg-deVries, são exemplos de equações às derivadas par-ciais não lineares com soluções do tipo solitão:

∂2ϕ

∂x2 − 1c2∂2ϕ

∂t2− k2 sinϕ = 0 Equação de Sine-Gordon

i∂ϕ

∂t+ ∂2ϕ

∂x2 + k|ϕ|2ϕ = 0 Equação de Schrödinger não linear.

EXERCÍCIOS

14.1 Resolva o problema de Cauchy para a equação

∂2y

∂t2= 2δm

(cosh

(h∂

∂x

)− 1)y,

com condições fronteira de Neumann, no intervalo [0,ℓ]. Comece por mostrar queϕn = cos(nπx/ℓ) é vetor próprio do operador T = 2δ

m

(cosh

(h ∂∂x

)− 1)e encontre

o respetivo valor próprio. Compare a solução obtida com a solução da equação lineardas ondas.

14.2 Estude o espaço das fases da equação diferencial x = αx2 + βx + γ. Relacione assoluções da equação diferencial com as soluções das equações (14.18) e (14.19).

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AO MÉTODO DOS RESÍDUOS

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O MÉTODO DOS RESÍDUOS 231

Relembram-se as definições básicas da teoria das funções analíticas e do método dos resíduos.

Uma função analítica ou holomorfa numa região abertaD do plano complexo C é represen-tada por uma série de Taylor

f(z) =+∞∑n=0

an(z − z0)n,

emque o raio de convergência da série éR = limn→+∞ an/an+1. Se ρ = limn→+∞(an)1/n

é finito, então, R = 1/ρ.

Seja γ uma curva fechada simples (sem interseções) no plano complexo. Se a curva γ temuma representação paramétrica injetiva, γ = x(t) + iy(t), para t0 ≤ t ≤ t1, então∫

γ

f(z)dz =∫ t1

t0

f(γ(t))γ′(t)dt .

O índice de uma curva fechada γ em torno de um ponto ponto z0 ∈ C é o número

I(γ, z0) = 12πi

∫γ

dz

z − z0.

Em geral, tem-se que, I(γ, z0) = n, em que n é um número inteiro. Se γ é uma curvafechada simples, então I(γ, z0) só pode tomar os valores −1,0 ou 1, figura A.1.

z0

I=-1

z0

I=0

z0

I=1

Figura A.1 Índice de uma curva fechada simples em torno de um ponto z0 do plano complexo.

Teorema A.1 (Teorema de Cauchy)Se γ é uma curva fechada simples numa região simplesmente conexa do plano complexo em que f(z) éanalítica, então ∫

γ

f(z)dz = 0 .

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232 O MÉTODO DOS RESÍDUOS

Se uma função complexa f(z) tem um número finito ou uma infinidade numerável desingularidades isoladas, z0,z1, . . ., então em torno de cada singularidade zm, existe umdesenvolvimento de Laurent com um raio de convergência finito. Isto é, em torno de zm,a função f(z) escreve-se na forma

f(z) =+∞∑n=1

bn(z − zm)n

++∞∑n=0

an(z − zm)n,

em que

an = 12πi

∫γ

f(z)(z − zm)n+1 dz

bn = 12πi

∫γ

f(z)(z − zm)n−1dz

e γ é uma curva fechada em torno de zm. O coeficiente b1 do desenvolvimento de Laurentde f designa-se por resíduo de f na singularidade zm. Em geral, não se pode utilizar afórmula de Taylor para a determinação dos an, pois a função f(z) não está bem definidanas singularidades.

Uma singularidade isolada de uma função f é um polo se apenas um número finito deconstantes bn é diferente de zero. Um polo zm é de ordem k se bn = 0 para n > k. Umpolo é simples quando se tem apenas b1 = 0. Se todas as singularidades isoladas de f sãopolos, então f diz-se meromorfa.

Uma singularidade é essencial se existe um número infinito de bk = 0.

O resíduo de uma função f = ϕ1/ϕ2, com um polo simples no ponto x0, pode ser calculadodiretamente pela fórmula Res(f,x0) = ϕ1(x0)/ϕ′

2(x0), desde que ϕ′2(x0) = 0. Se x0 é um

polo de ordem n,

Res(f,x0) = 1(n− 1)!

limx→x0

dn−1

dxn−1 (x− x0)nf(x).

Teorema A.2 (Teorema Integral de Cauchy)Seja γ uma curva fechada simples numa região do plano complexo em que f(z) é meromorfa. Se nãoexistem polos de f(z) sobre γ nem no interior da região delimitada por γ, então, para todo o z0 no interiorde γ, tem-se que

I(γ, z0)f(z0) = 12πi

∫γ

f(z)z − z0

dz .

Teorema A.3 (Teorema dos Resíduos)Seja f(z) uma função meromorfa numa região do plano complexo. Se no interior de uma curva fechada γ

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O MÉTODO DOS RESÍDUOS 233

existem polos zm de f(z) e se não existem polos de f(z) sobre γ, então∫γ

f(z)dz = 2πi∑m

I(γ,zm)Res(f,zm) .

Veja-se como aplicar o teorema dos resíduos ao cálculo de integrais definidos. Seja umafunção f(x) de uma variável real e suponha-se que a sua extensão ao plano complexo éuma função meromorfa.

Teorema A.4Se f(z) não tem polos sobre o eixo real e se |f(z)| ≤ M/|z2|, para |z| > R, então∫ +∞

−∞f(x)dx = 2πi

∑m:Im(zm)>0

Res(f,zm) = −2πi∑

m:Im(zm)<0

Res(f,zm) .

Teorema A.5Se |f(z)| ≤ M/|z2|, para |z| > R, então

v.p.

∫ +∞

−∞f(x)dx = 2πi

∑m:Im(zm)>0

Res(f,zm) + πi∑

m:Im(zm)=0

Res(f,zm)

= −2πi∑

m:Im(zm)<0

Res(f,zm) − πi∑

m:Im(zm)=0

Res(f,zm) .

Teorema A.6Se |f(z)| ≤ M/|z|, para |z| > R, então

v.p.

∫ +∞

−∞eiaxf(x)dx =

2πi∑

m:Im(zm)>0

Res(eiaxf,zm)

+πi∑

m:Im(zm)=0

Res(eiaxf,zm) , se a > 0

−2πi∑

m:Im(zm)<0

Res(eiaxf,zm)

−πi∑

m:Im(zm)=0

Res(eiaxf,zm) , se a < 0.

O teorema A.6 é ainda válido para integrais da forma

v.p.

∫ +∞

−∞cos ax f(x)dx e v.p.

∫ +∞

−∞sin ax f(x)dx.

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234 O MÉTODO DOS RESÍDUOS

Por exemplo, o integral ∫ +∞

−∞e−x2

dx

não pode ser calculado por técnicas de resíduos. Isto deve-se ao facto de |e−z2 | = 1, paraarg z = π/4, não se verificando nenhuma das condições dos teoremas A.3-A.6.

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BGUIA PARA A RESOLUÇÃO DOS EXERCÍCIOS

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GUIA PARA A RESOLUÇÃO DOS EXERCÍCIOS 237

1.1) (X,T2).

1.2) Decorre diretamente da definição de função contínua e da sua tradução em termosde conjuntos abertos e fechados. No entanto, faça-se a demonstração. Seja f : R → R.Quer-se mostrar que f é contínua se, e somente se, a pré-imagem de um conjunto abertoé sempre aberta. Assuma-se a definição tradicional de função contínua:

(∀ε>0)(∃δ>0)(∀x∈X)|x− x0| < δ =⇒ |f(x) − f(x0)| < ε.

Comece-se por assumir que f é contínua em x0 e que A ⊂ R é um conjunto aberto docontradomínio de f , em que f(x0) ∈ A e x0 ∈ f−1(A). Quer-se mostrar que f−1(A) éum conjunto aberto. Como, por hipótese, A é aberto, existe um intervalo aberto I = y :|y − f(x0)| < ε contido em A. Por continuidade, para δ suficientemente pequeno, existeum intervalo J = x ∈ R : |x−x0| < δ tal que f(J) ⊂ I . Como J ⊂ f−1(A) e, portanto,f−1(A) é a união de intervalos abertos, então f−1(A) é necessariamente aberto.

Assuma-se agora que f−1(A) é aberto, sempre que A é aberto. Escolha-se I = y : |y −f(x0)| < ε. Como, por hipótese f−1(A) é aberto e x0 ∈ f−1(A), existe um intervaloJ , centrado em x0 que está contido em f−1(A). Faça-se J = x ∈ R : |x − x0| < δ.Escolhendo δ suficientemente pequeno, tem-se que f(x) ∈ I para x ∈ J , isto é |x−x0| < δ

implica que |y − f(x0)| < ε. Assim, f é contínua em x0.

1.3) Por exemplo, escreva-se o conjunto x : (f + g) > a na forma de interseções deconjuntos envolvendo apenas f e g:

x : (f + g) > a = ∪q∈Q(x : f(x) > q ∩ x : g(x) > a− q).

Nos restantes casos tem-se:

x : f2 > a = x : f(x) >√a ∪ x : f(x) < −

√a, com a ≥ 0

Se a > 0: x : 1/f > a = x : f(x) < 1/a ∩ x : f(x) > 0Se a = 0: x : 1/f > a = x : f(x) > aSe a < 0: x : 1/f > a = x : f(x) < 1/a ∩ x : f(x) < 0.

No caso do produto, use-se a relação fg = ((f + g)2 − (f − g)2)/4.

1.4) Comece-se por enumerar os elementos do conjunto e faça-se uma cobertura com in-tervalos de largura ε/2n.

1.5) Sejam N1 e N2 o número de pontos no interior do círculo e do quadrado, respetiva-mente. Então, π ≈ 4N1/N2.

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238 GUIA PARA A RESOLUÇÃO DOS EXERCÍCIOS

1.6)∫ 1

0 f(x)dx = 1.

1.7) d = log(4)/ log(3) = 1,2618.

1.8) d = log(5)/ log(10) = 0,6989, d = 0 e d = 1/2.

2.1) Use-se a desigualdade |a+ b| ≤ |a| + |b| e as propriedades das séries de potências.

2.2) Basta mostrar que∫ +∞

−∞ |λ1f(x) + λ2g|dx é finito.

2.3) Basta mostrar que∫ +∞

−∞ |λ1f(x) + λ2g|2e−x2dx é finito. Verifique as propriedades do

produto interno.

2.4) α > −1/2 e α > 1/2.

3.1) Na alínea b), faz-se a integração por partes e use-se o resultado da alínea a). Naalínea c), use-se o resultado de b), calcule-se o integral e faça-se a substituição de variávelx = sin(θ).

3.2) ϕ0(x) = 1, ϕ1(x) = x− 1 e ϕ2(x) = (x2 − 4x+ 2)/2.

3.3) Começa-se por determinar os primeiros três elementos de uma base ortonormal deL2([0,1]). Em seguida, mostra-se que

sin(πx) ≃ −0,0504 + 4,1225x− 4,1225x2.

3.4) Encontre-se uma função f ∈ L2([0,2π]), com f = 0, para a qual

< f, sinnx >= 0

e f = sinnx, para todo o n ∈ N.

4.1) Introduza a métrica natural em X e Y . Se f é contínua, tem-se |x − x∗| < δ ⇒|f(x) − f(x∗)| < ε. Seja uma sucessão xn convergente para x∗. Por definição de limite,existe umN tal que, para n > N , |xn −x∗| < δ ⇒ |f(xn) − (x)∗| < ε. Os quantificadoresuniversais garantem a conclusão. A demonstração inversa tem um argumento semelhante.

4.2) SeK = F + iG : R2 → C, o operador T é hermítico se F (x,y) − iG(x,y) = F (y,x) +iG(y,x).

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GUIA PARA A RESOLUÇÃO DOS EXERCÍCIOS 239

4.3) a) Espetro contínuo. Valores próprios: α ∈ R. Vetores próprios:cosh(

√αx), se α ≥ 0, cos(

√|α|x), se α ≤ 0. b) Espetro discreto. Valores próprios:

αn = −π2n2/a2, com n ∈ N. Vetores próprios: sin(nπx/a). c) Espetro discreto. Va-lores próprios: αn = −π2n2/a2, com n ≥ 0. Vetores próprios: cos(nπx/a). d) Espetropontual vazio. O operador é hermítico nos casos b) e c).

4.4) a) A∗mn = Anm. b) Ann = 1/2 e Anm = i/(2π(n − m)), com n,m ∈ Z. O operador

T é hermítico.

4.5) Ann = 2πn, com n ∈ Z. Anm = 0, se n = m.

4.6) Por cálculo direto de < Tϕ, ψ >.

4.7)Comece por expandir os operadoresU1 eU2 em série de Taylor e calcule os operadoresauto-adjuntos respetivos.

4.8) Por cálculo direto da exponencial de uma matriz.

4.9) Por cálculo direto de ||Pf ||2.

4.10) Demonstração análoga à do caso de um operador hermítico.

4.11) Por aplicação do lema 4.5.

5.1) Comece-se por multiplicar e dividir a série de Fourier na forma real por√a2n + b2

n erearranjem-se os termos.

5.2) Prolongue a função sin(x) no intervalo [0,π] como uma função par no intervalo [−π,π].sin(x) = 2/π − (2/π)

∑∞n=2 cosnx(1 + (−1)n)/(n2 − 1).

5.3) a) |x| = π/2 + (2/π)∑∞n=1((−1)n − 1) cos(nx)/n2, para x ∈ [−π,π]. b) x =

−2∑∞n=1(−1)n sin(nx)/n, para x ∈ [−π,π]. c) cos3 x = 3 cosx/4 + cos 3x/4. d) a0 = 2,

an = bn = 0 para n ≥ 1. e) a0 = 2, an = bn = 0 para n ≥ 1.

5.4)∑∞n=1 1/n4 = π4/90,

∑∞n=0(−1)n/(2n+1) = π/4. Calculem-se os desenvolvimentos

de Fourier das funções f(x) = x4 e f(x) = 1, se 0 < x < π, e f(x) = −1, se −π < x < 0.

5.5) Usem-se as relações entre as funções trigonométricas e a exponencial.

5.6) Introduza-se a forma integral dos coeficientes de Fourier em fN e some-se a série depotências. Em particular, DN (0) = 2N + 1.

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240 GUIA PARA A RESOLUÇÃO DOS EXERCÍCIOS

5.7) Resolução análoga ao exercício anterior. Em particular, Φn(0) = n/(2π).

5.8) A(n,m),(m,n) = 1. Nos outros casos, os elementos da matriz são nulos.

5.9) f ∗ g = 2π∑n anbne

int, em que f =∑n ane

int e g =∑n bne

int.

5.10) f =< x,µ >, em que µ = (1,1/2,1/3, . . .). ||f(x)|| ≤ π||x||/√

6, ||f(x)|| =|∑n≥1 xn/n|.

6.1) Majora-se |Ffn(ϕ) − ϕ(0)| e calcula-se o limite n → ∞.

6.2) Aplique-se o resultado do exercício 5.6 e o teorema 3.4.

6.3) Usa-se a distribuição regular gerada a partir de fn(x) =√n/πe−nx2 e faz-se o limite

n → ∞.

6.4) −f ′(a).

6.5) f ′(x) = 2δ(x).

6.6) f ′′(x) = f ′′(x) +∑i hiδ

′(x−xi) +∑j h

′jδ(x−xj), em que hi e h′

j são as alturas dasdescontinuidades de f e de f ′, respetivamente.

6.7) f ′′(x) = −| sin x| + 2∑n∈Z δ(x− nπ), g′′(x) = 2δ(x).

6.8) Comece-se por escrever a equação do movimento na forma x =∑αkδ(t − kT ).

Então, v(nT+) = v0 +∑nk=0 αk/m, em que v(nT+) é a velocidade no instante imediata-

mente a seguir a nT .

7.1) c = 1,5 ms−1.

7.2) y(x) = gx(x− b)/(2c2) +√ℓ2 − b2(1 − x/b).

7.3) ϕ(x) = gx2(x− ℓ)2/(24c2).

7.4) Frequência dos modos próprios ωn =√λ2 − c2π2n2/ℓ2, com n ≥ 1. A solução geral

éϕ(x,t) = e−λt

∑n≥1

(an sin(πn

ℓx) cosh(ωnt) + bn sin(πn

ℓx) sinh(ωnt)

).

7.5) O modo próprio de vibração número n ≥ 0 é

an cos(πnℓx) cos(πnc

ℓt) + bn cos(πn

ℓx) sin(πnc

ℓt).

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GUIA PARA A RESOLUÇÃO DOS EXERCÍCIOS 241

7.6) A frequência de vibração do modo próprio n ≥ 1 é

ωn =

0 , se n é parnπc

ℓ, se n é ímpar

e a correspondente energia cinética é

En =

0 , se n é par

32Tα2

n2π2ℓ2 , se n é ímpar.

7.7) A frequência de vibração do modo próprio n ≥ 1, com n ímpar, é ωn = nπc/ℓ e acorrespondente energia cinética é

En = 8A2ρ

n2π2 sin2(nπδℓ

) ≈ 8A2ρδ2

ℓ2 .

7.8)Os valores próprios são λnm = −n2π2/a2 −m2π2/b2, a que correspondem os vetorespróprios ou modos próprios Fnm = sin(nπx/a) sin(mπy/b), em que n,m ≥ 1.

7.9) Usa-se a solução de d’ Alembert com prolongamento ímpar de f(x). ϕ(1/4,1/20) =−3/16.

7.10) Mostra-se por substituição de variáveis, u = x± ct.

7.11) Semelhante ao que foi feito no texto, particularizando para o potencial gravítico:E = ρ(c2||f ′||22 + ||g||22)/2 + ρg

∫ ℓ0 f(x)dx.

7.12) Por derivação.

7.13) A solução geral é

ψ(x,t) =∞∑n=1

(an cos cπn

ℓt+ bn sin cπn

ℓt)

sin πnℓx

+ 4ℓ2g

c2π3

∞∑n=1

1(2n− 1)3 (1 − cos π(2n− 1)c

ℓt),

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242 GUIA PARA A RESOLUÇÃO DOS EXERCÍCIOS

em que an = 2ℓ

∫ ℓ0 f(x) sin πn

ℓ xdx e bn = (2/(cπn)) 2ℓ

∫ ℓ0 g(x) sin πn

ℓ xdx.

7.14) V (x,y) = 8∑n≥1

1π(2n−1)3 sinh(2n−1)ℓ sin(2n− 1)x. sinh(2n− 1)y.

7.15)Obtém-se a equação de Schrödinger. Osmomentos canónicos calculam-se com pψ =∂L∂ψ

e pψ∗ = ∂L∂ψ∗ . A densidade de energia calcula-se por H = pψψ + pψ∗ ψ∗ − L.

7.16) L = 12ρ(∂ψ∂t

)2− ρc2

√1 +

(∂ψ∂x

)2− V (ψ).

8.1) a) Ff = −i√

2/π a(ξ2−a2) sin( 2πnξ

a ), |Ff |2 = 2a2

π(ξ2−a2)2 sin2( 2πnξa ).

b) Ff =√

2/π sin(aξ)ξ , |Ff |2 = 2 sin2(aξ)

ξ /π.

c) Ff =√

2/π ca (1 − cos(aξ)) 1ξ2 , |Ff |2 = 2c

πa (1 − cos(aξ))2 1ξ4 .

d) Ff = 1√2π

1a−iξ , |Ff |2 = 1

2π1

a2+ξ2 .

e) F sin(ax) = i√π/2(δ(ξ + a) − δ(ξ − a)), F cos(ax) =

√π/2(δ(ξ + a) + δ(ξ − a)).

8.2) Desenvolva a exponencial complexa numa soma de funções trigonométricas.

8.3) Mostra-se por substituição de variáveis.

8.4) FC =√

2πδ(ξ), Fδ(x) = 1/√

2π.

8.5) Use a propriedade da convolução.

8.6) Ff =√

2π∑n cnδ(ξ − 2πn

L ), em que, f =∑n cne

i2πnx/L.

8.7) a) 1√2π

∫ +∞−∞

e−iξx

x dx = i√π/2(−H(ξ) +H(−ξ)).

b) 1√2π

∫ +∞−∞

e−iξx

x2+a2 dx =√π/2 e

−a|ξ|

a .

c) 1√2π

∫ +∞−∞

e−iξxeiax

1+x2 dx =√π/2e−|a−ξ|.

8.8)∫ +∞

−∞sin2 xx2 dx = π/2.

8.9) Calcule diretamente F4f . O operador F tem os valores próprios, λ = 1, − 1,i, − i.Aos valores próprios λ = 1,−1, corresponde o vetor próprio e(−x2/2). Aos valores própriosλ = i,− i, corresponde o vetor próprio e(x2/2).

8.10) δ(n)(x) = ((−1)n/2π)∫∞

−∞ ξneiξxdξ.

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GUIA PARA A RESOLUÇÃO DOS EXERCÍCIOS 243

8.11) f(x) = c+ (δ(x) + δ(2)(x))/2.

8.12)Aplique a transformada de Fourier, na variável espacial, à equação das ondas e resolvaa equação diferencial ordinária.

8.13) G(x,t) = −e−m|x|/m.

9.1) Integre a equação do calor entre 0 e ℓ e aplique as condições fronteira.

9.2) a) T (x,t) = a0/2 +∑n≥1 ane

−kπ2n2t/ℓ2 cos(πnx/ℓ),

an = (2/ℓ)∫ ℓ

0cos(πnx/ℓ)f(x) dx.

b) Teq = (1/ℓ)∫ ℓ

0 f(x) dx .

9.3) T (x,t) = T1 + x(T2 − T1)/ℓ, ϕ = χ(T1 − T2)/ℓ.

9.4) T (x,t) = qt + a0(0)/2 +∑n≥1 an(0)e−kπ2n2t/ℓ2 cosπnx/ℓ e f(x) = a0(0)/2 +∑

n≥1 an(0) cosπnx/ℓ.

9.5) T (x,t) = T0e−9kπ2t/ℓ2 cos 3πx/ℓ+ T1e

−25kπ2t/ℓ2 cos 5πx/ℓ.

9.6) T (x,t) = T0∑∞n=0 cos (πnx/ℓ) cos (πn/2)e−kπ2n2t/ℓ2 .

10.1) a) Lf = (1 + e−sπ)/(1 + s2). b) Lf = (1 − e−s)/(1 − e−2s).

10.2) Por cálculo direto.

10.3) Pela fórmula dos resíduos.

10.4) H(t).

10.5) Lδ(n) = sn.

10.6) a) x(t) = 0, para 0 ≤ t ≤ 1; x(t) = (1 − cos(3 − 3t))/9, para t > 1. b) x(t) = sinh t.

10.7) a) x(t) = 2et/2 − t− 2 e y(t) = et/2 − t− 1.

10.8) x(t) = A(sinωt− ωt cosωt)/(2ω2).

10.9) G(x,t) = 1+iℏ√

m2ℏte

imx2/2ℏt.

10.10) G(x,t) =√

2πδ(x− ct).

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244 GUIA PARA A RESOLUÇÃO DOS EXERCÍCIOS

11.1) A amplitude da onda transmitida é 4Ac2c3/(c1 + c2)(c2 + c3).

11.2) Para ϕ1 = 0, a intensidade relativa da luz refletida é 85,4% e a intensidade relativada luz refratada é 14,6%. Para ϕ1 = 30, a intensidade relativa da luz refletida é 88,8% ea intensidade relativa da luz refractada é 11,2%.

11.3) vf = cω/√ω2 + α e vg = c

√ω2 + α/ω.

11.4) Relação de dispersão k =√

2mω/ℏ e vf =√

ℏω/2m.

11.5) a) Relação de dispersão, c2k4 = −ω2, k = (1 − i)√ω/2c, vf = ω/k = (1 + i)

√ωc/2

e vg = (1 + i)√

2ωc. b) λ =√ω/2c.

12.1) Por cálculo direto.

12.2) k = 3 e k = 6.

12.3) k = 154.

13.1) Forma canónica: 34

(∂2u∂α2 + ∂2u

∂β2

)+ 1

2∂u∂α +

√3

2∂u∂β = 0.

13.2) SeM2 < 1 tem-se uma equação elíptica. SeM2 = 1 tem-se uma equação parabólica,e se SeM2 > 1, tem-se uma equação hiperbólica.

13.3) ϕ(x,t) = ϕ1(t− (1 + ε)x+ x√

2ε+ ε2) + ϕ2(t− (1 + ε)x− x√

2ε+ ε2).

13.4) ϕ(x,t) = (2 +√

3)/(2√

3)f(x− t/(2 +√

3)) − (2 −√

3)/(2√

3)f(x− t/(2 −√

3)).

13.5) ϕ(x,t) = e−tψ(ln x,t).

13.6) ϕηη = 6η.

13.7) u(x,t) = −(t− 3x)(t− 2x)2 + h(t− 3x) + g(t− 2x) + c.

13.8) Por inversão de (7.62) e substituição numa solução progressiva.

14.1) A solução do problema de Cauchy é∑n≥0

(an cosωnt+ bn sinωnt) cos nπxℓ,

em que ωn =√

2δm (1 − cos nhπℓ ).

14.2) Faça o estudo qualitativo das órbitas de fase e relacione com as soluções da equaçãode Korteweg-de Vries.

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[Blanchard e Brüning, 2015] P. Blanchard e E. Brüning, Mathematics methods in physics,Birkhäuser, 2015.

[Esposito, 2017] G. Esposito, From ordinary to partial differential equations, Springer, 2017.

[Evans, 2010] L. C. Evans, Partial differential equations, American Mathematical Society,2010.

[Falconer, 1985] K. J. Falconer, The geometry of fractal sets, Cambridge Uni. Press, 1985.

[Haberman, 1998] R.Haberman, Elementary partial differential equations, PrenticeHall, 1998.

[Hassani, 1999] S. Hassani, Mathematical physics, Springer-Verlag, 1999.

[Higgins, 1977] J. R. Higgins, Completness and basis properties of sets of special functions, Cam-bridge University Press, 1977.

[Kolmogoroff e Fomin, 1977] A. Kolmogoroff e S. Fomin, Éléments de la théorie des fonctionset de l’ analyse fonctionelle, Mir, 1977.

[Körner, 1993] T. W. Körner, Fourier analysis, Cambridge Uni. Press, 1993.

[Kreyszig, 1978] E. Kreyszig, Introductory functional analysis with applications, J. Wiley, 1978.

[Marsden, 1973] J. E. Marsden, Basic complex analysis, Freeman, 1973.

[Olson, 2017] T. Olson, Applied Fourier analysis, from signal processing to medical imaging,Birkhäuser, 2017.

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246 BIBLIOGRAFIA

[Richtmyer, 1978] R. D. Richtmyer, Priciples of advanced mathematical phyics, Springer-Verlag,1978.

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[Schwartz, 1966] L. Schwartz, Mathematics for the physical sciences, Dover, 1966.

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[Shearer e Levy, 2015] M. Shearer e R. Levy, Partial differential equations. An introduction totheory and applications, Princeton University Press, 2015.

[Stein e Shakarchi, 2003] E. M. Stein e R. Shakarchi, Fourier analysis: An introduction, Prin-ceton University Press, 2003.

[Stein e Shakarchi, 2005] E. M. Stein e R. Shakarchi, Real analysis, measure theory, Integra-tion, and Hilbert Spaces, Princeton University Press, 2005.

[Strichartz, 1994] R. Strichartz, A guide to distribution theory and Fourier transforms, CRC Press,Boca Raton, 1994.

[Strichartz, 2000] R. Strichartz, The way of analysis, Jones and Bartlett Puplishers, Boston,2000.

[Szekeres, 2004] P. Szekeres, A course in modern mathematical physics. Groups, Hilbert space anddifferential geometry, Cambridge University Press, 2004.

Os conceitos básicos de análise podem ser revistos em [Strichartz, 2000]. Os livro de[Kolmogoroff e Fomin, 1977], [Stein e Shakarchi, 2005], [Higgins, 1977] e de [Kreyszig,1978] são referências completas sobre os fundamentos da teoria da medida, do integral deLebesgue, da construção dos espaços de Hilbert e da teoria dos operadores. A construçãoda medida exterior de Hausdorff é descrita em [Falconer, 1985]. Os livros de [Hassani,1999], [Szekeres, 2004] e de [Arfken, Weber e Harris, 2013] são dirigidos para a Física etêm os mesmos conteúdos. O livro de [Richtmyer, 1978] continua a ser o grande clássicoda Física Matemática e [Blanchard e Brüning, 2015] é uma referência avançada.

Os fundamentos da teoria das distribuições foram introduzidos em 1951 por L. Schwartz.Duas boas referências são os livros de [Schwartz, 1966] e de [Strichartz, 1994].

Referências completas sobre séries de Fourier são [Körner, 1993] e [Stein e Shakarchi,2003]. As técnicas das transformadas de Fourier e das funções de Green podem ser vistasem mais detalhe em [Haberman, 1998] e [Hassani, 1999].

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BIBLIOGRAFIA 247

A teoria da transformada de Fourier discreta está descrita em detalhe em [Olson, 2017]. Ateoria e as aplicações das transformadas de Laplace estão descritas em [Marsden, 1973].O livro de [Marsden, 1973] é uma boa referência para a técnica dos resíduos.

As equações às derivadas parciais têm uma vasta bibliografia. O tratado mais completo deequações às derivadas parciais é [Evans, 2010]. Bons compromissos são os livros de [Salsa,2015], [Shearer e Levy, 2015] e [Esposito, 2017]. Os livros de [Haberman, 1998] e de[Hassani, 1999] têm quase tudo sobre a equação das ondas e do calor, desde o elementarao avançado. [Strichartz, 1994] tem uma boa discussão sobre soluções fortes e fracas deequações às derivadas parciais.

O artigo de [Scott et al., 1973] é uma introdução aos solitões.

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ÍNDICE REMISSIVO

álgebra-σ, 3–6, 9–11, 16álgebra-σ de Borel, 5ângulo de Brewster, 184

campo escalar, 112comprimento de onda, 185condições de Cauchy, 100conjunto aberto, 3, 4conjunto de Cantor, 12, 14, 18conjunto fechado, 4conjunto mensurável, 4, 5convolução, 132, 133, 169corpo, 23critério de Dalzell), 42, 65critério de Vitali), 42curva de Koch, 20

delta de Dirac, 82densidade de energia, 111densidade lagrangiana, 111desigualdade de Minkovski, 26desigualdade triangular, 26desigualdade de Bessel, 40desigualdade de Cauchy-Schwarz, 26desigualdade isoperimétrica, 76dimensão de Hausdorff, 17, 18dimensão fractal, 18distância, 28

distribuição temperada, 85, 91distribuição, 81, 82

efeito Doppler, 211energia, 110, 111equação das cordas, 97equação de Bessel, 118equação de Helmholtz, 101equação de Poisson, 115equação de Schrödinger, 176, 188equação de Schrödinger não linear, 228equação de Sturm-Liouville, 118equações de Euler-Lagrange, 112equação das ondas, 97equação elíptica, 208equação hiperbólica, 97, 206, 208equação parabólica, 207, 208equação das ondas transversais, 97equação de Korteweg-de Vries, 225equação de Sine-Gordon, 228espaço de Hilbert, 27, 39, 41, 44, 53espaço de medida, 16espaço de Schwartz, 91, 131espaço de Sobolev, 33espaço topológico, 3, 4espaço de probabilidade, 11espaço mensurável, 5espaço pré-hilbertiano, 25

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250 ÍNDICE REMISSIVO

espaço vetorial, 23espetro pontual, 56

fórmula da soma de Poisson, 141fórmula de Euler, 69Fast Fourier Transform, 196fenómeno de Gibbs, 70, 72fonões, 223fronteira de Dirichlet, 156, 158fronteira de Neumann, 162função contínua, 3função de Bessel, 118função de erro, 161função de teste, 81função de Weierstrass-Mandelbrot, 19função indicatriz, 6função mensurável, 7, 8função de Heaviside, 174função de Rademacher, 42função gama, 168função de correlação, 133, 196função de Green, 142, 145, 172–174função simples, 15funcional linear, 81, 82

grupo, 23

igualdade de Bessel, 47igualdade de Parseval, 47, 195integral de Lebesgue, 12, 15integral de Riemann, 16

laplaciano, 98lei de Mersenne, 105lei de Snell, 184

método de Gram-Schmidt, 39, 49medida, 9medida de Lebesgue, 9

modos próprios de vibração, 105Monte Carlo, 12

número de ondas, 185norma, 26

onda estacionária, 105onda progressiva, 103, 105operador, 34, 53operador adjunto, 54operador autoadjunto, 55, 56operador de Sturm-Liouville, 58, 60operador hermítico, 55, 56operador unitário, 55

polinómios de Hermite, 47polinómios de Laguerre, 47polinómios de Legendre, 43, 47polinómios de Tchebichev, 47Prefácio, vproduto interno, 25propagador, 145, 159

reflexão, 182refração, 182relação de incerteza de Heisenber, 139ressonância, 115

série de Fourier, 65, 129solitões, 219solução forte, 102solução clássica, 102solução fraca, 122

teorema da amostragem de Nyquist, 194teorema de Cauchy-Kovalevskaya, 211teorema de d’Alembert, 106teorema de Fejér, 75teorema de Fubini, 16

Page 261: ! < ! K ! L...da integração de Lebesgue e são discutidos o teorema de Lusin, o teorema de Lebesgue da convergência dominada e o teorema de Fubini para integrais múltiplos. Introduz-se

ÍNDICE REMISSIVO 251

teorema de Lebesgue, 15teorema de Lusin, 14teorema de Plancherel, 137, 139teorema de Riesz-Fischer, 29, 32teorema de Weierstrass, 74teorema de Weyl, 76teorema integral de Fourier, 134, 135transformação de Lorentz, 120

transformada de Fourier discreta, 195transformada de Fourier, 130transformada de Laplace, 165tsunamis, 219

variável aleatória, 11velocidade de fase, 185velocidade de grupo, 187