Biopolítica e Biopotência No Coração Do Império

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Biopoltica e Biopotncia no corao do Imprio

Biopoltica e Biopotncia no corao do Imprio

par Peter Pl Pelbart

Mise en ligne le vendredi 10 mai 2002

Version originale de Pouvoir sur la vie, puissance de la vie, Multitudes 9, mai-juin 2002O Imperador da China resolveu, um belo dia, construir uma muralha para se proteger dos nmades, vindos do Norte. A construo mobilizou a populao inteira por anos a fio. Conta Kafka que ela foi empreendida por partes: um bloco aqui, outro ali, outro acol, e no necessariamente eles se encontravam. De modo que entre um e outro pedao de muralha construdo em regies desrticas abriam-se grandes brechas, lacunas quilomtricas[1]. O resultado foi uma muralha descontnua cuja lgica ningum entendia, j que ela no pretegia de nada nem de ningum. Talvez apenas os nmades, na sua circulao errtica pelas fronteiras do Imprio, tinham alguma noo do conjunto da obra. No entanto, todos supunham que a construo obedecesse a um plano rigoroso elaborado pelo Comando Supremo, mas ningum sabia quem dele fazia parte e quais seus verdadeiros desgnios. Enquanto isso, um sapateiro residente em Pequim relatou que j havia nmades acampados na praa central, a cu aberto, diante do Palcio Imperial, e que seu nmero aumentava a cada dia[2]. O prprio imperador apareceu uma vez na janela para espiar a agitao que eles provocavam. O Imprio mobiliza todas suas foras na construo da Muralha contra os nmades, mas eles j esto instalados no corao da capital enquanto o Imperador todo poderoso um prisioneiro em seu prprio palcio.

Kafka d poucas indicaes sobre os nmades. Eles tm bocas escancaradas, dentes afiados, comem carne crua junto a seus cavalos, falam como gralhas, reviram os olhos e afiam constantemente suas facas. No parecem ter a inteno de tomar de assalto o palcio imperial. Eles desconhecem os costumes locais e imprimem capital em que se infiltraram sua esquisitice. Ignoram as leis do Imprio, parecem ter sua prpria lei, que ningum entende. uma lei-esquiza, dizem Deleuze-Guattari[3]. Por que esquiza? Talvez pela semelhana do nmade com o esquizo. O esquizo est presente e ausente simultaneamente, ele est na tua frente e ao mesmo tempo te escapa, sempre est dentro e fora, da conversa, da famlia, da cidade, da economia, da cultura, da linguagem.. Ele ocupa um territrio mas ao mesmo tempo o desmancha, dificilmente ele entra em confronto direto com aquilo que recusa, no aceita a dialtica da oposio, que sabe submetida de antemo ao campo do adversrio, por isso ele desliza, escorrega, recusa o jogo ou subverte-lhe o sentido, corri o prprio campo e assim resiste s injunes dominantes. O nmade, como o esquizo, o desterrritorializado por excelncia, aquele que foge e faz tudo fugir. Ele faz da prpria desterritorializao um territrio subjetivo.

Como pode o Imprio lidar com um territrio subjetivo de tal natureza? Mas como pode ele deixar de lidar precisamente com isso? Por mais que um Imperador tenha Muralhas concretas a construir, Imprio algum pode ficar indiferente a essa dimenso subjetiva sobre a qual ele se assenta primordialmente, sob pena de esfacelar-se - o que ainda mais verdadeiro nas condies de hoje. De fato, como poderia o Imprio atual manter-se caso no capturasse o desejo de milhes de pessoas? Como conseguiria ele mobilizar tanta gente caso no plugasse o sonho das multides sua megamquina planetria? Como se expandiria se no vendesse a todos a promessa de uma segurana, de uma felicidade, o desejo de um modo de vida? Afinal, o que nos vendido o tempo todo, seno isto: maneiras de ver e de sentir, de pensar e de perceber, de morar e de vestir? O fato que consumimos, mais do que bens, formas de vida - e mesmo quando nos referimos apenas aos estratos mais carentes da populao, ainda assim essa tendncia crescente. Atravs dos fluxos de imagem, de informao, de conhecimento e de servios que acessamos constantemente, absorvemos maneiras de viver e sentidos de vida, consumimos toneladas de subjetividade. Chame-se como se quiser isto que nos rodeia, capitalismo cultural, economia imaterial, sociedade de espetculo, era da biopoltica, o fato que vemos instalar-se nas ltimas dcadas um novo modo de relao entre o capital e a subjetividade. O capital, como o disse Jameson, atravs da asceno da mdia e da indstria de propaganda, teria penetrado e colonizado um enclave at ento aparentemente inviolvel, o Inconsciente. Mas esse diagnstico hoje insuficiente. Ele agora no s penetra nas esferas as mais infinitesimais da existncia, mas tambm as mobiliza, ele as pe para trabalhar, ele as explora e amplia, produzindo uma plasticidade subjetiva que ao mesmo tempo lhe escapa por todos os lados, obrigando o prprio controle a nomadizar-se.

O Imprio contemporneo, diferentemente do Imprio chins do conto de Kafka, j no funciona na base de muralhas e trincheiras, e os ltimos acontecimentos demonstraram cabalmente a falncia da lgica da fortaleza. O Imprio se nomadizou completamente. Ou melhor, ele a resposta poltica e jurdica nomadizao generalizada. Ele mesmo depende da circulao de fluxos de toda ordem a alta velocidade, fluxos de capital, de informao, de imagem, de bens, mesmo e sobretudo de pessoas[4]. Claro que nem tudo circula da mesma maneira por toda parte, e nem todos extraem dessa circulao os mesmos benefcios. O novo capitalismo em rede, que enaltece as conexes, a movncia, a fluidez, produz novas formas de explorao e de excluso, novas elites e novas misrias, e sobretudo uma nova angstia - a do desligamento. O que Castel chamou de desfiliao, e Rifkin de desconexo. Ser ameaado de desconexo, de desengate - sabemos que a maioria se encontra nessa condio, de desplugamento efetivo da rede. O problema se agrava quando o direito de acesso s redes, como o diz Rifkin (e agora trata-se no s da rede no sentido estrito, tecnolgico e informtico, mas das redes de vida num sentido amplo) migra do mbito social para o mbito comercial. Em outras palavras: se antes a pertinncia s redes de sentido e de existncia, aos modos de vida e aos territrios subjetivos dependia de critrios intrnsecos tais como tradies, direitos de passagem, relaes de comunidade e trabalho, religio, sexo, cada vez mais esse acesso mediado por pedgios comerciais, impagveis para uma grande maioria. O que se v ento uma expropriao das redes de vida da maioria da populao, atravs de mecanismos cuja inventividade e perverso parecem ilimitadas.

Mas no deveramos deixar-nos embalar por um determinismo to apocalptico quanto complacente. Parafraseando Benjamin, seria preciso escovar esse presente a contrapelo, e examinar as novas possibilidades de reverso vital que se anunciam nesse contexto. Pois nada do que foi evocado acima pode ser imposto unilateralmente de cima para baixo, j que essa subjetividade vampirizada, essas redes de sentido expropriadas, esses territrios de existncia comercializados, essas formas de vida visadas no constituem uma massa inerte e passiva merc do capital, mas um conjunto vivo de estratgias. A partir da, seria preciso perguntar-se de que maneira, no interior dessa megamquina de produo de subjetividade, surgem novas modalidades de se agregar, de trabalhar, de criar sentido, de inventar dispositivos de valorizao e de autovalorizao. Num capitalismo conexionista, que funciona na base de projetos em rede, como se viabilizam outras redes que no as comandadas pelo capital, redes autnomas, que eventualmente cruzam, se descolam, infletem ou rivalizam com as redes dominantes? Que possibilidade restam, nessa conjuno de plugagem global e excluso macia, de produzir territrios existenciais alternativos queles ofertados ou mediados pelo capital? De que recursos dispe uma pessoa ou um coletivo para afirmar um modo prprio de ocupar o espao domstico, de cadenciar o tempo comunitrio, de mobilizar a memria coletiva, de produzir bens e conhecimento e faz-los circular, de transitar por esferas consideradas invisveis, de reinventar a corporeidade, de gerir a vizinhana e a solidariedade, de cuidar da infncia ou da velhice, de lidar com o prazer ou a dor?[5]Mais radicalmente, impe-se a pergunta: que possibilidades restam de criar lao, de tecer um territrio existencial e subjetivo na contramo da serializao e das reterritorializaes propostas a cada minuto pela economia material e imaterial atual? Como reverter o jogo entre a valorizao crescente dos ativos intangveis tais como inteligncia, criatividade, afetividade, e a manipulao crescente e violenta da esfera subjetiva? Como detectar modos de subjetivao emergentes, focos de enunciao coletiva, territrios existenciais, inteligncias grupais que escapam aos parmetros consensuais, s capturas do capital e que no ganharam ainda suficiente visibilidade no repertrio de nossas cidades?

H alguns anos no Brasil eram visveis configuraes comunitrias diversas, ora mais ligadas Igreja, ora ao Movimento dos Sem-Terra, ora s redes de trfico, ou provenientes de movimentos reivindicatrios e estticos diversos, como o hip-hop, ou modalidades de incluso s avessas proporcionado pelas gangues de periferia[6], mantendo com as redes hegemnicas graus de distncia ou enlace diversos. Eu no saberia dizer o que est nascendo hoje nos centros urbanos brasileiros, muito menos nas demais cidades do planeta. Mas h um fenmeno que me intriga, entre outros. No contexto de um capitalismo cultural, que expropria e revende modos de vida, no haveria uma tendncia crescente, por parte dos chamados excludos, em usar a prpria vida, na sua precariedade de subsistncia, como um vetor de autovalorizao? Quando um grupo de presidirios compe e grava sua msica, o que eles mostram e vendem no s sua msica, nem s suas histrias de vida escabrosas, mas seu estilo, sua singularidade, sua percepo, sua revolta, sua causticidade, sua maneira de vestir, de morar na priso, de gesticular, de protestar, de rebelar-se - em suma, sua vida. Seu nico capital sendo sua vida, no seu estado extremo de sobrevida e resistncia, disso que fizeram um vetor de existencializao, essa vida que eles capitalizaram e que assim se autovalorizou e produziu valor. claro que num regime de entropia cultural essa mercadoria interessa, pela sua estranheza, aspereza, visceralidade, ainda que facilmente tambm ela possa ser transformada em mero exotismo tnico de consumo descartvel. Mas a partir desse exemplo extremo e ambguo, eu perguntaria, tambm luz dos nmades de Kafka a quem me referi no incio, se no precisaramos de instrumentos muito esquisitos para avaliar a capacidade dos chamados excludos ou desfiliados ou desconectados de construirem territrios subjetivos a partir das prprias linhas de escape a que so impelidos, ou dos territrios de misria a que foram relegados, ou da incandescncia explosiva em que so capazes de transformar seus fiapos de vida em momentos de desespero coletivo.

Utilizando de maneira originalssima textos de Gabriel Tarde, Maurizio Lazzarato debruou-se recentemente sobre um feixe de questes correlatas[7], das quais reteramos a seguinte: Que capacidade social de produzir o novo est disseminada por toda parte, sem estar essa capacidade subordinada aos ditames do capital, sem ser proveniente dele e nem depender de sua valorizao? A idia de Tarde relida por Lazzarato, e que eu retomo nesse contexto de maneira excessivamente suscinta, que todos produzem constantemente, mesmo aqueles que no esto vinculados ao processo produtivo. Produzir o novo inventar novos desejos e novas crenas, novas associaes e novas formas de cooperao. Todos e qualquer um inventam, na densidade social da cidade, na conversa, nos costumes, no lazer - novos desejos e novas crenas, novas associaes e novas formas de cooperao. A inveno no prerrogativa dos grandes gnios, nem monoplio da indstria ou da cincia, ela a potncia do homem comum. Cada variao, por minscula que seja, ao propagar-se e ser imitada torna-se quantidade social, e assim pode ensejar outras invenes e novas imitaes, novas associaes e novas formas de cooperao. Nessa economia afetiva, a subjetividade no efeito ou superestrutura etrea, mas fora viva, quantidade social, potncia psquica e poltica.

Nesse contexto, as foras vivas presentes por toda parte na rede social deixam de ser apenas reservas passivas merc de um capital insacivel, e passam a ser consideradas elas mesmas um capital, ensejando uma comunialidade de autovalorizao. Ao invs de serem apenas objeto de uma vampirizao por parte do Imprio, so positividade imanente e expansiva que o Imprio se esfora em regular, modular, controlar. A potncia de vida da multido, no seu misto de inteligncia coletiva, afetao recproca, produo de lao, capacidade de inveno de novos desejos e novas crenas, de novas associaes e novas formas de cooperao, cada vez mais a fonte primordial de riqueza do prprio capitalismo. Uma economia imaterial que produz sobretudo informao, imagens, servios, no pode basear-se na fora fsica, no trabalho mecnico, na automatismo burro, na solido compartimentada. So requisitados dos trabalhadores sua inteligncia, sua imaginao, sua criatividade, sua conectividade, sua afetividade - toda uma dimenso subjetiva e extra-econmica antes relegada ao domnio exclusivamente pessoal e privado, no mximo artstico. Como o diz Toni Negri, agora a alma do trabalhador que posta a trabalhar, no mais o corpo, que apenas lhe serve de suporte. Por isso, quando trabalhamos nossa alma se cansa como um corpo, pois no h liberdade suficiente para a alma, assim como no h salrio suficiente para o corpo. Em todo caso, que a alma trabalhe significa, nos termos que mencionvamos h pouco, que a vitalidade cognitiva e afetiva que solicitada e posta a trabalhar. O que se requer de cada um sua fora de inveno, e a fora-inveno dos crebros em rede se torna tendencialmente, na economia atual, a principal fonte do valor. como se as mquinas, os meios de produo tivessem migrado para dentro da cabea dos trabalhadores e virtualmente passassem a pertencer-lhes. Agora sua inteligncia, sua cincia, sua imaginao, isto , sua prpria vida passaram a ser fonte de valor. A associao e cooperao entre uma pluralidade de crebros prescinde, no limite, da mediao do capitalista, to decisiva num regime fordista.

Podemos retomar nosso leitmotiv: todos e qualquer um, e no apenas os trabalhadores inseridos numa relao assalariada, detm a fora-inveno, cada crebro-corpo fonte de valor, cada parte da rede pode tornar-se vetor de valorizao e de autovalorizao. Assim, o que vem tona com cada vez maior clareza a biopotncia do coletivo, a riqueza biopoltica da multido. esse corpo vital coletivo reconfigurado pela economia imaterial das ltimas dcadas que, nos seus poderes de afetar e de ser afetado e de constituir para si uma comunialidade expansiva, desenha as possibilidades de uma democracia biopoltica.

Duas palavrinhas ainda. Uma a respeito do termo biopoltica e outra a respeito do termo multido. Biopoltico foi o termo forjado por Foucault para designar uma das modalidades de exerccio do poder sobre a vida, sobre a populao enquanto massa global afetada por processos de conjunto. Um grupo de tericos, majoritariamente italianos, props uma pequena inverso, no s semntica, mas tambm conceitual e poltica. Com ela, a biopoltica deixa de ser prioritariamente a perspectiva do poder tendo por objeto passivo o corpo da populao e suas condies de reproduo, sua vida. A prpria noo de vida deixa de ser definida apenas a partir dos processos biolgicos que afetam a populao. Vida inclui a sinergia coletiva, a cooperao social e subjetiva no contexto de produo material e imaterial contempornea, o intelecto geral. Vida significa inteligncia, afeto, cooperao, desejo. Como diz Lazzarato, a vida deixa de ser reduzida, assim, a sua definio biolgica para tornar-se cada vez mais uma virtualidade molecular da multido, energia a-orgnica, corpo-sem-rgos. O bios redefinido intensivamente, no interior de um caldo semitico e maqunico, molecular e coletivo, afetivo e econmico, aqum da diviso biolgico/mecnico, individual/coletivo, humano/inumano. Assim, a vida ao mesmo tempo se pulveriza e se hibridiza, se dissemina e se alastra, se moleculariza e se totaliza, se descola de sua acepo biolgica para ganhar uma amplitude inesperada e ser, portanto, redefinida como poder de afetar e ser afetado, na mais pura herana espinosana. Da a inverso, em parte inspirada em Deleuze, do sentido do termo forjado por Foucault: biopoltica no mais como o poder sobre a vida, mas como a potncia da vida. A biopoltica como poder sobre a vida toma a vida como um fato, natural, biolgico, como zo, ou como diz Agamben, como vida nua, como sobrevida. o que vemos operando na manipulao gentica, mas no limite tambm no modo como so tratados os prisioneiros da Al Qaeda em Guantnamo, ou os adolescentes infratores nas instituies de reeducao em So Paulo - e os atos de auto-imolao espetacularizada que esses jovens protagonizam em suas rebelies, diante das tropas de choque e das cmaras de televiso, no seriam a tentativa de reverso a partir desse mnimo que lhes resta, o corpo n?[8]. Em contrapartida, a biopoltica concebida como potncia de variao de formas de vida equivale biopotncia da multido, tal como referida acima.Ainda uma palavra sobre a multido. Tradicionalmente o termo usado de maneira pejorativa, indicando um agregado indomvel que cabe ao governante domar e dominar. J o povo concebido como um corpo pblico animado por uma vontade nica. Com efeito, como o diz Paolo Virno[9], e nas condies contemporneas isso ainda mais visvel, a multido plural, centrfuga, refratria unidade poltica. Ela no assina pactos com o soberano, no delega a ele direitos, inclina-se a formas de democracia no representativa. Talvez ela seja regida por uma lei-esquiza, tal como os nmades de Kafka. Numa frmula sugestiva, Virno ainda diz: a multido deriva do Uno, o povo tende ao Uno. O que esse Uno do qual a multido deriva? Para ir rpido, o que Simondon chamou de realidade pr-individual (e que os pr-socrticos chamavam de a-peiron, Ilimitado), que Tarde referiu como virtualidade, que Marx designou por intelecto geral. Chammo-lo de caldo biopoltico, esse magma material e imaterial, corpo-sem-rgos que precede cada individuao - a potncia ontolgica comum. De qualquer modo, por menos que se saiba que desenho pode ter uma democracia biopoltica, sabemos ao menos que ela est nas antpodas do que Canetti defininiu com sendo a lgica da massa, com sua composio homognea e compacta, com sua direo nica e lderana unitria. A multido, na sua configurao acentrada e acfala, no seu agenciamento esquizo, testemunha de um outro desejo e de uma outra subjetividade.

Eu concluo. Talvez Foucault continue tendo razo: hoje em dia, ao lado das lutas tradicionais contra a dominao (de um povo sobre outro, por exemplo) e contra a explorao (de uma classe sobre outra, por exemplo), a luta contra as formas de assujeitamento, isto , de submisso da subjetividade, que prevalecem. Talvez a explosividade desse momento tenha a ver com a extraordinria superposio dessas trs dimenses. Volta a pergunta insistente: Como pensar as subjetividades em revolta? Como mapear o sequestro social da vitalidade na desmesurada extenso do Imprio e na sua penetrao ilimitada, tendo em vista as modalidades de controle cada vez mais sofisticadas a que ele recorre, sobretudo quando ele se realavanca na base do terrorismo generalizado e da militarizaao do psiquismo mundial? Mas como mapear igualmente as estratgias de reativao vital, de constituio de si, individual e coletiva, de cooperao e autovalorizao das foras sociais margem do circuito formal da produo? Como acompanhar as linhas de xodo e desinvestimento ativo dos excludos, evitando enclausur-los no territrio da excluso, a exemplo daqueles que os privam da dimenso subjetiva e das linhas de escape que eles secretam a cada passo? Em que medida a virtualidade da multido extrapola o sistema produtivo atual com suas vampirizaes, os modelos de subjetivao que ele engendrou (por exemplo, o do trabalhador assalariado), os clculos do poder que ele suscita, a captura imperial e suas linhas de comando? Alm de recusar o sistema de valores e de explorao hegemnicas, como cria ela suas prprias possibilidades irredutveis, mesmo quando isso feito a cu aberto, nem que o Imperador esteja por perto, espreita, espiando para ver no que poderia ele capitalizar aquilo que dele escapa?

No sei o quanto as poucas pginas de Kafka sobre a Muralha da China refletem a parania do Imprio contemporneo, com suas estratgias frustras para proteger-se dos excludos que ele mesmo suscita, cujo contingente no pra de aumentar no corao da capital, numa vizinhana de intimidao crescente e num momento em que, como diria Kafka, sofre-se de enjo martimo mesmo em terra firme. No sei o quanto os nmades de Kafka, na sua indiferena ostensiva em relao ao Imprio, no podem ajudar a pensar a lgica da multido. Seja como for, em Kafka uma ironia fina vai solapando a solene consistncia do Imprio. H algo no funcionamento do Imprio que puro disfuncionamento. Quando nas Conversas com Kafka Janoush diz ao escritor checo que vivemos num mundo destrudo, este responde: No vivemos num mundo destrudo, vivemos num mundo transtornado. Tudo racha e estala como no equipamento de um veleiro destroado. Rachaduras e estalos que Kafka d a ver, e que a situao contempornea escancara. Talvez o desafio atual seja intensificar esses estalos e rachaduras a partir da biopotncia da multido. Afinal o poder, como diz Negri inspirado em Espinosa, superstio, organizao do medo: Ao lado do poder, h sempre a potncia. Ao lado da dominao, h sempre a insubordinao. E trata-se de cavar, de continuar a cavar, a partir do ponto mais baixo: este ponto ... simplesmente l onde as pessoas sofrem, ali onde elas so as mais pobres e as mais exploradas; ali onde as linguagens e os sentidos esto mais separados de qualquer poder de ao e onde, no entanto, ele existe; pois tudo isso a vida e no a morte.[10]

[1] F. Kafka, A grande muralha da China, So Paulo, Europa Amrica, 1976.

[2] F. Kafka, Uma folha antiga (texto complementar ao A grande muralha da China), in Um mdico rural, trad. Modesto Carone, So Paulo, Cia das Letras, 1999.

[3] G. Deleuze e F. Guattari, Kafka - Por uma literatura menor, Rio de Janeiro, Imago, 1977.

[4] Cf. Toni Negri e Michael Hardt, Empire, Paris, Exils Ed. 2000.

[5] F. Guattari, Restaurao da Cidade Subjetiva, in Caosmose, Rio de Janeiro, Ed. 34, 1992.

[6] Glria Digenes, Cartografias da cultura e da violncia. Gangues, galeras e o movimento hip hop, So Paulo-Fortaleza, Secretaria da Cultura e do Desporto, 1998.

[7] M.Lazzarato, Invention et travail dans la coopration entre cerveaux, Essai sur la thorie sociale de la diffrence de Gabriel Tarde, paratre.

[8] Maria Cristina Vicentin, Rebelies da juventude, tese, indito.

[9] Paolo Virno, Multitudes et principe dindividuation, in Multitudes n. 7, Paris, 2001.

[10] T. Negri, Exlio, So Paulo, Iluminuras.

Biopoltica

Origem: Wikipdia, a enciclopdia livre.

Ir para: navegao, pesquisaBiopoltica um neologismo criado por Michel Foucault. O termo pode referir-se a vrios conceitos diferentes, embora compatveis.

ndice

[esconder] 1 Conceitos

2 Definio

3 Referncias

4 Ligaes externas

[editar] Conceitos1. Na obra de Michel Foucault, o estilo de governo que regulamenta a populao atravs do biopoder (a aplicao e impacto do poder poltico sobre todos os aspectos da vida humana).[1]

HYPERLINK "http://pt.wikipedia.org/wiki/Biopol%C3%ADtica" \l "cite_note-1#cite_note-1" \o "" [2]

2. Nas obras de Michael Hardt e Antonio Negri, a insurreio anticapitalista que usa a vida e o corpo como armas; entre os exemplos, esto os refugiados e o terrorismo suicida. Conceitualizado como o oposto do biopoder, o qual visto como a prtica da soberania em condies biopolticas.[3]

3. A aplicao poltica da biotica.[4]

HYPERLINK "http://pt.wikipedia.org/wiki/Biopol%C3%ADtica" \l "cite_note-Rifkin_2002-4#cite_note-Rifkin_2002-4" \o "" [5]

4. Um espectro poltico que reflita posies no rumo da biotecnologia.[4]

HYPERLINK "http://pt.wikipedia.org/wiki/Biopol%C3%ADtica" \l "cite_note-Rifkin_2002-4#cite_note-Rifkin_2002-4" \o "" [5]

5. Advocacia poltica em prol ou em oposio biotecnologia.[4]

HYPERLINK "http://pt.wikipedia.org/wiki/Biopol%C3%ADtica" \l "cite_note-Rifkin_2002-4#cite_note-Rifkin_2002-4" \o "" [5]

6. Polticas pblicas relativas biotecnologia.[4]

HYPERLINK "http://pt.wikipedia.org/wiki/Biopol%C3%ADtica" \l "cite_note-Rifkin_2002-4#cite_note-Rifkin_2002-4" \o "" [5]

[editar] Definio A biopoltica um campo que permite agregar, aproximar, associar setores da realidade relacionados com a vida, a natureza e o conhecimento, cujas mudanas ao longo do tempo foram provocadas pela indstria, pela cincia e pela tecnologia, que hoje disputam o campo poltico-econmico mundial.[6]

Referncias1. Michel Foucault, editado por Jeremy R. Carrette (1999). Religion and culture: Michel Foucault. ISBN 0-415-92362-X.

2. Fazer viver deixar morrer por Susel Oliveira da Rosa in "Dossi Foucault", n. 3, dezembro 2006/maro 2007.

3. Michael Hardt e Antonio Negri. Multitude: War and Democracy in the Age of Empire. Hamish Hamilton, 2005.

4. 4,0 4,1 4,2 4,3 Hughes, James (2004). Citizen Cyborg: Why Democratic Societies Must Respond to the Redesigned Human of the Future. Westview Press. ISBN 0-8133-4198-1.

5. 5,0 5,1 5,2 5,3 Rifkin, Jeremy (31 de janeiro de 2002). Fusion Biopolitics. The Nation. Pgina visitada em 16-03-2008.

6. Cadernos de biopoltica em sermulher.org. Acessado em 11 de abril de 2008.

Biopoltica: o que ? Qual a sua importncia?

Biopoltica um ramo da poltica que trata das novas tecnologias biolgicas e suas repercusses sobre os interesses, desejos e direitos de indivduos, grupos e de toda a humanidade.

Sob este tema renem-se variados aspectos da cincia atual, particularmente da biologia molecular e das tcnicas de interveno e manipulao do material gentico presente no ncleo das clulas.

A biopoltica debrua-se sobre anlises e aes em torno da atual mudana de paradigma na sociedade, onde a informao torna-se a principal ferramenta de controle dos processos da vida (bio). E quando falo de informao, refiro-me a seus variados cdigos e s suas mais variadas formas: biolgica (tomos e molculas que formam o material gentico , nanopartculas que compem a matria viva); informao digital (a estrutura binria, cdigo numrico da linguagem dos computadores); e a comunicao como sistema, como mdia, como tecnologia.

Tudo isto ter (e tm) forte repercusso sobre a populao negra . Esperamos que aqui seja um espao de informao e de debate.

Entre as possveis repercusses das novas tecnologias biolgicas ou genticas, est o fortalecimento do racismo e da eugenia .

E mais, a possibilidade de privatizao e comercializao da vida; o desenvolvimento e comercializao de organismos transgnicos; a biopirataria; o conceito e a legislao de propriedade intelectual e muito mais.

La produccion biopolitica

par Michael Hardt, Toni Negri

Mise en ligne mars 2000

traduction castillane de La production biopolitique, Multitudes 1, mars 2000, Majeure: biopolitique et biopouvoirNosotros hemos podido aprehender[1], desde un punto de vista jurdico, ciertos elementos de la gnesis ideal del Imperio. Pero de permanecer en esta perspectiva sera difcil, sino imposible, comprender cmo la mquina imperial es efectivamente puesta a trabajar. Las teoras y los sistemas jurdicos remiten siempre a otra cosa que a ellas mismas. A travs de la evolucin y el ejercicio del derecho, indican las condiciones materiales que definen su proyecto sobre la realidad social. Nuestro anlisis debe entonces descender al nivel de lo concreto y explorar aqu la transformacin material del paradigma del poder. Nos falta descubrir los modos y las fuerzas de produccin de la realidad social, as como las subjetividades que la animan.

El biopoder en la sociedad de control

En ms de un sentido, los trabajos de Michel Foucault han preparado el terreno para un examen de los mecanismos del poder imperial. Ante todo, en primer lugar estos trabajos nos permiten reconocer un paso histrico y decisivo, en las formas sociales, de la sociedad disciplinaria a la sociedad de control. La sociedad disciplinaria es la sociedad en la cual el dominio social se construye a travs de una red ramificada de dispositivos o de aparatos que producen y registran costumbres, hbitos y prcticas productivas. Poner a esta sociedad a trabajar y asegurar la obediencia a su poder y a sus mecanismos de integracin y/o de exclusin se hace por medio de instituciones disciplinarias - la prisin, la fbrica, el asilo, el hospital, la universidad, el colegio, etc.- que estructuran el terreno social y ofrecen una lgica propia a la razn de la disciplina. El poder disciplinario gobierna, en efecto, estructurando los parmetros y los lmites del pensamiento y de la prctica, sancionando y/o prescribiendo los componentes desviados y/o normales. Foucault se refiere habitualmente al Ancien Rgime y al periodo clsico de la civilizacin francesa para ilustrar la aparicin de la disciplinariedad, pero se podra decir, ms generalmente, que la primera fase de acumulacin capitalista (tanto en Europa como en otros lugares) se hace enteramente bajo este modelo de poder. Por el contrario, la sociedad de control debemos comprenderla como la sociedad que se desarrolla en el extremo fin de la modernidad, y opera sobre lo post-moderno, en donde los mecanismos de dominio se vuelven siempre ms democrticos, siempre ms inmanentes al campo social, difusos en el cerebro y los cuerpos de los ciudadanos. Los comportamientos de integracin y de exclusin social propios al poder son, de este modo, cada vez ms interiorizados en los propios sujetos. El poder se ejerce ahora por mquinas que organizan directamente los cerebros (por sistemas de comunicacin, de redes de informacin, etc.) y los cuerpos (por sistemas de ventajas sociales, de actividades encuadradas, etc.) hacia un estado de alienacin autnoma, partiendo del sentido de la vida y del deseo de creatividad. La sociedad del control podra as ser caracterizada por una intensificacin y una generalizacin de los aparatos normalizantes de la disciplinariedad que animan interiormente nuestras prcticas comunes y cotidianas; pero al contrario de la disciplina, este control se extiende mucho ms all de las estructuras de las instituciones sociales, por la va de redes flexibles, modulables y fluctantes.En segundo lugar, el trabajo de Foucault nos permite reconocer la naturaleza biopoltica de este nuevo paradigma del poder. El biopoder es una forma de poder que rige y reglamenta la vida social por dentro, persiguindola, interpretndola, asimilndola y reformulndola. El poder no puede obtener un dominio efectivo sobre la vida entera de la poblacin ms que convirtindose en una funcin integrante y vital que todo individuo adopta y aviva de manera totalmente voluntaria. Como dice Foucault, la vida se ha convertido ahora [...] en un objeto de poder. La ms alta funcin de este poder es la de investir la vida de parte a parte, y su primera tarea la de administrarla. El biopoder se refiere as a una situacin en la cual lo que est directamente en juego en el poder es la produccin y la reproduccin de la vida misma. Estos dos elementos del trabajo de Foucault se enlazan entre s en el sentido de que slo la sociedad de control est en condiciones de adoptar el contexto biopoltico como su terreno exclusivo de referencia. En el paso de la sociedad disciplinaria a la sociedad de control, un nuevo paradigma de poder se realiza, el cual es definido por las tecnologas, al reconocer a la sociedad como el terreno del biopoder. En la sociedad disciplinaria, los efectos de las tecnologas biopolticas eran an parciales, en el sentido de que la ejecucin de las normas se haca segn una lgica relativamente cerrada, geomtrica y cuantitativa. La disciplinariedad fijaba a los individuos en el marco de las instituciones, pero no consegua consumirlos/consumarlos enteramente al ritmo de las prcticas y de la socializacin productivas; no alcanzaba hasta el punto de penetrar por entero las consciencias y los cuerpos de los individuos, hasta el punto de tratarlos y organizarlos en la totalidad de sus actividades. En la sociedad disciplinaria, as, la relacin entre el poder y el individuo era todava una relacin esttica: la invasin disciplinaria del poder contrapesaba la resistencia del individuo. Por el contrario, cuando el poder se hace totalmente biopoltico, el conjunto del cuerpo social es apresado por la mquina del poder y desarrollado en su virtualidad. Esta relacin es abierta, cualitativa y afectiva. La sociedad, subsumida bajo un poder que desciende hasta centros vitales de la estructura social y de sus procesos de desarrollo, reacciona como un nico cuerpo. El poder se expresa as como un control que invade las profundidades de las consciencias y de los cuerpos de la poblacin - y que se extiende, al mismo tiempo, a travs de la integralidad de las relaciones sociales. En este paso de la sociedad disciplinaria a la sociedad de control, podemos avanzar que la relacin- cada vez ms intensa- de implicacin mutua de todas las fuerzas sociales que el capitalismo ha buscado a travs de su desarrollo, se ha desarrollado ya totalmente. Marx reconoca algo similar en eso que l llamaba el paso de la subsuncin formal a la subsuncin real del trabajo al capital, y ms tarde, los filsofos de la Escuela de Francfort han analizado el paso (muy prximo) de la subsuncin de la cultura (y de las relaciones sociales) bajo la figura totalitaria del Estado, o realmente en la dialctica perversa de las Luces. Sin embargo, el paso al que nosotros nos referimos es fundamentalmente diferente: en lugar de focalizarse sobre el carcter unidimensional del proceso descrito por Marx, despus reformulado y extendido por la Escuela de Francfort, el paso evocado por Foucault trata fundamentalmente de la paradoja de la pluralidad y de la multiplicidad - perspectiva que Deleuze y Guattari desarrollaron an con mayor claridad. El anlisis de la subsuncin real , cuando sta es comprendida como un investimento, no slo de la dimensin econmica o cultural de la sociedad, sino tambin - o ms bien- del propio bios social, y cuando est atenta a las modalidades de la disciplinariedad y/o del control, perturba la imagen lineal y totalitaria del desarrollo capitalista. La sociedad civil es absorvida en el Estado, pero la consecuencia de esto es un estallido de los elementos que anteriormente estaban coordinados y mediatizados en la sociedad civil. Las resistencias no son ya marginales sino activas, en el corazn de una sociedad que se ensancha en red; los puntos individuales son singularizados en mil mesetas. Eso que Foucault construa implcitamente -y que Deleuze y Guattari han explicitado- es, por consecuencia, la paradoja de un poder que, unificando todo y englobando en l mismo todos los elementos de la vida social (y perdiendo al mismo tiempo su capacidad de mediatizar de manera efectiva las diferentes fuerzas sociales), revela en ese mismo instante un nuevo contexto, un nuevo medio de pluralidad y de singularizacin no dominable - un medio del acontecimiento.Estas teoras de la sociedad de control y del biopoder describen ambas los aspectos fundamentales del concepto de Imperio. Este concepto es el marco en el que la nueva universalidad de los sujetos debe ser entendida, y la finalidad hacia la que tiende el nuevo paradigma del poder. Un verdadero abismo se abre aqu entre los viejos marcos tericos de la ley internacional (bajo su forma contractual o bajo la forma de las Naciones Unidas) y la nueva realidad de la ley imperial. Todos los elementos intermediarios del proceso han desaparecido de facto, de modo que la legitimidad del orden internacional no puede ya construirse por mediaciones, sino que debe ms bien ser aprehendida de golpe e inmediatamente en toda su diversidad. Hemos ya reconocido este hecho desde un punto de vista jurdico. En efecto, hemos visto que cuando la nueva nocin del derecho emerge en el contexto de la mundializacin y se presenta como capaz de tratar la totalidad de la esfera planetaria como un conjunto sistmico nico, hay que suponer una cuestin previa inmediata (la accin en un estado de excepcin) y una tecnologa apropiada, flexible y formativa (las tcnicas de polica). Pero si el estado de excepcin y las tcnicas de polica constituyen el ncleo duro y el elemento central del nuevo derecho imperial, no obstante este nuevo rgimen no tiene nada que ver con los artificios jurdicos de la dictadura o del totalitarismo que han sido descritos en otros tiempos y a grandes trompetazos por muchos (demasiados, de hecho) autores. Al contrario, el poder de la ley sigue teniendo un papel central en el contexto de la evolucin contempornea: el derecho permanece en vigor y -precisamente por la va del estado de excepcin y las tcnicas policiales- se convierte en procedimiento. Es una transformacin radical que revela la relacin no mediatizada entre el poder y las subjetividades, y demuestra al mismo tiempo la imposibilidad de mediaciones anteriores y la diversidad temporal no dominable del acontecimiento. Dominar los espacios ilimitados del globo, penetrar las profundidades del mundo biopoltico y afrontar una temporalidad imprevisible, tales son las determinaciones sobre las que el nuevo derecho supranacional debe ser definido. Es ah en donde el concepto de Imperio debe luchar por establecerse, ah en donde debe probar su eficacia - partiendo de ah como la mquina debe ponerse en marcha.Desde este punto de vista, el contexto biopoltico del nuevo paradigma es perfectamente central a nuestro anlisis. Es lo que ofrece al poder una eleccin, no slo entre obediencia y desobediencia, o entre participacin poltica formal o rechazo, sino tambin para todas las alternativas de vida y de muerte, de riqueza y de pobreza, de produccin y de reproduccin social, etc. Dadas las grandes dificultades que la nueva nocin del derecho encuentra para representar esta dimensin del poder del Imperio, y habida cuenta de su incapacidad para tocar el biopoder concretamente en todos sus aspectos materiales, el derecho imperial no puede representar (en la mejor hiptesis) ms que parcialmente el esquema subyacente de la nueva constitucin de un orden mundial, y no sabra realmente concebir el motor que le pone en movimiento. Nuestro anlisis debe as concentrarse preferentemente sobre la dimensin productiva del biopoder.

La produccin de la vida

La cuestin de la produccin, en relacin con el biopoder y la sociedad de control, revela, sin embargo, una cierta flaqueza del trabajo de los autores de los que hemos tomado prestadas estas nociones. As, nos queda clarificar las dimensiones vitales o biopolticas de la obra de Foucault en relacin con la dinmica de produccin. En numerosas obras de mediados de los aos setenta, el filsofo se anticipa hasta tal punto que no sabramos comprender el paso del Estado soberano del Ancien rgime al Estado disciplinario sin tener en cuenta el modo en que el contexto biopoltico ha sido progresivamente puesto al servicio de la acumulacin capitalista: El control de la sociedad sobre los individuos no se efecta solamente a travs de la consciencia o de la ideologa, sino tambin en el cuerpo y con el cuerpo. Para la sociedad capitalista, es la biopoltica lo que ms cuenta: lo biolgico, lo somtico, lo corporal.Uno de los objetivos centrales de su estrategia de investigacin en este periodo era el de ir ms all de las versiones del materialismo histrico - incluidas numerosas variantes de la teora marxista- , que consideraba el problema del poder y de la reproduccin social sobre un plano supraestructural, distinto del plano real y fundamental de la produccin. Foucault trataba as de volver a poner el problema de la reproduccin social y todos los elementos de la superestructura en los lmites de la estructura material fundamental, y de definir este terreno no slo en trminos econmicos, sino tambin en trminos culturales, corporales y subjetivos. De este modo podemos comprender cmo la concepcin que tena Foucault del conjunto social se realiza y se perfecciona cuando, en una fase subsiguiente de su trabajo, descubre las lneas emergentes de la sociedad de control como imagen del poder activo a travs de la biopoltica global de la sociedad. No obstante, no parece que Foucault -a pesar de que hubiera captado poderosamente el horizonte biopoltico de la sociedad y lo hubiera definido como un campo de inmanencia- haya conseguido jams liberar su pensamiento de esta epistemologa estructuralista que guiaba su bsqueda desde el comienzo. Por epistemologa estructuralista entendemos aqu la reinvencin de un anlisis funcionalista en el dominio de las ciencias humanas, mtodo que sacrifica, efectivamente, la dinmica del sistema, la temporalidad creativa de su movimiento y la sustancia ontolgica de la reproduccin cultural y social. De hecho, si llegados a este punto, nosotros hubiramos preguntado a Foucault quin (o qu) dirige el sistema, o ms bien, qu es el bios, su respuesta habra sido inaudible o inexistente. A fin de cuentas, lo que Foucault no consigue aprehender es la dinmica real de la produccin en la sociedad biopoltica.Por el contrario, Deleuze y Guattari nos ofrecen una comprehensin propiamente postestructuralista del biopoder, que renueva el pensamiento materialista y se introduce con solidez en la cuestin de la produccin de ser social. Su trabajo desmitifica el estructuralismo y todas las concepciones filosficas, sociolgicas y polticas que hacen de la fijeza del marco epistemolgico un punto de referencia incontorneable. Ellos concentran su atencin sobre la sustancia ontolgica de la produccin social.Unas mquinas producen: el funcionamiento consta de mquinas sociales, en sus diversos aparatos y ensamblajes, produce el mundo con los sujetos y los objetos que le constituyen. Sin embargo, Deleuze y Guattari no pareden ser capaces de concebir positivamente ms que las tendencias al movimiento continuo y los flujos absolutos. As, tambin en su pensamiento los elementos creativos y la ontologa radical de la produccin de lo social permanecen sin sustancia ni poder. Deleuze y Guattari descubren la productividad de la reproduccin social -produccin innovadora, produccin de valores, relaciones sociales, afectos, devenires, etc.- pero consiguen no articularla ms que superficial y efmeramente, como un horizonte catico indeterminado, marcado por el acontecimiento inasible.Se puede concebir ms fcilmente la relacin entre produccin social y biopoder en la obra de un grupo de marxistas italianos contemporneos: ellos reconocen, en efecto, la dimensin biopoltica en funcin de la nueva naturaleza del trabajo productivo y de su evolucin viva en sociedad, y para hacerlo utilizan expresiones tales como intelectualidad de masa y trabajo inmaterial, as como el concepto marxista de general intellet. Estos anlisis parten de dos proyectos de bsqueda coordinados. El primero consiste en el anlisis de las transformaciones recientes del trabajo productivo y de su tendencia cada vez ms inmaterial. El papel central preferentemente ocupado por la fuerza de trabajo de los obreros de fbrica en la produccin de plus-valores es hoy da asumida de forma creciente por una fuerza de trabajo intelectual, inmaterial y fundado sobre la comunicacin. Es entonces necesario desarrollar una nueva teora poltica de la plusvala capaz de colocar el problema de esta nueva acumulacin capitalista en el centro del mecanismo de explotacin (y -quiz- en el centro de la revuelta potencial). El segundo proyecto (seguido lgicamente del primero) desarrollado por esta Escuela, consiste en el anlisis de la dimensin social e inmediatamente comunicante del trabajo vivo en la sociedad capitalista contempornea; de este modo plantea con insistencia el problema de las nuevas figuras de la subjetividad en su explotacin, al tiempo que en su potencial revolucionario. La dimensin inmediatamente social de la explotacin del trabajo vivo inmaterial ahoga el trabajo en todos los elementos relacionales que definen lo social, pero al mismo tiempo activa tambin los elementos crticos que desarrollan el potencial de insubordinacin y de revuelta a travs del conjunto de las prcticas laborales. Tras una nueva teora de la plusvala, una nueva teora de la subjetividad debe ser formulada, teora que pasa y funciona fundamentalmente por el conocimiento, la comunicacin y el lenguaje. Estos anlisis han restablecido, as, la importancia de la produccin en el marco del procreso biopoltico de la constitucin social, pero igualmente lo han aislado bajo ciertos aspectos, al tomarlo bajo la forma pura y al afinarlo sobre el plano ideal. Han trabajado como si redescubrir las nuevas formas de fuerzas productivas -trabajo inmaterial, trabajo intelectual masificado, trabajo de inteligencia colectiva- fuera suficiente para aferrar con solidez la relacin dinmica y creativa entre produccin material y reproduccin social. Reinsertando la produccin en el contexto biopoltico, la presentan casi exclusivamente sobre el horizonte del lenguaje y la comunicacin. Uno de los defectos ms serios ha sido, en estos autores, la tendencia a no tratar las nuevas prcticas laborales en la sociedad biopoltica ms que bajo sus aspectos intelectuales y no materiales. Ahora bien, la productividad de los cuerpos y el valor de los afectos son, por contra, absolutamente centrales en este contexto. As pues, nosotros abordaremos los tres aspectos principales del trabajo inmaterial en la economa contempornea: el trabajo de comunicacin de la produccin industrial, recientemente conectado en el interior de redes de informacin; el trabajo de interaccin del anlisis simblico y del anlisis de los problemas; el trabajo de produccin y de manipulacin de los afectos (cf. Section 3.4). Este tercer aspecto, con su focalizacin en la productividad de lo corporal y lo somtico, es un elemento extremamente importante en las redes contemporneas de la produccin biopoltica. El trabajo de esta escuela y su anlisis de la inteligencia colectiva establece, es verdad, un cierto progreso, pero su marco conceptual permanece demasiado puro, casi angelical. En ltimo trmino, estas nuevas teoras no hacen, tampoco, sino raspar la superficie de la dinmica productiva del nuevo marco terico del biopoder.Nuestro propsito es entonces el de trabajar a partir de esos ensayos, parcialmente logrados, para reconocer el potencial de la produccin biopoltica. Es precisamente aproximando de manera coherente las diferentes caractersticas que definen el contexto biopoltico que hemos descrito hasta aqu, y devolvindolas a la ontologa de la produccin, que estaremos en condiciones de identificar la nueva figura del cuerpo biopoltico colectivo - que podra, sin embargo, permanecer tan contradictorio como paradjico. Es que ese cuerpo se convierte en estructura no ya negando la fuerza productiva originaria que la anima, sino reconocindola; se hace lenguaje -a la vez cientfico y social- porque se trata de una multitud de cuerpos singulares y determinados a la bsqueda de una relacin. Es as a la vez produccin y reproduccin, estructura y superestructura, porque est vivo, en el sentido ms pleno, y es poltico, en el sentido propio. Nuestro anlisis debe descender a la jungla de determinaciones productivas y conflictivas que nos ofrece el cuerpo biopoltico colectivo. El contexto de nuestro anlisis debe as ser el desarrollo de la vida misma, el proceso de la constitucin del mundo y de la historia. El anlisis deber ser propuesto no en el sentido de formas ideales, sino en el marco de la complejidad densa de la experiencia.

Sociedades y comunicacin

Al preguntarnos cmo llegan a constituirse los elementos polticos y soberanos de la mquina imperial, descubrimos que no es de ningn modo necesario el limitar nuestro anlisis a las instituciones reguladoras supranacionales establecidas; ni siquiera centrarlo ah. Las organizaciones de las Naciones Unidas, con sus grandes agencias multinacionales y trasnacionales para la finanza y el comercio (el FMI, el Banco Mundial, el GATT, etc.) no se vuelven importantes en la perspectiva de una constitucin jurdica supranacional sino cuando se las considera dentro del marco de la dinmica de la produccin biopoltica del orden mundial. La funcin que ocupaban en el antiguo orden internacional -quisiramos subrayar- no es lo que actualmente da una legitimidad a estas organizaciones: lo que en el presente las legitima es ms bien la funcin nuevamente posible en el simbolismo del orden imperial. Fuera de este nuevo marco, estas instituciones son ineficaces. El antiguo marco institucional contribuye lo mejor posible a la formacin y educacin del personal administrativo de la mquina imperial, al adiestramiento de la nueva lite imperial. Las enormes sociedades transnacionales y multinacionales construyen el tejido conjuntivo fundamental del mundo biopoltico, bajo ciertos aspectos esenciales. El capital, en efecto, siempre ha organizado en una perspectiva totalizante el mundo entero, pero slo en la segunda mitad del siglo XX las sociedades industriales y financieras multinacionales y transnacionales han comenzado de veras a estructurar biopolticamente los territorios a escala mundial. Algunos anticipan que estas sociedades simplemente han venido a ocupar el lugar que antes perteneca a los sistemas colonialistas e imperialistas de las diferentes naciones en las fases anteriores al desarrollo capitalista, desde el imperialismo europeo del siglo XIX hasta la fase fordista de la evolucin en el siglo XX. Esto es en parte cierto, pero ese mismo lugar ha sido sustancialmente transformado por la nueva realidad del capitalismo. Las actividades de las sociedades no se definen ya por la imposicin de un ordenamiento abstracto, la organizacin del pillaje puro y simple y los intercambios desiguales. Antes bien, ellas estructuran y articulan directamente territorios y poblaciones, y tienden a hacer de los Estados-naciones simples instrumentos para registrar los flujos de mercancas, las monedas y las poblaciones que se ponen en movimiento. Las sociedades transnacionales distribuyen directamente la fuerza de trabajo entre los diferentes mercados, atribuyen funcionalmente los recursos y organizan jerrquicamente los diferentes sectores de la produccin mundial. El complejo aparato que selecciona los investimentos y dirige las maniobras financieras y monetarias determina la nueva geografa del mercado mundial, es decir realmente la nueva estructuracin biopoltica del mundo.La imagen ms completa de ese mundo es ofrecida en una perspectiva financiera. Desde este punto de vista, podemos distinguir un horizonte de valores y una mquina de distribucin, un mecanismo de acumulacin y un medio de comunicacin, un poder y un lenguaje. No existe ni vida bruta ni punto de vista exterior, nada, que pueda ser colocado en el exterior de un campo controlado por el dinero: nada escapa al dinero. Produccin y reproduccin son revestidos de hbitos financieros y, de hecho, sobre la escena del mundo, cada figura biopoltica se presenta adornada de sus oropeles monetarios: Acumulad, acumulad! Es la Ley y los Profetas! Las grandes potencias industriales y financieras producen, de este modo, no slo mercancas, sino tambin subjetividades. Producen subjetividades agnticas en el marco del contexto biopoltico: necesidades, relaciones sociales, cuerpos y espritus; lo que quiere decir que producen productores. En la esfera biopoltica, la vida es destinada a trabajar para la produccin, y la produccin a trabajar para la vida. Es una gran colmena en la que la reina vigila permanentemente produccin y reproduccin. Cuanto ms profundiza el anlisis, ms descubre, a niveles crecientes de intensidad, las ensambladuras comunicantes de relaciones interactivas. El desarrollo de las redes de comunicacin posee un vnculo orgnico con la aparicin del nuevo orden mundial: se trata, en otros trminos, del efecto y de la causa, del producto y del productor. La comunicacin no slo expresa sino tambin organiza el movimiento de mundializacin. Organiza multiplicando y estructurando las interconexiones por medio de redes; expresa y controla el sentido y la direccin del imaginario que recorre estas conexiones comunicantes. En otros trminos: el imaginario es guiado y canalizado en el marco de la mquina cominicatriz. Eso que las teoras del poder de la modernidad han estado forzadas a considerar como transcendente, es decir exterior a las relaciones productivas y sociales, es aqu formado en el interior, es decir inmanente a estas mismas relaciones. La mediacin es absorvida en la mquina de produccin. La sntesis poltica del espacio social es fijado en el espacio de la comunicacin. Es por esta razn que las industrias de la comunicacin han tomado una posicin tan central: no slo organizan la produccin a una nueva escala e imponen una nueva estructura apropiada al espacio mundial, sino que convierten tambin su justificacin inmanente. El poder organiza en tanto que productor; organizador, habla y se expresa en tanto que autoridad. El lenguaje, en tanto que comunicador, produce mercancas y crea, adems, subjetividades que pone en relacin y que jerarquiza. Las industrias de comunicacin integran el imaginario y lo simblico en la estructura de lo biopoltico, no slo ponindolos al servicio del poder, sino integrndolos realmente y de hecho en su propio funcionamiento. Llegados a este punto, podemos comenzar a tratar la cuestin de la legitimazin del nuevo orden mundial. ste no nace de acuerdos internacionales existentes anteriormente, ni tampoco del funcionamiento de las primeras organizaciones supranacionales embrionarias, creadas ellas mismas por tratados fundados sobre la ley internacional. La legitimacin de la mquina imperial nace - al menos en parte - de las industrias de la comunicacin, es decir de la transformacin del nuevo modo de produccin en una mquina. Es un sujeto que produce su propia imagen de autoridad. Es una forma de legitimacin que no descansa sobre nada exterior a ella misma, y que es reformulada sin cesar por el desarrollo de su propio lenguaje de auto-validacin.Otra consecuencia ms debe ser abordada a partir de estas premisas: Si la comunicacin es uno de los sectores hegemnicos de la produccin, e influye sobre la totalidad del campo de lo biopoltico, entonces debemos considerar la comunicacin y el contexto biopoltico como coexistentes y coextensivos. Esto nos lleva bien lejos del viejo terreno, tal y como la ha descrito Jrgen Habermas, por ejemplo. Dehecho,cuandoHabermashadesarrolladoelconcepto de accin cominicatriz, demostrando tan fuertemente su forma productiva y las consecuencias ontolgicas que de ella se derivan, l parte siempre de un punto de vista exterior a estos efectos de la mundializacin, de una perspectiva de vida y de verdad que podra contrarrestar la colonizacin del individuo por la informacin. La mquina imperial, no obstante, demuestra que ese punto de vista exterior no existe ya; al contrario: la produccin comunicatriz y la construccin de la legitimacin imperial navegan juntas y ya no pueden ser separadas. La mquina es auto-validante y auto-poitica, es decir: sistmica. Ella construye estructuras sociales que vacan o vuelven inefectivas toda contradiccin; crea situaciones en las que, antes incluso de neutralizar la diferencia por la coercin, parece absorverla en un juego de equilibrios auto-generadores y auto-reguladores. Como hemos dicho en otro lugar, toda teora jurdica que trate condiciones de la posmodernidad, deber tener en cuenta esta definicin especficamente comunicatriz de la produccin social. La mquina imperial vive produciendo un contexto de equilibrios y /o reduciendo las complejidades. Ella pretende proponer un proyecto de ciudadana universal e intensifica, con este propsito, la eficacia de su intervencin sobre todo elemento de la relacin de comunicacin, disolviendo toda identidad e historia sobre un modo enteramente postmoderno. Pero contrariamente a la forma en que muchas valoraciones postmodernas lo hubieran hecho, la mquina imperial, en lugar de eliminar los relatos fundadores, los produce y los reproduce realmente (en particular, los principales relatos ideolgicos) con el fin de hacer valer y celebrar su propio poder. Es en esta coincidencia de produccin por el lenguaje, de produccin lingstica de la realidad y de lenguaje de auto-validacin, en donde reside una clave fundamental para comprender la eficacia, la validez y la legitimacin del derecho imperial.

[1] Este texto es un extracto del captulo I.2. del libro de Michael Hardt y Toni Negri, LEmpire, publicado en las ediciones Exils en el presente ao. Las notas de pie de pgina no se reproducen en la versin presente (N. de MULTITUDES).