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__________________________________________________________________________________________________ Revista Eletrônica Produção & Engenharia, v. 3, n. 1, p. 210-223, Jan./Jun. 2013 210 RESUMO Este estudo foi desenvolvido com dados coletados em duas empresas florestais localizadas nos Municípios de Belo Oriente e de Santa Bárbara, no Estado de Minas Gerais. O objetivo foi avaliar ergonomicamente a operação aplicação de gel, através de análise do ambiente de trabalho e de avaliações biomecânicas, da carga de trabalho físico e risco de Lesões por Esforços Repetitivos/Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (LER/DORT). A operação registrou frequência cardíaca média muito próxima do valor-limite, sendo classificada como moderadamente pesada. O limite de compressão do disco vertebral L 5 -S 1 foi ultrapassado, e verificou-se altíssimo risco de LER/DORT, expondo os trabalhadores a patologias ocupacionais. Concluiu-se que a operação de aplicação de gel, da maneira que é realizada, encontra-se fora dos padrões ergonômicos recomendados. Palavras-chave: Eucaliptocultura, Ergonomia, Operações florestais. Ergonomic assessment of operation of gel application in two forestry companies ABSTRACT This study was developed with data collected in two forestry companies located in Belo Oriente and Santa Bárbara, Minas Gerais State. The aim was to assess ergonomically the operation of gel application, through analysis of the workplace, biomechanical and physical workload evaluating, and Repetitive Strain Injury / Work-Related Musculoskeletal Disorders (RSI/WRMD) risk. The operation registered a very close limit value average cardiac frequency, been classified as moderately heavy. The recommended value for compression force on L 5 -S 1 vertebral disk has been exceeded, and it was found very high RSI/WRMD risk, exposing the workers to occupational diseases. It was concluded that gel application operation is out in accordance with the recommended standards, how is performed. Keywords: Eucalyptus cultivation, Ergonomics, Forestry operations. Avaliação ergonômica da operação de aplicação de gel em duas empresas florestais Marcos Dias do Carmo [email protected] Amaury Paulo de Souza [email protected] Luciano José Minette [email protected]

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Revista Eletrônica Produção & Engenharia, v. 3, n. 1, p. 210-223, Jan./Jun. 2013 210

RESUMO

Este estudo foi desenvolvido com dados coletados em duas empresas florestais localizadas nos Municípios de

Belo Oriente e de Santa Bárbara, no Estado de Minas Gerais. O objetivo foi avaliar ergonomicamente a

operação aplicação de gel, através de análise do ambiente de trabalho e de avaliações biomecânicas, da carga

de trabalho físico e risco de Lesões por Esforços Repetitivos/Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao

Trabalho (LER/DORT). A operação registrou frequência cardíaca média muito próxima do valor-limite, sendo

classificada como moderadamente pesada. O limite de compressão do disco vertebral L5-S1 foi ultrapassado, e

verificou-se altíssimo risco de LER/DORT, expondo os trabalhadores a patologias ocupacionais. Concluiu-se

que a operação de aplicação de gel, da maneira que é realizada, encontra-se fora dos padrões ergonômicos

recomendados.

Palavras-chave: Eucaliptocultura, Ergonomia, Operações florestais.

Ergonomic assessment of operation of gel application in two forestry

companies

ABSTRACT This study was developed with data collected in two forestry companies located in Belo Oriente and Santa

Bárbara, Minas Gerais State. The aim was to assess ergonomically the operation of gel application, through

analysis of the workplace, biomechanical and physical workload evaluating, and Repetitive Strain Injury /

Work-Related Musculoskeletal Disorders (RSI/WRMD) risk. The operation registered a very close limit value

average cardiac frequency, been classified as moderately heavy. The recommended value for compression

force on L5-S1 vertebral disk has been exceeded, and it was found very high RSI/WRMD risk, exposing the

workers to occupational diseases. It was concluded that gel application operation is out in accordance with the

recommended standards, how is performed.

Keywords: Eucalyptus cultivation, Ergonomics, Forestry operations.

Avaliação ergonômica da operação de aplicação de

gel em duas empresas florestais

Marcos Dias do Carmo

[email protected]

Amaury Paulo de Souza

[email protected]

Luciano José Minette

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211 Revista Eletrônica Produção & Engenharia, v. 3, n. 1, p. 210-223, Jan./Jun. 2013

1. Introdução

1.1. Descrição do problema

Desde a década de 1990, a expansão do

setor de base florestal brasileiro vem-se mostrando

notadamente significativa. De acordo com ABIMCI

(2011), o setor foi responsável, no ano de 2007, por

3,4% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional,

equivalente a US$ 44,6 bilhões, demandando

alternativas em implantação florestal que ofereçam

sistemas mais aprimorados e que visem à

sustentabilidade econômica, ambiental e social e,

principalmente, que busquem por maiores ganhos

em saúde e segurança no trabalho. A Ergonomia

tem contribuído com o aumento da produtividade e

da qualidade final do produto, mesmo tendo como

alvo primordial a qualidade de vida do trabalhador

florestal.

Segundo Fiedler (1998), dependendo da

maneira como as atividades florestais são

executadas, os trabalhadores, muitas vezes, erguem

e transportam cargas com pesos acima dos limites

toleráveis e, ainda, de maneira incorreta e

continuadamente por vários anos. Logo, a

manutenção dessas posturas e cargas, de forma

excessiva ou repetida, aumenta o risco de lesões por

desgaste das articulações envolvidas,

comprometendo seriamente a saúde do trabalhador,

o que pode levar, também, a um quadro de Lesões

por Esforços Repetitivos/ Distúrbios

Osteomusculares Relacionados ao Trabalho

(LER/DORT). Além disso, ao se lesionar o

trabalhador necessita de tratamento e reabilitação,

onerando custos extras ao Estado e ao empregador,

além de afetar o seu equilíbrio emocional e

psíquico.

De acordo com Couto (1995), a capacidade

física do ser humano para desenvolver atividades

pesadas em geral é muito baixa. Os transtornos de

coluna constituem uma das maiores causas de

afastamento prolongado do trabalho e de sofrimento

humano. As lombalgias, por exemplo, são muitas

vezes originadas e agravadas por condições de

trabalho inadequadas, e nesse caso tais problemas

decorrem da utilização incorreta da “máquina

humana”.

A operação de aplicação de gel, objeto deste

estudo, conhecidamente apresenta vários problemas

ergonômicos, como elevada carga de trabalho

físico, alta exigência de forças, posturas forçadas e

inadequadas, repetitividade de movimentos, esforço

estático e ausência de intervalos para recuperação

da fadiga, sendo todos esses itens passíveis de

medidas apropriadas de correção, através da

reorganização do trabalho.

1.2. Definição e aplicação de Ergonomia

A International Ergonomics Association

(IEA, 2000) definiu Ergonomia como a disciplina

científica que investiga as interações entre o ser

humano e outros elementos do sistema, aplicando

teorias, princípios, dados e métodos a projetos que

busquem a otimização do bem-estar humano e do

desempenho global de sistemas. Logo, busca-se a

redução de fadiga, estresse, erros e acidentes,

proporcionando segurança, satisfação e saúde ao

trabalhador enquanto elemento fundamental nesse

sistema produtivo. A eficiência virá como

consequência (IIDA, 2005).

Utilizando o conceito e ferramentas da

Ergonomia, pode-se, com efeito, mitigar os danos

diretos e indiretos sobre o bem-estar e a saúde do

trabalhador e, consequentemente, potencializar a

eficiência da operação, por meio da adaptação

ergonômica do trabalho ao ser humano.

Segundo Vidal (2003), para realizar a

transformação positiva das situações de trabalho é

necessário, essencialmente, modelar a atividade de

trabalho, o que é possibilitado pela Análise

Ergonômica do Trabalho (AET): caracterizar de que

maneira os fatores técnicos, humanos, ambientais e

sociais numa situação de trabalho determinam as

atividades dos operadores. A AET caracteriza-se

como análise sistêmica, holística e integrada. Sua

prática consiste em analisar a atividade com relação

ao seu contexto físico, avaliando esforço físico

exigido, organização postural, dispêndio energético,

repouso articulado com a noção de homeostase; ao

seu contexto cognitivo, caracterizando a

compreensão diagnóstica, decisão operatória e

decisão procedimental; e ao seu contexto

organizacional, por seu turno esquematizando a

divisão do trabalho, a cooperação simples e a

constituição dos efetivos.

A AET pode ajudar a resolver os grandes

problemas de organização do trabalho nas

empresas. É cuidando dos problemas precocemente

que as ações ergonômicas apresentam seu maior

impacto e seu menor custo (VIDAL, 2002).

O modelo de análise ergonômica do trabalho

utilizado neste estudo, ajustado de acordo com as

características da atividade pesquisada, vem sendo

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cada vez mais aplicado por especialistas brasileiros

em estudos e pesquisas no setor florestal, a exemplo

de Minette et al. (2010).

Cada vez mais os estudos em Ergonomia

vêm-se mostrando importante ferramenta para o

levantamento de situações de risco à saúde do

trabalhador tanto no setor florestal quanto em

diversas áreas, oferecendo oportunidades de

melhorias nos processos operacionais e buscando a

conformidade desses com a legislação vigente,

através de estudos mais detalhados, como o

realizado por Carmo (2010).

1.3. Descrição da operação

A operação de aplicação de gel é geralmente

utilizada no processo de implantação florestal, no

plantio manual de mudas da cultura, nesse caso o

Eucalyptus sp., aplicando simultaneamente a dose

de gel próximo à muda.

A operação de plantio manual com aplicação

de gel consiste nas etapas mostradas na Figura 1 e

discriminadas a seguir.

Depósito de gel

Abastecimento do

reservatório de

mudas

Deslocamento até

área de plantio

Plantio de mudas

Depósito de

mudas

Abastecimento do

reservatório de

mudas

Figura 1 - Fluxograma da jornada diária de trabalho na

operação de plantio manual com aplicação de gel

a) Abastecimento do reservatório costal de

gel: o trabalhador retirava o reservatório das costas

e colocava-o no solo ou em uma base de apoio

adaptada à carroceria do caminhão-depósito. Com o

auxílio de regador, transferia o gel do depósito para

o reservatório costal, com capacidade para até 22,0

L de gel (Figura 2).

Figura 2 - Etapa de abastecimento do reservatório costal de gel

b) Abastecimento do reservatório de mudas: o

trabalhador transferia as mudas depositadas nas

bandejas para o reservatório de transporte que

ficava preso à cintura e, em seguida, deslocava-se

com o gel e as mudas para o local de plantio (Figura

3).

Figura 3 - Etapa de abastecimento do reservatório de mudas

c) Plantio: o trabalhador utilizava plantadora

manual que possuía dois compartimentos: um para

depositar a muda na cova e outro acoplado ao

reservatório de gel por uma mangueira para

depositar determinado volume da substância

próximo à muda. O trabalhador deslocava-se entre

as covas e, ao chegar a cada uma delas, enterrava a

ponta da plantadora no solo. Apanhava a muda no

reservatório de transporte e fazia sua remoção do

tubete, introduzindo-a na parte superior da

plantadora. Depois, o trabalhador pressionava o pé

em torno da muda para firmá-la ao solo, formando

uma espécie de calha para retenção de água (Figura

4). Ao terminar o plantio, o trabalhador deixava a

plantadora na área e retornava ao depósito de gel e

mudas, munindo-se novamente para iniciar um

novo ciclo de trabalho.

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Figura 4 - Etapa de plantio manual das mudas e aplicação do gel

d) Encerramento: a jornada diária de trabalho

era encerrada após o cumprimento, pelo

trabalhador, da meta de plantar 480 mudas, que era

equivalente a seis caixas destas.

O kit utilizado na operação de plantio

manual com aplicação de gel era composto por um

reservatório costal de material plástico com alças

para o transporte do gel, um reservatório de mudas

preso por um cinto à cintura do trabalhador e uma

plantadeira.

A capacidade do costal era de 22,0 L de gel,

com massa total de 28,4 kg depois de abastecido. A

massa da plantadora era de 3,5 kg e do reservatório

de mudas, 2,8 kg.

As declividades nas áreas de plantio eram,

em sua maioria, superiores a 20º, o que dificultava o

deslocamento do trabalhador e oferecia riscos de

quedas.

1.4. Objetivo

O objetivo desta pesquisa de campo foi

avaliar a operação de aplicação de gel no processo

de implantação da cultura do eucalipto, visando

conhecer a realidade de suas exigências

ergonômicas e biomecânicas relacionadas à sua

realização pelos trabalhadores florestais, de modo a

possibilitar a adaptação das condições de trabalho

às características psicofisiológicas do ser humano,

proporcionando um máximo de conforto e

segurança, com desempenho eficiente.

2. Material e métodos

O objeto desta pesquisa de campo foi a

operação de aplicação de gel no processo de

implantação florestal da cultura do eucalipto,

através de pesquisas bibliográficas, utilização de

técnicas para a coleta de dados e registro dos dados

e posterior análise.

2.1. Local de desenvolvimento do estudo

Os dados foram coletados em duas empresas

florestais, A e B, localizadas, respectivamente, nos

Municípios de Belo Oriente, Distrito Florestal do

Vale do Rio Doce, e Santa Bárbara, região Centro-

Leste, ambos no Estado de Minas Gerais, durante o

mês de abril do ano de 2006. As coordenadas

geográficas das empresas A e B eram: 19° 13’ 12”

S e 42° 29’ 01” W, e 19° 56’ 15” S e 43°26’15” W,

respectivamente.

2.2. Amostragem

A população da amostra foi constituída de

100,0% dos trabalhadores florestais envolvidos com

a operação de aplicação de gel. Desses, 14 eram

trabalhadores da empresa A e oito da empresa B,

totalizando 22 indivíduos.

2.3. Avaliação ergonômica da operação

Condições de trabalho e perfil do trabalhador

Foi utilizado um questionário em forma de

entrevista com o objetivo de caracterizar as

condições de trabalho e o perfil do trabalhador. Esse

método tem a vantagem de incluir na amostragem

os trabalhadores analfabetos ou semianalfabetos,

além de permitir ao pesquisador familiarizar-se com

os termos utilizados no ambiente de trabalho e

diminuir a possibilidade de haver interpretação

equivocada de perguntas.

Foram avaliadas as seguintes variáveis:

características da função exercida, ambiente de

trabalho, supervisão e treinamento, higiene e

segurança no trabalho, escolaridade, ergonomia e

postura de trabalho. A análise dos questionários foi

realizada por meio de programa estatístico

denominado Epi Info (versão 3.3.2 – 2005).

Carga de trabalho físico

A carga de trabalho físico da operação de

aplicação de gel foi avaliada pelo levantamento da

frequência cardíaca durante a jornada de trabalho. A

coleta e análise dos dados foram feitas pelo sistema

Polar Electro Oy. O equipamento, finlandês,

consistia de um receptor digital de pulso, correia

elástica e um transmissor com eletrodos. Os dados

foram obtidos pelo transmissor que era fixado ao

peito pela correia e transmitidos ao receptor em

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intervalos de tempo predefinidos. Ao término da

coleta de dados, estes foram descarregados em um

programa que acompanhava o equipamento e,

posteriormente, analisados por um software

fornecido pelo mesmo fabricante.

Foi utilizada a metodologia proposta por

Apud (1989) para calcular a carga cardiovascular

(CCV) do trabalho, correspondente à percentagem

da frequência cardíaca durante o trabalho em

relação à frequência cardíaca máxima utilizável,

através da seguinte equação:

100

FCRFCM

FCRFCTCCV

em que:

FCT = frequência cardíaca de trabalho;

FCM = frequência cardíaca máxima (220 -

idade); e

FCR = frequência cardíaca de repouso.

A frequência cardíaca limite (FCL) em bpm

(batimentos por minuto) para a CCV de 40% foi

obtida pela seguinte fórmula:

FCRFCRFCMFCL )(40,0

Segundo Apud (1989), quando a CCV

ultrapassa 40% (acima da FCL) é necessário

determinar o tempo de repouso (pausa), com o

objetivo de reorganizar a tarefa, usando a equação:

FCRFCT

FCLFCTHtTr

)(

em que:

Tr = tempo de repouso, descanso ou pausas, em

minutos; e

Ht = duração do trabalho, em minutos.

Avaliação biomecânica

A avaliação biomecânica da operação foi

realizada por uma criteriosa análise bidimensional a

partir uma série de fotografias e filmes, em que

foram registradas diversas posturas adotadas na

operação. Depois de selecionadas as posturas e seus

ângulos terem sido medidos, os dados foram

inseridos no software 2DSSPP (versão 2005), para

modelagem e predição de posturas e forças

estáticas, desenvolvido pela Universidade de

Michigan, em sua versão bidimensional. A análise

forneceu a carga-limite recomendada que 99% dos

homens e 75% das mulheres conseguem levantar,

sendo equivalente a uma força de compressão

máxima de 3.426,3 N sobre o disco vertebral L5-S1,

que pode ser tolerada pela maioria dos

trabalhadores jovens e em boas condições de saúde,

de acordo com a metodologia proposta na

elaboração do modelo biomecânico.

Risco de LER/DORT

Utilizou-se para avaliar o risco de

surgimento de Lesões por Esforços Repetitivos/

Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao

Trabalho (LER/DORT) o check-list de Couto

(COUTO, 2002), que oferece avaliação simplificada

do risco de tenossinovites e distúrbios

musculoesqueléticos de membros superiores

relacionados ao trabalho. Este check-list permite

rápida identificação de situações propícias ao

surgimento de LER/DORT. O check-list de Couto

consiste em uma série de perguntas com respostas

triviais associadas a pontuações caracterizando

situações relacionadas a sobrecarga física, força

com as mãos, postura no trabalho, posto de

trabalho, repetitividade e organização do trabalho,

ferramenta de trabalho. Respostas para situações

isentas de risco correspondem a um ponto cada,

enquanto para outras que ofereçam risco, à

pontuação zero.

Para essa análise foram realizadas

filmagens, fotos e observações in loco da operação,

sendo, posteriormente, esse material utilizado para

responder às questões envolvidas no check-list. Os

resultados foram obtidos a partir da soma dos

pontos do questionário.

A interpretação dos resultados foi feita a

partir do seguinte critério:

Acima de 22 pontos: ausência de fatores

biomecânicos – baixíssimo risco;

Entre 22 e 19 pontos: fator biomecânico

pouco significativo – baixo risco;

Entre 15 e 18 pontos: fator biomecânico

de moderada importância – risco

moderado;

10 a 14 pontos: fator biomecânico

significativo – alto risco; e

15 ou mais pontos: fator biomecânico

muito significativo – altíssimo risco.

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3. Resultados e discussões

A análise dos dados retornou os seguintes

resultados, seguidos das respectivas discussões:

3.1. Condições de trabalho e perfil dos

trabalhadores

A Tabela 1 mostra os dados e informações

obtidos pela entrevista com questionário direto,

relacionados a situações do cotidiano do ambiente

de trabalho.

Como ilustrado na Tabela 2, foram

levantadas: média de idade, massa média, altura

média, cútis e lateralidade da população de

trabalhadores das empresas A e B.

Tabela 1 - Opinião dos trabalhadores das empresas A e B sobre situações cotidianas do ambiente de trabalho

Opinião dos trabalhadores sobre situações no

cotidiano do trabalho

Concordam (%)

empresa A

Concordam (%)

empresa B

Escolheram este trabalho por falta de oportunidades 63,0 66,0

Gostavam do tipo de trabalho que faziam 73,0 34,0

Afirmaram que a tarefa era de difícil execução 45,0 45,0

Consideraram a atividade perigosa 84,0 28,0

O risco de quedas era o principal perigo 75,0 85,0

Consideraram a operação cansativa 100,0 100,0

Motivo cansaço: subir/descer o terreno várias vezes 66,0 90,0

Admitiram faltar ao trabalho 20,0 28,0

Faltavam ao trabalho por duas vezes em um mês 44,0 22,0

Faltavam ao trabalho por dores na coluna vertebral 23,0 14,0

Desejavam mudar de ramo dentro da empresa 48,0 50,0

O cargo de encarregado era o mais almejado 33,0 38,0

Possuíam bom relacionamento com o encarregado 63,0 72,0

Tabela 2 - Dados físicos dos trabalhadores amostrados

Dados físicos dos

trabalhadores

Valores médios

Empresa

A B

Idade (anos) 32,4 34,5

Peso (Kg) 68,8 69,7

Altura (m) 1,70 1,70

Cútis (%)

Branca 12,0 14,0

Negra 32,0 57,0

Mestiça 56,0 29,0

Lateralidade (%) Destro 91,0 29,0

Canhoto 9,0 71,0

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Foram levantados os níveis de escolaridade

dos trabalhadores, bem como suas opiniões sobre os

estudos. Os dados são ilustrados na Tabela 3.

Os dados sobre hábitos e costumes dos

trabalhadores foram levantados através de

entrevista, com os resultados apresentados na

Tabela 4.

Tabela 3 - Nível de escolaridade e opinião dos trabalhadores das empresas A e B

Nível de escolaridade (%)

Empresa A

(%)

Empresa B

Nunca estudaram 7,0 -

Ensino Fundamental Incompleto 74,0 100,0

Ensino Fundamental Completo 7,0 -

Ensino Médio Completo 12,0 -

Opinião dos trabalhadores

Afirmaram não estudar atualmente 100,0 100,0

Pararam de estudar pela necessidade de trabalhar 58,0 57,0

Pararam de estudar por vontade própria 20,0 43,0

Pararam de estudar por dificuldades financeiras 16,0 -

Pararam de estudar por causa da distância 7,0 -

Gostariam de voltar a estudar 63,0 100,0

Não voltar a estudar devido ao cansaço (do trabalho) 73,0 86,0

Tabela 4 - Opinião dos trabalhadores, seus hábitos e costumes

Opinião dos trabalhadores – Hábitos e costumes Empresa A (%) Empresa B (%)

Dormiam em torno das 21 horas da noite 35,0 33,0

Acordavam em torno das 4 horas da manhã 67,0 69,0

Período de sono de 7 horas (média) 31,0 39,0

Afirmaram sofrer insônia 7,0 3,0

Achavam o período de sono suficiente para descanso 86,0 63,0

Não sentiam cansaço no início da jornada de trabalho 81,0 85,0

Sentiam cansaço físico após a jornada diária 58,0 58,0

Trabalhadores ligados ao tabagismo 30,0 50,0

Relaram consumir bebidas alcoólicas 45,0 66,0

Consumiam café durante o trabalho 52,0 50,0

Esforçavam-se para cumprir a meta antes do almoço 83,0 77,0

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Em razão da distância entre as residências

dos trabalhadores e os locais de trabalho, havia a

necessidade de que eles acordassem cedo para

serem transportados, através de ônibus das

empresas, até o trabalho.

O sistema de folgas, em ambas as empresas,

correspondia aos sábados, domingos e feriados.

Para Fiedler (1998), o alto percentual de

fumantes e consumidores de bebidas alcoólicas,

mesmo nos finais de semana, é uma característica

não satisfatória para a execução do trabalho de alta

exigência física, a exemplo da operação de

aplicação de gel.

Ambas as empresas disponibilizavam para

os trabalhadores, durante a jornada diária de

trabalho, garrafas térmicas de 5 L para conservar a

baixa temperatura da água.

De acordo com Minette et al. (2007), as

pausas são necessárias para evitar a sobrecarga de

trabalho quando se detectam excessos de carga

física, por isso não se recomenda a organização do

trabalho em metas, visto que o trabalhador, muitas

vezes, ignora as limitações do seu organismo,

procurando encerrar a tarefa o mais breve possível,

ignorando os malefícios das pausas irregulares.

Sobre os tipos e frequências das refeições

dos trabalhadores, a pesquisa de campo retornou os

seguintes dados, descritos na Tabela 5.

Dos trabalhadores entrevistados na empresa

A, 50,0% tinham maior sensação de fome às 11 h,

enquanto para a maioria (67,0%) dos trabalhadores

entrevistados na empresa B a mesma sensação

ocorria às 10h30.

Tabela 5 - Tipos e frequências das refeições diárias realizadas pelos trabalhadores

Tipo de refeição Dias de trabalho (%) Dias de folga (%)

A B A B

Café da manhã 84,0 71,0 74,0 71,0

Lanche da manhã 73,0 71,0 83,0 71,0

Almoço 97,0 86,0 100,0 100,0

Lanche da tarde 44,0 29,0 44,0 71,0

Jantar 99,0 71,0 100,0 100,0

Lanche da noite 20,0 29,0 20,0 71,0

Sobre a sindicalização dos trabalhadores,

foram obtidas as seguintes informações através de

entrevistas, conforme descrito na Tabela 6.

Questionados sobre a importância de serem

sindicalizados, a maioria dos trabalhadores da

empresa A relatou que o principal motivo era “o

auxílio para a futura aposentadoria” e para a metade

dos trabalhadores de B, o principal motivo eram “as

consultas médicas que o sindicato oferecia”.

Sobre o grau de treinamento nas empresas, entre os

trabalhadores entrevistados em ambas as empresas,

100,0% deles afirmaram ter recebido treinamento

relativo à função por meio do encarregado e do

técnico de segurança, com duração média de dois

dias, acreditando que esse tempo foi suficiente para

o aprendizado. Na Tabela 7, encontram-se as

opiniões dos trabalhadores obtidas por meio de

entrevistas.

Tabela 6 - Grau de sindicalização e opinião dos trabalhadores

Opinião dos

trabalhadores –

Sindicalização

Empresa

A (%)

Empresa

B (%)

Eram sindicalizados 25,0 43,0

Afirmaram conhecer as

atividades do sindicato

18,0 33,0

Achavam importante ser

sindicalizados

77,0 67,0

Aumento de salário era o

maior benefício

60,0 87,0

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Tabela 7 - Opinião dos trabalhadores sobre treinamentos e

segurança

Opinião dos trabalhadores

sobre treinamentos e

segurança no trabalho

Empresa

A (%)

Empresa

B (%)

Afirmaram ter recebido

treinamentos na empresa

78,0 88,0

Recebiam treinamento

mensal sobre a operação

87,0 71,0

Consideravam importantes os

treinamentos

98,0 98,0

Receberam treinamento em

segurança no trabalho

98,0 100,0

A operação de plantio florestal manual com

aplicação de gel requer cuidado especial com as

mudas e com a maneira de plantá-las, bem como

conhecimentos para maior segurança no trabalho e

sobre atitudes a serem tomadas diante de eventuais

situações de emergência.

Em relação aos efeitos do trabalho na saúde

dos trabalhadores, a pesquisa de campo levantou os

seguintes dados e informações, descritos a seguir.

Dos entrevistados, 12,0% dos da empresa A

relataram estar com problemas de saúde na ocasião

da entrevista, e, desses, 50,0% acreditavam que

esses problemas estivessem associados à execução

da tarefa.

Doze por cento dos trabalhadores de ambas

as empresas relataram sentir dor nos olhos,

acreditando ser decorrente do esforço visual durante

o trabalho; citaram irritação 35,0% (A) e 38,0% (B).

Os trabalhadores acreditavam que esses sintomas

estavam relacionados à poeira, e 18,0% deles

também consideravam ser a causa de alergia.

O desconforto visual pode provocar

sensação de cansaço nos olhos, dor, irritabilidade e

vermelhidão, obrigando, muitas vezes, o

trabalhador a adotar posturas e movimentos

inadequados, buscando situações de conforto visual

(RIO; PIRES, 2001). Segundo Couto (1995), a

sudorese dos trabalhadores pode resultar em

irritação ocular e, consequentemente, alguma

interferência na tarefa, acentuando os riscos de

acidente.

Partes do corpo em que os trabalhadores relataram dores ou

desconforto muscular após a jornada de trabalho

35

18

35

66

40

0

10

20

30

40

50

60

70

A B

Empresa

%

Coluna vertebral

Membros inferiores

Ombros

Dedos das mãos

Figura 5 - Partes do corpo em que os trabalhadores mais alegaram dor ou desconforto muscular após a jornada de trabalho.

De acordo com Couto (1995), a postura de

pé, quando utilizada na maior parte da jornada de

trabalho, pode ocasionar dores nos músculos da

panturrilha e surgimento de varizes, principalmente

ao se realizar o trabalho transportando cargas

pesadas e em ambientes quentes.

Sobre as ferramentas de trabalho, a

pesquisa revelou as seguintes informações:

Para 82,0% (A e B) dos entrevistados, o

kit utilizado oferecia boa segurança e

encontrava-se em bom estado de

conservação.

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Avaliação ergonômica da operação de aplicação de gel em duas empresas florestais

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Todos os trabalhadores (A e B)

afirmaram que o costal possuía regulagem

para altura.

Todos os entrevistados, de ambas as

empresas, afirmaram que o estofamento do

costal não era ideal, pois causava

incômodo e elevava a transpiração.

Cem por cento dos trabalhadores

relataram (A e B) que os controles de

acionamento do equipamento eram bem

instalados e de fácil acesso e manuseio.

Sobre a postura de trabalho, foram

obtidos os seguintes resultados, mostrados na

Tabela 8.

Tabela 8 - Opinião dos trabalhadores sobre a postura de trabalho relacionada à execução da atividade de aplicação de gel

Opinião dos trabalhadores – Postura de trabalho Empresa A (%) Empresa B (%)

A postura era extremamente desconfortável 77,0 89,0

A postura não podia ser facilmente alterada 47,0 45,0

Havia risco de quedas ao subir e descer o terreno 71,0 79,0

O local de trabalho era de difícil acesso 30,0 25,0

Admitiram ter sofrido acidentes realizando a operação 12,0 -

Acidentes associados a quedas por declividades do terreno 100,0 -

Segundo Iida (2005), os acidentes

geralmente resultam de interações inadequadas

entre o homem, a tarefa e o seu ambiente, podendo

haver o predomínio de um desses fatores. Logo, a

combinação de má postura relacionada com o

transporte dos equipamentos e com a dificuldade de

locomoção pelo talhão implicava risco potencial

para acidentes.

3.2. Carga de trabalho físico

A carga cardiovascular (CCV) exigida para

a operação de plantio manual com aplicação de gel

foi de 41,0% em A e 40,0% em B, estando o

primeiro registro citado anteriormente e o segundo

exatamente iguais ao valor recomendado por Apud

(1989), em sua metodologia.

Em ambas as situações, o ciclo de trabalho

avaliado foi classificado como moderadamente

pesado, visto que a frequência cardíaca (FCT)

durante toda a jornada de trabalho foi de 122 bpm

(A) e 116 bpm (B), todas acima do limite

recomendado.

Para Couto (1995), durante uma jornada de

trabalho de oito horas a frequência cardíaca não

deve exceder a 110 bpm, pois acima desse limite há

indicação de fadiga.

Em consequência desse ritmo de trabalho,

de acordo com Souza e Minette (2002), à medida

que aumenta a fadiga, são reduzidos o ritmo de

trabalho, o raciocínio e a atenção, tornando o

trabalhador menos produtivo e mais suscetível a

erros, incidentes e acidentes. As Figuras 6 e 7

ilustram as oscilações da frequência cardíaca dos

trabalhadores registradas nas empresas A e B,

respectivamente, para a operação de aplicação de

gel.

Figura 6 - Frequência cardíaca observada durante a operação

de plantio manual com aplicação de gel na empresa A, em

função do tempo

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Figura 7 - Frequência cardíaca observada durante a operação

de plantio manual com a aplicação de gel na empresa B, em

função do tempo

Na situação observada na empresa A, a cada

60 min da jornada diária o trabalhador deveria

trabalhar 58 min e descansar por outros 2 min. Isso

não acontecia devido à organização do trabalho em

metas, o que induzia o trabalhador a cumprir sua

tarefa rapidamente para ser logo liberado,

prejudicando o mecanismo de recuperação de

fadiga e oferecendo riscos à sua saúde.

As pausas, segundo Silva (2007),

proporcionam alívio entre o esforço e o repouso; o

organismo humano necessita de períodos de

recuperação de energia para que possa manter sua

capacidade funcional.

Na opinião de Couto (1995), essas pausas

representam um mecanismo fisiológico de

compensação e de prevenção da fadiga crônica.

Quanto mais frequentes e menores, melhor será a

recuperação do trabalhador, e ele poderá manter seu

ritmo de trabalho.

3.3. Avaliação biomecânica

A avaliação biomecânica foi realizada em

quatro etapas: coveamento manual, plantio das

mudas, abastecimento do costal e deslocamento

entre covas. Nas etapas de plantio e de

deslocamento, a carga-limite recomendada foi

ultrapassada nas articulações coxofemorais e

tornozelos. Apresentaram risco de lesões no disco

vertebral L5-S1 e do joelho 17,0%, 23,0% no

tornozelo e 26,0% nas articulações coxofemorais.

Na etapa de abastecimento, a carga-limite foi

ultrapassada em todas as articulações.

A Tabela 8 apresenta os resultados da

análise biomecânica de ambas as etapas da

operação. A sigla SRL (Sem Risco de Lesão nas

Articulações) equivale a dizer que mais de 99,0%

dos trabalhadores conseguem suportar a carga

imposta pela atividade sem risco para as

articulações. A sigla CLR (Carga-Limite

Recomendada Ultrapassada) indica que menos de

99,0% dos trabalhadores conseguem suportar a

carga imposta pela atividade sem risco para as

articulações envolvidas.

Tabela 8 - Resultado da análise biomecânica da operação de plantio manual com aplicação de gel

Etapa Postura

Estática

Articulações e respectivas condições de suportar a carga, em que:

SRL = Sem Risco de Lesão; e CLR = Carga Limite Recomendada

Ultrapassada

Cotovel

os Ombros Disco L5-S1 Coxofemorais Joelhos Tornozelos

Coveamento

manual

CLR CLR CLR CLR SRL SRL

Plantio de

mudas

SRL SRL SRL CLR SRL CLR

Abastecimento

do costal

CLR CLR CLR CLR CLR CLR

Deslocamento

entre covas

SRL SRL SRL CLR CLR SRL

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Avaliação ergonômica da operação de aplicação de gel em duas empresas florestais

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Segundo Couto (1995), a sobrecarga postural e o

trabalho estático podem gerar fadiga muscular,

transtornos osteomusculares e compressão de

estruturas nervosas, além do agravamento de lesões

prévias em músculos e ligamentos.

Os resultados da Tabela 9 indicam na etapa

de abastecimento do costal uma força da ordem de

4.724,0 N, valor muito superior ao recomendado

pelo modelo biomecânico desenvolvido pela

Universidade de Michigan, que é de 3.426,3 N e

deve ser evitado, pois oferece sérios riscos à saúde

do trabalhador.

Tabela 9 - Forças de compressão no disco L5-S1 registradas

nas etapas da operação de plantio manual com aplicação de

gel, considerando-se o limite recomendado de 3.426,3 N

Etapa Força de compressão no

disco l5-s1 (n)

Plantio 1131,0 ± 67

Abastecimento 4724,0 ± 366

Deslocamento 1469,0 ± 95

De acordo com Couto (1995), essas forças

de compressão excessivas podem ocasionar o

surgimento de lombalgia por distensão

musculoligamentar, que, mesmo não sendo das

mais graves, são recidivantes, podendo, também,

ocasionar hipertonia crônica dos músculos, com

compressão dos discos intervertebrais e

consequente degeneração destes.

3.4. Risco de LER/DORT

De acordo com o check-list de Couto (2002),

a operação de aplicação de gel apresentou altíssimo

risco de LER/DORT, totalizando nove pontos no

somatório.

Durante a execução das etapas da operação,

foi observada alta frequência de movimentos

repetitivos, agravados por manuseio de cargas

pesadas, ocasionando aumento do risco de lesões

por desgaste das articulações envolvidas, fato que

contribui para o comprometimento da saúde do

trabalhador. Ao se lesionar, esse funcionário é

afastado da atividade para tratamento, onerando

custos extras ao Sistema Previdenciário do Estado e

prejuízos para o empregador, além de alterar o

quadro emocional e psíquico do trabalhador.

A etiologia das LER/DORT está ligada à

exigência de manutenção de posição fixa dos

ombros e pescoço por tempo prolongado, uso de

máquinas que exigem posturas ou movimentos

forçados e, ou, repetitivos, pressão para produzir

mais e impossibilidade de pausas (MAENO, 2001).

Segundo Silva (2007), as pausas

proporcionam alívio entre o esforço e o repouso. As

pausas representam mecanismo fisiológico de

compensação e prevenção da fadiga crônica.

Quanto mais frequentes e menores, melhor será a

recuperação do trabalhador, e ele poderá manter seu

ritmo de trabalho (COUTO, 1995).

O trabalho organizado em sistemas de

metas, sem intervalos programados para

recuperação da fadiga, oferece riscos de danos

osteomusculares, devendo, por tanto, ser evitado.

Tendões, músculos e articulações submetidos ao

trabalho contínuo e com repetição de movimentos,

sem regime de pausas, sofrem alterações e passam a

ter dificuldade para obedecer aos comandos do

sistema nervoso. Assim, as dores acabam por

provocar a diminuição da qualidade do trabalho e

da produtividade, afetando diretamente a saúde do

trabalhador e expondo-o ao risco de acidentes.

O check-list de Couto é um instrumento

subjetivo, e para um diagnóstico mais preciso é

coerente que também seja feita uma avaliação pelo

médico do trabalho.

4. Conclusão

Ao final deste estudo, conclui-se que:

O ambiente de trabalho estudado

proporcionava riscos de acidentes,

principalmente em função da necessidade de o

trabalhador transportar cargas em terrenos com

declividade acentuada, favorecendo o

surgimento de dores musculares causadas por

posturas forçadas inadequadas ou ferimentos

por quedas.

O perfil dos trabalhadores revelou uma

população de trabalhadores com nível de

escolaridade baixo, porém ciente dos riscos de

acidentes proporcionados pela atividade por

eles exercida, o que evidencia a importância

dos treinamentos operacionais e de segurança.

A operação de aplicação de gel no setor

florestal, da maneira como era realizada nos

casos estudados, não se encontrava dentro dos

padrões ergonômicos recomendados,

necessitando urgentemente de intervenções e

ajustes adequados, através da reorganização do

trabalho e adequação das cargas e posturas

adotadas.

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O sistema de metas adotado nos casos

estudados pode oferecer ao trabalhador riscos

de lesão e acidentes, pois esse operário tendia a

exceder os limites do corpo para cumprir sua

meta diária rapidamente, associado a um alto

índice de absenteísmo e à sobrecarga física e

cardíaca exigida pela atividade.

A análise biomecânica da atividade

indicou a existência de risco significativo de

lesão durante a execução da tarefa em todas as

etapas, principalmente naquela de

abastecimento do costal de gel, em que o disco

vertebral L5-S1 recebia carga acima do limite

recomendado e esse mesmo limite foi

ultrapassado em todas as articulações, o que

demonstrou novamente a necessidade de

ajustes técnicos na mesma atividade, pois o

trabalhador ficava exposto ao surgimento de

patologias ocupacionais.

Finalmente, a análise dos riscos de

surgimento de LER/DORT indicou, da mesma

forma, a necessidade de reorganização da

operação de aplicação de gel, pois a execução

dessa atividade oferecia risco altíssimo de

lesões ao trabalhador, principalmente devido à

alta frequência de movimentos repetitivos

associados ao esforço estático e ao manuseio de

cargas pesadas, presentes na rotina da

atividade.

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223 Revista Eletrônica Produção & Engenharia, v.3, n. 1, p. 210-223, Jan./Jun. 2013

Recebido em: 13/08/2009

Publicado em: 11/08/2013